Fitch vê incerteza na recuperação e mantém Brasil em grau especulativo (FOLHA)

Publicado em 20/05/2017 07:56
A perspectiva continua negativa, o que significa que pode haver rebaixamentos do rating nos próximos meses

A agência de classificação de risco Fitch manteve nesta sexta-feira (19) a nota de crédito do Brasil em grau especulativo, citando incertezas na recuperação da economia, preocupações políticas e fraqueza estrutural das finanças. Já a agência Moody's afirmou que a crise envolvendo o governo pode afetar, sim, o rating do país.

Na Fitch, a nota foi mantida em "BB", segundo degrau abaixo do grau de investimento (categoria atribuída a países considerados de menor risco de calote, que, por isso, obtêm financiamento com juros menores).

A perspectiva continua negativa, o que significa que pode haver rebaixamentos do rating nos próximos meses se a agência entender que as condições apontadas não melhoraram.

A manutenção ocorre um dia depois de os mercados reagirem com pânico à divulgação de notícias indicando que o presidente Michel Temer teria dado aval ao pagamento de propina para silenciar o ex-deputado Eduardo Cunha.

Segundo a Fitch, a manutenção do rating é justificada pelo crescente endividamento do governo, que compromete as finanças públicas, perspectivas fracas de expansão e indicadores de governança mais enfraquecidos em comparação com países de mesmo porte que o Brasil. Esses fatores, junto com o que a agência chama de "repetidos episódios de instabilidade política", têm implicações negativas para a economia brasileira, complementa.

A agência vê melhora nas políticas econômicas e considera que o ajuste nos mercados externos, a inflação e o melhor ancoramento das expectativas de preços e também a aprovação do teto de gastos poderiam facilitar a consolidação fiscal.

A perspectiva negativa, prossegue, reflete incertezas para a recuperação da economia brasileira, as perspectivas para a estabilização da dívida pública a médio prazo devido aos desequilíbrios fiscais e a evolução da agenda legislativa, especificamente no que diz respeito à reforma da Previdência.

A Fitch estima que a economia brasileira crescerá 0,5% neste ano e 2,5% em 2018, apesar de enxergar riscos a essas projeções, como o desemprego elevado e incertezas políticas e fiscais permanentes.

O crescimento para 2018 poderia ganhar força com a ajuda da política de queda de juros do Banco Central, e também com a contribuição do exterior.

"Volatilidade financeiro alta no exterior e no cenário doméstico, um recuo na agenda de reforma que possa prejudicar a confiança e um impacto menor do afrouxamento monetário sobre a demanda doméstica continuam representando riscos de baixa para o panorama de crescimento", afirma a Fitch no comunicado.

INCERTEZA POLÍTICA

Segundo a Fitch, o cenário político continua desafiador, apesar do alívio provocado pelo encaminhamento das reformas e pelo apoio na base do governo. "A aprovação de algumas reformas atesta a forte coalizão da base da administração Temer. No entanto, governabilidade ampla e o processo de reforma continuam vulneráveis pela ampliação do escopo das investigações da Lava Jato, que agora envolve lideranças políticas", indica o comunicado.

As eleições presidencial e para o Congresso em 2018 são citadas como focos de incerteza.

Também nesta sexta, a agência de classificação de risco Moody's indicou que as alegações envolvendo Temer "prejudicam a perspectiva de crédito do Brasil ameaçando paralisar ou reverter o positivo momento político e econômico observado recentemente".

"Elas também desviam o foco dos esforços para a promoção das reformas fiscais. Estas reformas, que são críticas para a melhora da força fiscal do país, provavelmente serão interrompidas", prossegue a agência, em comunicado..

Para a Moody's, ainda é cedo para avaliar os desdobramentos das revelações.

"No entanto, nossa visão sobre o que pode ameaçar a perspectiva estável do rating Ba2 continua sendo aquela refletida em nossa ação de rating de março de 2017: 'Um ressurgimento da desarticulação política e, ainda, a interrupção do momento favorável às reformas que ameace a implementação das reformas fiscais e o cumprimento do teto dos gastos públicos – especialmente atrasos na aprovação da reforma da previdência – exercerão pressão negativa sobre os ratings'".

Na quinta-feira, o apoio ao governo Temer ficou em suspenso, após o presidente ser gravado pelo empresário Joesley Batista, presidente da JBS, em conversas que indicam que ele tomou conhecimento de um plano para destituir um procurador da República que investigava o grupo.

O Planalto confirmou encontro com Joesley, mas Temer diz que "jamais solicitou pagamentos para obter o silêncio" de Cunha.

REAÇÃO

O Ministério da Fazenda soltou nota nesta sexta (19) para comentar a manutenção da nota de crédito pela Fitch, ressaltando que a agência de classificação de risco reconhece pontos fortes na economia brasileira.

"A Fitch reconhece que a diversidade da economia brasileira, o volume expressivo de reservas internacionais e a capacidade do mercado doméstico de dívida pública de financiar os déficits fiscais nos últimos anos constituem pontos fortes do país", diz o texto.

A pasta, que ainda não se pronunciou oficialmente sobre os possíveis impactos da crise política na economia, destaca que a agência aponta em sua análise a importância da aprovação das reformas.

