Brasil deve voltar a bater a marca de três milhões de toneladas de algodão
Mesmo tendo sido plantada num momento em que os custos de produção estavam nos patamares mais altos da história, os produtores brasileiros de algodão mantiveram a área e devem voltar a ultrapassar três milhões de toneladas da fibra, na safra 2022/2023. Em 20 anos, a marca foi atingida apenas uma vez, no ciclo 2019/2020. Na safra em curso, as lavouras brasileiras de algodão ocuparam 1,65 milhão de hectares, e a expectativa da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) é de que a produtividade fique em torno de 1.827 quilos por hectare. Os números foram divulgados ontem, 01 de março, na 70ª reunião da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Algodão e seus Derivados, na sede do Ministério da Agricultura, em Brasília.
Embora otimistas em relação aos números apresentados por todos os setores que participam da Câmara, os cotonicultores ressaltaram que ainda é muito cedo para contar a estimativa como certa, e o clima será definitivo para a confirmação. Apenas recentemente o estado de Mato Grosso, maior produtor nacional de algodão, concluiu o plantio da safra, quase no limite da janela permitida, por causa do atraso na colheita da soja. As lavouras mato-grossenses somam 1,18 milhão de hectares. Na Bahia, segundo maior produtor brasileiro, a área plantada ficou em 312 mil hectares, um incremento de 1,8% em relação ao ano agrícola de 2021/2022, e até o momento, as lavouras se desenvolvem bem.
“Nós estamos na metade do ciclo do algodão e precisamos, ainda, de muita chuva até o final. Dependemos da produtividade para compensar uma safra plantada com custos muito altos, e ter uma rentabilidade satisfatória. A causa dos custos altos foi, principalmente, a elevação dos preços dos fertilizantes, que chegaram a ser até quatro vezes mais caros do que vínhamos pagando. Sem esse insumo, não se forma lavoura”, explicou o presidente da câmara e ex-presidente da Abrapa, Júlio Cézar Busato, que, na ocasião, entregou o comando do foro da cadeia produtiva do algodão ao novo presidente da Abrapa, Alexandre Schenkel. Segundo Busato, que assumiu a vice-presidência do Instituto Pensar Agropecuária (IPA), os preços dos combustíveis já estão se normalizando, e devem reduzir a pressão sobre o cotonicultor na safra seguinte.
Recado
Para Alexandre Schenkel, presidente da Abrapa, o produtor brasileiro de algodão deu um importante recado para o mercado. “Não apenas mantivemos nossa área, quando a situação se tornou desfavorável, como até tivemos um pequeno incremento. Temos uma estrutura que é específica para o algodão e não podemos deixá-la ociosa. Nós acreditamos na cotonicultura, temos compromisso com o mercado, e, talvez antes mesmo do que esperávamos, vamos ser o primeiro exportador do produto no ranking mundial. O mundo pode contar com nosso algodão, que, além de escala, tem sustentabilidade e rastreabilidade”, afirmou Schenkel.
Sustentabilidade e rastreabilidade, por sinal, foram o tema da apresentação da diretora de Relações Institucionais da Abrapa, Silmara Ferraresi, que mostrou a evolução destes, que são dois dos quatro compromissos fundamentais da Abrapa, junto com a qualidade e a promoção. A união do Sistema Abrapa de Identificação (SAI) com o programa Algodão Brasileiro Responsável (ABR) resultou no SouABR. Pela primeira, em todo o mundo, tornou-se possível o rastreamento de toda a cadeia produtiva de uma peça de vestuário, desde a semente até o guarda-roupa. A inovação foi encampada, primeiro, pelas varejistas Reserva e Renner, e, agora está aberta às marcas interessadas e elegíveis a participar.
Exportações
Se na primeira vez que o Brasil colheu mais de três milhões de toneladas de algodão a logística para fazer o produto chegar ao mercado, sobretudo externo, era uma preocupação proporcional ao tamanho da safra, desta vez, exportadores e produtores contam com a experiência, como referência positiva. A expectativa da Associação Nacional dos Produtores de Algodão (Anea) é de embarcar, aproximadamente, 1,71 milhão de toneladas, em 2022/2023. Representando o setor na 70ª reunião da Câmara, Henrique Snitcovski argumenta que o Brasil já foi capaz de embarcar volumes representativos, “não só em um único mês, mas em um período mais longo, o que traz segurança para o mercado internacional, quando eles precisam se programar com antecipação para as suas misturas, nas fábricas”. Snitcovski credita ao trabalho conjunto do setor produtivo, o sucesso nos embarques com a pluma, nos últimos anos.
“Fizemos uma força-tarefa para superar os gargalos relacionados à infraestrutura e trazer mais previsibilidade para a organização do fluxo de exportação, e, principalmente, para promover o algodão no mercado internacional, levando mais informações, transparência e credibilidade, assim como assegurando o fornecimento do produto brasileiro durante 12 meses, com regularidade”, ele acrescentou que este esforço é contínuo.
Têxteis e vestuário
Também membro da câmara, a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit) apresentou um panorama do setor. Segundo o presidente da entidade, Fernando Pimentel, o setor de têxteis estima um crescimento de 2,3% para este ano. “Trata-se ainda de um primeiro levantamento, que pode mudar”, advertiu Pimentel. O elo da indústria têxtil foi o que mais sofreu, no ano passado, com o impacto do aumento dos custos de produção. Segundo a Abit, o consumo do varejo no Brasil “ainda não deslanchou”, em função de incertezas.
O presidente da associação ressaltou as perspectivas para o consumo de fibras no mundo, com destaque para os chamados tecidos tecnológicos, assim como para a valorização de conceitos, como economia circular e sustentabilidade, que representam oportunidade para o algodão brasileiro. Segundo Pimentel, o desejo da indústria nacional é que o país possa exportar mais produtos manufaturados e menos matéria-prima. “Deixaríamos de receber dois dólares por quilo de algodão, para receber 20 dólares por quilo de algodão manufaturado”, ponderou.
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