Palocci ainda tem muito o que contar... por FERNANDO RODRIGUES, do PODER360

Publicado em 06/09/2017 15:34
Homem de confiança de Lula e Dilma revela pacto de sangue entre Emilio Odebrecht e o PT

Por que Antonio Palocci, 56 anos, ex-ministro da Fazenda, resolveu dar depoimento entregando Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff?

Vai demorar um pouco para ter a reposta definitiva. Tenho algumas suspeitas.

Antonio Palocci tem 2 anos e meio a mais do que eu. É um dos políticos mais hábeis que já conheci. Seu o relato contundente ao juiz Sérgio Moro certamente foi dado com algo cartesianamente calculado. A razão mais pragmática me parece mesmo tentar abreviar o tempo de cadeia e partir para algum tipo de pedido de benemerência, obtendo uma punição mais amena.

Palocci foi preso em 26 de setembro de 2016. Está para completar 1 ano vendo o sol nascer quadrado. Em 26 de junho de 2017, foi condenado a 12 anos de prisão pelo juiz Sérgio Moro.

Tentou algumas vezes fazer um acordo de delação premiada. Seu nhenhenhém foi rebarbado pelos investigadores da Lava Jato. O ex-ministro falava muito e dizia pouco. Percebeu que a estratégia estava fazendo água. Resolveu ser mais pró-ativo nesta semana.

Nenhuma atitude “at large” de Palocci até hoje, pelo menos que eu saiba, foi tomada sem antes calcular a relação custo-benefício. O ex-ministro é um “político de resultados”. Há pouca ou nenhuma ideologia nos seus atos. Sempre ouvi dizer –repeti muitas vezes e lamento– que José Dirceu encarnava o verdadeiro e maior “apparatchik petista”. Hoje tenho certeza de que Dirceu é fichinha perto de Palocci.

Tenho algumas histórias para contar. Começo com uma do início de 2011.

Durante quase uma década eu me esfalfava em Brasília para ajudar a Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) a promover uma campanha a favor de uma Lei de Acesso à Informação.

Hoje, parece fazer 100 anos que a LAI está por aí. #SQN. Demorou uns 10 anos para virar realidade.

Durante os 8 anos de Luiz Inácio Lula da Silva como presidente foi muito difícil avançar. O núcleo central dentro do Planalto era comandado por uma troika composta por stalinistas tardios, egressos da esquerda católica e petistas de universidade. Uma mistura explosiva que deixava o país às vezes enroscado numa dobra do tempo pré-queda do muro de Berlim.

Aí veio Dilma Rousseff. As coisas poderiam piorar. Exceto por um detalhe. Ela nomeou, por determinação de Lula, Antonio Palocci como ministro-chefe da Casa Civil.

Os primeiros 6 meses de Dilma no Planalto foram os seus melhores, até Palocci ser derrubado por causa de suspeitas de enriquecimento ilícito. Arrisco dizer que se o ministro da Casa Civil tivesse ficado os 4 anos na cadeira o mandato dilmista teria sido muito menos catastrófico. Poderia até ter sido exitoso. Mas quis o destino (e Dilma Rousseff) que Gleisi Hoffmann sucedesse a Palocci. Essa é outra história.

Peço perdão pela digressão e retomo ao tema principal deste relato sobre a campanha pró-Lei de Acesso à Informação. Em 2011, o assessor de imprensa de Palocci era o competente jornalista Thomas Traumann. Pedi uma audiência. Foi marcada para 29 de março (se a memória e minhas anotações não me traem).

Fui bem objetivo no encontro com Palocci: “O Brasil não tem Lei de Acesso à Informação. Os Estados Unidos têm desde 1966. A Suécia tem há 2 séculos. É uma legislação que serve não só para jornalistas bisbilhotarem o governo (embora isso vá acontecer), mas que vai melhorar o ambiente de negócios. As informações públicas ficarão mais disponíveis aos investidores. Essa é uma lei que vai ajudar a melhorar o capitalismo brasileiro”.

O ministro ouvia com atenção. Aí conclui com um argumento matador: “Palocci, o governo Dilma vai se sair muito bem nesse caso. A presidente não tem nada a esconder. Há apenas uma geração de diplomatas e militares que resistem à lei, pois temem algumas revelações do passado. Mas essas revelações também ajudarão a melhorar a imagem da presidente. Em resumo, o Brasil precisa da lei, mas certamente isso fará um bem enorme à imagem da presidente da República”.

Já entendi”, respondeu Palocci. Assim, com duas palavras. E entendeu mesmo. Algum outro ministro da Casa Civil talvez ficasse me olhando e pensando “o que esse jornalista interesseiro está tentando me empurrar?”. Palocci era capaz de pensar em outra dimensão. Ia além do interesse do interlocutor. Enxergava com mais rapidez o que a maioria tapada de Brasília às vezes demora anos para captar.

