Ricardo Noblat: Dilma, sem planos para voltar...
Publicado no Blog do Noblat
Era a terceira vez que o mesmo grupo de seis senadores contrários ou indecisos quanto ao impeachment se reunia no Palácio do Alvorada com a presidente Dilma Rousseff desde que ela fora afastada do cargo em abril último.
Foi no fim da tarde da quarta-feira passada, dia em que Rodrigo Maia (DEM-RJ) se elegeu presidente da Câmara dos Deputados para completar o mandato de Eduardo Cunha. O tempo começava a esfriar do lado de fora do palácio.
Dentro, o tempo esquentou quando o senador Cristovam Buarque (PPS-DF), o único indeciso do grupo, perguntou a Dilma como seria um eventual governo dela caso o impeachment, em agosto próximo, acabasse derrotado pelo Senado.
Os demais senadores demonstraram interesse pela resposta – Roberto Requião (PMDB-PR), Lídice da Mata (PSB-BA), João Capiberibe (PSB-AM), Randolfo Rodrigues (REDE) e Elmano Serra (PTB-PI). Sentados, alguns se acomodaram na ponta das cadeiras.
Dilma não respondeu. Então Cristovam insistiu: “Antes do afastamento, a senhora chamou Lula para assumir a chefia da Casa Civil. A nomeação dele sinalizava um novo rumo para o governo. E se a senhora voltar, como será?”
Dilma evitou responder. Fez um comentário qualquer que, mais tarde, nenhum dos senadores soube reproduzir. Cristovam retomou a palavra e deu uma sugestão: “Por que a senhora não renuncia à presidência, e desafia Temer a fazer o mesmo?”
Macia até ali no trato com os visitantes, Dilma irritou-se com a sugestão e reagiu elevando o tom da voz: “Renúncia, não. Não haverá renúncia. A renúncia me diminuiria. E seria uma traição aos companheiros que lutam contra o golpe”.
Cristovam ainda insistiu: “Veja, não digo que a senhora deva renunciar primeiro para só depois desafiar Temer a fazer o mesmo. A senhora poderia publicamente propor a Temer uma renúncia conjunta para que o povo possa eleger um novo presidente”.
Dilma descartou a ideia. E começou a falar sobre uma carta aos brasileiros que pretende divulgar em breve. Nela, insiste em chamar o impeachment de golpe. E propõe a realização de um plebiscito sobre a antecipação da eleição presidencial de 2018.
Plebiscito não é iniciativa do presidente da República. Somente o Congresso, diz a Constituição, pode convocar um plebiscito. Dilma, portanto, estaria acenando com algo que não depende dela. Sua oferta seria igual a um suspiro.
A reunião dos senadores com ela deu em nada como as anteriores haviam dado em nada também. Dilma não imagina voltar ao cargo, hoje ocupado pelo vice Michel Temer. Na verdade, sequer gostaria de voltar ao cargo. Faltam-lhe para isso condições, planos e vontade.
Quando da instauração pela Câmara do processo de impeachment, Lula e o PT até examinaram a hipótese de ela renunciar para que o partido pudesse logo passar à oposição ao governo Temer. Dilma bateu o pé e não renunciou.
Sempre teve claro que o melhor para ela seria agarrar-se ao discurso do golpe e simular uma resistência para efeito do público externo. Lula e o PT foram a reboque dela. E sentem-se, agora, aliviados por não ter mais que defender obrigatoriamente Dilma e o seu governo.
Dilma, Lula e o PT contam os dias que faltam para que chegue ao final essa fase infeliz de suas trajetórias. A fase infeliz de Dilma chegará mais rápido. Ela irá para o exílio em Porto Alegre, sem poder se candidatar a nada por oito anos.
A fase infeliz das trajetórias de Lula e do PT não chegará ao fim tão cedo.
Poste sedutor
Lula jura que, se for perdoada, Dilma vai sorrir mais que garota-propaganda de dentifrício
“Está certo que a Dilma não é nenhuma mola de fusquinha, às vezes ela é dura, o pessoal tem medo dela, mas isso é defeito que a gente conserta”. (Lula, na discurseira para uma plateia amestrada em Carpina, Pernambuco, garantindo que os superpoderes de milagreiro imobiliário incluem a transformação de um poste mal encarado em Miss Simpatia)...
