Na FOLHA: Carnaval acaba, país volta a dançar, por VINICIUS TORRES FREIRE

Publicado em 22/02/2015 06:48
articulista da Folha de S. Paulo, na edição deste domingo

Carnaval acaba, país volta a dançar

Após calmaria do feriado, conflito político reacende rápido e governo ainda parece sem rumo

O CALDO ENGROSSA. Ao que parece insatisfeita com a calmaria dos dias de Carnaval, a presidente resolveu reesquentar os tamborins. Acusou o governo FHC de aninhar a corrupção na Petrobras em vez de sufocá-la no berço, com o que a maldita foi crescendo, crescendo e absorvendo, por fim, o governo do PT. De bate-pronto, FHC comparou Dilma Rousseff a um punguista que grita "pega ladrão" a fim de obnubilar o fato de que acabou de bater uma carteira.

A vulgaridade tediosa dessa conversa toda importa menos. Mas fez com que muita gente notasse ou confirmasse que o governo padece de alienação da realidade e que a oposição mesma precisa ser medicada.

Tanto desnorteio pode provocar confusão maior, acentuar a degradação econômica e estimular tumulto na rua.

Muita gente graúda, certa elite econômica, dá obviamente como perdido o crescimento do país em 2015, não há novidade nisso faz tempo. Um censo rápido das preocupações dessas pessoas registra o seguinte:

1) É preciso preservar o essencial do conserto que Joaquim Levy prometeu fazer nas contas do governo; 2) A presidente parece desorientada e com uma "leitura" da realidade desconectada até da comum das pessoas. "Falta comando, equipe, estratégia, visão e inteligência de informações", como diz um empresário num estilo que mistura MBA com Escola Superior de Guerra; 3) Um biênio de estagnação econômica, de limite para benefícios sociais, de acirramento político e "fraqueza das lideranças" pode criar "crise nas ruas", que são "sempre imprevisíveis", seja lá qual for o sentido das ruas; 4) Qual será o próximo aumento de imposto (ou fim de desoneração)? Vai pegar quem?

Pegou muito mal a entrevista de sexta-feira de cinzas da presidente. Notou-se que, em primeiro lugar, Dilma Rousseff atira no próprio pé, pois atribui a roubança da Petrobras a governos passados, o que inclui o de Lula, além de referendar as acusações de um criminoso confesso que acusou o PT de receber parte do furto da estatal. Mais espantoso, para o colunista também, é que a presidente acredite que possa jogar fumaça sobre o rolo da Petrobras lembrando escândalos de governos passados. Não vai iludir ninguém informado. Não é isso que interessa a certa elite relevante.

Goste-se ou não disso, há mais preocupação imediata com o que vai ser feito das crises, como na Petrobras, do que com as culpas políticas ou legais --teme-se tanto o descrédito financeiro do país quanto as demissões, talvez quebras, em cascata, decorrentes da ruína da estatal.

Há temor de tumulto até pior do que o vivido entre junho de 2013 e a Copa de 2014, que abalou comércio e confiança econômica. Causa impressão o caso do Paraná, a revolta que causou o governador reeleito Beto Richa (PSDB) ao anunciar as consequências da sua própria herança maldita (mais impostos e arrocho). Especula-se se tal coisa poderia acontecer no país, quando cair de vez a ficha da recessão.

Há ainda temor de que o efeito da falta d'água e energia piore (piore, pois já faz mal).

O governo passa a impressão de que não apenas não sabe o que fazer dessas e doutras crises como, ainda pior, acredita que tudo se deva a "disputa política", uma ilusão do isolamento.

 

Dilma vs. Dilma, editorial do Estadão

A presidente Dilma Rousseff voltou de seu retiro de carnaval no litoral da Bahia aparentemente cheia de ideias para reverter a agenda negativa que a atormenta desde que assumiu o segundo mandato. Já no fim da tarde da Quarta-Feira de Cinzas reuniu-se no Palácio da Alvorada com os ministros de seu círculo mais íntimo para alinhavar iniciativas em dois âmbitos: o político e o da comunicação. Em ambos, porém, Dilma vai ter de se entender primeiro consigo mesma, se alimenta realmente a esperança de dissipar o ambiente carregado de más notícias e péssimas perspectivas que ela própria se encarregou de criar para o País.