Muitos outros políticos ajudaram depois a fazer a lei virar uma realidade. Gente do PT, do DEM, do PSDB, do PMDB e de tantos outros partidos. Algum dia preciso relatar isso em detalhes. Mas a conversa seminal com Palocci é que destravou muitas portas naquele início de 2011.

O texto da LAI foi aprovado em definitivo pelo Senado em 25 de outubro de 2011, cerca de 7 meses depois de meu papo com Palocci na Casa Civil (ele já havia sido defenestrado em 7 de junho daquele ano). O projeto foi sancionado pela presidente Dilma Rousseff em 18 de novembro de 2011, transformando-se na lei 12.527.

A LAI é 1 dos maiores avanços institucionais do Brasil em muitas décadas. É raro passar uma semana sem que fiquemos sabendo de alguma informação interessante que alguém obteve por meio dessa lei.

Palocci ajudou a destravar a tramitação da Lei de Acesso sobretudo porque enxergou ali algum benefício para si próprio e para o governo que representava. Só isso. Simples assim.

No depoimento para Sérgio Moro, creio ter sido esse o pensamento do ex-ministro. Não queria ajudar ou prejudicar Lula ou o PT. Palocci pensou em si próprio.

Não sei se tudo o que Palocci contou a Moro é verdade. Por certo, é uma história bem contada. Tem gravitas. Não se trata de um qualquer falando. Quem prestou depoimento foi o homem de confiança de Lula e de Dilma.

As expressões escolhidas, inclusive a Über brega-kitsch “pacto de sangue”, ajudam a dar verossimilhança ao relato. E teve o dinheiro. Palocci falou que R$ 300 milhões colocados à disposição pela Odebrecht a Lula. O valor foi muito bem alegorizado por Vinicius Torres Freire (não tem Twitter, só tem Feice), dizendo que a quantia equivale a cerca de 6 aptos endinheirados de Geddel Vieira Lima.

No movimento estudantil Palocci era da Libelu, a Liberdade e Luta, uma tendência trotskista embedada no PT.

No final dos anos 1970 e início dos anos 1980, sendo 2 anos e meio mais jovem, não convivi com o então futuro ministro da Fazenda muito de perto. Todos éramos de esquerda, mas cada um no seu quadrado. Jovem, eu achava a Libelu muito “de direita“. Meus amigos do ME (“bolsa acrônimo” para quem tem menos de 40 anos: Movimento Estudantil) falavam sobre o pragmatismo radical daquele estudante de medicina e membro do DCE da USP.

Uma vez ouvi esta descrição: “A gente entrava na sala para falar de organização de greve ou fazer uma moção de apoio político a alguém e o Palocci perguntava aos alunos da sala se estava tudo bem. Se havia alguma queixa sobre as instalações da universidade. Ele já sabia o que era fisiologia naquela época”.

Em 1980 eu me considerava “esquerda séria” e vivia fazendo coisas bizarras como moções de apoio, na Bélgica, aos índios Miskitos, Sumus e Ramas, da Nicarágua. Hoje estou curado. Naquela época, considerava um horror militantes do ME que se importavam mais com a qualidade das carteiras nas salas de aula do que com o regime sandinista equivocado e opressor dos autóctones nicaraguenses. Só que com seu pensamento utilitário, reconheço, Palocci conseguiu ir bem longe –não sei se chegou aonde queria, mas foi longe.

Ao contar tudo o que diz saber de Lula e de Dilma, mas com o cuidado de ir enfiando no meio frases do tipo “achei exagerado”, Palocci tenta encontrar o buraco da agulha para passar e sair livre da atual encrenca em que se meteu. Laborioso e preocupado com si próprio, passou de fase. Decidiu ficar “PT free” ou “Lula free“.

Há outro aspecto relevante a ser considerado. Depois de uma inflexão na direção do PMDB e do PSDB, a Lava Jato sofreu um revés com a revelação das cafajestices de Joesley Batista, uma espécie de Jece Valadão das delações premiadas. Há um vento agora soprando a favor de a “República de Curitiba” retomar sua trajetória anti-PT. Palocci sabe fazer análise de conjuntura. Percebeu que soltando algo sobre Lula e Dilma poderia recobrar parte do prestígio perdido na cadeia depois várias tentativas frustradas de engabelar os investigadores com relatos sem nexo.

A pergunta que fica é se Sérgio Moro acreditará na narrativa ladina e de ocasião do ex-ministro ou se vai exigir provas mais vigorosas.

De qualquer forma, uma coisa é certa: Palocci tomou um caminho sem volta. Abandonou o PT, Lula e Dilma. Se vai conseguir sair mais cedo da cadeia só saberemos mais adiante –ainda mais agora que começou a ruir a mãe de todas as delações, a história mirabolante contada por Joesley Batista (o surrealista pagamento de propina para 1.800 políticos).

Minha impressão é que procuradores, juízes e delegados certamente preferirão pensar várias vezes antes de conceder alguma indulgência em troca apenas da 1ª versão ben trovata de um condenado finório e astuto como Palocci. O ex-ministro tem muito mais a falar e a contar. Bancos, empresas de mídia encrencadas, outras empreiteiras, JBS-Friboi. Nada disso ainda emergiu da boca do ex-militante da Libelu.

