Chumbinhos caem em consequência da seca e especialistas da cafeicultura avaliam impactos para a safra 2021

Publicado em 18/12/2020 14:27 e atualizado em 21/12/2020 13:45
Levantamento feito por Virginia Alves (editora do mercado de café do NA)

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O ano de 2020 ficará marcado para a cafeicultura brasileira. Se por um lado o clima foi positivo para a colheita de uma safra recorde de 63 milhões de sacas de 60 kg – segundo números da Conab, por outro lado a seca levanta incertezas quanto a quebra para 2021, que naturalmente já é de ciclo baixo para o Brasil.

Pesquisadores respeitados, como Roberto Santinato e Roberto Antônio Thomaziello, à frente da cafeicultura brasileira há anos, já classificam a seca de 2020 como uma das piores na história do maior produtor de café do mundo. "Essa atual é uma das mais fortes que vi nos meus 50 anos de cafeicultura", afirmaram os dois especialistas, em momentos distintos, em entrevista ao Notícias Agrícolas.

Roberto Thomaziello, engenheiro agrônomo do IAC, da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, destaca que além da falta de chuva desde abril, as altas temperaturas castigaram ainda mais o cafezal. Na região de Franca/SP, as temperaturas chegaram a bater a casa dos 35 graus entre setembro e outubro, período de florada.

-- "Acima dos 28 graus a planta já começa a sentir os impactos das altas temperaturas. Todas as áreas apresentaram temperaturas muito elevadas", explicou..

Florada tempo seco no sul de Minas - Geovane Ferreira da Silva

Florada tempo seco no sul de Minas - Geovane Ferreira da Silva

Seca no café - Envio de Mário Ferraz de Araújo - Cooxupé - 0911

Seca no café - Envio de Mário Ferraz de Araújo - Cooxupé - 0911

PERDAS GRANDES, MAS VARIÁVEIS, diz Thomaziello

A primeira florada generalizada foi registrada em setembro, justamente quando as temperaturas estavam mais elevadas. Sem o retorno efetivo das chuvas, o cenário só foi se agravando e as perdas para 2021 já são dadas como certas.

Thomaziello explica ainda que em decorrência da chuva irregular, as perdas são variáveis.

-- "O prejuízo será muito grande, mas ele é variável. Dentro de uma mesma propriedade temos situações diferentes. Podemos ter produtores que perderam 10%, 20%, 30% e até 40%", considerando além da seca, o ano de bienalidade baixa para o café arábica", comenta.

Thomaziello levanta ainda as preocupações para a produção de café especial no ano que vem. Segundo o especialista, com uma florada irregular a tendência é também de uma colheita irregular, o que deve impactar diretamente essa produção.

-- "Quem busca por qualidade com certeza encontrará dificuldades, esse é mais um ponto que precisamos continuar acompanhando de perto".

Finaliza alertando que as atenções seguem voltadas para o clima.

-- "Com um déficit hídrico intenso, o produtor ainda precisar torcer para não acontecer nenhum veranico no primeiro trimestre de 2021".

Lavouras irrigadas também sofrem os impactos, diz Roberto Santinato

Roberto Santinato, especialista em irrigação na cafeicultura, destaca que as condições climáticas adversas prejudicaram também as lavouras com sistema de irrigação. O especialista explica ainda que antigamente secas como essa aconteciam a cada 15 ou 20 anos, mas que agora vem sendo registrada a cada 5 ou, no máximo, 6 anos.

-- "Pelo o que tenho acompanhado, quem não tem irrigação deve perder entre 30 e 40%. Quem esperava colher 50 sacas, vai cair tranquilamente umas 20 sacas", explica.

Nas áreas irrigadas, o especialista destaca que nas regiões mais quentes de Minas Gerais registraram temperaturas acima dos 30 graus. "A cada grau que aumenta você perde 10% da fotossíntese ou da formação de carboidrato. Onde foi assim, mesmo com a irrigação, deve-se perder em torno de 10%, afirma.

Santinato traz ainda os problemas que as regiões mais frias enfrentaram em 2020 e cita o exemplo de São João da Boa Vista. De acordo com o especialista, com a chegada das frentes frias a umidade relativa do ar subia para 80,90%, mantendo o padrão por 4 ou 5 dias.

-- A planta sem proteção acabou favorecendo a entrada da Phoma nas lavouras. Quem tinha aplicado já há 40 dias, a doença acabou entrando para valer na produção", explica.

"Essas frentes acabaram condicionando a umidade relativa alta no período de 5 dias, foi o suficiente para a doença entrar. Como a proteção no cafeeiro é maior na folha do que no frutinho, ela pegou os frutinhos da segunda florada e eles estão caindo", explica. 

Seca no café - Fotos Guy Carvalho

Seca no café - Fotos Guy Carvalho

Com as chuvas, os cafeeiros lançam novas folhas, registra prof. Donizete

A última seca marcante para o café foi registrada em 2014. Justamente por ter acontecido em momentos diferentes, naquela época registrada entre janeiro e fevereiro, a produção de 2021 deve sentir os impactos de forma mais severa.  

