Bolsa Família dentro de teto expandido pode liberar gasto além do apontado por transição
Por Bernardo Caram
BRASÍLIA (Reuters) - A mudança na PEC de Transição para expandir o teto de gastos no valor do Bolsa Família em vez de excluir o programa social da norma fiscal pode abrir margem para despesas em volume maior do que o apontado pela transição de governo, mesmo criando um limite global para os desembolsos, avaliam analistas ouvidos pela Reuters, apontando que o programa pode estar superestimado.
Nesta terça-feira, o relator da PEC, senador Alexandre Silveira (PSD-MG), apresentou parecer à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado propondo ampliar o limite do teto de gastos em 175 bilhões de reais em 2023 e 2024.
A versão inicial da proposta do governo eleito não expandiria o teto, mas excetuaria integralmente o programa social da regra fiscal sem especificar um valor. A equipe de transição de governo apenas estimava que essa despesa ficaria em 175 bilhões de reais, o que abriria espaço em 2023 para gastos em outras áreas de 105 bilhões de reais --valor equivalente ao Orçamento do Bolsa Família que hoje está dentro do teto.
De um lado, o fato de o novo texto definir especificamente a expansão do teto em 175 bilhões de reais delimita o nível máximo de gastos totais. Com isso, o novo governo não teria autorização para ampliar indefinidamente o alcance e o custo do programa social, por exemplo.
Por outro lado, o ex-secretário do Tesouro Nacional Jeferson Bittencourt, economista da ASA Investments, alerta que a medida deve, na prática, criar uma vantagem ao governo eleito e aumentar a margem para novos gastos.
“Se o orçamento do programa (Bolsa Família) for menor, e muito provavelmente será, porque claramente foi superestimado, haverá mais espaço livre do que os 105 bilhões de reais”, disse, ressaltando que a nova versão do texto estabelece a margem adicional de 175 bilhões de reais nas contas mesmo se o programa não alcançar todo esse custo.
Segundo ele, esse espaço livre adicional não aconteceria se o programa estivesse integralmente fora do teto. Isso porque uma revisão para baixo do valor do programa em 2023 não teria nenhum efeito sobre as despesas dentro do teto.
“A nova PEC é mais frouxa do que a proposta inicial do PT”, disse.
Em uma indicação de que o custo total do programa pode efetivamente ser reduzido, membros da equipe de transição vêm afirmando que o Auxílio Brasil foi inflado pelo governo Jair Bolsonaro, com uma brecha que permitiu que mais de uma pessoa da mesma família receba o benefício. O grupo prometeu adotar ações contra essa distorção e propor uma revisão do programa.
A economista da consultoria Tendências Juliana Damasceno compartilha da visão de que o programa pode estar superestimado e acrescenta mais um fator que deve levar o Bolsa Família a ter um custo menor no próximo ano.
“Esses 175 bilhões de reais consideram os 150 reais adicionais para crianças, o que não deve ser pago desde janeiro”, afirmou.
Sobre o fato de o novo texto trazer um limite máximo para os gastos do governo, a economista avaliou que o parecer “delimita em um montante maior do que o necessário” e “acima do razoável”.
Para Damasceno, havia modelos mais equilibrados em discussão, como um que prevê uma expansão de 80 bilhões de reais no teto para recomposição de gastos de ministérios, além da retirada de 70 bilhões de reais do custo necessário para complementar o Bolsa Família, sem a exclusão da despesa total com o benefício da regra fiscal. Com isso, a ampliação total do gasto seria limitada a 150 bilhões de reais.
O parecer apresentado nesta terça-feira ainda será avaliado pela CCJ e o plenário do Senado, antes de seguir para a Câmara. O texto pode ser modificado durante a tramitação.
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