PACTO DE SANGUE ENTRE EMILIO ODEBRECHT E LULA (Ex-ministro prestou depoimento à Lava Jato nesta 4ª)

O ex-ministro Antonio Palocci afirmou nesta 4ª feira (6.set.2017) ao juiz Sérgio Moro haver 1 “pacto de sangue” do PT com a Odebrecht. Segundo ele, acordo previa pagamento de R$ 300 milhões ao partido pela empreiteira.

De acordo com o político, R$ 4 milhões foram entregues em espécie ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Palocci prestou depoimento ao juiz Sérgio Moro, em Curitiba, na Lava Jato.

A ex-presidente Dilma Rousseff foi citada pelo depoente. Segundo ele, a petista estava em reunião com Lula e o empreiteiro Emílio Odebrecht em foi discutido o pagamento de R$ 300 milhões ao PT.

A conversa, diz Palocci, foi em 30 de dezembro de 2010. A forma como o dinheiro seria repassado, na versão do ex-ministro, era dúvida. O impasse teria sido resolvido e o valor, confirmado.

SEDE DO INSTITUTO LULA

O ex-ministro afirma que o ex-presidente sabia da compra de 1 imóvel pela empreiteira Odebrecht para o Instituto Lula. Palocci teria tido uma conversa com Marisa Letícia, mulher de Lula, morta em fevereiro, sobre o assunto.

O ex-presidente considerava a operação inadequada e queria que Palocci convencesse Marisa disso, segundo o depoimento.

Lula foi denunciado no caso em 14 de dezembro de 2016. Conforme o MPF (Ministério Público Federal), a Odebrecht teria tentado pagar propina ao petista por meio da compra de imóvel, destinado ao “Memorial da Democracia”, ligado ao Instituto Lula. A compra nunca se concretizou. Leia a íntegra da denúncia e a defesa de Lula.

Segundo a força-tarefa, a empreiteira seria beneficiada no caso em contratos com a Petrobras.

OUTRO LADO

O Instituto Lula divulgou nota negando as acusações de depoimento de Palocci:

“A história que Antonio Palocci conta é contraditória com outros depoimentos de testemunhas, réus, delatores da Odebrecht e provas e que só se compreende dentro da situação de um homem preso e condenado em outros processos pelo juiz Sérgio Moro que busca negociar com o Ministério Público e o próprio juiz Moro um acordo de delação premiada que exige que se justifique acusações falsas e sem provas contra o ex-presidente Lula. Palocci repete o papel de réu que não só desiste de se defender como, sem o compromisso de dizer a verdade, valida as acusações do Ministério Público para obter redução de pena e que no processo do tríplex foi de Léo Pinheiro. A acusação do Ministério Público fala que o terreno teria sido comprado com recursos desviados de contratos da Petrobrás, e só por envolver Petrobrás o caso é julgado no Paraná por Sérgio Moro. Não há nada no processo ou no depoimento de Palocci que confirme isso. Sobre a tal “planilha”, mesmo Palocci diz que era um controle interno do Marcelo Odebrecht e que “acha” que se refere a ele. Ou seja, nem Palocci conhecia a tal planilha, quanto mais Lula.

Palocci falou de uma série de reuniões onde não estava e de outras onde não haveriam testemunhas de suas conversas. Todas falas sem provas.

Marcelo por sua vez diz ter pedido que seu pai contasse para Lula e Emílio negou ter contado isso para Lula.

O réu Glauco da Costa Marques reafirmou em depoimento ser o proprietário do imóvel vizinho ao da residência do ex-presidente e ter contrato de aluguel com a família do ex-presidente, e que está recebendo o aluguel. Uma relação de locador e locatário não se confunde com propriedade oculta.

Processos fora da devida jurisdição com juiz de notória parcialidade, sentenças que não apontam nem ato de corrupção nem benefício recebido, negociações secretas de delação com réus presos que mudam versões de depoimento em busca de acordos com o juízo explicitam cada vez mais que os processos contra o ex-presidente Lula na Operação Lava Jato em Curitiba não obedecem o devido processo legal.

O Instituto Lula reafirma que jamais solicitou ou recebeu qualquer terreno da empresa Odebrecht e jamais teve qualquer outra sede que não o sobrado onde funciona no bairro do Ipiranga em residência adquirida em 1991.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva reafirma que jamais cometeu qualquer ilícito nem antes, nem durante, nem depois de exercer dois mandatos de presidente da República eleito pela população brasileira.

Assessoria de Imprensa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.”

Dez pontos do depoimento de Palocci que atingem Lula (na VEJA)

Ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil disse a Sergio Moro que o petista tinha 'pacto de sangue' com a Odebrecht, que envolveu 'pacote de propinas'

Preso na Operação Lava Jato desde setembro de 2016, o ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil Antonio Palocci falou como réu ao juiz federal Sergio Moro nesta quarta-feira, no processo que tem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como acusado de receber 13 milhões de reais em propina da Odebrecht por meio de um apartamento em São Bernardo do Campo (SP) e um imóvel que serviria como sede ao Instituto Lula.

