Foco na previdência, por Agroanalysis/FGV
O grande desafio da economia brasileira atual reside no ajuste das contas públicas. De fato, o resultado primário do setor público como proporção do Produto Interno Bruto (PIB) no início da década era superior a 3%. Ao longo da primeira metade da década, a política fiscal foi conduzida de maneira relativamente irresponsável, baseada na crença equivocada de que a manutenção da demanda agregada aquecida via gastos públicos levaria a um aumento dos investimentos produtivos. Essa ilusão desfez-se na realidade dos fatos, que mostraram que os investimentos continuaram em um patamar relativamente baixo no País, incom-patíveis com uma taxa de crescimento econômico sustentável da ordem de 3% ao ano. No entanto, o aspecto mais perverso dessa irresponsabilidade foi a geração de um desequilíbrio fiscal de magnitude assustadora: a corrosão do superávit primário no início da década desembocou em um déficit de mais de 1,4% no ano passado.
Esse resultado só não foi pior por conta dos esforços do último ano do governo Temer em conter gastos públicos. A consequência direta disso foi um salto da dívida pública bruta do setor público da ordem de 25% do PIB entre 2014 e o final do ano passado.A trajetória das variáveis fiscais, considerando uma perspectiva dinâmica, sinaliza uma situação insustentável no médio e no longo prazos caso nada seja feito. As projeções indicam que, na ausência de alguma correção do lado dos gastos públicos, o resultado primário tornar-se-á cada vez mais deficitário e o endividamento público crescerá recorrentemente. O crescimento desenfreado da dívida pública fatalmente levará, em algum momento, à sua moratória ou a um quadro in-flacionário agudo, motivado pela necessidade de emissão de moeda pelo lado do Governo para financiar as suas contas.
Por conta disso, afora alguns setores movidos por interesses próprios, formou-se um consenso na sociedade acerca da necessidade de um ajuste efetivo das contas do governo pelo lado da con-tenção de gastos. Nesse sentido, deve ficar claro que todo esforço fiscal realizado nos últimos anos com foco para evitar o agravamento do quadro das contas públicas foi feito na compressão de gastos do Governo em diversos setores, e seus efeitos não são perceptíveis no curto prazo, mas são percebidos no longo prazo. Em outras palavras, o ajuste feito na contenção de gastos dos últimos anos só pode ser mantido no curto prazo, havendo a necessidade de um ajuste mais efetivo do lado das despesas públicas em termos estruturais.
A decomposição da estrutura dos gastos do governo federal nos últimos anos revela um quadro claro e preocupante. As contas da previ-dência social apresentaram um quadro de franca e acelerada deterioração, com o INSS registrando um déficit de R$ 195 bilhões (2,9% do PIB) em 2018. A piora das contas do sistema previden-ciário ao longo da última década e meia é resul-tado de uma combinação de fatores perversos que vão além do envelhecimento populacional. As características assistencialistas conferidas ao INSS ao longo do tempo e os aumentos do salá-rio-mínimo acima da inflação (que impactaram diretamente o piso do benefício previdenciário) são elementos que têm impacto direto sobre o resultado do sistema.
Em função disso, é inadiável a realização de uma reforma da previdência que abranja diferentes segmentos da sociedade. Nesse sentido, o novo governo enviou uma proposta de reforma ao Congresso Nacional no início de 2019. Essa pro-posta contém aspectos extremamente louváveis e é focada em múltiplas dimensões, e não apenas nos trabalhadores do setor privado. Em tese, a sua aprovação permitiria uma economia considerável aos cofres da União nos próximos anos.
No entanto, o maior problema relativo à aprovação dessa proposta de reforma é que ela impõe, ao afetar diretamente vários setores da sociedade, um custo político considerável. Sob essa perspectiva, espera-se que o governo se envolva efetivamente na construção de uma maioria no Congresso (na Câmara dos Deputados e no Senado Federal) para a aprovação da proposta. A demora ou a eventual não aprovação terá custos significativos para a economia brasileira nos próximos anos.
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