Agricultura 4.0 – uma necessidade para o produtor!, por Steve Cachia

Publicado em 27/09/2019 11:17

O ano safra 2018/19 é uma prova viva de quanto a profissão de agricultor é complexa. Há sim anos de lucros acima da média nesta atividade, mas na maioria das vezes, devido a imprevisibilidade na direção dos preços, não somos todos que conseguimos aproveitar do melhor momento para compra e/ou vender.

Na verdade, os mercados agrícolas sempre foram voláteis, onde desde o período do pré-plantio até a fase da comercialização, estamos correndo riscos. Até pouco tempo atrás, o clima era considerado o principal fator caracterizando incertezas. Além do mais, as informações eram escassas e demoradas para chegar ao mercado de modo geral. Hoje o cenário mudou. Não se pode mais esconder informação do produtor, ao contrario, o produtor tem informação até demais e
tem a tarefa de selecionar o que realmente é útil para seu mercado. Também não basta acompanhar apenas o desempenho climático e dados de oferta e demanda para acompanhar o cenário futuro dos preços. Tem uma lista extensa de fatores novos que precisam ser analisados de perto porque também podem influenciar na comercialização. Se pegarmos apenas os mercados de soja, milho e trigo, notamos que os preços são balizados pelas bolsas de commodities no exterior e que operam quase 24 horas por dia de modo eletrônico e onde qualquer pessoa, mesmo de fora do mundo agro, pode investir. Por isso que fatores geopolíticos globais passaram a ganhar em importância na comercialização de grãos até nas áreas mais remotas do Brasil. Da guerra comercial e cambial EUA/China ao terrorismo e a oscilação no preço do petróleo, das eleições no Brasil ao surto da peste suína na Ásia, do risco de nova recessão econômica mundial e da crise nuclear EUA/Irã, tudo pode acabar influenciando nossos mercados, e pior ainda, sem aviso prévio.

Até alguns anos atrás, na tentativa de ganhar vantagem no mercado, as grandes empresas e corporações, que detinham os recursos financeiros necessários investiam milhões de dólares em programas, softwares e tecnologia digital, na tentativa de encurtar a distancia entre a produção e a formação do preço. Mas felizmente, a revolução tecnológica que está ocorrendo no momento significa que tecnologia de ponta, que até pouco tempo atrás estavam disponíveis apenas para as grandes corporações, hoje em dia já estão ficando a disposição até do pequeno produtor. Do mesmo jeito que o preço de uma impressora 3D caiu de Us$ 18.000 para Us$ 400,00 nos últimos 10 anos, outros sistemas e ferramentas considerados apenas um sonho até pouco tempo atrás, agora passaram a ser disponibilizados em massa. Portanto o produtor mais uma vez precisa se preparar e se atualizar para uma nova enxurrada de produtos, inclusive para a comercialização, que estarão disponíveis e acessíveis financeiramente nos próximos anos.

O objetivo principal do produtor brasileiro é de produzir bem e comercializar melhor ainda. Mas sabemos que devido aos inúmeros fatores imprevisíveis que já mencionamos, não e tarefa fácil. Erros na comercialização resultam em perdas financeiras pesadas e que demora anos para recuperar. Então como se faz para minimizar estes riscos ? Estudos mostram que estratégias e exercícios de baixar custos de produção sem comprometer a produtividade podem ser um dos
caminhos para driblar os problemas e incertezas sem depender demasiadamente no preço propriamente dito. Após avanços significativos na produtividade na lavoura, a tecnologia agora nos promete entregar soluções eficientes que ajudam a baixar custos de produção. A vantagem do agronegócio é que mesmo estando a beira de uma nova recessão global, a população de quase 8 bilhões de pessoas vai continuar exigindo alimentos e produtos de origem agrícola. O mundo tecnológico continua avançando a passos largos, talvez no exterior em ritmo bem mais acelerado que no Brasil. Por outro lado, não é qualquer ideia inovadora ou startup tem sucesso imediato e consegue revolucionar o setor onde pretende atuar. Além do mais, o mundo agro, foi talvez uma das últimas indústrias a abraçar e ser inserida na revolução tecnológica. Nossa alerta ao produtor brasileiro é que o futuro é agora, é o jeito arcaico de comercializar produtos agrícolas também vai mudar e rápido. Se o produtor brasileiro quer estar inserido nesse mundo, se quer ser cada vez mais competitivo com produtores americanos e europeus, precisa estar por dentro das mudanças que estão acontecendo.