Neurônio desempregado
Senador especializado em besteirol histórico exige que a chefe seja indenizada
“Isso aqui vai ficar registrado como golpe. Dilma está sendo vítima de um projeto de retirada dos direitos trabalhistas. Tenho certeza de que ela será inocentada pela História”. (Lindbergh Farias,senador do PT do Rio de Janeiro, revelando que Dilma Rousseff será a primeira vítima de um golpe trabalhista porque a demissão por justa causa não dá direito ao seguro-desemprego)
José Nêumanne: O terror é apenas o horror
Alá deve estar mais envergonhado da ação assassina de seus soldados da jihad do que toda a cristandade (Publicado no Blog do Nêumanne)
Em 1890, o marinheiro polonês naturalizado britânico Jósef Konrad subiu o Rio Congo e testemunhou uma carnificina na qual metade da população local sucumbiu. Tornado o escritor que sempre justifica uma releitura prazerosa por outro gênio, Jorge Luís Borges, Joseph Conrad registrou seu testemunho no romance No Coração das Trevas. E deu voz ao ódio ao colonialismo. Do livro o gênio do cinema Francis Ford Coppola extraiu o enredo de Apocalypse Now, expressando o ódio ao imperialismo invasor. Antes disso, finda a Segunda Guerra Mundial, em Paris, dois gênios da literatura francesa, ambos ganhadores do Prêmio Nobel da Literatura, injustamente nunca concedido ao autor de Lord Jim, transformaram numa rixa uma boa amizade mantida nas mesas do café Deux Magots, em Saint Germain-des-Près. O caolho Sartre defendia o terrorismo como arma na luta da Argélia contra o colonialismo francês. O argelino Camus cunhou a máxima de que ele não perdoaria o terrorista cuja bomba matasse aleatoriamente sua mãe numa estação de metrô em Oran, onde ele nasceu. E assim o terrorismo – amor ou ódio? – , dilema crucial do século 20, invadiu e dilacera o século 21.
Sartre, o pai do existencialismo, tornou-se um dos maiores ídolos do social-comunismo da História. Mas em seu enterro gigantesco também foi enterrada a reputação de um intelectual brilhante que tinha tudo para imortalizar-se como o filósofo de O Ser e o Nada. E terminou permanecendo vivo como o escritor deAs Palavras. Edição recente de textos esparsos de galã Camus mostra como o amigo que virou rival dele não é mais apenas o genial romancista de O Estrangeiro, como era conhecido antes, pois ele, não Sartre, é que tinha razão nesta questão capital: não há razão nenhuma para a execução aleatória de cidadãos inocentes e alheios às questões que acionam os explosivos de um terrorista suicida.
O atentado contra a redação do Charlie Hebdo, a sequência de chacinas de 13 de novembro em casas noturnas da capital francesa e o caminhão-bomba que atropelou e matou 84 na comemoração do aniversário da queda da Bastilha, em 14 de julho de 2016, expõem mais do que nunca a completa razão lógica de Camus. O colonialismo não foi derrotado nas execuções aleatórias da Casbah, em Argel. O imperialismo não sucumbiu à explosão das Torres Gêmeas em Nova York. O terrorismo não tem causa, contém apenas ódio, preconceito, irracionalidade e uma brutalidade do qual o único animal capaz é o soi-disant racional. Um leão na floresta não promove chacinas como a do aeroporto de Istambul.
“O inferno são os outros”, definiu subliminarmente Sartre na peça Huis Clos (Entre Quatro Paredes), na boca do protagonista Garcin a essência do terror como arma. É uma ironia que Sartre não tenha entendido o próprio conceito e que Camus não tenha conseguido como ele resumir tudo o que pensava sobre o assunto numa síntese absoluta como esta.
