Mas, afinal, Cunha fará ou não fará delação premiada? (REINALDO AZEVEDO)
Eis a questão que não quer calar e, que consta, deixa boa parte do mundo político em polvorosa: Eduardo Cunha, o antes todo-poderoso presidente da Câmara e hoje um presidiário sob a guarda de Sérgio Moro, fará ou não fará delação premiada?
Eis um mistério e tanto, não é mesmo?
Eu fico aqui me perguntando qual delação seria o bastante para o tamanho do gigante. Mais: fico aqui refletindo se alguém que chegou ao atual estágio do enfrentamento com seus acusadores merece o benefício de uma delação.
Há, como se sabe, uma disputa surda de estratégias e pontos de vista entre os procuradores da Lava-Jato e os delegados da Polícia Federal. Estes acham que é chegada a hora de pôr fim às delações premiadas. E não para frear a investigação, mas para não desmoralizá-la.
“Ah, mas eu quero saber o que Cunha sabe”, poderá dizer alguém. Bem, quem não quer? A questão é saber se seria moralmente aceitável conceder-lhe tal benefício, agora que ele detém um quadro bem mais completo da narrativa do que outros.
Ora, por óbvio, hoje é mais fácil selecionar alvos do que jamais. Em boa parte a história da lava-Jato já está contada. Será que se deve conceder a Cunha a licença de reescrevê-la e de lhe mudar detalhes depois de tanto tempo?
Isso aponta, me parece, para a necessidade de disciplinar as delações. E se Cunha decidir, sei lá, jogar no lixo, com suas eventuais revelações, boa parte do trabalho feito até aqui? Os primeiros delatores tinham menos condições de escolher o caminho do que ele tem agora, embora pareça o contrário.
Para quem passou por aquilo que ele passou, haja temperamento cristão para não pensar um pouquinho em vingança. E, como se sabe, chance de se redimir não lhe faltou.
Delações, creio, têm de ser como repatriação: “Quem tiver algo de relevante a dizer nesse caso, apresente-se até tal dia. Depois disso, cada um arca com o peso de suas escolhas”.
Venham cá: ficaria bem um Cunha com uma cana leve, já que, nesse caso, teria colaborado, e um deputadozinho qualquer acusado por ele arrastando uma pena severa? Não creio.
Ou, na hipótese que leva os petistas ao delírio, ele pegaria uma pena bem leve, quase nada, enquanto o país estaria mergulhado no caos. Não parece que seria esse um bom desfecho.
As perplexidades do Congresso e os medos
Oposição diz que governo Temer pode ser alvo de uma eventual delação do ex-parlamentar
O mundo político em Brasília ficou perplexo, claro!, com a prisão de Eduardo Cunha. Em primeiro lugar, porque ela era dada como certa, só não se se sabia a hora. Em segundo, porque aconteceu.
Fiquemos no primeiro aspecto. Como Sergio Moro havia dado, 48 horas antes, 10 dias para Cunha apresentar sua defesa prévia justamente nesse processo que o levou à cadeia, não se esperava que tal decisão fosse tomada nesse intervalo. Moro, no entanto, não tem compromisso com a ortodoxia.
E, e é evidente, começou o ciclo de especulações sobre a possível delação premiada do ex-deputado. O procedimento não foi descartado por Paulinho da Força (SD-SP), seu fiel escudeiro. Voltarei a esse assunto em outro post.
O governo e os governistas preferiram não comentar o episódio — no que, convenham, fizeram muito bem. Comentar o quê? Qualquer fala meio impensada vira um tsunami de problemas.
Quem saiu gazeteando pelos corredores e salões do Congresso que o governo Temer passou a ter uma corda no pescoço foram os oposicionistas, muito especialmente os petistas.
Essa gente é, a seu modo, curiosa. Antonio Palocci está preso sob a acusação, entre outras, de criar facilidades para a Odebrecht, e os companheiros não veem um Lula enrascado!?!?!? Mas anteveem a queda do governo com a prisão de Cunha e sua eventual delação premiada. É mesmo?
Pode ser que a realidade se complique para Temer? Até pode. Vamos ver. Uma coisa, no entanto, é certa: o então vice não tinha, como é sabido, instrumentos para aquinhoar este ou aquele. Que se tenha notícia, ninguém procurou envolvê-lo pessoalmente com safadezas. Se houver um ponto fraco, será o PMDB. Isso à parte, não existe razão para antever que o governo Temer cairá se Cunha botar a boca no trombone.
Com tudo o que se sabe e tudo o que vazou sobre a Lava-Jato até agora, o presidente, ele mesmo, não saiu arranhado. Mas, de fato, há o risco de que não se possa falar o mesmo sobre seus ministros. E se, em muitos casos, for até uma solução?
