FOLHA (deste domingo): "Está no preço", editorial; "De volta ao palanque"; e "Acima da lei?"

Publicado em 06/03/2016 09:09
Moro deu a Lula o papel de coitadinho (??!!)

"Está no preço", editorial da FOLHA 

EDIÇÃO DESTE DOMINGO

Poucas manifestações sobre a crise brasileira poderão igualar-se, em clareza e autenticidade, à vigorosa valorização da moeda brasileira e das ações das companhias nacionais nos últimos dias.

À medida que desdobramentos da Operação Lava Jato traziam novas ameaças à permanência da presidente Dilma Rousseff (PT) no Planalto e à sobrevivência política de Lula, a Bolsa de Valores subia, puxada pelas empresas estatais, e caíam as cotações do dólar.

Não se esperem dos mercados escrúpulos ou juízos morais. Sua atividade é converter informações disponíveis em preços que orientem as decisões de investidores, empresários e consumidores -tarefa que realizam não à perfeição, mas com diligência inigualável.

Se falta feijão, que o produto encareça e mais gente se anime a cultivá-lo; se um modelo de automóvel tornou-se obsoleto, que seu barateamento atraia compradores. Entre as variáveis a instigar a oferta e a demanda, há de ser considerada a continuidade de um governo cuja impotência obstrui a recuperação da economia.

A conexão entre a paralisia decisória de Brasília e a severa recessão em curso é evidenciada pelos números recém-divulgados do Produto Interno Bruto brasileiro.

Sabia-se havia muito que 2015 seria um ano de ajustes dolorosos; os notórios desequilíbrios econômicos acumulados pelo país, entretanto, não bastavam para prenunciar tamanha catástrofe.

No início do ano passado, as expectativas mais consensuais para o PIB rondavam a estagnação -um crescimento pouco acima ou pouco abaixo de zero. Antes do trimestre derradeiro, nem o mais pessimista dos oráculos antevia a retração de 3,8% afinal apurada pelo IBGE.

Na história nacional, só se conheciam taxas semelhantes em momentos de choque financeiro, como a insolvência da dívida externa, em 1981, e o confisco da poupança, em 1990. Mas essa não é a única anomalia dos resultados.

Uma aterradora sequência de dez trimestres de investimentos em queda, prova material dos níveis baixos de confiança do empresariado, aponta que o cenário recessivo se manterá inclemente neste 2016 e poderá atingir marcas inauditas de duração.

Pior ainda, nem mesmo o inevitável aumento do desemprego serviu para aplacar uma inflação que se alimenta do rombo do Tesouro Nacional. Dessa forma, os juros não podem ser reduzidos para reativar o crédito e o consumo.

É a ausência de liderança política -e, em consequência, de solução para o Orçamento federal- que exacerba o pessimismo e os ajustes nos mercados, sejam de mercadorias, trabalho, ações ou moedas.

 

Moro deu a Lula o papel de coitadinho

por ELIO GASPARI

Realizou-se parcialmente o primeiro objetivo dos procuradores da Lava Jato: o juiz Sergio Moro determinou a condução coercitiva de Lula a uma delegacia. Ele não foi preso, foi submetido a um constrangimento inédito: um ex-presidente da República entrou numa viatura policial. É bom lembrar que, quando os coronéis de IPMs da ditadura chamavam Juscelino Kubitschek para depor num quartel, marcavam hora e ele ia. O grande JK deixava-se fotografar entrando no prédio com seu inesquecível sorriso.

Há mais de um ano, Moro e os procuradores mostram que sabem o que estão fazendo. Indicações de contas mal explicadas envolvendo Nosso Guia, eles as têm, e podem ser encontradas nas 89 páginas em que o Ministério Público mostrou como o dinheiro de empresas metidas em petrorroubalheiras ia para as arcas do Instituto Lula e da família Silva. Como indício não é prova, podem ter dado um passo maior que a perna. Sobretudo porque a condução coercitiva deu ao episódio uma teatralidade desnecessária.

Lula foi presenteado com o papel de vítima, que desempenha há 40 anos com maestria. Como o marqueteiro João Santana já explicou, ele alterna a condição de coitadinho com a de poderoso. O coitadinho é perseguido pela elite. O poderoso defende as empreiteiras.

Lula teve seu mau momento quando respondeu a uma pergunta sobre os pedalinhos de Atibaia dizendo que ela não honrava a Polícia Federal. Deu-se ares de poderoso quando na verdade está diante de um caso em que um suboficial do Exército pagou do seu bolso brinquedos caros para os netos do chefe. O que não honra a Presidência da República é a família Silva ter se metido nesse tipo de transações. Os policiais fizeram muito bem ao perguntar e Lula continua devendo diversas respostas.

