Especialistas em agro analisam perspectivas para o setor na próxima década
O desempenho do agronegócio brasileiro, na próxima década, deve ser melhor que a média no restante do mundo, para commodities agrícolas importantes: soja, milho, açúcar e carnes (bovina, suína e frango). Apesar do otimismo, a taxa de crescimento apresentada pelo setor, nos últimos dez anos, no que diz respeito à produção e às exportações das principais culturas, não deve se repetir no período indicado.
A conclusão é do “Outlook Fiesp 2026 – Projeções para o Agronegócio Brasileiro”, levantamento elaborado pelo Departamento de Agronegócio (Deagro) da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que engloba diagnósticos e projeções do setor, em termos de produção, produtividade, consumo doméstico e exportações.
Presidente da Fiesp, Paulo Skaf disse, em nota à imprensa, que “há muitos e grandes desafios de curto prazo, especialmente da situação econômica do país, que afetam diretamente o desempenho do agronegócio, mas também há muitas oportunidades”.
Ele ainda lembra que, hoje, 60% das exportações do agro enfrentam por algum tipo de industrialização: “Precisamos abrir novos mercados, como o asiático, para aumentar essa proporção. Se o governo fizer o que precisa ser feito em termos de política comercial, alcançaremos números ainda mais significativos”.
GRÃOS
O Outlook Fiesp 2026 aponta que a participação de mercado do Brasil nas exportações mundiais de soja, por exemplo, deve chegar a 49% entre 2016 e 2026, com um aumento de 4,6% por ano, bem acima dos 2,7%, em média, dos demais produtores.
Conforme o Deagro/Fiesp, o milho nacional, por sua vez, que vem sendo bastante disputado no mercado externo por causa de sua qualidade, deve ter alta anual de 8,8%, com a participação nas vendas externas chegando a 23%, em 2026. Para a safra 2025/26, o órgão prevê um incremento de 21% no consumo interno, alavancado pelo setor de proteínas animais.
Em relação ao açúcar, o Departamento de Agronegócio estima que o Brasil, que hoje é o maior exportador mundial desta commodity, será responsável por metade do que é comercializado lá fora, na próxima década, com índice de crescimento de 2,2% ao ano.
Vice-presidente da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), Hélio Sirimarco vê com cautela as perspectivas de desempenho para o setor agropecuário. “Em dez anos, as variáveis que podem impactar esses mercados são muitas e imprevisíveis. Só para mencionar uma: o câmbio. Além disso, não sabemos ainda como vai se comportar o mercado internacional, após a posse de Trump (Donald Trump, presidente eleito dos Estados Unidos, que toma posse no dia 20 de janeiro)?”, questiona.
Na opinião de Sirimarco, se o dólar se valorizar em relação ao yuan (moeda oficial da China, principal parceiro comercial do Brasil), por exemplo, isso pode afetar as importações daquele país asiático: “E se o dólar se valorizar em relação a outras moedas, isso também vai impactar os preços das principais commodities”.
CARNES DE FRANGO E SUÍNA
Conforme o Deagro/Fiesp, 2017 deve marcar o início da recuperação para o mercado de carnes, como a de frango e suína, que registraram aumentos históricos dos custos de produção e estagnação do consumo, por causa da redução do poder de compra da população brasileira.
“Com a esperada recuperação econômica do Brasil, esperamos que o mercado interno se reaqueça e siga o bom fluxo obtido com as exportações, que registraram alta de 1,9% em carne de frango, no ano passado, e de 32% em carne suína. Em 2016, enfrentamos um cenário altamente desafiador, com as altas históricas dos custos de produção e retração dos níveis de consumo, com a crise econômica e o aumento do desemprego no país”, avalia o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), o ex-ministro da Agricultura Francisco Turra.
Para 2017, de acordo com Turra, que também é membro da Academia Nacional de Agricultura, da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), “nossa expectativa é de crescimento de 3% a 5% na produção e nas exportações de carne de frango, com a retomada dos níveis de consumo em patamares semelhantes aos de 2015”. “Para a carne suína, a alta em 2017 deve chegar a 2% na produção; e até 5% nas exportações.”
O Departamento de Agronegócio ainda indica uma projeção para a carne suína, para a próxima década, que também deve ser favorável, com crescimento anual das exportações de 3% e participação no mercado externo de 10%. “A carne de frango manterá sua expressiva fatia do mercado global, com 41% do montante comercializado.”