Se os auxiliares de Temer se complicarem? Bem, terão de ser trocados, essa é a regra. Por enquanto, o que se vê é muito foguetório. Acrescento: ainda que se queira ligar Cunha a Temer, o fato é que aquele nunca foi tão próximo deste como Palocci foi de Lula.
Talvez o senador Lindbergfh Farias devesse comemorar a coisa com mais parcimônia e voltar as suas energias para o seu próprio partido. Até porque, vamos convir, uma eventual queda do governo Temer não teria o condão de levar o PT de volta ao poder.
As eleições deste 2016 evidenciaram o peso que tem a legenda. Está na lona.
Nas razões apontadas para prender Cunha, há o que faz e o que não faz sentido (por REINALDO AZEVEDO)
Eduardo Cunha pode ser acusado de tudo, menos de burro. Se há coisa sobre a qual ele não tinha a menor dúvida — e a mala de ceroula certamente já estava pronta — é a de que seria preso tão logo caísse no colo de Sérgio Moro. O juiz fez com ele um desnecessário, como a qualquer um resta evidente, jogo de gato e rato. Faz 48 horas que o juiz deu a Cunha um prazo de 10 dias para apresentar a sua defesa prévia justamente no caso que agora o leva à prisão: o recebimento, segundo a acusação, de uma propina de US$ 1,5 milhão em contrato de exploração de petróleo pela Petrobras num campo em Benin, na África. A mala das ceroulas estava pronta desde que foi cassado. Mas é certo que, na segunda, o ex-deputado deve ter pensado que não teria de abri-la com tanta celeridade.
Do ponto de vista legal, Moro não precisaria ter esperado expirar o prazo dos dez dias para decretar a prisão preventiva, é claro! Mas não é menos claro que as duas decisões, tomadas quase ao mesmo tempo, caracterizam um comportamento, digamos, heterodoxo. Curitiba continua imbuída da tarefa de deixar claro que novas regras do direito estão sendo aplicadas no país. Elas derivam de uma certa tradição oral, chave à qual pertence o alarido.
A defesa do deputado tem razão ao apontar que não há um só fato novo que justifique a prisão, além daqueles já apontados pelo Ministério Público Federal ao STF há coisa de quatro meses. E que não chegaram a ser apreciados por Teori Zavascki porque, antes disso, o então deputado foi cassado e perdeu o foro especial por prerrogativa de função. Foi parar na Vara de Sérgio Moro e, dali, saltou para a cadeia, onde deve permanecer por um tempo. É pouco provável que o Tribunal de Justiça o tire de lá. Por muito menos, outros tiveram referendada a preventiva.
E quais foram as alegações do Ministério Público apresentadas ao juiz Sérgio Moro, de pronto acatadas pelo juiz, para justificar a prisão preventiva? Vamos ver. Há o que faz sentido e o que é, como se diz por aí, “forçação de barra”. É bom notar que Moro acatou todas elas. Como sabemos, não costuma haver divergências entre o juiz e o MP.
Os procuradores alegam que parte do dinheiro que Cunha mantém no exterior ainda não foi localizada, o que aponta para o risco de dissipação dos recursos. A possibilidade existe? Existe? Os indícios, nesse caso, estão contra Cunha? Estão. Isso se encaixa num dos motivos previstos no Artigo 312 do Código de Processo Penal para a decretação da preventiva? A resposta, entendo, é “sim”. A possibilidade caracteriza, a meu ver, risco à instrução criminal porque, por óbvio, tal dissipação implicaria uma alteração nas provas.
O Ministério Público cita ainda 10 elementos a indicar que Cunha representa um risco à ordem pública — chance de cometer novos crimes — e, de novo, de comprometer a instrução criminal, a saber: 1) requerimentos ao Tribunal de Contas da União (TCU) e à Câmara dos Deputados sobre a empresa Mitsui para forçar o lobista Julio Camargo a lhe pagar propina; 2) requerimentos contra o grupo Schahin, cujos acionistas eram seus inimigos pessoais e do seu operador, Lucio Bolonha Funaro; 3) convocação pela CPI da Petrobras da advogada Beatriz Catta Preta, que atuou como defensora do lobista Júilio Camargo, responsável pelo depoimento que o acusou de ter recebido propina da Petrobras; 4) contratação da Kroll pela CPI da Petrobras para tentar tirar a credibilidade de colaboradores da Operação Lava Jato; 5) pedido de quebra de sigilo de parentes de Alberto Youssef, o primeiro colaborador a delatá-lo; 6) apresentação de projeto de lei que prevê que colaboradores não podem corrigir seus depoimentos; 7) demissão do servidor de informática da Câmara que forneceu provas evidenciando que os requerimentos para pressionar a empresa Mitsui foram elaborados por ele próprio, não pela então deputada “laranja” Solange Almeida; 8) manobras junto a aliados no Conselho de Ética para enterrar o processo que pedia a sua cassação; 9) ameaças relatadas pelo ex-relator do Conselho de Ética Fausto Pinato (PRB-SP) e 10) relato de oferta de propina a Pinatto.