Uma conjunção dos astros fez com que, no mesmo dia em que se soube da colaboração de Delcídio do Amaral, o IBGE divulgasse uma contração de 3,8% da economia.

Governo em crise política é coisa comum. Crise política junto com recessão é coisa mais rara. Ambas, somadas a um governo catatônico, ecoam o ocaso do mandato de Fernando Collor de Mello.

O JOGO DA TROCA DE PRESIDENTE

Quem não torce pela sobrevivência do mandato de Dilma Rousseff deve saber o que quer. Tirar a doutora da cadeira é uma coisa. Quem colocar no lugar, e como, é outra.

Pelo caminho do impeachment, o vice-presidente Michel Temer assume no dia seguinte.

Pelo caminho da cassação da chapa de Dilma e Temer, assumirá o presidente da Câmara (hoje, Eduardo Cunha), obrigado a convocar eleições em até 90 dias. Se a lâmina do TSE cair depois do início de julho, o pleito poderá coincidir com a eleição municipal de outubro. Candidatos? Marina Silva, sem dúvida. Além dela, quem sobreviver na briga dos tucanos, e resta a possibilidade de aparecimento de um meteoro. Esta opção expressaria diretamente a vontade popular.

Se o TSE cassar a chapa Dilma-Temer a partir de 1º de janeiro, deputados e senadores elegerão, 30 dias depois, o seu substituto, para concluir o mandato. Votam todos aqueles que estiverem no exercício de suas funções. Se continuarem nas cadeiras, Eduardo Cunha presidirá a eleição e Delcídio do Amaral votará.

Esse colégio eleitoral será composto de 594 pessoas. Deles, 99 têm processos à espera de julgamento no STF e são 500 os inquéritos em andamento envolvendo parlamentares.

Vinte e um anos depois da campanha das Diretas, o regime democrático brasileiro corre o risco de eleger indiretamente um presidente da República.

JOÃO SANTANA

As eventuais colaborações de Léo Pinheiro da OAS e de diretores da Odebrecht poderão colocar mais um magano na fila: João Santana.

O marqueteiro do PT foi surpreendido pelo acervo de informações que os investigadores reuniram a respeito de suas transações com a Odebrecht. Essa é a parte mais simples.

Santana é um arquivo vivo dos métodos e das manhas do mercado que fez dele um milionário. Desde sua chegada à carceragem de Curitiba, ele está em outro mundo, diante da estratégia do Ministério Público. De um lado, os procuradores acumulam provas para buscar condenações. De outro, não se contentam com confissões. Se um preso quer colaborar, precisa botar na mesa coisas novas.

Por exemplo: diretores da Andrade Gutierrez destamparam a panela das pesquisas eleitorais pagas pela empresa para atender às necessidades de candidatos. Esse é um costume velho e multipartidário. A empreiteira mostrou uma árvore, Santana poderá mostrar a floresta.

ODEBRECHT

Em outubro, quando a Camargo Corrêa fechou seu acordo de colaboração, a Odebrecht desmentiu categoricamente que caminhasse na mesma direção.

Acreditava que antes das festas de Natal o STJ soltaria seu presidente. Confiava na macumba palaciana narrada por Delcídio do Amaral e divulgada pela repórter Débora Bergamasco. Tinham uma conta fechada, na ponta do lápis. Deu água.

Apesar da ênfase do desmentido da Odebrecht, ela vinha testando as águas para seguir no mesmo caminho, já aceito pela Andrade Gutierrez.

DILMÊS

A doutora Dilma disse, no ano passado, que os problemas da Petrobras eram "página virada", depois informou que "não respeito delator". Agora, indignada, repudiou o que chama de "uso abusivo de vazamentos".

Ela pode ter dito o certo, mas, se a Lava Jato não tivesse continuado a folhear o livro da Petrobras, a roubalheira teria ido para baixo do tapete e, se os colaboradores não tivessem sido ouvidos, as empreiteiras continuariam caladas.

Um vazamento pode ser irregular, mas isso não exclui a possibilidade de ele ser verdadeiro. É melhor haver uma verdade vazada do que blindá-la com mentiras.

VALÉRIO DE VOLTA

O empresário Marcos Valério continua na penitenciária. Ele poderá desempatar uma parte das revelações de Delcídio do Amaral.

O senador deve lembrar que, na primeira vez em que mencionou as ansiedades de Valério, Lula, calado, olhava para as próprias meias. Na segunda, mandou que procurasse Paulo Okamotto.