A inteligência artificial vai acabar com até 70% dos empregos tradicionais como conhecemos hoje, vai trazer mais eficiência com menos custo e ao mesmo tempo criar empregos em novas áreas e setores. A tecnologia blockchain vai nos apresentar contratos inteligentes que não podem ser adulterados e que garantem que vendedor vai entregar produtos dentro das especificações acordadas e que comprador não vai precisar se preocupar sobre o pagamento. Big Empresas tradicionais vão deixar de existir mas outras vão surgir. Robôs agrícolas de menos de Us$ 100,00, por exemplo, serão fundamentais para contribuir em transformar pequenos agricultores em micro empresários rurais. Um agricultor familiar de algum estado no interior do Brasil poderá exportar diretamente a uma pequena loja em algum pais asiático ou africano, e na maior segurança.

O fato é que já estamos sendo bombardeados com informações sobre a tecnologia a serviço do campo, e apesar do entusiasmo, muitas ainda não conseguem mensurar o que está vindo nos próximos 5 a 10 anos. Segundo estudo da Culte, empresa de tecnologia que trabalha em prol da inclusão digital e do empoderamento dos pequenos produtores rurais do Brasil, entre as muitas tecnologias que estão revolucionando a agricultura mundial, 6 merecem atenção especial.

1. Fazendas verticais - uma solução para a produção de produtos agropecuários em centros urbanos de países com área agrícola escassa. Coberturas de prédios e instalações automatizadas com a aplicação de metodologias agrícolas de ponta.

2. Drones - também conhecido como veículo aéreo não tripulado. Tem se mostrado uma excelente ferramenta para a agricultura por conta de sua flexibilidade. O aparelho é comumente utilizado para captar informações fotográficas aéreas que contribuem para a análise da plantação (demarcação de plantio, acompanhamento do desenvolvimento da safra, etc.), mas também pode ser usado na pulverização, acompanhamento de pastagem, busca por nascentes de água, monitoramento de áreas desmatadas, identificação de locais propícios para abertura de estradas, vigilância, telemetria, busca por focos de incêndio e tantas outras coisas. Se usado corretamente, o drone é capaz até de tocar uma boiada, encontrar animais perdidos ou facilitar a negociação de propriedades.

3. Veículos agrícolas autônomos – capacidade de operar sem a intervenção humana direta. Na agricultura, os veículos autônomos, apresentam diversas utilidades, como pulverizar, arar, semear e colher, dentre outros. A maior vantagem dos veículos autônomos sobre as máquinas agrícolas comuns é justamente sua autonomia: ao deixar de depender de operadores humanos, garantimos maior segurança na operação, além da facilidade na gestão da atividade, pois um único gestor pode acompanhar o trabalho de vários veículos autônomos, que são capazes de operar longas jornadas de trabalho ininterruptamente, aumentando consideravelmente a produtividade.

4. IOT e irrigação inteligente – a água é o bem mais precioso e essencial para a vida e toda a nossa cadeia produtiva, de forma que sua disponibilidade tornou possível a criação da agricultura e da revolução agrícola. Entretanto, ela também é um bem finito, que demanda soluções para sua utilização de forma racional e responsável. Especialistas vêm tentando solucionar esse problema com a combinação de duas tecnologias: a “Internet das Coisas” (ou IOT) e a irrigação inteligente. A IOT consiste na combinação de uma série de elementos que captam e transmitem dados, através de sensores, conexão com a rede e tecnologia embarcada. Essa integração possibilita a troca de informação e o aprimoramento da irrigação inteligente, pois há um entendimento mais preciso sobre a real necessidade de irrigação de determinada cultura, sem desperdícios e sem irrigar menos que o necessário.

