Instabilidade do mercado: como o produtor pode se proteger das variações de preços e custos de produção
O agronegócio e os setores urbanos estão intrinsecamente conectados, já que as cadeias produtivas de alimentos influenciam diretamente no cotidiano das cidades. Porém, muitos ruídos de comunicação entre as duas pontas geram discussões e desentendimentos que merecem atenção. Nesse contexto, o site Notícias Agrícolas e a consultoria MPrado desenvolveram o projeto Conexão Campo e Cidade, que visa debater diversas questões relacionadas aos negócios que envolvem os ambientes urbanos e rurais.
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Na conversa desta semana, Sergio De Zen, diretor de informações agropecuárias e políticas agrícolas da Conab, foi convidado para falar sobre como deve ser o desenvolvimento da safra 22/23 no Brasil. Inicialmente com uma produção projetada em 308 milhões de toneladas de grãos, os produtores do país vão enfrentar na safra que se inicia neste semestre altos custos de insumos e preços que variam em um mercado extremamente volátil, devido a incertezas econômicas em todo o planeta.
Produção de 308 milhões de toneladas e os preços das commodities
A projeção de produção da Conab para a safra 22/23 é a produção de 308 milhões de toneladas de grãos no Brasil. Segundo De Zen, este ano deve ser mais seguro que realmente seja ultrapassada a barreira das 300 milhões de toneladas, em um momento em que o mundo precisa desse aumento de produção no Brasil. “Essa supersafra ela vem justamente no momento que a gente tem um ajuste global da economia”, afirmou o diretor.
Por outro lado, esse aumento de produção está acompanhado de uma elevação nos custos para o produtor. Como detalhou De Zen, a primeira parte dos insumos já foi comprada e os produtores estão prontos para irem para o campo. Em algumas partes do Sul já até mesmo começou o plantio, e o que se visto é que “as margens tendem a ser menores do que aquelas que a gente teve nos últimos anos. Isso é sempre preocupante para o agricultor”, destacou.
Ambiente de volatilidade por conta de série de incertezas ao redor do mundo
Aprofundando o assunto, Marcelo Prado elencou alguns fatores que têm causado volatilidade no mercado mundial, sendo que algumas notícias influência a queda de preços, enquanto que outras dão tendência de alta, como: países europeus com sérios indícios de recessão; falta de energia para produção na Europa; novo relatório do USDA na segunda-feira (12) com redução a projeção da produção de soja nos Estados Unidos para 119,2 milhões de toneladas; e demanda contínua da China, mesmo com constantes lockdowns. Tudo isso causa incertezas para o produtor rural.
De Zen ressalta que manuais de economia não têm instruções de como agir em uma pandemia, por isso, o ambiente econômico de todos os países ficaram bagunçados, os preços relativos estão bagunçados. Além disso, a guerra entre Rússia e Ucrânia adicionou mais um complicador.
Conforme ele apontou, todas essas variáveis provocaram um aperto monetários pelos bancos centrais como solução. Agora, a intensidade dos efeitos que isso terá, ninguém sabe. No Brasil, como a alta de juros pelo Banco Central começou mais cedo, a recuperação também vai ser antecipada. Na Europa deve ser diferente, ainda mais com a crise energética por conta da dependência da Rússia.
“O agricultor, olhando para esse cenário incerto, ele tem que firmar posição. Não tem que plantar sem fixar margem. Tem que fixar margem”
Portanto, como sugeriu o diretor, “o agricultor, olhando para esse cenário incerto, tem que firmar posição. Não tem que plantar sem fixar margem. Tem que fixar margem. Tanto o produtor de milho quanto o de soja. Não adianta querer especular com preço, porque não é ano para isso. Lógico que vamos escoar toda produção de milho e soja, porque o Brasil produz um produto muito bom, com preço competitivo. Mas as margens caem”.