As chuvas voltaram com regularidade apenas no final de novembro nas principais regiões produtoras do país. Donizete Alves professor e pesquisador da Universidade Federal de Lavras (UFL) e referência na cafeicultura nacional, destaca que passado o estresse, as lavouras estão crescendo e lançando novas folhas.

-- "Os cafeicultores parecem que estão percebendo esses sinais e passaram a cuidar melhor. Estão adubando, controlando pragas e doenças, enfim estão fazendo agora o que não puderam fazer de setembro a novembro", afirma.

No início de dezembro, também em entrevista ao Notícias Agrícolas, Donizete já destacava que a safra 21 começava com três meses de atraso e a importância da continuidade nos tratos culturais. "Certamente estas ações vão minorar os prejuízos porque os frutos vão crescer e ficarão mais pesados", comenta.

>>> Chuvas chegam ao Sul de Minas Gerais, mas a dúvida é se os frutos do café vão crescer

As incertezas, no entanto, aumentaram nos últimos dias. No sul de Minas Gerais, principal polo produtor do país, produtores passaram a registrar muita queda de chumbinho. "Essa queda é uma resposta tardia ao clima seco e quente dos últimos meses", comenta.

Explica ainda que isso acontece devido a um desequilíbrio hormonal que aconteceu durante o período de estresse e que "promoveu na região um enfraquecimento na haste que liga o chumbinho ao ramo. "Com a retomada das chuvas a água penetra no fruto com uma força/pressão que rompe a chamada enfraquecida, derrubando o fruto", explica.

O professor explica ainda que o produtor pode observar a condição com facilidade na lavoura. "Basta você balançar o galho, se os frutos caírem foi esse desequilíbrio hormonal que aconteceu lá trás", comenta.

Café no chão em Ibaraci/MG - Foto Sindicato Rural

Café no chão em Ibaraci/MG - Foto Sindicato Rural

>>> Café: Ibiraci/MG aumenta potencial de perda e prevê quebra de 50% na safra 21 de arábica

Falando na seca de 2014, o professor explica que os cenários são diferentes. Há seis anos a seca atingiu o crescimento dos frutos, resultando então na quebra de safra daquele ano.

-- "Foram períodos diferentes. Essa seca de 2020 ela está pegando a fase de florescimento de chumbinho, em 2014 pegou as frases de crescimento de fruto e granação", explica.

O professor destaca ainda que as condições climáticas de 2020 pode ser considerada pior, já que atingiu uma fase muito sensível do desenvolvimento. "Além do mais, ninguém garante que a partir de janeiro e fevereiro não vai haver um veranico. Se houver, vai ser complicado porque vai ser um estresse duplo", comenta.

E agora? 

Para os próximos passos, Donizete destaca que os cafeicultores precisam continuar os tratos culturais, mantendo o controle de praga e doenças.

-- "Aplicar os produtos necessários para que a planta lance folha, porque somente lançando folha é que a planta vai fazer com que os frutos que já estão na planta cresçam", orienta.

José Braz Matiello, engenheiro da Fundação Procafé, também relembra a seca de 2014, mas também classifica 2020 com um pior cenário para a produção do Brasil.

-- "Essa atual ela foi mais abrangente em termos de regiões, pegou o coração da região cafeeira. A sorte é que pegou em um ano que já ia dar menos café, se não ia tirar muito mais", comenta. Ele acredita ainda que seca deva tirar entre 7 e 8 milhões da safra do ano que vem.

>>> Procafé: Chuvas de dezembro começam a recuperar déficit hídrico, mas estado ainda é de atenção com queda de chumbinho acentuada

Do lado da meteorologia, Paulo Sentelhas – professor da Esalq/USP e CTO da Agrymet, com os dados do sistema AGRYMAX, comprova os baixos volumes de chuvas registrados em 2020. Na região de Franca, por exemplo, em comparação com o ano passado, choveu 53,6% na área. Entre março e novembro deste ano foi registrado um acumulado de 392 mm, contra 845 mm no ano anterior.  Os dados também chamam atenção para a temperatura. Em 2019, no entre setembro e novembro apenas 10 dias tiveram temperaturas acima dos 32ºC, contra 30 dias registrados no ano atual.

Em Machado/MG o cenário é parecido. Em 2019 foram registrados 793 mm, contra 402 mm registrados neste ano. O número representa 45,6% a menos de chuva. Na temperatura, os dados mostram 28 dias com temperaturas acima de 32 graus em 28 dias, entre o meses de setembro e novembro, contra 8 dias no ano anterior.

Nos mapas abaixo, disponíveis no site da Cooxupé, é possível observar a diferença expressiva entre os meses de outubro, tanto no Sul de Minas como no Cerrado Mineiro. Os mapas referentes ao mês de novembro serão divulgados nos próximos dias pela cooperativa.