Dilma enfrenta hoje, no plano político, problemas com a governabilidade agravados pelo peso de uma imagem extremamente negativa, especialmente para quem acaba de se reeleger. Recapitulando: dias atrás, uma pesquisa Datafolha apurou que 47% dos brasileiros a consideram desonesta e 54% a julgam falsa. A avaliação de seu governo despencou em dois meses de 42% para 23% de ótimo/bom e aumentou substancialmente de 24% para 44% de ruim/péssimo. Ou seja: a presidente da República está com a credibilidade gravemente comprometida. Culpa de quem?

Basicamente, da soberba que a impede de admitir os próprios erros e de procurar ajuda onde quer que possa ser encontrada. Reeleita, Dilma poderia ter-se fortalecido chamando para o diálogo e o entendimento todas as forças vivas da Nação - afinal, ela é a presidente de todos os brasileiros - de modo a oxigenar o debate sobre novos e melhores caminhos para o País. O máximo de concessão que foi capaz de fazer foi designar, sem nenhum entusiasmo, uma equipe econômica com respaldo no mercado para a tarefa de colocar em ordem as contas do governo. Na área estritamente política, em vez de se abrir, fechou-se. Afastou a corrente majoritária de seu próprio partido e se cercou de ministros com os quais tem maior identificação ideológica, além de tentar, inutilmente, enfraquecer seu maior aliado, o PMDB.

O resultado é que hoje a presidente da República não tem apoio popular e tampouco pode confiar em parte do PT e no PMDB.

No âmbito da comunicação Dilma também vai encontrar dificuldades para criar uma agenda positiva. E a razão é muito simples: sua falta de credibilidade perante a opinião pública. Promover a imagem do governo não é uma tarefa que se esgote na sedução da militância profissional, paga, aquela que pode não ter gostado, mas também não deu grande importância ao fato de Dilma ter desmentido, logo ao tomar posse, suas promessas de campanha. A dificuldade é convencer quem se sente ludibriado em sua boa-fé. E estes certamente integram a maioria de 54% que acha que Dilma é falsa ou os 47% mais radicais que a consideram desonesta.

Recentemente, a presidente teve uma conversa de mais de duas horas em São Paulo com seu criador - a primeira desde sua segunda posse - e como de hábito Lula tentou lhe ensinar o caminho das pedras: reunir-se - e prestar atenção no que têm a dizer - com governadores, lideranças da base aliada, do movimento sindical, das organizações sociais. E conceder mais entrevistas à imprensa, comparecer a um maior número de eventos oficiais dentro e fora do Palácio, falar diretamente aos brasileiros por meio de cadeias de rádio e de televisão. Enfim, mostrar-se e conversar com as pessoas, seduzi-las.

Para Lula tudo isso pode parecer muito óbvio e fácil. É exatamente o que ele próprio sabe fazer melhor. Mas talento não se ensina. E a arte da sedução, definitivamente, não é a especialidade de Dilma, que não tem a menor paciência para ouvir o que não lhe interessa e não consegue disfarçar contrariedades. Ouvir a opinião de terceiros e dialogar é algo que Dilma só faz como último recurso. Não é por outra razão que se cerca apenas de pessoas que pensam como ela.

Se está, portanto, realmente decidida a construir uma agenda positiva para o governo, a Dilma Rousseff não bastará anunciar novos pacotes de bondades ou fingir que dá ouvidos a gente em quem nunca prestou atenção. Antes de mais nada, vai ter de enfrentar o desafio de superar a si mesma.

