Joesley, o herói marginal da PGR e do Supremo. Tribunal deve confirmar: “O crime compensa”
Tudo ficará como antes em relação à delação de Joesley Batista, e ele já pode ser considerado o criminoso mais rico e mais bem-sucedido do Brasil. Ele e sua intrépida trupe. Mais: a partir deste julgamento, e até que não se mude a lei de delação premiada, a 12.850, o país passa a ser regido por duas Constituições — ou por uma Constituição e um AI-5 contemporâneo. Há aquela aprovada pela Constituinte de 1988, e há o acordo que um bandido celebra com o Ministério Público Federal, sob os auspícios de um juiz. Se o que sair dessa negociação se transforma em algo intocável, então há um soberano no país: o bandido-delator. E seus braços operadores são um procurador e o ministro do STF ao qual couber a relatoria de um caso.
Vamos pensar um pouco.
Que os ministros do Supremo Tribunal Federal manteriam, e vão manter, Edson Fachin como o relator da homologação, bem, isso eu já havia antecipado aqui. Quando menos não fosse, sê-lo-ia (diria o presidente Temer) por espírito de corpo. Sim, houve a violação do princípio do juiz natural, garantido por três Incisos do Artigo 5º. Ao procurador-geral da República, não cabe escolher o juiz, como não é tarefa de defensores. Mas se passará por cima disso. Também já evidenciei que essa ilegalidade original veio acompanhada de outras tantas. A mais evidente, escancarada, foi a admissão em juízo de uma prova ilícita — no caso, a gravação feita por Joesley da conversa mantida com Michel Temer. Nesse caso, viola-se o Inciso LVI do mesmo Artigo 5º. Estamos falando daquela parte importante da Constituição que garante os direitos fundamentais.
Fachin defendeu com unhas, dentes e argumentos falaciosos a intocabilidade da delação. Alexandre de Moraes concordou com ele em linhas gerais, mas, em algum momento, parece haver uma brecha em que o ministro reconhece a necessidade do pleno. Celso de Mello vai votar com o relator. É o que sugere sua intervenção. Marco Aurélio e Luiz Fux não se mostravam entusiastas da soberania do bandido premiado, mas apartes feitos aqui e ali sugerem que vão fechar com o relator.
Coube ao ministro Gilmar Mendes, como de hábito, lembrar que os Poderes e as instituições têm seus respectivos papeis, definidos, aliás, na mesma Carta Magna. Há ainda uma terceira violação: como a delação de Joesley tem como alvo principal o presidente da República, homologá-la corresponde a investigar o chefe do Executivo. Pode? Pode! Mas, nesse caso, a decisão cabe ao pleno, não à turma ou ao monocrata. Logo, parece evidente que, quando menos, os 11 ministros precisam enfossar os termos da delação, reformando-os se necessário.
Falácia
Fachin investiu em vários aspectos incrivelmente falaciosos. Disse, por exemplo, que a homologação é uma análise meramente formal de um acerto feito entre um criminoso confesso e o Ministério Público. É mesmo? E quando essa homologação traz até a dosagem de uma pena informal, como aconteceu no caso da Odebrecht, cujo acordo foi homologado por Carmen Lúcia? A argumentação atinge o estado da arte da falácia neste ponto: segundo o ministro, ao relator cabe a homologação e, ao plenário, julgar a eficácia do dito-cujo, mas só ao fim do processo, quando se entrar no mérito das ações oriundas da delação.
Parece que está a dizer a dizer uma obviedade, mas não está. Até porque o falso não tem como ser óbvio a não ser como expressão da mentira. Fiquemos em Joesley: aqueles que ele delatou, todos peixes muito menores do que ele (e eis aí uma invenção brasileira: a delação para baixo), serão um dia julgados, mas ele próprio não será. Ao contrário: estará pronto para, se quiser, delinquir mais uma vez e fazer outro acordo de delação.
Leia a íntegra no blog de Reinaldo Azevedo no site da RedeTV.
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