Bem, aí já se trata de forçar a barra. Que esse conjunto de elementos seja usado contra Cunha numa sentença condenatória, aí sim. Afirmar que tais ocorrências do passado constituem, hoje, risco à instrução criminal corresponde a alargar demais o conceito. A ser assim, todo acusado deveria ser imediatamente preso. Os efeitos de cada uma dessas eventuais ações de Cunha já estão dados.
A força-tarefa também afirmou ao juiz que existe o risco de não-cumprimento da Lei Penal — em outras palavras: risco de fuga. Evidência: Cunha tem recursos no exterior e possui dupla cidadania. Também nesse caso, trata-se de forçar os limites da compreensão do que está no Artigo 312 do CPP. A dupla cidadania, por si, mesmo que associada a recursos no exterior, não implica iminência de fuga. Num caso assim, bastaria, então, recolher o passaporte.
Que fique a síntese: das razões apontadas para se decretar a prisão preventiva, só uma encontra o devido respaldo numa leitura objetiva do que vai na lei: a existência de recursos no exterior, ainda não identificados, e que poderiam se dissipar. É claro que isso interfere na chamada instrução criminal. Os demais motivos, ainda que acatadas pelo juiz, são exercício de direito criativo na área penal. Não é nenhuma novidade na Lava-Jato.
O que boa parte das pessoas não percebeu até agora — e esta é sempre a parte mais difícil de entender na democracia — é que o cometimento do crime que está sendo investigado é razão para a condenação. Para que se aplique o que se chama “prisão cautelar”, o busílis é outro. “Cautelar” é aquilo “que acautela”, que previne contra a ocorrência de algo indesejado. Ora, o crime em si não serve porque já aconteceu, está no passado. A prisão cautelar, que é o outro nome da preventiva, tem de necessariamente dizer respeito ao futuro. E tem de estar amparada em indícios concretos, não em mero juízo de valor.
Uma das razões acolhidas por Sérgio Moro faz sentido, e, pois, a prisão de Cunha é justificada. As demais são apenas exercício de heterodoxia. Podem até fazer algum mal a Cunha, mas também fazem mal ao ordenamento jurídico.
Se o segredo de aborrecer é falar tudo, então que se fale tudo.
Cunha esperava ser preso e teme rigor de Moro (JOSIAS DE SOUZA)
Em conversa com um deputado peemedebista, Eduardo Cunha disse na noite de terça-feira (18) que esperava ser preso a qualquer momento. Passou a trabalhar com a hipótese de ser detido depois que um dos processos que protagoniza chegou às mãos de Sergio Moro. Seus temores confirmaram-se nesta quarta-feira. Nas palavras do ex-mandachuva da Câmara, o juiz da Lava Jato não perderia a “oportunidade” de colocá-lo atrás das grades.
Cunha disse ao correligionário do PMDB que receia ser tratado por Moro de forma draconiana. Comparou a sua situação à do ex-vice-presidente da Câmara, André Vargas. Cassado pela Câmara depois de ter sido pilhado mantendo relações monetárias com o doleiro Alberto Youssef, o ex-petista Vargas também migrou do foro privilegiado do STF para a primeira instância do Judiciário.
Preso por ordem de Moro, arrostou uma primeira condenação por corrupção e lavagem de dinheiro. Pegou 14 anos de prisão, em regime inicialmente fechado. E não saiu mais da cadeia. Cunha revela-se conformado quanto à perspectiva de ser sentenciado na Lava Jato. Avalia que sua pena será bem mais severa do que foi imposta a Vargas, superior a 20 anos.
Cunha desenvolve um raciocínio político. Acha que os procuradores da Lava Jato e Sergio Moro utilizarão o seu processo para desmontar a tese petista segundo a qual a Lava Jato persegue o PT. Durante a conversa da noite de terça-feira, o agora prisioneiro da Polícia Federal não disse palavra sobre a hipótese de tornar-se um delator.
