IAC conclui trabalho de melhoramento genético de feijoeiro no Brasil
Os trabalhos com melhoramento genético em feijoeiro no Brasil, foram iniciados no Instituto Agronômico (IAC), em 1932, através de avaliações sobre a capacidade produtiva da espécie, porte de planta e resistência a doenças, para posterior utilização na obtenção de linhagens.
Neste período, centenas de linhagens foram analisadas quanto às características mencionadas, selecionando- -se plantas em populações derivadas de cruzamentos artificiais. Como resultado deste trabalho pioneiro observou-se que as linhagens de tegumento preto eram mais produtivas que os demais tipos por apresentarem tolerância a seca e principalmente, ao patógeno agente da ferrugem, que se caracterizava na época como a principal doença que ocorria na cultura. Constatou-se também que as sementes de cor preta apresentavam baixa aceitação comercial, o que não acontecia com cultivares de tegumento tipo rosinha, roxinho, bolinha e, principalmente os tipos manteiga (feijões de origem Andina) que dominavam o mercado consumidor antes dos anos 70.
Em meados de 1970, pesquisadores do Instituto Agronômico em uma propriedade em Palmital-SP, identificaram uma planta de maior capacidade produtiva, cuja coloração do grão era creme com listras marrom. O proprietário da fazenda a chamava de carioquinha, devido a uma raça de suínos que também possuía listras pelo corpo. Após vários experimentos realizados foi recomendada como cultivar em 1971 com o nome de Carioquinha. Na sequência vários trabalhos conjuntos foram realizados pelo IAC e Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI), órgão também ligado a Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, com a finalidade de demonstrar aos agricultores que a cultivar era mais produtiva que as demais em uso. Os resultados obtidos nesse trabalho promoveram uma revolução no comércio de feijão no Brasil, pois a cultivar modificou a tradição do consumo de feijões dos tipos rosinha, roxinho, manteiga e jalo e viabilizou o agronegócio do feijão no Brasil. Este tipo de grão, 43 anos do seu lançamento, é ainda cultivado.
A partir do lançamento da cultivar Carioquinha o Programa de Melhoramento Genético de Feijoeiro do IAC desenvolveu inúmeras populações segregantes que apresentavam tegumento carioca visando o lançamento de genótipos mais adaptados que a ‘Carioquinha’. Neste sentido, no início da década de 80 foi lançada a cultivar IAC Carioca que apresentou potencial produtivo maior e resistência a raça fisiológica 65 do patógeno da antracnose (Colletotrichum lindemuthianum). Essa nova cultivar, nessa época, mostrou-se a mais agressiva e disseminada nas principais regiões produtoras de feijão no Brasil.
Em continuidade ao melhoramento genético voltado para resistência a doenças, em especial, antracnose, no Alisson Fernando Chiorato1 Sérgio Augusto Morais Carbonell1 1 Instituto Agronômico, Centro de Grãos e Fibras, [email protected]. início da década 90 foram lançadas as cultivares IAC Carioca Aruã, IAC Carioca Pyatã e IAC Carioca Akytã. Essas três cultivares reuniam em um único genótipo, genes de resistência para as raças fisiológicas da antracnose 31, 65, 73, 81, 89 e 95 proporcionando estabilidade da resistência em regiões com alta ocorrência do patógeno, assim como porte ereto de planta.
Vale destacar, além da resistência a antracnose, que a cultivar IAC Carioca Aruã foi a primeira cultivar brasileira a apresentar tolerância ao escurecimento do grão, podendo ser armazenada por vários meses sem que ocorresse a depreciação do produto. Essa cultivar também se tornou a base genética utilizada por vários programas de melhoramento na busca de grãos mais claros e tolerantes ao escurecimento.
As cultivares IAC Carioca Pyatã e IAC Carioca Akytã destacaram-se pela resistência genética a doença da mancha angular causada pelo fungo Pseudoisariopsis griseola juntamente com a resistência a antracnose, agregando a elas um diferencial de qualidade, que permitiu reduções significativas no custo de produção devido a diminuição no uso de defensivos agrícolas e, a disponibilização de produtos com melhor qualidade ao consumidor.
Após esta fase, ocorreu em 1999 o lançamento da cultivar IAC Carioca Eté que apresentou resistência genética a antracnose, mancha angular e tolerância ao vírus do mosaico dourado, bem como, com potencial produtivo superior as cultivares anteriormente lançadas. Em 2002 foi lançada a cultivar IAC Carioca Tybatã, uma linhagem irmã da IAC Carioca Eté, mas com melhor qualidade de grão, maior potencial produtivo e também resistência para os patógenos da antracnose, mancha angular e tolerância ao vírus do mosaico dourado.
Visando manter o vetor do progresso genético para produtividade, nos anos de 2004 e 2005 foram lan- çadas pelo IAC as cultivares IAC Votuporanga, IAC Apuã e IAC Ybaté com potencial produtivo maior do que as cultivares anteriores. Essas cultivares apresentaram porte de planta ereto para colheita mecânica, atendendo a demanda de produtores da época que iniciaram nesse período um sistema de colheita mecânica da cultura.
Após o lançamento dessas cultivares, em 2005 o programa de melhoramento genético de feijoeiro do IAC mudou a base genética utilizada em cruzamentos, tendo como principal objetivo, além da resistência a antracnose, melhorar a qualidade tecnológica de grãos considerando características como maior tamanho de grão, menor tempo de cozimento, tolerância ao escurecimento, coloração clara de grão, qualidade de caldo e maior porcentagem de proteína.