O atentado de 14 de julho em Nice, à margem do “mare nostrum”, o Mediterrâneo, em cujo azul deslumbrante circularam as antigas civilizações grega e romana, ilustra à perfeição essa síntese. Não representa a vingança dos sarracenos contra os cruzados e os israelitas na luta milenar pela Terra Sagrada de Jerusalém. Alá deve estar mais envergonhado da ação assassina de seus soldados da jihad do que toda a cristandade. Maomé pode até ter tornado mais difíceis de aturar seus períodos de jejum, pois não entende como em seu ainda nome se derrama tanto sangue inocente. Marx, o jornalista que bradava contra a censura na Gazeta Renana, também não concebeu nem conceberia tanta crueldade. Não há fé nem ideal que justifiquem o ataque à liberdade dos outros de pensarem como quiserem e de rezarem para em que acreditem. Não há motivo, razão nem lógica.
A polícia francesa procura por algo inútil para dizer ao bobalhão do Hollande se o atentado foi planejado ou sequer autorizado pelo Estado Islâmico. Esta é uma manifestação da tonteira generalizada compartilhada pelos turcos que gastam bilhões para garantir a segurança em seu território e não conseguem evitar atentados em seu aeroporto que homenageia o grande estadista Ataturk. Ou da completa burrice dos responsáveis pela segurança do Rio de Janeiro durante a Olimpíada para a qual virão os principais alvos do “ódio do novo califado”, todos representados pela elite de seus ídolos esportivos: EUA, Reino Unido, Alemanha, França, etc.
Se o 14 de julho do sanguinário Robespierre e do corrupto Danton foi violado por um caminhoneiro lunático, não importa o mínimo se este foi treinado pelo Estado Islâmico ou se apenas inspirou-se no ódio que move hoje todos os psicopatas que se recusam a conviver com os diferentes e, por isso, os liquidam. O Brasil não é inimigo do Islã. E nossa presidente afastada, no auge de escassez de sua parca inteligente, chegou a propor na Nova York das Torres Gêmeas negociações com o califado da intolerância.
O que importa é que os imbecis continuam acreditando nas mesmas sandices escritas, não por Maomé, mas por Sartre. Os franceses desconfiam que um terrorista brasileiro pretende atacar a delegação francesa. Ninguém deu bola. Todo mundo acredita que a irrelevância de nosso país na geopolítica global nos torna imunes à fúria terrorista. Falta-nos a consciência que Camus tinha de que a desumanidade do extermínio do outro, seja quem for, desde que não seja o próprio combatente, nunca tem justificativa e logo não pode ser perdoada.
A única lógica do atentado de Nice é disseminar o medo. Não adiantam as lamúrias de Hollande, a tristeza de Merkel, o estupor de miss May, a diplomática solidariedade de Obama nem a patética ignorância de madama Rousseff. O medo está disseminado. Que o medo seja, então, a nossa arma. A única capaz de mostrar que ninguém é invulnerável, nem os esquimós no Alaska nem os visitantes da bela El Calafate, na Patagônia argentina. Os peles-vermelhas das reservas americanas, os caçadores mongóis e os monges do Tibete são todos alvos eventuais do terror desumano. Enquanto todos estes, inclusive nós, não tivermos essa consciência, continuaremos sem ter nenhuma chance de defesa contra o homofóbico de Orlando, os irmãos que infernizaram a maratona de Boston para ganhar a pior das notoriedades ou os separatistas de origem russa da Ucrânia que se dão ao luxo de abater aviões comerciais em pleno voo. Ninguém é seguro em lugar nenhum deste planeta. E o inimigo não é só o terrorista em potencial, mas todo babaca que ainda prega a tolerância com o terror por motivos ideológicos, políticos ou religiosos. Não pense a vítima que eles são inocentes porque não têm armas. Eles têm algo pior do que a bomba de Hidrogênio: eles têm a crença de que só eles salvarão a Terra
O terror é apenas e tão somente, aprendamos todos, por favor, o que exprime a fala de Mc Duff na cena 3 do segundo ato de Macbeth, de Shakespeare, usada por Conrad como epígrafe em No Coração das Trevas: o horror, horror, horror…
J. R. Guzzo: Nova lei das estatais chega tarde e contribui pouco
Quando aconteceu o último caso de corrupção num dos bancos estaduais que infestavam os 26 estados brasileiros? Quando o último deles desapareceu
Publicado na revista Exame
A nova lei das estatais, que acaba de ser aprovada pelo congresso e sancionada pelo presidente Michel Temer, é com certeza um caso de muito pouco e muito tarde, como se diz. Melhora a situação de fim do mundo que existe hoje nas empresas controladas e geridas pelo Poder Público, mas melhora pouco — muito pouco, na verdade, quando se leva em conta que as estatais brasileiras se transformaram ao longo dos últimos 13 anos numa pura e completa aberração.
