Não dá para desancar os políticos e poupar o eleitor (por JOSIAS DE SOUZA, do UOL)

Publicado em 28/09/2017 07:08

A política brasileira vive uma realidade de ópera-bufa. Mas o desfecho pode ser de tragédia. O país assiste a três atos da ópera-bufa: o nariz de palhaço que o Lula aplicou em si mesmo ao desqualificar as revelações devastadoras de Antonio Palocci, a indignação do Senado com o recolhimento domiciliar noturno que o STF impôs a Aécio Neves e o desinteresse da Câmara pela investigação de Michel Temer e a organização criminosa que a Procuradoria vê ao seu redor.

O excesso de imoralidade parece ter anestesiado a sociedade. E o sistema político aproveita para cultivar o insolúvel como uma flor do lodo. Num instante em que o Brasil vai a pique, a Câmara aprovou a medida provisória que garantiu foro privilegiado a Moreira Franco, um dos ministros denunciados junto com Temer. E o Senado gasta suas melhores energias para aprovar o fundo que derramará verbas públicas nas campanhas eleitorais sem cortar gastos.

A tragédia que pode surgir no fim de tantos atos burlescos é o descaso do eleitor brasileiro. A essa altura, seria uma irresponsabilidade desancar os políticos e poupar os eleitores. Chegou a hora de parar de tratar a política como um conto do vigário no qual o país cai a cada quatro anos. O trágico só será evitado se você tratar a eleição de 2018 como oportunidade para um acerto de contas. No foro privilegiado da urna, o juiz é você. É a hora em que o brasileiro de bem pode impedir que o político pilhado com os bens continue se dando bem.

Veja o que pensa  Procuradora-chefe Raquel Dodge a respeito do essencial

A nova procuradora-geral da República, Raquel Dodge, concedeu nesta terça-feira sua primeira entrevista coletiva. A íntregra está disponível no rodapé. Vão abaixo oito tópicos selecionados pelo blog. Lendo-os, você saberá o que pensa a substituta de Rodrigo Janot sobre o essencial. Ela enaltece a Lava Jato, valoriza o instituto da colaboração premiada, defende o aproveitamento de provas coletadas por meio de acordos de delação rescindidos, não tolera vazamento de dados sigilosos e dará sequência às investigações contra Michel Temer —se a Câmara deixar.

— Lava Jato: O compromisso do Ministério Público com o combate à corrupção, em especial com a Operação Lava Jato, que tantas contribuições benéficas tem trazido para o país, é o meu compromisso. Todos os membos do Ministério Público Federal, assim também a população brasileira, reconhecem a importância dessa investigação, os resultados que dela decorrem. São resultados não só relacionados com a repressão de alguém que comete um crime, mas é um resultado transformador […] na percepção que a população tem de que é possível enfrentar a criminalidade com os instrumentos jurídicos que temos hoje à disposição do país.

— Delação premiada: É fato que a lei que cria a colaboração premiada auxiliou muitíssimo. É um novo instrumento jurídico que surge exatamente ao tempo do nascedouro dessa investigação [Lava Jato]. E isso tem trazido resultados muito interessantes no desvendamento desse tipo de criminalidade, que se pratica entre quatro paredes, de forma dissimulada… Esse instrumento jurídico revelou-se adequado ao desvendamento exatamente desse tipo de crime, como prevê a lei.

— Transição: Na transição [da gestão de Rodrigo Janot para a nova administração] eu respeitei muito o princípio de que a transferência do sigilo legal dependia de autorização judicial. Então, nossa equipe de trabalho, que hoje já está nomeada, não teve acesso a nenhum dos documentos sigilosos que estavam tramitando aqui na Procuradoria-Geral da República e nem no Supremo Tribunal Federal. Isso por absoluto respeito à norma, que não admite transferência de sigilo legal a não ser por autorização judicial. E não se revelou a necessidade de que essa autorização fosse feita a nós naquela fase de tansição. De modo que, nesses sete ou oito dias que estamos no caso, minha equipe e eu temos trabalhado mais de 12 horas por dia, exatamente nos inteirando de todos os documentos que existem e como esses documentos, esses indícios e provas se relacionam uns com os outros… Para os próximos dias e meses, o nosso compromisso é trabalhar com afinco para que não haja solução de continuidade, tanto nas investigações quanto nas ações penais já propostas e que estão tramitando no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça.