BOA NOTÍCIA

Depois de seu magnífico retrato de Stálin e de seu comissariado, o historiador Simon Montefiore mandará às livrarias em maio uma história dos czares Romanov, que governaram a Rússia até 1917.

Tem tudo para ser coisa fina, pois antes de se meter com os bolcheviques, Montefiore escreveu uma elegante biografia de Grigory Potemkin, o poderoso primeiro-ministro e namorado de Catarina, a Grande. Uma história de poder e amor.

O tio-avô de Montefiore foi sócio dos banqueiros Rothschild e ele tem um olho de lince para observar o poder e as elites. Essa foi uma das virtudes do retrato de Stálin com sua "corte do Czar Vermelho".

 

Lula fortão, Lula fraquinho e a crise

Por VINICIUS TORRES FREIRE

Lula no papel de vítima é uma personagem que mais preocupa do que anima a oposição, o PSDB pelo menos; prejudica o plano de deposição de Dilma Rousseff. Lula na delegacia e o tumulto decorrente vão fazer o PMDB deixar como está para ver como é que fica até os protestos contra a presidente, no dia 13. Vai à breca a discussão parlamentar de planos para conter a ruína econômica, que assim mais ruína será.

Essas parecem ser algumas consequências do transe da semana passada e de Lula ter sido levado, sob vara, a uma delegacia.

Lula vítima das elites, o "Lula fraquinho", a seguir pode se tornar o "Lula fortão", o pobre que venceu na vida, vingador do povo. Relembra-se aqui uma mistura de teoria com roteiro de cinema inventada lá por 2006 por João Santana. "Fortão" e "fraquinho" eram os papéis subliminares desempenhados pelo ex-presidente em campanhas e discursos orientados pelo marqueteiro.

O Lula "fraquinho" que, tal como o Hulk dos quadrinhos, se torna "fortão", assusta oposicionistas. Mais que isso, embates contra Lula tiram o foco da derrubada de Dilma, na análise de senadores tucanos.

"Bater em Lula é desperdiçar energia. Não resolve o problema do país. Lula não está no poder, é um problema da Justiça. Dilma é o foco", diz um líder tucano. Pior ainda, os ataques a Lula podem reaproximá-lo da presidente e reunificar o "campo petista" ou da esquerda. Movimentos sociais, partes do PT e o governo vinham se insultando.

Na sexta-feira de noite, movimentos sociais que andavam chamando Dilma Rousseff de "traidora" da esquerda juntaram-se para saudar Lula e "barrar o golpe", no comício de desagravo no Sindicato dos Bancários de São Paulo.

A "condução coercitiva" levou Lula a relançar sua candidatura para 2018 e prometer uma "caravana" pelo país. O PT prepara protestos para esta semana e para 31 de março, data do golpe que derrubou João Goulart. A princípio, essa manifestação deve se chamar "1964 Nunca Mais".

O PMDB fica quieto, por ora. Antes de tomar um rumo, até o do impeachment, a ideia é: 1) Continuar o programa de pacificação até a convenção do partido, no dia 12: passar uma cola na relação entre Renan Calheiros e Michel Temer; 2) Esperar o que "será das ruas": avaliar a força de Lula e, principalmente, o tamanho do protesto do dia 13 contra Dilma.

Segundo o pessoal do PSDB, praticamente foi por água abaixo a ideia de "colaborar" com programas de reformas ou remendos econômicos do governo. O plano é atravancar tramitações e insistir em destravar o processo de impeachment. Eduardo Cunha vai pelo mesmo caminho, emperrando a Câmara enquanto o Supremo não der definições sobre o rito de impeachment.

Um trio de empresários e banqueiros relevantes ficou incomodado com o cerco a Lula, uma "irresponsabilidade, vai insuflar os ânimos e aumentar o conflito no país arrasado, como se já não bastasse a Dilma", no dizer de um deles, de resto nem favorável ao impeachment. O resumo da ópera dessa visão é que os processos "precisam ser resolvidos", com o mínimo de conflito, rapidamente, para que o país possa tomar um rumo, o que de qualquer modo julgam improvável –a crise ainda iria longe. Mas conflito na rua preocupa muito essas pessoas.

 

De volta ao palanque

Por BERNARDO MELLO FRANCO,  de BRASÍLIA - 

A sexta-feira quente fez as peças avançarem no tabuleiro da crise. A Lava Jato ensaiou seu movimento mais ousado ao obrigar Lula a depor sob condução coercitiva da polícia. O ex-presidente reagiu com fúria e convocou a tropa para defendê-lo. A tensão transbordou para as ruas, com cenas de pancadaria que podem se repetir nos próximos dias.