 

O tamanho do estrago ainda pode surpreender, por Rolf Kuntz

Quem gosta de inflação pode ficar sossegado, porque a festa ainda vai longe, pelo menos segundo os especialistas do setor financeiro. Os preços continuarão subindo bem acima da meta oficial de 4,5% até o fim do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, de acordo com o mercado. Em 2018 a taxa anual ainda estará colada, ou quase, em 5%. Essa projeção aparece em tabela exibida pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, a uma plateia de empresários e analistas em Nova York, na quarta-feira. As expectativas, disse ele, estão de novo convergindo para a meta. De fato, estão. A primeira barra do quadro, correspondente a 2015, passa ligeiramente de 7%. A segunda fica em cerca de 5,5% e as duas seguintes, na vizinhança de 5%. Convergem, sim, mas muito devagar. Apesar disso, dirigentes do Banco Central continuam prometendo atingir a meta no próximo ano. Os slides apresentados em Nova York terminam com a promessa de trabalho duro de preparação para 2016. O último quadro, sem tabelas ou gráficos, é uma foto de regata na Guanabara.

A exposição começou e terminou com fotos de um Brasil muito mais bonito que o do noticiário do dia a dia. As primeiras imagens apresentadas foram as de estudantes em vários tipos de escolas, acompanhadas de um gráfico sobre o aumento de alunos em faculdades, 60% entre 2006 e 2014. Nenhuma palavra, é claro, sobre a qualidade do ensino, sobre os erros de prioridades, sobre o desempenho dos brasileiros em testes internacionais, nem sobre os atrasos de pagamentos devidos a escolas, a prefeituras e a professores, noticiados nesta sexta-feira pelo Estado.

Antes dos barquinhos, a plateia viu muita coisa feia, como a devastação das contas públicas nos últimos quatro anos e a crescente promiscuidade, a partir de 2008, entre o Tesouro e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Além disso, ouviu promessas de correção dos erros acumulados com teimosia e muita arrogância a partir do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Tudo foi apresentado com suficiente clareza, embora de forma diplomática. A dimensão do estrago, no entanto, foi mostrada apenas parcialmente. Talvez nem o ministro tenha uma ideia clara do tamanho dos danos causados ao País em tantos anos de irresponsabilidade, incompetência e ocupação predatória da administração federal - ministérios, órgãos subordinados e companhias estatais. Mas o auditório, tanto em Washington quanto em Nova York, estava razoavelmente informado, por exemplo, sobre a devastação da Petrobrás e muito interessado nas consequências da pilhagem.

Esses efeitos já têm sido calculados por economistas do setor financeiro, muito antes de qualquer palavra do governo sobre o assunto. Segundo técnicos do Bank of America Merrill Lynch, o escândalo da Petrobrás poderá custar 0,86 ponto porcentual de crescimento econômico, por causa da importância da empresa, direta e indireta, nos investimentos.

A estimativa da Capital Economics, de Londres, parece, à primeira vista, menos pessimista - uma perda de crescimento de cerca de 0,5 ponto de porcentagem, segundo informou a Agência Estado. Mas os problemas gerados pela crise da estatal poderão ir muito além dos investimentos vinculados a seus programas e do contágio financeiro de construtoras e fornecedoras de equipamentos e insumos. A Petrobrás é uma das empresas mais endividadas do mundo, seu fluxo de caixa foi seriamente prejudicado nos últimos anos e já se discute, no mercado, a hipótese de um socorro financeiro bancado pelo Tesouro. Nesse caso a situação fiscal se agravará, o conserto das contas públicas ficará mais difícil e o crédito do País poderá ser afetado mais uma vez.

Esses temores surgem - e foram manifestados também por participantes dos encontros nos Estados Unidos - quando o ministro da Fazenda e seus colegas de equipe tentam reconstruir a credibilidade do governo federal, arrasada nos últimos anos, e estimular a confiança de investidores e financiadores na economia brasileira.

Não se trata de levá-los a apostar num bom desempenho em 2015. Ninguém sequer menciona essa hipótese. No mercado financeiro, a mediana das projeções indicou uma retração econômica de 0,42% na pesquisa Focus do dia 13, divulgada pelo Banco Central no começo da semana seguinte. A variação estimada para o produto industrial ficou em menos 0,43%. A inflação esperada para o ano chegou a 7,27%. Nesse caso a inflação cheia está associada em boa parte à correção de preços congelados politicamente e também aos efeitos da seca e da escassez de energia. As estimativas de produção embutem, portanto, aumentos de custos e dificuldades adicionais para a indústria e para a recuperação a partir de 2016.

