Chicharrita: Argentina registra alta pressão da cigarrinha do milho e já pode ter perdido 10 milhões de toneladas
Velha conhecida e uma das principais inimigas do produtor de milho brasileiro, a cigarrinha está se espalhando também na Argentina e já trazendo grandes impactos para a produção do cereal pelo país.
Durante o mês de abril, a Bolsa de Cereais de Rosário reduziu a expectativa de produção de milho da Argentina em 6,5 milhões de toneladas, especialmente por danos causados pelas doenças transmitidas pela cigarrinha, ou chicharrita, como é conhecida a praga por lá. Anteriormente, a Bolsa de Grãos de Buenos Aires também já havia cortado 2 milhões de toneladas das suas projeções.
“Tem perdas sim, mas ainda é difícil de se contabilizar. Entre 2 e 3 milhões de toneladas certamente foram perdidas, mas não foi um problema tão generalizado, pegou mais uma parte da região produtora”, relata o Analista de Mercado da Brandalizze Consulting, Vlamir Brandalizze.
Diretor da Globaltecnos na Argentina, Sebastian Gavalda, acredita em números ainda mais drásticos de perdas, chegando em até 10 milhões de toneladas já consolidadas, o que seria mais de 18% de perda com relação as projeções iniciais dos órgãos oficiais de 53 milhões de toneladas.
“Oficialmente, algumas instituições falam entre 5 e 6 milhões de perdas, mas nós calculamos entre 8 e 10 milhões. Isso é um impacto muito grande nos produtores afetados, alguns terão zero grãos colhidos e outros vão ter perdas de 50, 60 ou 70%”, aponta Gavalda.
A safra 2023/24 registrou aumento na população de cigarrinhas em algumas áreas também do Brasil, especialmente no Sul do país, o que ajuda a explicar essa situação de infestação da Argentina e do Paraguai.
“A cigarrinha é um inseto altamente dependente das condições climáticas, como as temperaturas não foram tão baixas no inverno e a umidade relativa do ar foi maior, isso faz a dinâmica populacional do inseto aumentar e conecta com a explosão da praga”, explica Willian Zancan, Gerente de Pragas, Doenças e Soluções Integradas para Cultura do Milho e Sorgo da Bayer.
Além de ter aumento no número de insetos no país, outro fator que contribuiu muito para este problema foi que a cigarrinha apareceu em regiões onde isso não era comum, pegando os produtores locais de surpresa.
“A cigarrinha expandiu para zonas onde nunca existiu, como o norte argentino, que chamamos de NOA, que em outros anos não tinha registros do inseto. As províncias do Norte e do Centro foram muito afetadas, em lugares que a cigarrinha nunca tinha estado. Então os produtores não sabiam como combatê-la”, conta Gavalda.
Na opinião de Zancan, alguns aprendizados ficaram após os últimos anos de crescimento da cigarrinha no Brasil e agora devem ficar de exemplo para os produtores argentinos.
“É preciso conhecer a dinâmica das cigarrinhas e das doenças que elas transmitem, além de não tomar medidas isoladas, já que nenhuma delas tem eficácia de 100% e nem é curativa. A primeira atenção tem que ser na eliminação do milho tiguera, isso é o mais importante. Depois, atenção na escolha de cultivares com genética mais tolerante e sementes tratadas para redução dos impactos”, relata Zancan.
O especialista ainda lista outros pontos de atenção importantes, como o monitoramento das lavouras e o cuidado durante colheita e transporte para evitar quedas de sementes que irão gerar plantas voluntárias e criar a ponte verde. “Quanto mais cedo a cigarrinha entrar na lavoura maiores serão os danos. As perdas podem chegar à 70% em algumas áreas pela ausência do manejo efetivo”, destaca.
Com essas perdas de produção já dadas como certas, outros impactos também vão surgir numa reação em cadeia, como a redução das exportações e queda nas arrecadações e geração de receita econômica.
“A Argentina é uma importante exportadora de milho, a terceira maior do mundo, e vai ter queda de pelo menos 10 milhões de toneladas das 40 ou 42 milhões de toneladas esperadas. Como a colheita será apenas entre julho e agosto, precisamos esperar para ter um número definitivo, até as colheitadeiras entrarem para ver a produção final”, pontua Sebastian Gavalda.
Diretor Geral do Grupo Labhoro, Ginaldo de Sousa, cita o Chefe do Departamento de Estudos Econômicos da Bolsa de Rosário, Julio Calzada, que estimou que o dano da cigarrinha do milho já foi responsável pela perda de cerca de US$ 1,268 bilhão da safra de milho 23/24.
Os reflexos deste problema também devem se estender para a próxima safra 2024/25, que começará a ser semeada na Argentina entre os meses de agosto e setembro deste ano. “Pensando em 24/25, vai ter uma queda importante da área de plantio, até porque não existe solução tecnológica eficaz para combater a cigarrinha”, alerta Gavalda.
Como algum conforto ao produtor argentino, Vlamir Brandalizze enxerga que o pior dos ataques da cigarrinha já passou. “Conversando com o pessoal de lá, os últimos dias tiveram chuva e temperaturas mais baixas. Isso ajudou a estacionar o problema, que diminuiu nessa semana. Março foi o período mais crítico, mas agora em abril está acomodando”.
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