Mapa de Déficit Hídrico Outubro 2020

Mapa de Déficit Hídrico de Outubro  - Cerrado Mineiro - Cooxupé
Fonte: Cooxupé

Produção mundial de café atinge o equivalente a 168,55 milhões de sacas de 60kg no ano-cafeeiro 2019-2020 (Embrapa Café)

A produção mundial de café no ano-cafeeiro 2019-2020 atingiu 168,55 milhões de sacas de 60kg, das quais 95,73 milhões de sacas são de café arábica, que equivalem a aproximadamente 56,8%, e 72,82 milhões de café robusta, volume que corresponde a 43,2% da produção global.

Se for estabelecida uma comparação com o ano-cafeeiro anterior, cuja safra foi de 171,37 milhões de sacas de café, sendo 100,82 de café arábica e 70,55 de café robusta, verifica-se que esses volumes representam, respectivamente, uma redução de 1,6% da produção total, um declínio de 5,1% do volume de café arábica e um incremento de 3,2% do volume de café robusta.

Especificamente em relação ao café robusta, observa-se que no ano-cafeeiro 2019-2020 o volume produzido no mundo teve acréscimo de 2,27 milhões de sacas em relação ao volume de 2018-2019.

Nesse mesmo contexto, é possível constatar que a produção mundial de café robusta teve aumento pelo terceiro ano consecutivo, pois em 2016-2017 a safra foi de 60,02 milhões de sacas, em 2017-2018, foi de 68,99 milhões de sacas, e no ano-cafeeiro passado, o volume de produção mundial do café robusta atingiu 70,55 milhões de sacas.

É possível verificar um aumento de aproximadamente 12,8 milhões de sacas de 60kg – 21,3% – na produção mundial de café robusta desde 2016-2017 até o ano-cafeeiro atual.

No que concerne ao consumo mundial de café no atual ano-cafeeiro, tanto de países produtores como exportadores, estima-se um volume total de 167,59 milhões de sacas consumidas, o que representa uma pequena queda de 0,9% em relação ao ano-cafeeiro anterior, que foi de 169,11 milhões de sacas.

Nesse contexto, no caso específico dos países exportadores, o consumo interno permanece estável em torno de 50 milhões e nos países importadores o consumo diminuiu 1,1% e atingiu 117,59 milhões de sacas.

Leia esta ANÁLISE/divulgação na íntegra na página da Embrapa Café,  do Observatório do Café e do Consórcio Pesquisa Café

Conheça também o Portfólio de tecnologias do Consórcio pelo link https://www.consorciopesquisacafe.com.br/index.php/publicacoes/637 e também acesse todas ANÁLISES e notícias da cafeicultura.

Futuros do café sobem cotações com preocupações sobre o clima

Nem mesmo anúncio de safra recorde no Brasil, em 2020, alterou a inclinação positiva dos mercados (BALANÇO SEMANAL — 14 a 18/12/2020 - do CNC)
 
Os contratos futuros do café tiveram semana positiva nos mercados internacionais, com os participantes permanecendo com sua atenção voltada ao clima nos países produtores, principalmente no cinturão cafeeiro do Brasil. Nem mesmo o anúncio de safra recorde no País (saiba mais) impactou o desempenho.
 
Na Bolsa de Nova York, o vencimento mar/21 do café arábica subiu 500 pontos, encerrando a sessão de ontem (17) a US$ 1,2660 por libra-peso. Na ICE Europe, o vencimento jan/21 do robusta fechou a US$ 1.365 por tonelada, com ganhos de US$ 30.
 
Segundo a Somar Meteorologia, o verão, que tem início oficialmente às 7h02 da próxima terça-feira no Hemisfério Sul, será marcado pelo fenômeno La Niña no Oceano Pacífico, que pode ser o terceiro mais forte nas últimas duas décadas e implicar chuvas abaixo da média no Sul do País.
 
Para a Região Sudeste, responsável pela maior parte da safra cafeeira no Brasil, a previsão é de chuva acima do normal no sul do Espírito Santo, litoral de São Paulo e no Rio de Janeiro.
 
Após uma guinada na segunda-feira (14), o dólar comercial veio devolvendo parte dos ganhos, mas ainda encerrou a semana com valorização de 0,6%, cotado a R$ 5,0788.
 
O recuo passou a ocorrer com a melhora do ânimo de investidores devido à possibilidade de um pacote de estímulo fiscal nos Estados Unidos e ao avanço das negociações comerciais entre Reino Unido e União Europeia. No Brasil, a divisa norte-americana foi pressionada pela entrada de fluxo.
 
No mercado físico, mesmo com a alta internacional, a liquidez segue reduzida, com compradores e vendedores retraídos em função da proximidade das festas de fim de ano e, também, do alto volume de café já comercializado.
 
Os indicadores calculados pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) para as variedades arábica e conilon ficaram em R$ 606,64/saca e R$ 403,01/saca, respectivamente com ganhos de 4,2% e 2,3%.
 
 

 

 

 

 

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Tags:
Por:
Virgínia Alves
Fonte:
Notícias Agrícolas/Embrapa/CNC

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