Em cerca de duas horas diante de Moro, Palocci, que negocia um acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal, incriminou Lula e afirmou o petista tinha um “pacto de sangue” com a empreiteira, que teria lhe rendido um “pacote de propinas”.

Veja abaixo dez pontos do depoimento do ex-ministro que atingem o ex-presidente:

‘Relação movida a propina’

Ao responder a primeira pergunta formulada pelo juiz federal Sergio Moro, Antonio Palocci reconheceu ao magistrado que a denúncia do Ministério Público Federal “procede”, disse ter participado das tratativas de vantagens indevidas nos governos dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff e afirmou que a relação entre os governos petistas e a empreiteira era “bastante intensa, movida a vantagens dirigidas à empresa e propinas pagas pela Odebrecht para agentes públicos em forma de doação de campanha, em forma de benefícios pessoais, em forma de caixa um e caixa dois”.

‘Pacto de sangue’

Palocci classificou como “pacto de sangue” o acordo entre o empresário Emílio Odebrecht e Lula, que teria envolvido um “pacote de propinas” ao petista. O acerto teria sido firmado em 2010, no final do mandato do ex-presidente no Palácio do Planalto, em função da “tensão” da Odebrecht com a posse de Dilma Rousseff. A presidente eleita já se posicionara contra interesses da empresa na construção de hidrelétricas no Rio Madeira. O ex-ministro disse ter ficado “chocado” com a oferta do empresário ao ex-presidente, relatada a ele pelo próprio Lula em uma conversa no Palácio da Alvorada.

R$ 300 milhões à disposição

No encontro na residência oficial da presidência da República em Brasília, segundo Palocci, o Lula disse a ele que Emílio Odebrecht lhe prometera, como um dos itens do “pacote”, deixar à sua disposição 300 milhões de reais para “atividades políticas” nos anos seguintes ao fim do mandato presidencial. O ex-ministro disse ter sido encarregado pelo petista de tratar sobre os recursos com Marcelo Odebrecht, que propôs a criação de uma planilha para manejo do dinheiro. Em uma das primeiras conversas com o empreiteiro, no entanto, Marcelo alegou engano de seu pai e reduziu o valor a 150 milhões de reais. O compromisso voltou a ser de 300 milhões de reais depois de reunião entre Emílio Odebrecht, Lula e Dilma. “O presidente Lula me chama de novo e fala: ‘olha, o Emílio veio, tivemos uma ótima reunião, ele confirmou os 300 milhões e falou que pode ser mais se necessário”, disse Palocci a Moro.

Obra do sítio concluída

Como parte do “pacote de propinas” da Odebrecht a Lula, citado por Antonio Palocci a Sergio Moro, o empresário Emílio Odebrecht teria se comprometido a participar das obras do sítio Santa Bárbara, em Atibaia (SP), usado pela família do ex-presidente. “O seu Emílio apresentou ao presidente o sítio para uso da família, que já estava fazendo a reforma, fase final. Ele disse que o sítio já estava pronto”, relatou o ex-ministro.

Lula é réu em uma ação penal na Justiça Federal do Paraná, sob responsabilidade do juiz Sergio Moro, que apura a posse da propriedade rural no interior paulista. Segundo a denúncia da força-tarefa da Lava Jato, as empreiteiras Odebrecht e OAS e o pecuarista José Carlos Bumlai executaram as obras no sítio.

Veja também: Lula estimulou petrolão após descoberta do pré-sal, diz Palocci

Palestras por R$ 200.000

O “pacote de propinas” prometido por Emílio Odebrecht a Lula também envolvia, segundo Antonio Palocci, “várias palestras” do ex-presidente, “pagas a 200.000 reais, fora impostos, combinadas com a Odebrecht para o próximo ano”. Uma das ações penais que têm Lula entre os réus, baseada na Operação Janus, apura pagamentos milionários pela empreiteira ao petista em palestras, além de supostos benefícios à Odebrecht em financiamentos do BNDES a obras na América Latina e na África.

Uma sede para o Instituto Lula

Antonio Palocci declarou a Sergio Moro ter sido contrário à compra, pela Odebrecht, de um prédio que serviria como sede do Instituto Lula, outro item do “pacote de propinas” oferecido pela Odebrecht ao ex-presidente. Apesar de sua posição, diz Palocci, a aquisição teria sido encaminhada pelo pecuarista José Carlos Bumlai e o advogado Roberto Teixeira, compadre de Lula. A DAG Construtora, empresa de Demerval Gusmão, amigo de Marcelo Odebrecht, pagou os 12,4 milhões de reais pelo imóvel, que, por fim, acabou não sendo descartado.

