Mercado de açúcar: "Nem Aristóteles resolve", por Arnaldo Luiz Correa
O mercado futuro de açúcar em NY encerrou a sexta-feira com o contrato outubro/21 cotado a 19.49 centavos de dólar por libra-peso, uma queda 61 pontos em relação à semana anterior. O spread outubro/março encerrou negociado a 66 pontos, indicando um desconto de 8.39% ao ano entre os dois meses. Simplificando, ninguém quer açúcar para entrega física em outubro e aqueles que estão posicionados na compra/recebimento apressam-se em liquidar a posição ou rolar os futuros para o vencimento seguinte na esperança de dias melhores.
Um mercado que propagandeia uma safra reduzida de cana e o perigo de faltar açúcar, como pode explicar um spread tão fraco? Mercados com crítico problema de disponibilidade tendem a se inverter. No caso nosso, as peças não se encaixam. Mas a gente assiste a tudo sem entender nada.
Traders experientes apontam que a questão é um pouco mais complexa do que simplesmente olhar os números frios do spread. Os altos preços do frete internacional – dizem - distorcem o basis (o valor do açúcar no mercado físico menos o preço dele no mercado futuro) e reduzem (quando não extinguem) a margem de lucro das tradings, que tentam empurrar o recebimento de açúcar que seria entregue agora pelas usinas para 3-4 meses adiante, mesmo que pagando prêmio (ouvimos 45-50 pontos no mercado) para isso.
Também pode afetar a tomada de decisão das tradings o fato de que as chamadas de margem sofridas por elas devido ao repentino aumento nas cotações, deixou o caixa bem baixo. Pelos nossos cálculos, somando as fixações das duas safras, 21/22 e 22/23, muito embora também há fixações na 23/24, o total de margem chamada para as tradings, bancos, provedores de OTC e as próprias usinas está em torno de US$ 2.7 bilhões.
Mas, afinal, por que sobe tanto o preço do açúcar no mercado futuro? Bem, os fundos aumentaram ainda mais a posição comprada e pelo número divulgado na sexta-feira pelo CFTC (Commodity Futures Trading Commission), agência independente do governo dos Estados Unidos, que regula os mercados de futuros e opções das commodities, com base na terça passada em relação a anterior, eles adicionaram 7,600 lotes, ampliando a posição total para 256,600 lotes comprados (equivalentes a mais de 13 milhões de toneladas de açúcar).
Interessante notar que no acumulado do mês de agosto, o açúcar contrasta com as demais commodities: subiu 9% enquanto as energéticas experimentaram uma queda substancial: petróleo WTI caiu 16%, gasolina caiu 14%, o Brent caiu 13% e o etanol de milho em Chicago caiu 10%.
O mercado global está fugindo do risco: a China apresenta desaceleração (crescimento de 8.5% contra 8.7% há um mês), aumenta a preocupação da variante delta da covid-19 em vários países (hospitalização em Israel subiu ao nível de março), diminui o apetite dos bancos centrais para injetar mais dinheiro nas economias. Mas, o açúcar em NY continua em alta. Vai entender.
No Brasil, a inflação encosta nos 9%, o desemprego é de 14.6%, a economia não sai do lugar e deve ter um crescimento pífio no ano que vem. Além da pandemia, estamos no meio de uma crise fiscal e institucional que deve se arrastar por muito tempo trazendo ainda mais instabilidade política e desconfiança por parte dos investidores locais e estrangeiros. O dólar encerrou a semana a 5.3780. Ameaças de paralização dos caminhoneiros, fechando estradas, dia 7 de setembro comandadas por cantores sertanejos (veja só a que ponto chegamos) que pensam representar setores do agronegócio. Uma verdadeira e ridícula República de Bananas, que faria brilhar os olhos do diretor Sacha Baron Cohen.
Há poucas dúvidas que teremos fortes turbulências no próximo ano e o impacto delas no câmbio será sentido fortemente nas cotações do açúcar, que se desvalorizariam para se ajustar a um real mais fraco. Esse é um ponto que merece atenção por parte dos gestores de risco. Explico.
O que mais se ouve no mercado é uma análise rasa acerca daqueles que fixaram preços em reais por tonelada e agora veem os preços atuais em patamares muito mais altos. “O etanol está pagando mais”, dizem uns. “Ah, se eu tivesse esperado para fixar”, reclamam outros. O fato é que os preços estão onde estão por uma razão simples: todo mundo fixou e os fundos nadam de braçada colocando o mercado onde querem. Não houvesse tanta fixação assim, com toda a certeza os preços não teriam força para subir no vazio como sobem agora.
Os preços em NY subiram porque o volume de fixação é alto [lá atrás] ou o volume de fixação é alto porque os preços subiram [lá atrás]? Está aí um corolário do princípio aristotélico da contradição. A ser estudado pelos filósofos do mercado.
Pessoalmente, prefiro seguir a velha e surrada filosofia de que ninguém quebra com lucro no bolso. Muitas usinas, apesar dos altos preços em reais por tonelada, combinação da perspectiva de juros mais altos no Brasil e do real fraco no mercado à vista, estão inseguras em aumentar suas fixações para as safras 22/23 e 23/24.
No fechamento de sexta-feira, a média aritmética dos preços de NY correspondentes à safra 22/23, trazidos para valor presente mostravam R$ 2,232 por tonelada. Do começo do ano 2000 até hoje, corrigindo os valores convertidos em US$ pelo IPCA, em apenas 10% dos eventos, o preço corrigido foi maior do que esse valor. Sugestão conservadora? Fixe os preços em reais por tonelada e compre 10% em calls (opções de compra) at-the-money (opções no dinheiro).
Você sabia que os nossos cursos mudaram de data? Devido às alterações no nosso site que implicam no armazenamento das videoaulas, além de melhorias na qualidade de imagem e som e recursos didáticos, fomos obrigados a mudar as datas dos nossos cursos: o Curso Essencial será dado de 18 a 22 de outubro e o Curso Avançado de Opções dias 8 a 12 de novembro. Sempre às 16 horas com duas horas e meia de duração. Depois, só em 2022.
Aproveite o final de semana!
Arnaldo Luiz Corrêa
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