Estamos ficando para trás, diz presidente da Embrapa

Publicado em 12/10/2015 11:26

Num país onde sobram exemplos de estatais ineficientes, a Embrapa tem sido uma honrosa exceção. Em 42 anos de história, o trabalho de seus pesquisadores foi essencial para o avanço do agronegócio no Brasil, principalmente com o desenvolvimento de variedades adaptadas ao solo e ao clima das novas fronteiras agrícolas e à disseminação de tecnologias para elevar a produtividade. Sobre seu futuro, porém, paira uma ameaça.

O Brasil investe por ano 1,9% do produto interno bruto agropecuário em pesquisa no setor. É, proporcionalmente, cerca da metade do que investem os Estados Unidos. “Se não dobrarmos o investimento, o Brasil vai perder competitividade”, diz Maurício Lopes, presidente da Embrapa. Ele quer atrair parceiros da iniciativa privada. Assim, a estatal poderia se livrar de amarras que atrapalham sua eficiência, como a burocracia do setor público.

Exame - Os países desenvolvidos investem mais de 3% do PIB do setor agropecuário em pesquisa. É bem mais do que o Brasil aplica. Estamos investindo pouco? 

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Maurício - Investimos 1,9% do PIB agrícola em pesquisa agropecuária, sendo que quase 60% disso corresponde ao orçamento anual da Embrapa. Mas é preciso dobrar o investimento para manter a competitividade. O Brasil hoje contribui com apenas 5% dos investimentos mundiais em pesquisa agrícola. A Índia responde por 7% desse total.

Os Estados Unidos, por 13%. Os chineses são os que mais investem no mundo: um quinto dos recursos globais aplicados na área vem da China. A ciência avança a uma velocidade alucinante e, sem mais recursos, fica difícil manter programas de pesquisa complexa, aumentar o número de projetos e ampliar a cooperação internacional.

Exame - Como a falta de dinheiro atrapalha?

Maurício - O ponto mais crítico está na pesquisa de plantas transgênicas, algo que exige muito capital. Trata-se de uma área importante. No Brasil, temos de desenvolver variedades mais resistentes à seca, por exemplo. Uma empresa pública não tem recursos para competir com as grandes multinacionais. Sofremos com a falta de agilidade. Para contratar um fornecedor, tenho de abrir uma licitação. Para abrir um concurso público, é preciso obter autorização do governo. E o desenvolvimento de tecnologia não pode esperar.

Exame - Cerca de 70% do orçamento da Embrapa vai para o pagamento de pessoal. Isso não é um problema?

Maurício - Essa é uma relação aceitável. Os cérebros compõem o pilar de um centro de pesquisa e inovação. É natural que custem caro. Com todas as dificuldades, a Embrapa é uma das poucas instituições públicas no mundo que conseguem ocupar algum espaço no mercado de transgênicos.

Lançaremos até o fim deste ano a primeira variedade de soja transgênica desenvolvida inteiramente no Hemisfério Sul — as folhas são mais resistentes a um herbicida para combater infestações de plantas daninhas. Em 2016, vamos levar ao mercado um feijão transgênico resistente à doen­ça do mosaico-dourado, que causa grandes perdas aos agricultores brasileiros (veja quadro na pág. 60).

Exame - O que fazer para ampliar os investimentos?

Maurício - Defendo a criação de uma subsidiária da Embrapa, que vamos chamar de Embrapatec. Essa empresa receberia a tecnologia desenvolvida em nossos laboratórios e trabalharia em conjunto com o setor privado, o qual traria investimentos. Dessa relação podem surgir novas tecnologias, com potencial para dar origem a novos negócios.

A empresa pública de pesquisa agrícola do governo francês fez algo parecido. A ministra Kátia Abreu, da Agricultura, está de acordo com essa iniciativa. Um projeto de lei para criar a subsidiária está sendo elaborado pelo governo e deverá ser enviado ao Congresso no ano que vem. Mas essa nova empresa precisará ter liberdade para atuar — se for submetida às mesmas limitações do setor público que a Embrapa enfrenta, não vai adiantar nada.

Exame - Qual deve ser hoje o papel da Embrapa?

Maurício - A Embrapa teve um papel importante no desenvolvimento da agricultura tropical há 40 anos, quando o Brasil ainda era importador de alimentos. Hoje, porém, parte expressiva da pesquisa agrícola brasileira é feita pelo setor privado. Não faz muito sentido aplicar dinheiro público nas mesmas frentes em que as empresas já estão atuando.

Por isso, vejo como algo natural a diminuição da participação do investimento em algumas áreas como a das sementes de soja, na qual a Embrapa chegou a ter uma fatia de 70% até meados dos anos 90. Nossa parcela atualmente é de 10%, e a meta é recuperar um pouco, chegando a 15% em cinco anos.

Nosso papel agora é outro: abrir novas fronteiras para a agropecuária e agir mais estrategicamente. Um exemplo: nos últimos anos, nossos pesquisadores fizeram um trabalho para identificar pragas que atacam a soja, o milho e o algodão em outras partes do mundo, com potencial para produzir grandes danos às lavouras brasileiras. Fomos a outros países, identificamos variedades resistentes e criamos uma reserva genética para combater essas doenças.

Exame - De onde virá o novo salto da agricultura brasileira?

Maurício - Da ocupação das terras de baixa produtividade. O caso mais expressivo é o das pastagens degradadas. Há cerca de 50 milhões de hectares nessa situação no Brasil. A recuperação dessas pastagens possibilita o aumento da produção pecuária de uma para até quatro cabeças de gado por hectare. Os rebanhos ficam mais adensados, o que permite a liberação de parte da área para as lavouras.

Outra grande oportunidade é o aprimoramento de culturas nas quais hoje nossa produtividade ainda é baixa. Somos muito produtivos em algumas frentes, como a da soja. Mas ainda há espaço para aumentar o rendimento de milho, trigo, feijão, arroz e na produção de carne.

 

Entrevista completa no site da revista Exame

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Fonte:
Exame

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2 comentários

  • Dalzir Vitoria Uberlândia - MG

    A EMBRAPA há muito tempo virou mais um órgão de emprego e pelo que gasta gera muito pouco de RESULTADO ao setor... sucesso no passado não garante sucesso no futuro...

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    • Paulo Roberto Rensi Bandeirantes - PR

      Sr. Dalzir, a tão querida EMBRAPA, como todas as "coisas" produtivas desse país foi sucateado. Veja a disponibilidade de recursos para pesquisa atualmente. Os royalties que recebem dos seus cultivares, está cada vez virando fumaça, pois os seus cérebros estão se aposentando e, os novos não querem ir trabalhar numa instituição onde não há condição de desenvolver minhas pesquisas.

      Note que no inicio da autorização da soja RR, a maioria dos cultivares usados eram

      BRS, ou seja, desenvolvidos pela EMBRAPA, hoje após 10 anos, quais são os cultivares detentores das tecnologias de transgenia?

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  • Valdomiro Rodante Junior Porangatu - GO

    Após esse governo assumir , gostaria de saber em estamos à frente , invasões ?

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