Cadê a chuva do verão?, por Josélia Pegorim
Dezembro e janeiro são dois meses tradicionalmente de muita chuva na maior parte do Brasil. Os temporais estão ocorrendo, mas a irregularidade ou mesmo ausência da chuva desde o dia o início oficial do verão 2016/2017, em 21 de dezembro de 2016, e na primeira semana de janeiro de 2017 tem feito muita gente comparar a situação atual com os eventos de seca e calor fora do comum experimentados em parte dos verões de 2014 e de 2015.
Outro fato que vem sendo lembrado é a chuva muito volumosa que ocorreu em janeiro de 2016 em muitas áreas do país, especialmente do Sudeste, do Centro-Oeste e do Nordeste.
Um evento marcante de janeiro de 2016 foi a excepcional chuva que ocorreu em Barreiras, no oeste da Bahia, onde o mês terminou com cerca de 600 mm acumulados. Em Brasília, pela medição do Instituto Nacional de Meteorologia, janeiro de 2016 foi o janeiro mais chuvoso desde 2013. Em Goiânia, capital de Goiás, janeiro de 2016 foi o janeiro mais chuvoso em 36 anos.
A situação de agora é mesmo comparável a dos verões de 2015 e de 2014? A chuva de janeiro vai se normalizar no decorrer do mês? Há previsão de que chova tanto em janeiro de 2017 como em janeiro de 2016?
Confira abaixo a análise do meteorologista Alexandre Nascimento, um dos especialistas em previsão climática da equipe da Climatempo.
Há semelhanças entre o que observamos no Oceano Atlântico neste início de 2017 com os bloqueios atmosféricos verificados me parte dos verões de 2014 e 2015?
Alexandre Nascimento afirma que não. As situações são muito diferentes. "Nos anos de 2014 e 2015 tínhamos um bloqueio oceânico bem formado, tanto no Atlântico quanto no Pacífico. As poucas frentes frias que conseguiam atravessar o Pacífico e chegar ao Atlântico Sul ficavam bloqueadas na grande faixa de água quente que existia em ambos os anos. Neste ano vemos que não há nenhum bloqueio oceânico."
Bloqueio oceânico
Nos mapas abaixo vemos a anomalia da temperatura da água do mar (TSM) em janeiro de 2014, em janeiro de 2015 e em dezembro de 2016, que representa a situação atual. Os tons de vermelho representam a anomalia positiva, quando a TSM está acima da média. Os tons de azul representam a anomalia negativa, quando a TSM está abaixo do normal.
A situação de bloqueio é representada pela extensa faixa em tons de vermelho e alaranjado sobre o Atlântico Sul, entre a costa do Uruguai e do Rio de Janeiro estendendo-se até a costa oeste da África.
Alexandre Nascimento explica como o sistema de pressão ASAS (Alta Subtropical do Atlântico Sul) atua na situação de bloqueio atmosférico.
"Nestas duas situações, de janeiro de 2014 e janeiro de 2015, a ASAS entrou no interior do Brasil durante o verão e influenciou as condições do tempo durante muitas semanas. Em 2014 foram 10 semanas e em 2015 foi mais de um mês".
Posição média do sistema ASAS
Nos mapas de linha de corrente no nível de pressão de 850 hPa (aproximadamente 1500 metros acima do nível do mar) é possível ver a posição média do grande sistema de alta pressão atmosférica do Atlântico Sul (ASAS) marcada com a letra A em janeiro de 2015 e em janeiro de 2014.
O que esperar do comportamento da ASAS no decorrer de janeiro de 2017?
Alexandre Nascimento explica que na situação atual, de 2016 para 2017, não há nenhum bloqueio oceânico. "A ASAS está atuando desde o fim do ano passado, mas ela deve perder força nas próximas semanas. Como não há a componente oceânica, esta posição atípica ficará por menos tempo. A situação volta ao normal muito mais rápido do que em 2015 ou em 2014".
O mapa mostra a estimativa do volume de chuva sobre o Brasil para o período de 15 dias. Vemos claramente que a chuva deve aumentar nos próximos 15 dias.
Oscilação Madden-Julian
Em janeiro de 2016, mesmo sob a forte influência do fenômeno El Niño, que normalmente reduz a chuva sobre o Nordeste do Brasil, quase toda a Região e também muitas áreas do Centro-Oeste e do Sudeste tiveram muita chuva. No Sudeste, as regiões mais favorecidas foram o norte de Minas Gerais e o Espírito Santo. A região do Distrito Federal, onde ainda se observada um quadro de deficiência de chuva, também teve muita chuva em janeiro de 2015. A razão de chuva muito volumosa de janeiro de 2016 em todas estas áreas foi a ocorrência de uma forte Oscilação Madden-Julian (OMJ) que superou o efeito negativo para chuva do El Niño.
Pode ocorrer em janeiro de 2017 uma influência forte da Oscilação Madden-Julian como em janeiro de 2016?
Na avaliação do meteorologista Alexandre Nascimento não há expectativa de que isto aconteça. "Outras fontes de instabilidade que poderiam atuar não estão atuando neste mês de janeiro de 2017, como a Oscilação Madden-Jullian. E a expectativa é de que não atue pelo menos até o dia 15."
Entenda o que é a oscilação Madden-Julian em duas análises da situação ocorrida em janeiro de 2016: Chove mais no Nordeste e menos no RS e Influência da oscilação Madden-Julian no verão 2016
O mapa abaixo mostra a previsão-ensemble do ECMWF, modelo de previsão numérica europeu. Alexandre explica: "O gráfico representa um ondograma. Quanto mais afastada do centro da figura, maior seria a contribuição da OMJ. Podemos verificar que não teremos a atuação da OMJ pelo menos até o dia 15. A previsão aponta que deve continuar perto do centro e, portanto, a OMJ não terá relevância."
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