— Provas e acordos rescindidos: No tocante às provas, me parece que a lei é clara no sentido de que a rescisão do acordo não invalida a prova produzida no âmbito da delação premiada. Como a matéria já é regulada por lei, é à lei que nós daremos consequência e aplicação.

— Provas do caso JBS podem ser anuladas? Do ponto de vista jurídico, há diferença entre a rescisão de uma prova ou de um instrumento e a nulidade desse instrumento. E a questão será analisada pela nossa equipe no momento oportuno, considerando essas duas possibilidade jurídicas. No momento, não posso adiantar nenhum raciocínio sobre isso, exatamente porque estamos num momento de estudar o caso. […] Do ponto de vista jurídico, a lei distingue entre rescisão e nulidade. São situações diferentes, que levam a consequências distintas. E iremos aquilatar exatamente se estamos no domínio de uma ou de outra. Não estou adiantando nenhuma posição específica neste caso concreto. Mas apenas adianto que há diferenças jurícas entre uma hipótese e outra.

— Vazamentos de dados sigilosos: No tocante a vazamentos, a minha compreensão é que a lei 12.850 disciplina que deve haver sigilo sobre delações em curso, a prova colhida no âmbito das delações, até o momento em que o Poder Judiciário levante esse sigilo. É com esse acatamento ao que dispõe a lei que eu tratarei essas questões no âmbito da Procuradoria-Geral da República. […] Considero que a imprensa tem um papel importante na comunicação do que sabe ao público. E cada profissional de imprensa avalia o que deve ser comunicado. Mas, também da nossa parte, temos que ter compromisso com aquilo que está disciplinado por lei —notadamente questões que estão submetidas a sigilos que só podem ser levantados por ordem judicial. É nessa expectativa de trabalhar assim, com estrito respeito à lei, que tenho orientado minha equipe.

— Como lidar com procuradores suspeitos, a encrenca da JBS, e o desgaste provocado pela briga Rodrigo Janot X Gilmar Mendes? Considero que nós temos de lidar com todas essas questões com temperança, com sobriedade, com espírito público. Sei que os brasileiros depositam uma grande expectativa em que as instituições do sistema de administração de Justiça —aí incluídas a advocacia, a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e o Poder Judiciário— trabalhem bem, desincumbam-se bem das suas atribuições. É para isso que estamos aqui, somos servidores públicos. E é com esse espírito que recebo todo esse trabalho que foi feito. Vejo nele muito de mérito, muito importante para o país. E pretendo, com esse espírito, conduzi-lo do melhor modo possível, no limite das minhas possibilidade e das minhas forças, com sobriedade, com temperança, com equilíbrio, buscando finalmente alcançar aquilo que interesssa, que é o resultado…”

— Denúncia de Janot contra Temer: No meu primeiro dia de trabalho, a minha primeira tarefa foi exatamente elaborar um memorial, que foi entregue ao Supremo Tribunal Federal. Era o meu único modo de participar da tramitação judicial desse assunto, na medida em que a sustentação oral já havia sido feita na semana anterior. Como sabem todos, há regras muito claras no processo penal, no tocante ao momento em que falamos nos autos processuais. Mas me vali, então, desse memorial para apresentar à Corte a minha posição, no sentido de que a denúncia devia ser encaminhada incontinenti à Câmara, para que ela fizesse esta avaliação sobre a continuidade. Não me cabe dar opinião sobre o que fará ou como se manifestará a Câmara dos Deputados, porque respeito essa instituição. Cada uma das nossas instituições trabalha no domínio da sua atribuição. Se a Câmara dos Deputados aprovar a continuidade desta tramitação, exercerei aquilo, com clareza e transparência, que é dado a todo membro do Minsitério Público fazer. Uma vez ajuizada, a denúncia será submetida ao plenário do Supremo Tribunal Federal. Se recebida, deverá ter continuidade, porque a ação penal pública é indisponível. Não pode nenhum procurador, nenhum membro do Ministério Público dispor da ação penal —voltar atrás, numa linguagem mais leiga. Então, estaremos dependendo a seguir do recebimento ou não dessa denúncia. Uma vez recebida, a ação penal pública é indisponível. Darei a ela a continuidade que é do mister do meu cargo.

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Fonte:
Blog Josias de Souza (UOL)

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