“Desculpa, doutor, eu não estava de santo na história não. O nosso ilícito com a Odebrecht já estava muito grande naquele momento, eu achei que essa compra não precisava ser um ilícito, não precisava ser um ilícito travestido de lícito”, disse o ex-ministro a Moro.

Reunião com Marisa Letícia

A desistência do imóvel teria sido concretizada após o aval da ex-primeira-dama Maria Letícia Lula da Silva, falecida em fevereiro deste ano. Convencido por Antonio Palocci de que o imóvel poderia render problemas e era um “convite a uma investigação”, Lula teria delegado ao ex-ministro a tarefa de persuadir sua mulher de que o prédio era “inadequado”. “’Vá lá e me ajude a convencer a dona Marisa de que esse prédio é inadequado, a compra desse prédio foi inadequada. Porque se eu fizer isso ela vai ficar brava comigo, porque ela fala que eu não cuido disso. Se você fizer ela vai entender melhor porque ela gosta de você, ela te entende’”, apelou o petista, segundo Palocci.

R$ 4 milhões ao Instituto Lula

Ainda sobre o Instituto Lula, Antonio Palocci relatou ao juiz da Lava Jato ter intercedido junto a Marcelo Odebrecht para cobrir um “buraco” de 4 milhões de reais nas contas da instituição. Paulo Okamotto, presidente do instituto, teria pedido ao ex-ministro a articulação. “O Paulo Okamotto me pediu para que eu ajudasse ele a cobrir o final de ano do instituto, que faltava recurso. Acho que meio para o final de 2013, começo de 2014. Ele tinha um buraco nas contas, me pediu para arrumar recursos. Eu fui ao Marcelo Odebrecht (…) o Marcelo concordou em dar, falou que tinha disponibilidade. Pedi ao Brani [assessor de Palocci] para transmitir ao Paulo Okamotto que seriam dados os 4 milhões que ele havia pedido”.

Pré-sal reforça petrolão

Antonio Palocci relatou a Moro que em 2007, antes da descoberta das reservas de petróleo e após a reeleição de Lula, o petista havia manifestado preocupação com a corrupção na Petrobras, especialmente irregularidades nas diretorias de Serviços e de Abastecimento, feudos de PT e PP na estatal. “Mas logo após veio o pré-sal e pôs o governo em uma atitude muito frenética em relação à Petrobras. Esses assuntos de ilícitos e de diretores ficaram em terceiro plano, as coisas continuaram correndo do jeito que era”, contou o ex-ministro. De acordo com Palocci, os investimentos atraídos pela descoberta de petróleo não só frearam a intenção do ex-presidente em agir contra o petrolão, como levaram o petista a incentivar o esquema: “ele até chegou a encomendar que os diretores a partir daí fizessem mais reservas partidárias”.

Obstrução de Justiça

Por duas vezes em seu depoimento, o ex-ministro falou ao magistrado sobre sua atuação para atrapalhar as investigações da Operação Lava Jato. Em uma delas, já no final da oitiva, citou Lula como um de seus companheiros na empreitada. “Em algumas oportunidades, eu me reuni com o ex-presidente Lula e com outras pessoas no sentido de buscar criar obstáculos à Lava Jato”, introduziu Palocci. Ele afirmou ao juiz federal que poderia falar mais sobre o assunto, mas Moro entendeu que não era apropriado tratar dele neste processo, que apura corrupção e lavagem de dinheiro.

Palocci injeta autofagia na deterioração de Lula (JOSIAS DE SOUZA, UOL)

Os deuses do acaso foram caprichosos com Lula. No dia do encerramento da caravana nordestina do pajé do PT, Antonio Palocci prestou depoimento a Sergio Moro, em Curitiba. Lula gastou os últimos 20 dias fazendo pose de “guerreiro do povo brasileiro”. Em duas horas de depoimento, Palocci demoliu a fantasia. Acusou o líder máximo do petismo de guerrear pelos interesses da Odebrecht. Num “pacto de sangue” com a construtora, Lula amealhou propinas para bancar suas campanhas eleitorais e os seus confortos, dedurou o amigo.

Ao quebrar o silêncio, Palocci acrescentou uma novidade no processo de apodrecimento da reputação de Lula. Pela primeira vez, o ex-soberano enfrenta a autofagia companheira. Até aqui, Lula dedicou-se a desqualificar o juiz e os procuradores da Lava Jato. Se fizer o mesmo com Palocci será como xingar a própria imagem refletida no espelho. Palocci mantinha com Lula uma relação do tipo unha e cutícula.

Lula talvez não tenha se dado conta. Mas empurrou o companheiro para o colo dos investigadores. Num dos processos que responde na Lava Jato, Palocci é acusado de coletar verbas sujas em nome de Lula. Na contabilidade do Departamento de Propinas da Odebrecht, a verba destinada a Lula era lançada na rubrica “Amigo”. O ex-presidente petista respondeu à suspeita assim:

“Quem tiver contando mentiras, quem tiver inventando historinhas, quem tiver dizendo que criou uma conta pra mim, para um terceiro… Já faz sete anos que eu deixei a Presidência. Essa conta está onde? Esse terceiro está onde? Esse cara deve estar comendo, então, o dinheiro que era pra mim, porra!”