"A decisão da agência faz menção, em seu relatório, à importância e ao desafio da aprovação das reformas em curso, as quais ajudarão na reversão do cenário fiscal, contribuindo para uma trajetória benigna de endividamento público", diz a nota da pasta.

No texto, o Ministério da Fazenda diz que a agência destaca a reforma da Previdência como um fator fundamental para o cumprimento dos gastos públicos.

"A avaliação da agência reforça a importância das iniciativas que visam à recuperação da economia brasileira e à construção das bases para o crescimento sustentado. O Ministério da Fazenda reafirma seu compromisso com a busca da consolidação fiscal do país e a sustentabilidade da dívida pública".

'O mercado quer alguém, não sei quem, com capacidade para tocar as reformas' (FOLHA)

POR FLAVIA LIMA, DE SÃO PAULO

Não está claro como as delações que atingiram o presidente Michel Temer afetarão a capacidade de articulação política do governo, mas há a percepção de que as reformas trabalhista e da Previdência podem ficar para depois das eleições presidenciais de 2018, diz o diretor de pesquisas para a América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos. Segundo ele, o mercado não personifica a questão. "Isso não é um 'love affair'."

*

Folha - O risco de as reformas não saírem ou serem diluídas é maior com ou sem Temer?

Alberto Ramos - Num cenário com Temer, a capacidade de articulação política diminui? Depende. Estamos falando das primeiras 48 horas do evento. Se a governabilidade tiver sido diluída de maneira irreversível, reduz-se a chance de aprovar as reformas ou de lutar por uma reforma com conteúdo robusto. Mas, num cenário alternativo, nada garante que o que vem depois [do governo Michel Temer] consiga tocar essas reformas.

Há a possibilidade de que elas só venham a acontecer depois de uma nova eleição, com mandato conferido nas urnas, e possivelmente se tenha que esperar até 2019.

O mercado já sabe o que seria melhor?

Essa é a pergunta que todo o mundo faz. O mercado não personifica a questão. Isso não é um "love affair".

O que o mercado quer é governabilidade –alguém, não sei quem, que tenha capacidade de tocar as reformas. Se essa capacidade é melhor com Temer ou sem Temer, o tempo dirá. A incerteza acaba impactando o próprio Congresso, que fica hoje mais focado em outros temas. No mínimo, essas reformas vão sair com algum atraso, o que em si já é um custo.

Como ficaria a economia sem as reformas ou se a sua discussão no Congresso for adiada por muito tempo?

Ficaria pior. As reformas são críticas para conter a expansão do gasto público. Sem elas, o teto do gasto vai ser difícil de ser observado. Hoje, há uma equipe econômica determinada a manter o fiscal bem disciplinado. Até que ponto a perda de governabilidade vai erodir essa determinação no dia a dia?

As incertezas sobre o futuro das reformas podem afetar as expectativas para a alta do PIB neste ano?

Esperava alta de 1,1%, e isso embutia um segundo semestre razoável. A crise política pode contaminar até parte do segundo trimestre. Não há dúvida de que um cenário diferente para câmbio, juros, indicadores de confiança e possivelmente o fiscal muda o cenário. Mudará muito mais 2018 e 2019, mas contamina 2017. A ver.

Meirelles deve ficar em eventual transição e surge como presidenciável

  Pedro Ladeira/Folhapress  
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, participa da 20ª Marcha Nacional dos Prefeitos, em Brasília (DF)
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles

BRASÍLIA - Atracado ao cargo, o presidente Michel Temer mostra-se mais aguerrido do que se poderia imaginar na defesa de seu mandato. Há motivos óbvios, vale mencionar a proteção do foro especial.

O peemedebista diz que fica, e a crise faz a economia sangrar. Aliados próximos dizem que essa gestão não tem mais como levar adiante a agenda de reformas no Congresso. O Palácio do Planalto vinha contando diariamente os votos para a nova Previdência sem a convicção de ter atingido o número necessário até então. Agora, não há o que contar: o relator da proposta diz que inexiste espaço para avanço legislativo.

A máquina pública, já em ritmo lento por causa dos solavancos provocados a cada delação envolvendo ministros e parlamentares, agora para. Dela dependem importantes iniciativas para viabilizar concessões e (parcos) investimentos públicos.

A volatilidade nos preços dos ativos financeiros (embora mais contida na sexta) encarece o custo das empresas, e a perspectiva de crédito para negócios e famílias tende a piorar com a estridência das incertezas. A chance de a atividade seguir para o terceiro ano de recessão é concreta.

Na quinta-feira apocalíptica, Henrique Meirelles (Fazenda) tentou serenar investidores. Houve a sinalização de permanecer na condução da política econômica caso o presidente seja obrigado a deixar o Jaburu. Políticos da confiança de Temer desenham cenários sucessórios diversos, com a figura de Meirelles sempre central na economia.

O ministro também é queridinho do mercado e dos donos do PIB para o Planalto no caso de eleição indireta. Há quem ache que ele teria estatura política suficiente para uma candidatura se o pleito se der com a escolha da população.

Temer é investigado por obstrução de Justiça, corrupção e organização criminosa. Sem uma solução rápida, a economia pode colapsar. Independentemente do desfecho, parece estar claro quem fica. 

 

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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