Não se trata apenas de um poço sem fundo de corrupção, que levou a um estágio patológico todas as desgraças que infeccionam as companhias do governo desde o primeiro dia após sua criação. É mais do que corrupção: elas são hoje o maior sistema permanente de corrupção existente no mundo.
Além disso, as modestas melhoras que a lei pretende trazer vêm muito depois do que já deveria ter vindo — e isso só deixa as coisas ainda mais complicadas do que já são, pois, nesse tempo todo que passou sem nada ser feito, tudo que podia piorar já piorou, e muito do que piorou não tem mais conserto.
Enfim, e mais complicado ainda do que fazer pouco e fazer tarde, é a circunstância de que a nova lei deixa perfeitamente vivo o vírus fatal que provoca e mantém a doença toda: ela não acaba com as estatais e, enquanto as estatais não acabarem, a corrupção não acabará.
Pode ser elementar, e certamente é triste, mas é assim. O que cria a ladroagem nas empresas estatais é a existência de empresas estatais, nem mais nem menos. Sempre é possível imaginar, claro, um Brasil onde só os justos governassem as corporações administradas pela União, os 26 estados e os quase 6 000 municípios brasileiros. É possível e é inútil, porque isso não vai acontecer nunca.
A única solução possível — não a mais certa, ou a mais prática, ou a mais isso e mais aquilo, mas simplesmente a única possível — é acabar com as estatais. Todas? Sim, todas, menos as que obviamente são indispensáveis e não podem existir sem pertencer ao governo, como as que fornecem o transporte público de passageiros.
Elas não são um negócio. Precisam cobrar tarifas acessíveis à grande maioria da população; não podem dar lucro e têm de sobreviver com dinheiro de impostos, diretamente ou por meio de empresas subsidiadas, em favor do bem comum. Mas é isso, e só isso.
Não há nenhuma outra estatal que seja indispensável para a existência cotidiana do cidadão comum — ou sequer traga a ele algum benefício real. Ao contrário, só lhe dão prejuízo, pela ladroagem ou pela incompetência na gestão. Quando desaparecem, por ter sido privatizadas ou simplesmente extintas, não deixam um único traço de saudade; em compensação, deixam de saquear o Erário público.
Quando aconteceu o último caso de corrupção num dos bancos estaduais que infestavam os 26 estados brasileiros e serviam de caixa pessoal para governadores, políticos e amigos? Resposta: quando o último deles desapareceu. Estão fazendo alguma falta? Ninguém se lembra, também, de alguma negociata na Siderbras, extinta, ou nas estatais de telecomunicações, vendidas para a iniciativa privada, ou em qualquer outra companhia do governo que sumiu do mapa.
É um remédio tecnicamente infalível. Não é a receita que está sendo aplicada agora e, no mundo das realidades, nem poderia ser — acabar com uma Petrobras, uma Eletrobras, uma Nuclebras e outras de porte semelhante não seria politicamente possível no momento nem será ainda por um bom período de tempo.
Mas vai ser preciso começar em algum ponto no tempo, e isso nem sequer passou pela cabeça dos autores da nova lei. Mal deu para criar limites ao “livre provimento” de 1 800 cargos de comando nas estatais existentes, dentro do oceano de mais de 220 000 empregos ali disponíveis hoje, e muitos não queriam nem isso. (A propósito: por que não queriam? Por seu amor ao interesse público?)
É o que temos. Foi o máximo que se conseguiu. Antes pouco e tarde do que nada e nunca, é claro — mas é tudo que dá para dizer de bom nessa história.
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