Preso em Curitiba, Palocci ficou imprensado. De um lado, a provedora Odebrecht. Do outro, o beneficiários dos mimos, que jura não ter recebido nada. Ou Palocci abria o bico ou seria condenado como um comedor solitário e egoísta de propinas —sem atenuantes. Faltando-lhe o histórico militante de José Dirceu, Palocci sucumbiu. Foi como se mandasse uma coroa de flores para o mito petista —com uma mensagem no cartão: “Descanse em paz.”

Lava Jato: ‘Não há nenhum acordo com Palocci’

Membro da força-tarefa da Lava Jato, o procurador regional da República Carlos Fernando dos Santos Lima disse que “não há nenhum acordo de colaboração firmado com Antonio Palocci.” Em conversa com o blog, ele soou enfático: “Também não existe nenhuma promessa da nossa parte. Na verdade, eu diria que está muito longe de acontecer qualquer coisa em relação a essa matéria.”

Foi contra esse pano de fundo, sem qualquer perspectiva de ser reconhecido pelo Ministério Público Federal como um colaborador, que o ex-ministro dos governos petistas entregou Lula na bandeja em depoimento ao juiz Sergio Moro. Segundo Palocci, Lula firmou com a Odebrecht um “pacto de sangue”. Em troca da preservação dos interesses da construtora no governo de Dilma Rousseff, Lula e o PT beliscaram R$ 300 milhões em propinas.

Para Carlos Fernando, Palocci tenta atenuar sua pena num processo específico. “Ele pode, eventualmente, receber um benefício, pois a lei permite a concessão de benefícios àqueles que confessam crimes. Mas não há nada além disso. Nenhum acordo de delação foi firmado. E não há perspectiva de que isso ocorra.”

O acordo com Palocci não prosperou por falta de interesse da força-tarefa de Curitiba. “Assim como vários outros réus, o Palocci maniestou interesse'', disse o procurador Carlos Fernando. ''Mas essas negociações não avançam. Muitas vezes há dificuldade de compreensão. Não fazemois acordo quando não temos certeza de que a colaboração terá utilidade para as investigações.”

Quer dizer: por ora, Palocci não disse nada que os investigadores já não soubessem.

Dilma para Geddel: "Vem pra Caixa você também"! (por Josias de Souza, no UOL)

Michel Temer mal tivera tempo de festejar a erosão da colaboração judicial da JBS quando a Polícia Federal estourou a caverna de Ali-Baba que Geddel Vieira Lima improvisou num condomínio em Salvador. Foi a maior apreensão de dinheiro vivo já realizada na história: R$ 51.030.866,40. Repetindo: depois de passar o dia contando dinheiro, a PF informou que o ex-ministro de Temer, amigo do presidente há três décadas, entesourou num apartamento na capital baiana R$ 51 milhões.

A batida policial foi ordenada pelo juiz Valisney Oliveira, de Brasília. Deu-se no âmbito da Operação Cui Bono, que apura um assalto à Caixa Econômica Federal. Noutros tempos, quando se falava sobre bancos e assaltos, imaginava-se que a coisa acontecia de fora pra dentro. O PMDB da Câmara, grupo de Temer, desenvolveu na Caixa o assalto de dentro pra fora. No caso de Geddel, a coisa aconteceu durante o imaculado governo de Dilma Rousseff.

Sob o comando do PT, a casa bancária estatal já estava loteada politicamente. E Dilma acenou para Geddel: “Vem pra Caixa você também!” Apadrinhado por Temer, Geddel foi guindado ao posto de vice-presidente de Pessoa Jurídica da instituição. Ali permaneceu de 2011 até 2013. Saiu quando bem quis. E produziu resultados que reforçam o já sabido: a corrupção brasileira tem vocação amazônica.

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Por uma dessas trapaças do destino, a “caverna” de Geddel foi estourada no mesmo dia em que a Procuradoria-Geral da República denunciou Lula, Dilma e outros seis grão-petistas por formar uma organização criminosa. O grupo é acusado de roubar durante a Era petista R$ 1,485 bilhão em verbas públicas.

No caso de Geddel, a PF desbaratou uma inusitada e sigilosa forma de fazer poupança: dinheiro vivo depositado em caixas de papelão e malas, espalhadas por um apartamento sem mobília. Ironia suprema: escondeu-se num endereço residencial uma fortuna presumivelmente desviada de uma instituição financeira estatal que convida brasileiros pobres a abrir contas de caderneta de poupança nas suas agências: “Vem pra Caixa você também!” Geddel foi.