Não se trata de problemas ocasionais ligados a eventos incontroláveis ou dificilmente previsíveis. O efeito inflacionário da correção de preços e o impacto sobre os custos são consequências de erros acumulados em muitos anos. Esses erros incluem as falhas na política de infraestrutura e a incompetência no acompanhamento e na coordenação de projetos. Centrais prontas para produzir energia, mas inúteis por falta de sistemas de transmissão, exemplificam essa incompetência. As obras são privadas e tocadas sob a responsabilidade de consórcios, mas são componentes de planos e programas oficiais.

É preciso levar esses dados em conta para formar uma ideia mais precisa do estrago deixado como herança para a nova equipe governamental. No caso da Petrobrás, os danos vão obviamente muito além dos bilhões desviados, do endividamento, dos problemas de caixa e da perda de valor de mercado. Incluem todos esses problemas e mais os efeitos sobre muitas outras empresas e sobre o próprio governo. Ao lotear o Estado e abrir espaço para a pilhagem, os ocupantes do poder foram incompetentes até para avaliar a possível extensão dos custos de sua política. Até eles devem estar surpresos.

ROLF KUNTZ É JORNALISTA

 

"Que agonia!!!", 

POR VINICIUS MOTA, DA FOLHA DE SÃO PAULO -

Ao final da longa purgação que apenas se inicia, a Petrobras e todo o complexo político-empresarial ao seu redor terão sido desidratados. Do devaneio fáustico vivido nos últimos dez anos restará um vulto apequenado, para o bem da democracia brasileira.

As viúvas do sonho grande estão por toda parte. Um punhado de militantes e intelectuais fanáticos por estatais monopolistas acaba de publicar um manifesto que exala agonia.

O léxico já denota a filiação dos autores. A roubalheira na Petrobras são apenas "malfeitos". O texto nem bem começa e alerta para a "soberania" ameaçada, mais à frente sabe-se que por "interesses geopolíticos dominantes", mancomunados, claro, com "certa mídia", em busca de seus objetivos "antinacionais".

Que agenda depuradora essa turma teria condição de implantar se controlasse a máquina repressiva do Estado. Conspiradores antipatrióticos poderiam ser encarcerados, seus veículos de comunicação, asfixiados, e suas empresas, estatizadas para abrigar a companheirada.

Que espectro de PDVSA, o portento estatal total que fatura o equivalente a 60% do PIB na Venezuela, poderia surgir no Brasil. O Congresso conservador, o Orçamento limitado e vigiado, o Judiciário indócil, o Ministério Público indômito e a Polícia Federal autônoma seriam afogados pela força diluviana dessa empresa-Estado.

Felizmente o Brasil é muito maior que o petróleo que produz e pode vir a produzir. A Petrobras, mesmo agigantada após anos de política monopolista perdulária, fatura pouco mais de 5% do valor do PIB.

Quanto maior é o peso de empresas estatais na economia, mais amplos são os meios para o autoritarismo. Imagine se o governo ainda tivesse em mãos a Vale, a Embraer e as telefônicas para fazer política. Quais seriam os valores da corrupção, se é que sobrariam instituições independentes o bastante para apurá-los?

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Fonte:
Folha de S. Paulo/Estadão

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1 comentário

  • João Alves da Fonseca Paracatu - MG

    O Brasil é um País formidável,sinto muito orgulho de ser brasileiro,ao assistir o programa globo repórter exibido em 20/02,gravado no Rio Grande do Sul,fiquei tão emocionado e concluí que realmente não merecemos estes dirigentes mequetrefes que tem conduzido nosso destino,parece uma praga devastadora ,precisamos reagir,talvez até criar uma campanha de orgulho nacional,onde as benesses das bênçãos da natureza,da fartura e de sermos um povo miscigenado tão alegre nos livre de predadores tão cruéis, sanguinários e ladrões.

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