Justiça bloqueia R$ 220 milhões de Cunha, mas encontra contas no Brasil zeradas (em O GLOBO)
Medida foi decretada em junho. Ação foi lembrada pelo MPF no pedido de prisão
Em três das quatro contas que o deputado cassado mantém no Brasil, o resultado do bloqueio foi de que Cunha não tinha saldo positivo. Na quarta, o banco já não estava mais em atividade. O bloqueio foi realizado no dia 15 de junho. A remuneração mensal bruta de um deputado federal é de R$ 33.763,00.
Em três das quatro contas que o deputado cassado mantém no Brasil, o resultado do bloqueio foi de que Cunha não tinha saldo positivo. Na quarta, o banco já não estava mais em atividade. O bloqueio foi realizado no dia 15 de junho. A remuneração mensal bruta de um deputado federal é de R$ 33.763,00.
O processo acusa Cunha de ter atuado para que a Petrobras adquirisse um campo de petróleo em Benin, na África. Cunha teria recebido, em francos suíços, o equivalente a R$ 5 milhões de reais em propina por essa atuação. As autoridades suíças já bloquearam as contas de Cunha no país.
“Até o presente momento, das contas de Eduardo Cunha no exterior, somente foi bloqueado, em 17/04/2015, o saldo de CHF 2.348.000,00 francos suíços (correspondente a aproximadamente USD 3 milhões)”, lembraram os procuradores do Ministério Público Federal no despacho que pediu a prisão de Cunha.
O valor de R$ 220 milhões foi pedido pelo Ministério Público em junho e dão conta da soma dos valores provenientens de enriquecimento ilícito de Eduardo Cunha e outros dois acusados, mais o valor da multa civil. O juiz Augusto Gonçalves, na ocasião, também decretou a quebra do sigilo fiscal de Eduardo Cunha.
O mesmo bloqueitorial da FOLHAo encontrou R$ 623 mil nas contas da mulher de Eduardo Cunha, Cláudia Cruz. Também não foi encontrado nenhum valor nas contas da empresa C3, de propriedade de Cunha.
O homem-bomba, editorial da FOLHA
Eduardo Cunha está atrás das grades. Acusado de corrupção, lavagem de dinheiro e envio clandestino de recursos ao exterior (evasão de divisas), o ex-presidente da Câmara dos Deputados teve sua prisão preventiva decretada pelo juiz federal Sergio Moro.
Em decisão assinada na segunda-feira (17) e executada nesta quarta (19), o magistrado de Curitiba, responsável pelos julgamentos em primeira instância da Operação Lava Jato, afirmou haver indícios de que o ex-deputado pelo PMDB-RJ se envolveu "na prática habitual e profissional de crimes contra a administração pública".
Baseando-se em documentos reunidos pelo Ministério Público Federal, Moro sustenta que Cunha utilizou contas secretas no exterior para ocultar o produto de seus desvios, os quais teriam ocorrido não só nos contratos com a Petrobras mas também em outras áreas, não raro "com o emprego de extorsão e de terceiros para colher propinas".
Daí por que o juiz considerou necessária a prisão provisória por tempo indeterminado: para evitar obstrução da Justiça e reiteração do delito, além de dificultar a dispersão de montantes ainda não recuperados —cerca de US$ 13 milhões, segundo o MPF— e impedir a fuga de Cunha, nascido no Rio e detentor de cidadania italiana.
Dado o conjunto da obra e o grau de exposição que se deu a ela, havia poucas dúvidas de que, tendo perdido as proteções que a Constituição oferece aos deputados, o peemedebista cedo ou tarde teria o mesmo destino de outros investigados pela força-tarefa de Curitiba.
Surpreendeu que tenha sido tão cedo: pouco mais de um mês após terminar na Câmara o processo de cassação do mandato de Cunha, o mais longo de nossa história, e menos de uma semana depois de a ação penal, iniciada no Supremo Tribunal Federal, começar a tramitar sob a batuta de Moro.
Pegos desprevenidos, os antigos colegas de Cunha demoraram a reagir à notícia. Quando o fizeram, sem conseguirem esconder a perplexidade diante da prisão de um dos mais poderosos presidentes da Câmara que o Brasil já conheceu, paralisaram votações e suspenderam sessões em plena quarta, dia de maior movimentação na Casa.
Sensação semelhante tomou conta do governo federal. Oficialmente em silêncio —o presidente se encontrava em trânsito, retornando do Japão—, o entourage de Michel Temer (PMDB) revelava nos bastidores grande apreensão.
Parlamentar influente como poucos, o ex-deputado vinha negando a possibilidade de negociar um acordo com os investigadores. "Só faz delação quem cometeu crime, e eu não cometi", dizia.
Agora que Eduardo Cunha sabe como Sergio Moro enxerga sua situação, talvez ele mude de ideia. Sua delação premiada cairia como uma bomba em Brasília —e não há quem não saiba disso no mundo político.
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