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Só prisão de delatores salva novo script da JBS

Num instante em que Rodrigo Janot providenciava para si mesmo um script Classe A, no qual fazia o papel de um arqueiro destemido, surgiu um áudio tóxico. Nele, os delatores da JBS injetam em cena um outro script, Classe B. Em vez do épico idealizado por Janot, um policial barato. É protagonizado por Joesley e seu escudeiro providencial: Ricardo Saud, um Sancho Pança de algibeiras cheias.

Ouvindo-se a fita, dá para imaginar a dupla, pés sobre a mesa, calculando o quanto da rapina a JBS conseguiria salvar. É como se a dupla gargalhasse da República apodrecida e do procurador-geral, que lhes proporcionaria a completa imunidade penal. Dispunham da luxuosa assessoria de Marcelo Miller, um amigo de Janot, procurador da Lava Jato. Que virou a casaca.

“Nós somos a joia da coroa deles”, disse o delator Joesley, na conversa em que celebrou sua capacidade de antecipar os passos de Janot. “Temos que ser a tampa do caixão”, ele acrescentou, antevendo a mercadoria que teria de entregar para merecer o prêmio máximo. “Não vamos ser presos”, previu Joesley. “E vamos salvar a empresa.”

No script Classe A, Janot era um temido arqueiro. No Script Classe B, os delatores o converteram num procurador manipulado. Só há uma maneira de salvar esse filme: aproveitar todas as provas e enviar os delatores para a cadeia.

REFLEXÕES FILOSÓFICAS ACERCA DO FURACÃO IRMA (E DO FURACÃO DILMA) - POR RODRIGO CONSTANTINO

 

Como o leitor bem informado deve saber, a Flórida toda está sob alerta máximo por conta do furacão Irma, o mais forte já registrado no Atlântico, com ventos de quase 200 milhas por hora. Por conta disso, o blog deve ter bem menos atividade nos próximos dias. Por sorte, coincide com o feriado do 7 de setembro no Brasil. Sabemos que não há muitos motivos para celebrar nossa “independência”, mas feriado é sempre feriado, não é mesmo?

Esse texto é mais genérico e longo, apenas com algumas reflexões acerca do furacão. Esse tipo de situação de risco iminente de calamidade expõe o que há de pior e também de melhor nos seres humanos. É, para mim, a prova de que somos um misto de besta selvagem e cavalheiro civilizado, estamos entre o monstro e o santo, “nature & nurture”, como dizem os ingleses. Diante do medo, do pânico, podemos agir como macacos desesperados, mas também como heróis altruístas.

O que faz a diferença? Haverá sempre o livre-arbítrio individual, claro, mas a cultura disseminada na sociedade faz toda diferença. Como as instituições, que ao longo do tempo ajudam a moldar (para o bem e para o mal) esta cultura. O que vimos no Texas depois do Harvey foi tocante: inúmeras pessoas se arriscando para ajudar desconhecidos. Ao mesmo tempo, há muitas vezes pilhagem nessas ocasiões em que as leis ficam suspensas por algum período.

É a segunda experiência que tenho com um risco de furacão forte. Ano passado, o Mathew assustou, mas não foi esse terror todo. As autoridades preferem sempre pecar por excesso de alarmismo, com razão. Melhor se previnir do que remediar o caos depois. Ao menos assim pensam os povos mais avançados, que não deixam tudo para a última hora, não “deixam a vida levar”, achando o máximo à espontaneidade.

Isso chama a atenção por aqui. Dias antes do potencial furacão destruidor, todos formam filas para comprar água, abastecer seus carros, comprar mantimentos básicos para se previnir. Quem já foi mordido por cobra tem medo até de linguiça. “Prepare-se para o pior, espere o melhor, e receba o que vier”, diz um ditado chinês. A turma aqui parece levar a sério a sugestão.

Fui colocar gasolina no carro ontem às 11h da noite. Fila gigantesca. Todos souberam que naquele posto tinha chegado combustível. O preço subiu quase 20%, de $2,40 o galão para $2,80 (morram de inveja, meus caros, pois isso ainda é quase a metade do preço por litro no Brasil). Mas eis o interessante: não havia um “malandro” furando a fila (e não era difícil fazê-lo). Seguíamos numa fila indiana, carro a carro, cada um enchendo o tanque e dando a vaga ao próximo. Civilização.

Claro que nem sempre esse verniz de civilização resiste. Essas cenas, que parecem do aniversário do supermercado Guanabara (cariocas entenderão, os demais podem fazer uma busca no Google), mostram certo desespero para conseguir seu quinhão de água, como se fosse a última chance no deserto do Saara... 

Parece até a Venezuela. Ou seja, o socialismo é um desastre mesmo, só que causado por homens, não pela natureza. No capitalismo há abundância. Só um risco de furacão para fazer com que as prateleiras fiquem vazias. E mesmo assim será por pouco tempo. O furacão Irma é ameaçador e tem potencial grande de destruição, mas ainda assim não se compara com o furacão Dilma, que devastou nosso país.

A tentação será repetir, como fazem muitos, que o problema é o brasileiro. Mas nosso fracasso vem justamente dessa combinação entre instituições e cultura. Ambas são muito fracas em nosso país. Não há nada inato no povo brasileiro que o condene à mediocridade eterna.