5. Sensores e Big Data - atuam para calcular o deslocamento do maquinário, a umidade dos grãos, a medição do fluxo de grãos, entre outras coisas. Podem ser sensores térmicos, elétricos ou ópticos, que geram registros precisos de geolocalização, rotação de culturas, consumo de água e características do solo. O objetivo é construir um grande acervo de informações que será usado por produtores e especialistas para otimizar a produção e formar decisões e investimentos no futuro.

6. Blockchain - consiste em uma das tecnologias mais promissoras da atualidade, contribuindo com diversos benefícios para as mais variadas áreas — dentre elas a agricultura. Este termo, que em tradução livre significa “cadeia de blocos”, funciona como um livro de registros digital, onde são armazenados dados de forma descentralizada, registrando as informações pertinentes com todos os agentes envolvidos no negócio. É como se cada elo da cadeia (ou cada pessoa) tivesse uma cópia perfeita desse livro com todos os registros feitos nele até então. Caso uma dessas pessoas alterasse ou apagasse dados do seu livro (seja por acidente ou por más intenções), o sistema detectaria esse problema imediatamente ao comparar a cópia alterada com as outras milhares de cópias disponíveis na cadeia, tornando a falsificação dos registros contidos no livro uma tarefa impossível. A imutabilidade das informações, aliada à descentralização no armazenamento dos dados, gera segurança e rapidez para o rastreio de toda a produção agrícola, desde as etapas iniciais até a comercialização do produto.

Até pouco tempo atrás a palavra tecnologia era praticamente sinônima com produtos caros e de luxo. Hoje a tecnologia está ficando a serviço de todos, pequenos e médios produtores rurais e a população em geral. Na nossa atividade do agronegócio, especificamente do lado de fora da porteira, esperamos também grandes mudanças disruptivas a serem provocadas pela tecnologia blockchain. A comercialização em si deve ser afetada. Desde financiamento da safra, seguros agrícolas, vendas da produção, compras de insumos agrícolas, exportações pelos pequenos produtores, acesso e negociação e pagamento em novas moedas (criptomoedas), tudo deve estar disponível para quem quiser usar. A cadeia produtiva tende a ser cada vez mais interligada. A decisão final sempre cabe a cada um de nos, mas a agricultura e o agronegócio estão se encaminhando nessa direção, onde os negócios serão feitos do modo mais transparente e seguro e com muito menos burocracia. O resultado é um menor custo para cada operação.

No final do século passado, a ciência evitou uma crise de segurança alimentar mundial através da biotecnologia, agora vai ser a tecnologia que deve contribuir para minimizar problemas que possam surgir no futuro próximo. A população mundial, que hoje é de pouco mais de 7 bilhões de pessoas, deve ultrapassar a marca de 9 bilhões de pessoas até 2050. Resultado, a produção mundial de alimentos precisa crescer em torno de 60% para atender essa nova demanda. A tecnologia promete ajudar não somente pelo lado empresarial, mas deve ter também significativo impacto social. Segundo o Banco Mundial, 78% das pessoas no mundo que são consideradas pobres vivem em áreas rurais. Ao mesmo tempo, a agricultura e o agronegócio são consideradas as ferramentas mais poderosas para tirar pessoas da pobreza. Com a tecnologia ajudando e contribuindo para resolver pelo menos parte dos problemas do campo, toda a sociedade tende a se beneficiar.

Mas enquanto continuamos trabalhando no sentido de criarmos uma situação de menos interferência e fronteiras possíveis em nossos mercados agrícolas, claro não podemos esquecer a realidade atual. A guerra comercial provocada pelo governo americano contra a China criou uma grande confusão nos mercados mas também boas oportunidades para o Brasil. O risco é que a qualquer hora tudo poderá mudar e poderemos voltar a sermos reféns de acordos sobre o qual não temos controle. É por essa independência de podermos controlar melhor o destino da nossa produção é que acreditamos que a chamada Agricultura 4.0 que ainda está na fase inicial é uma necessidade para o produtor brasileiro que busca ter sucesso na atividade.

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Steve Cachia

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