Em Curitiba, Sergio Moro abandonou de vez o discurso de que Lula não seria alvo das investigações. O juiz deixou claro que o petista está em sua mira e já indicou que pretende condená-lo. Em decisão, apontou "fundada suspeita" de que o ex-presidente recebeu "benefícios materiais" de fornecedoras da Petrobras.

Curiosamente, Moro não esperou o petista se defender nos autos. Ele contestou uma nota enviada à imprensa sobre o tríplex do Guarujá. A seu juízo, apresentaria um "álibi" de "pouca consistência com os fatos".

Em São Paulo, Lula se pintou para a guerra. Reuniu aliados, criticou o juiz e prometeu reagir. "Se quiseram matar a jararaca, não bateram na cabeça. Bateram no rabo, porque a jararaca está viva", desafiou.

A ofensiva da Lava Jato pôs o ex-presidente de volta no palanque. Em tom de campanha, ele escancarou o discurso de candidato ao Palácio do Planalto. "O que aconteceu hoje era o que precisava acontecer para o PT levantar a cabeça", afirmou. "Estou disposto a andar por este país."

Aos 70 anos, Lula mostrou que ainda tem força para mobilizar aliados a defendê-lo de forma incondicional. No dia em que acordou com a polícia na porta, ele voltou para casa nos braços de seguidores.

Resta saber se o discurso aplaudido pelos petistas será capaz de hipnotizar plateias mais amplas no Brasil de 2018. O país está mudando, e a imagem do ex-presidente também. Ele não está fora do jogo, mas terá dificuldade de sustentar o velho figurino de vítima das elites. Pelo menos enquanto não explicar bem a relação de simpatia, quase amor, que manteve com empreiteiras do petrolão. 

 

Acima da lei, por FERREIRA GULLAR

Peço que o leitor me desculpe por voltar a falar de Luiz Inácio Lula da Silva, mas é que, nos últimos meses, ele se tornou um dos centros da problemática política que envolve a atuação do PT no governo do país.

No que se refere particularmente ao ex-presidente, as investigações levadas a efeito pela Operação Lava Jato terminaram por revelar ligações suas com empresários envolvidos no escândalo da Petrobras, de que também teria se beneficiado. Os dois fatos até agora mais evidentes disso são a suposta compra de um apartamento tríplex, em Guarujá, e de um sítio, em Atibaia.

Até bem pouco, quase ninguém sabia dessas supostas propriedades de Lula. Só depois que a imprensa noticiou o fato ele passou a falar no assunto. Primeiro, foi o caso do apartamento tríplex, a respeito do qual afirmou ter adquirido apenas uma cota em 2005. Não obstante, a imprensa voltou a revelar que sua mulher, dona Marisa, havia visitado, muito depois, o referido tríplex, em companhia do presidente da OAS.

Após a visita, essa empresa bancou a reforma do apartamento a um custo de quase R$ 800 mil. Lula também visitou o prédio na época em que se instalava ali um elevador privativo para o tríplex. Depois de muitas versões diferentes, ele terminou por admitir que vendera a cota em novembro de 2015, ou seja, poucos meses atrás. Afinal, qual é a versão verdadeira?

Quanto ao sítio, segundo afirma, não lhe pertence, mas desde que deixou a Presidência da República, em 2010, passou a frequentá-lo constantemente juntamente com sua família. Também esse sítio foi reformado e equipado com cozinha e mobília completa, a um custo de R$ 1 milhão. Não obstante, garante que o sítio não lhe pertence, mas a sócios de seu filho, que se revelam de uma generosidade rara. Nunca conheci tanta generosidade, mas também nunca fui presidente do Brasil.

Se eu fosse petista, poderia até acreditar nessa lorota, como, ao que parece, acreditam (ou fingem acreditar) a presidente Dilma Rousseff e seu chefe da Casa Civil, Jaques Wagner. Este afirmou que Lula está sendo vítima de uma "caça a uma liderança nacional, nesse caso, uma caça constante". Para Dilma, trata-se de "uma grande injustiça", tanto mais porque "o país, a América Latina e o mundo precisam de um líder com as características do presidente Lula". Quais são essas características, ela não disse.

Note-se que até então nem ela nem o Wagner tinham vindo a público defender o seu grande líder e, mesmo agora, ao fazê-lo, nenhum dos dois se refere ao tríplex ou ao sítio de Atibaia. Tampouco afirmam explicitamente que Lula é inocente.