Marcelo Prado também reforçou que, quando se tem janelas para venda, como aconteceu na segunda-feira 12/9, com altas de 5% nos preços da soja no Bolsa de Chicago, é hora do agricultor olhar os seus custos e tentar fazer fixações futuras parciais, para fazer um mix de preço que seja rentável, porque essas janelas aparecem uma vez ou outra.
“Chegou o momento de fazer travas, mas não são travas para baixo. O produtor precisa evoluir para o mercado de capitais”.
Com o mesmo ponto de vista, Antônio da Luz declarou que é preciso fazer travas de preços, mas esperando que os preços fiquem mais altos. “Acho que agora chegou o momento de fazer travas. E quando falamos travas, não são travas para baixo, travar no mercado físico. O produtor precisa evoluir para o mercado de capitais, para o mercado de derivativos, aprender a travar de verdade, como os americanos fazem desde 1848, travar na Bolsa”. Ele ressalta que os produtores costumas alegar que é difícil fazer esse tipo de negociação, porém, para ele, é muito mais fácil do que plantar. “Você sabe plantar, então vai saber travar”, completou.
O economista prosseguiu explicando que, hoje existem operações com opções que garantem proteção tanto para alta quanto para baixa de preços. Entretanto, para ele, o produtor tem que procurar o aprendizado nisso. “Dadas as condições atuais, nós temos sim um encolhimento de margem. Desde o início da pandemia, os custos de produção aumentaram 72%. Os preços mais elevados do passado, que eram considerados preços de sonho, hoje são preços de piso, porque a inflação elevou a necessidade de preços maiores”, afirmou.
"Com essa confusão que está acontecendo no mundo inteiro, não é hora de deixar a cabeça para fora da janela"
Antônio da Luz acredito que o mercado vai corrigir essa inflação, mas não é possível dizer quando. “Não sei dizer se é daqui um mês, se é daqui seis meses, se é daqui um ano. E na dúvida, a gente protege, na dúvida se faz hedge, na dúvida a gente não se arrisca. Com essa confusão que está acontecendo no mundo inteiro, não é hora de deixar a cabeça para fora da janela”, finalizou.
Roberto Rodrigues também se posicionou sobre o assunto, destacando que é preciso travar os custos de forma que se cubra os custos de produção: “Nós produtores rurais já temos uma ideia bastante consistente de quanto vai custar o plantio. Portanto, nós temos uma ideia de quanto vai custar uma saca de soja, uma saca de milho. De modo que o que temos que fazer, é travar margem. Na linha do que o Antônio falou, vamos fazer trava, vamos fazer hedge, protegendo pelo menos o custo”.
Custos de produção no Brasil
Além da proteção de preços no mercado de capitais, o produtor brasileiro também encontra mais uma forma de ter mais rentabilidade com a economia dos custos de produção. Leticia Jacintho apresentou alguns dados de que, na média dos últimos cinco anos, os custos de produção da soja no Brasil foi o dobro da Argentina, quase duas vezes maior que o da Ucrânia e 8% a mais do que nos Estados Unidos. Em relação ao milho, o custo no Brasil é quase o dobro da Argentina, 12% maior que o dos Estados Unidos e 15% maior que o da Ucrânia.
Esses países têm solos bem mais férteis que o brasileiro. Porém, como afirmou De Zen, os custos com fertilizantes no Brasil são muitos altos porque não é feita análise de solo. “Nós plantamos com receita de bolo. Entre 80% e 90% da produção brasileira, o produtor não faz análise de solo periódica. Em um sistema de plantio de direto como nosso, ele está desperdiçando dinheiro com certeza”, declarou.
Marcelo Prado ressaltou que a própria tecnologia de alta precisão existente hoje possibilita uma adubação direcionada de acordo com a necessidade de cada área. E para completar, De Zen revelou que a Conab calcula que, no Brasil, US$ 1 bilhão de dólares por ano gastos em insumos são perdidos porque a tecnologia não é usada corretamente. “Precisa ter análise de solo”, frisou o diretor.
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