“A carne suína tem excelente potencial de crescimento no mercado internacional, como vimos com a elevação registrada no saldo de 2016. Além dos mercados já conquistados – com a ampliação das vendas para o Leste Europeu, Ásia e países da América do Sul –, temos boas expectativas quanto a abertura de novos mercados para o nosso setor, como é o caso da Coreia do Sul (já em vias de abertura), México (que está na pauta de negociações brasileiras), etc.”, informa o presidente da ABPA.
Segundo Turra, da mesma forma que a suína, a carne de frango nacional, hoje presente em 160 mercados mundiais, deve incrementar suas vendas com a sólida confiança conquistada junto ao mercado internacional graças, entre outros motivos, ao excelente status sanitário brasileiro.
“Enquanto o mundo enfrenta uma crise histórica de influenza aviária, permanecemos sem nunca registrar casos dessa enfermidade”, destaca.
CARNE BOVINA
No caso da carne bovina, o cenário projetado pelo “Outlook Fiesp 2026 – Projeções para o Agronegócio Brasileiro” aponta para um crescimento das exportações de 4,5% ao ano, com alta das exportações na ordem de 18%, nos próximos dez anos.
Conforme o estudo indica, o cenário pode marcar uma melhora em relação ao desempenho registrado entre 2005-2015 (0,3% e 15% para crescimento e fatia do mercado mundial, respectivamente): “No entanto, a abertura recíproca entre Brasil e EUA para o produto sinaliza, em médio prazo, a possibilidade de acesso a novos mercados, mais exigentes e que remuneram melhor o produto brasileiro, o que poderá resultar em números ainda mais positivos.”
CRÉDITO E SEGURO RURAL
Gerente do Deagro/Fiesp, Antonio Carlos Costa explica, em nota à imprensa, que “o agronegócio já mostrou que não está blindado contra o que ocorre na economia brasileira”, já que a queda na renda e na confiança do consumidor atingem o consumo de alimentos mais elaborados.
Segundo ele, a situação fiscal do Brasil é um forte obstáculo para a política agrícola nacional, especialmente para o crédito e o seguro rural, programas fundamentais para assegurar o desempenho futuro do agro.
Diretor da SNA, o analista de mercado Fernando Pimentel acredita que “o maior desafio é manter o nível de financiamento de custeio e investimento para a agricultura, ambos afetados pela crise que assola o país”.
“O seguro é um dos instrumentos que ajudariam na atração de mais investidores privados para custear a produção agrícola, já que um dos elementos que afasta grande parte dos investidores é a incerteza climática. Porém, o processo não é simples, pois não existe recurso suficiente para subvencionar os prêmios, que ainda são caros para o produtor. Também o serviço precisa melhorar, com maior presença de seguradoras atuantes no ambiente do agro”, comenta Pimentel, que também é diretor comercial e de operações da Agrometrika.
O Deagro/Fiesp também destaca que a redução de empréstimos impacta os investimentos, com consequências para a produtividade das lavouras. “Além disso, o ponto de equilíbrio do câmbio e o possível surgimento de uma onda protecionista trazem novas preocupações em curto prazo.”
“Sem dúvida, a falta de recursos pode impactar no âmbito da tecnologia. Isso já está ocorrendo na região do Matopiba (formada por alguns municípios dos Estados de Maranhão, Tocantins Piauí e Bahia) nessa safra verão. Mas nosso sistema matricial de financiamento, que atrai as empresas comerciais para o crédito ao produtor, ameniza um pouco o quadro. Isso ocorreu na crise de crédito de 2008 e está ocorrendo agora. Indústrias de insumos e exportadores devem estar mais presentes no crédito, na safra 2017/18”, orienta o diretor da SNA.
Quanto à questão do (suposto) protecionismo na era Trump, nos EUA, Pimentel acredita que ainda seja cedo para comentar, mas eventualmente os movimentos da diplomacia norte-americana, criando arestas na Ásia, poderia beneficiar o Brasil, indiretamente.
“Temos de aguardar para ver o que vai ficar no campo da retórica e o que de fato vai se materializar em termos de protecionismo. Na área de alimentos, o que já deveria existir já está posto pela Europa e EUA. Não teria muito espaço para novidades. Em outros segmentos da exportação de serviços e manufaturados, aí sim, podemos ter mudanças importantes e adversas”, diz Pimentel.
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