E, em meio a tudo isso, o que fez Lula? Sumiu, simplesmente deixou de dar entrevistas, falar sobre o assunto. Era como se não fosse com ele. Em vez disso, manda o Instituto Lula e o presidente do PT responderem às acusações. Mas estes tampouco as discutem, apenas afirmam que ele está sendo vítima de perseguição.

Perseguição da parte de quem? Claro, da Polícia Federal, do Ministério Público, dos órgãos da Justiça e da imprensa, que, como se sabe, num país capitalista, existem para perseguir os que lutam pelos pobres, como a Odebrecht, a Camargo Corrêa, o PT e o Lula.

Não estou entre aqueles que querem, a todo custo, ver o ex-presidente na cadeia. Não obstante, como a Constituição assegura que todos são iguais perante a lei, não se pode aceitar que, por ser um destacado líder político, esteja ele a salvo de qualquer procedimento investigativo que vise defender o interesse público. Por isso mesmo é inaceitável a atitude da cúpula petista, em face de qualquer medida judicial contra ele, pretendendo até mesmo impedir que os fatos sejam apurados.

Ou devemos concluir que a apuração da verdade é contra Lula? Intimado a depor no processo que examina a compra do tríplex, negou-se a ir, o que pegou mal, já que essa seria a oportunidade de ele esclarecer as acusações que lhe fazem.

Você, leitor, certo de sua inocência iria, não iria? Pois é, eu também iria.

 

E a orquestra já não toca, por CLÓVIS ROSSI

O Brasil como Titanic é a comparação de Judd Webber, na newsletter sobre América Latina do "Financial Times".

Depois de informar que, em um dos luxuosos shoppings que pontuam o cenário do país tropical, toma-se sorvete a US$ 4 a casquinha, ele afirma: "Mas, ao contrário da orquestra tocando enquanto o transatlântico afundava, a aparência de normalidade não pode durar".

Judd vai ao exagero de sugerir ao vendedor de sorvetes que aceite apenas pagamento em dinheiro, porque "a taxa de cheques devolvidos no Brasil é a maior desde que as estatísticas começaram".

De acordo, Judd, com uma ressalva: é evidente que, se por orquestra se tomar o governo, ela já parou de tocar faz algum tempo.

Meses atrás, um inquilino importante do Palácio do Planalto desabafou comigo: "É muito difícil governar quando o horizonte que se tem é de apenas uma semana".

De lá para cá, ficou pior.

Breve recapitulação: na quinta-feira (3) cedinho, chegava à minha caixa de correspondência eletrônica boletim da "Economist" em tom tão lúgubre quanto o de Judd Webber.

Dizia: "Os estatísticos confirmarão hoje [quinta] que o PIB encolheu cerca de 4% no ano passado [foi, na verdade, 3,8%]. Cerca de 100 mil empregos foram perdidos em janeiro, além de mais de 1,5 milhão em 2015. O gasto dos consumidores está se contraindo: vendas no varejo caíram 7% em dezembro. A inflação, correndo a 11%, está comendo os salários daqueles que ainda têm emprego. A treva estagflacionária persistirá até que Dilma Rousseff enfrente o deficit orçamentário que mina a confiança, agora em chocantes 10,8% do PIB".

Termina com a previsão de que, do jeito que as coisas vão, as notícias sobre o PIB de 2016 serão igualmente lúgubres.

Parecia, pois, a descrição perfeita do fundo do poço, mas eis que, nas horas seguintes, vieram informações que demonstram que o excelente colunista Vinicius Torres Freire estava certo ao imaginar que o fundo do poço tem um alçapão.

Primeiro, o vazamento da delação premiada do senador Delcídio do Amaral, apontando o dedo para a presidente e para seu antecessor e padrinho, Luiz Inácio Lula da Silva.

Mais 24 horas e a Polícia Federal leva Lula, sob vara, para prestar depoimento sobre as inúmeras suspeitas que pesam sobre o ex-presidente.

É a tempestade perfeita, dificultando ou, no limite, impedindo o resgate dos passageiros do Titanic Brasil, agora que a orquestra já não toca e não há salva-vidas para todos.

Pode ser que Delcídio do Amaral esteja mentindo, pode ser que ele não tenha provas, o que será fundamental no âmbito jurídico. Mas, no âmbito político, o "iceberg" já bateu no navio.

É como no caso Roberto Jefferson/mensalão: ele tampouco ofereceu provas, na entrevista que deu à Folha, mas o desfecho acabou sendo a prisão de uma parte da cúpula do PT.

A diferença entre o mensalão e o petrolão é o estado da economia (saudável à época) e a popularidade do presidente de turno, inexistente agora. O comandante irá ao fundo com o navio?

 

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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