Afinal, há milhares de brasileiros aqui na Flórida, e estão agindo como os demais, via de regra. Em Weston mesmo temos uma comunidade interligada onde um ajuda o outro, numa “corrente do bem” que é motivo de muita esperança: nós temos salvação!

Outra digressão produzida pela iminente chegada de Irma é o abismo que separa um país de primeiro mundo de outro de terceiro. O que mata mesmo não é tanto o desastre natural, mas o social. Nos Estados Unidos temos a melhor infraestrutura, tecnologia, organização para as rotas de fuga, população disciplinada para evacuar as áreas de maior risco. Por isso as perdas em vidas são menores.

Em países mais pobres, como alguns do Caribe, a destruição é bem maior pela falta dessas condições. Ou seja, deveríamos nos preocupar menos com o “aquecimento global” e mais com o socialismo ou os estados fracassados: são eles que destroem e matam muito mais.

Até porque há muita controvérsia se esses furacões têm mesmo alguma ligação com as tais “mudanças climáticas”. Vários cientistas negam esse elo, e os piores furacões ou inundações ocorreram no passado. Qualquer desastre natural hoje é visto como resultado certo do aquecimento global e, portanto, do capitalismo. O furacão Katrina, que devastou New Orleans, foi um exemplo claro disso, como o Harvey agora no Texas. Como será que essa gente iria reagir aos desastres do passado, quando ninguém falava ainda em aquecimento global (na verdade se falava em esfriamento global)?

Em termos de força, o pior furacão se deu em 1935, seguido pelo Camille, em 1969. O Andrew, de 1992, vem depois, mas logo em seguida temos um em 1919 e outro em 1928. As enchentes chinesas matam milhares de pessoas desde o século XIX. Seria culpa do “aquecimento global” também? A histeria parece ter tomado conta de todos atualmente, levando a concluir que qualquer catástrofe natural tem a mão do homem, através das indústrias. Furacões, inclusive mais intensos, sempre nos acompanharam, mas eis que agora o homem é seu causador!

Menos arrogância, menos ideologia, mais razão e mais ciência, por favor. E por falar no Andrew, fecho com uma reflexão filosófica sobre o sublime. Meu melhor amigo morava em Miami nessa época. Conversei com ele ontem para saber de sua experiência. Não havia “shutters” protegendo as janelas ainda, o que veio depois dele. Meu amigo, então, encarou o bicho de frente. E eis como descreveu sua experiência: de certa forma, foi até interessante, após o medo inicial, ver aquele espetáculo da natureza, algo meio… sublime!

Pode parecer paradoxal, mas existe isso sim. O primeiro livro de Edmund Burke foi justamente sobre isso: Investigação Filosófica Sobra a Origem de Nossas Ideias do Sublime e da Beleza. Nele, Burke explica o motivo de nosso fascínio pelo poder da natureza:

O que quer que de alguma forma seja capaz de excitar as ideias de dor e de perigo, ou seja, tudo o que for terrível de alguma forma, ou que compreenda objetos terríveis, ou opere de forma análoga ao horror é fonte do sublime; ou seja, é capaz de produzir a emoção mais forte que a mente é capaz de sentir. Digo que é a emoção mais forte, porque acredito que as ideias de dor são muito mais poderosas do que as que são introduzidas pelo prazer.

Escrevi uma resenha do livro tomando como base o filme “Manchester à Beira-Mar”. E eis como a terminei, citando uma vez mais Burke:

A paixão causada pelo grandioso e sublime na natureza, quando estas causas operam em suas formas mais poderosas, é o Assombro; e o assombro é aquele estado da alma em que todos os seus movimentos estão suspensos com algum grau de horror. Neste caso, a mente está tão inteiramente preenchida por seu objeto, que ela não consegue entreter qualquer outro nem, por consequência, raciocinar sobre o objeto que a ocupa. Daí surge o grande poder do sublime, que longe de ser produzido por nossos raciocínios, ocorre antes deles e passa por nós com uma força irresistível. O assombro, como eu disse, é o efeito do sublime em seu mais alto grau; seus efeitos menores são a admiração, a reverência e o respeito.

O subilme está acima da razão. Por isso demanda apenas reverência, respeito, humildade. Lembra como somos pequenos diante do Todo, da natureza, de Deus. As contingências do destino não podem ser controladas nem racionalizadas. Daí vem essa sensação de impotência, de choque, e também de respeito.

Mas, como ainda existe aquilo que podemos controlar, que é para mitigar os riscos, e como estou com a mulher grávida de quase 9 meses, confesso que não quero experimentar o sublime dessa vez: é hora de correr atrás dos últimos preparativos para enfrentar Irma. Tudo pode acontecer, inclusive ser mais um alarme falso, com o furacão mudando a rota, ou se enfraquecendo. Tomara! Até os agnósticos nessas horas podem rezar, não?

Rodrigo Constantino

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