MPF diz que Vale privilegiou lucro a segurança de trabalhadores em Brumadinho
Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - O Ministério Público Federal afirmou, em parecer enviado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que a mineradora Vale tomou decisões sobre a barragem de Brumadinho (MG), que rompeu em janeiro com centenas de mortos e desaparecidos, com o objetivo de privilegiar o lucro da companhia em detrimento da segurança dos trabalhadores.
A avaliação é contestada pela mineradora, que destaca que a barragem 1 da Minas Córrego do Feijão foi construída pela Ferteco, empresa adquirida pela Vale, e que coube à dona anterior do empreendimento a escolha pelo método a montante, uma técnica de construção da estrutura mais barata, mas que também oferece maiores riscos.
Ao comentar o caso para uma instrução de futuro julgamento do mérito do habeas corpus pelo STJ sobre cinco pessoas que tiveram a prisão decretada após o desastre, o subprocurador-geral da República João Pedro de Saboia Bandeira de Mello Filho disse que a tragédia em si não se deve a "qualquer fraude ou negligência dos técnicos", e apontou para os "motivos econômicos".
O integrante do MPF avaliou no parecer que a mineradora fez escolhas, como deixar refeitórios próximos à barragem ou não ter esvaziado o depósito de rejeitos, mesmo ele estando desativado há anos, por opção econômica.
"Assim, tudo até agora vem indicando que a Vale privilegiou a lucratividade em detrimento da segurança de seus trabalhadores e dos habitantes do entorno", disse o subprocurador-geral da República na manifestação entregue na quarta-feira e obtida pela Reuters.
Essa manifestação do MPF foi apresentada para instruir o futuro julgamento do mérito do habeas corpus pela corte referente a cinco pessoas ligadas à Vale e à auditora alemã Tüv Süd, que foram colocadas em liberdade na semana passada por decisão da 6ª Turma do STJ. Elas tinham sido presas por ordem judicial após o rompimento da barragem de Brumadinho, mas soltas por liminar do STJ.
No parecer, o integrante do MPF defende a manutenção das cinco pessoas em liberdade e que é "preciso investigar para prender, e não prender para investigar".
Bandeira de Mello Filho disse que, embora não seja possível descartar preliminarmente a hipótese de falsidade ideológica dos funcionários envolvidos no caso, não é possível entender, por enquanto, o interesse dos técnicos terceirizados e mesmos dos empregados da Vale de participar de uma eventual fraude atestando a estabilidade de uma barragem instável.
"Especificamente, para enganar quem, e a troco de quê?", questionou-se.
"Volto a dizer que, a priori, nenhuma hipótese deve ser desconsiderada. Mas desde logo presumir que houve falsidade e fraude, é abrir uma larga porta para não se apurar responsabilidade dos dirigentes empresariais que optaram por construir uma barragem 'a montante', que a mantiveram em operação por anos, e, depois de desativá-la, também por anos a mantiveram repleta ou quase", afirmou no parecer.
O subprocurador defende que em todas as instâncias judiciais se examine o caso com "atenção redobrada" de forma a "não favorecer a impunibilidade daqueles que podem ser (não afirmo que o sejam, pois se trata de investigação inicial ainda) os maiores, se não os únicos, responsáveis".
OUTRO LADO
Procurada, a Vale afirmou ainda que a barragem não recebia rejeitos desde julho de 2016, ou seja, estava inativa, "sendo que tal decisão se baseia justamente em premissas de segurança".
Segundo uma nota oficial, a Vale apenas aguardava o licenciamento ambiental para o início do processo de descomissionamento (desmonte da barragem), conforme determina a lei, sendo que o requerimento se deu em agosto de 2015 e somente houve a autorização em dezembro passado.
"Tais fatos --aliado ao sistema estruturado de gestão de barragens, que engloba diversas ações técnicas e de governança, bem como ao constante investimento na melhoria e aprimoramento dos processos da companhia, visando sempre as melhores técnicas operacionais e tecnologias para assegurar a estabilidade de suas estruturas-- demonstram a constante preocupação da Vale com a segurança de suas barragens", afirmou a Vale.
A empresa disse ainda que "o dever de diligência no exercício de atividades empresariais e profissionais é rigorosamente respeitado pelos executivos da Vale, não havendo que se falar de responsabilidade 'criminal' sem uma clara e inequívoca comprovação individual de culpa ou dolo".
"Nenhuma presunção de culpa pode decorrer exclusivamente do cargo do administrador de uma empresa, pois não existe responsabilização criminal simplesmente como decorrência da posição executiva ocupada", disse a empresa, lembrando que todas as barragens da mineradora são certificadas e receberam laudos de estabilidade.
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