É importante lembrar que até meados de 1998 o tamanho de grão considerado como padrão era o da cultivar Carioquinha desenvolvida em 1970, que apresentava tamanho médio entre O Agronômico | v. 64-66 | 2014 7 TRAJETÓRIA DE PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA 8 O Agronômico | v. 64-66 | 2014 INFORMAÇÕES TÉCNICAS as peneiras 11 e 12. Após 1998, este padrão foi modificado com a disponibilização da cultivar BRS Pérola desenvolvida pela EMBRAPA, passando para o tamanho médio de grão entre as peneiras 12 e 13, o que se tornou o padrão preferido das empresas empacotadoras e do consumidor final. Isto tem relevância, pois o consumidor final é, em última instância, o elo da cadeia produtiva que define as exigências de mercado, e consequentemente para todo o processo de inovação. As empresas empacotadoras passaram a aliar as “marcas do produto” ao tipo e coloração clara de grão e o consumidor, associando grãos maiores a um melhor rendimento de panela. Salienta-se que não é só o tamanho do grão que determina o sucesso de uma cultivar, mas a sua característica de manter a coloração clara (carioca), a alta produtividade com estabilidade de produção, a qualidade tecnológica e nutricional e a resistência a pragas e doenças.
Alinhado às demandas do mercado, o programa de melhoramento genético de feijoeiro do IAC novamente mudou a base genética dos genótipos utilizados em cruzamentos desenvolvendo cultivares que apresentassem grãos maiores (maior rendimento de peneira) e resistência/tolerância ao escurecimento do grão. A cultivar IAC Alvorada, lançada pelo IAC em 2008, respondeu a essa demanda por ter agregado tais características. Atualmente, no Brasil essa cultivar é considerada padrão de mercado para qualidade de grão, apresentando ainda excelente produtividade e porte ereto de planta para colheita mecânica.
A cultivar IAC Alvorada, apesar de ser padrão para qualidade de grão, apresentou suscetibilidade ao fungo de solo Fusarium oxysporum causador da doença da murcha de Fusarium, sendo este fato um inibidor para sua utiliza- ção nas principais áreas de cultivo no Brasil. Isto se configurou em um novo desafio para o programa de melhoramento do IAC levando ao desenvolvimento de milhares de linhagens, que foram avaliadas para os aspectos de qualidade de grão e resistência as doenças da antracnose e murcha de Fusarium.
Como resultado final ocorreu o lançamento da cultivar IAC Formoso no ano de 2010. Destaca-se aqui, que esta cultivar, a partir do vetor de qualidade tecnológica, é a que apresenta o menor tempo de cozimento do grão. Outro aspecto importante da cultivar IAC Formoso refere-se a produtividade superior e também tolerância ao déficit hídrico. Essa cultivar além de apresentar alto potencial produtivo e Foto: Henrique Grandi TRAJETÓRIA DE PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA INFORMAÇÕES TÉCNICAS tolerância ao déficit hídrico, destaca- -se por possuir teores significativos de isoflavonas quando comparados a outras cultivares do mercado, chegando a apresentar uma porcentagem 10 vezes maior em relação aos padrões de mercado. A porcentagem de isoflavona encontrada na cultivar IAC Formoso é equivalente a 10% da porcentagem média de isoflavonas encontrada na soja.
Em 2012, foi lançada a cultivar IAC Imperador, que além manter a resistência a antracnose, a bacteriose e a murcha de Fusarium apresenta precocidade, com ciclo de 75 dias, considerando a fase da semeadura a colheita. Essa cultivar ainda está em expansão pelo recente lançamento, mas certamente irá integrar sistemas de cultivo em regiões onde foi implantado o vazio sanitário1 que requer a utilização de cultivares de ciclo rápido.
Entre os anos 2010 e 2013 os trabalhos de P&D do Programa de Melhoramento Genético do Feijoeiro direcionaram suas atividades para agregar qualidade de grão presente na cultivar IAC Alvorada e resistência à antracnose e à murcha de Fusarium. O resultado deste esforço foi o lançamento 1 O vazio sanitário é um período de ausência de plantas vivas nas lavouras de culturas como soja, feijão e algodão. Na soja, ele visa reduzir a quantidade de uredosporos (esporos que aparecem na fase epidêmica da doença) no ambiente durante a entressafra e, dessa forma, diminuir a possibilidade de incidência precoce da ferrugem asiática. O período, que varia de 60 a 90 dias, foi estabelecido considerando que o tempo máximo de viabilidade de uredosporos registrado é de 55 dias. da cultivar IAC Milênio2 . As principais características da cultivar IAC Milênio a serem destacadas são a produtividade média apresentada de 2.831 kg ha-1 nos ensaios de Valor de Cultivo e Uso (VCU) realizados no Estado de São Paulo entre os anos de 2011 a 2013, ciclo médio de 95 dias, massa de mil grãos de 290 gramas, alta qualidade de grão resistente ao escurecimento, resistente ao fungo de solo Fusarium oxysporum e também para as raças fisiológicas 81, 89 e 95 do patógeno da antracnose (Colletotrichum lindemuthianum).
Atualmente as pesquisas conduzidas no âmbito do Programa de Melhoramento Genético do Feijoeiro têm sido pautadas pelos seguintes temas: qualidade tecnológica do grão, aumento dos índices de produtividade, escassez hídrica, adoção de características nutracêutica ao feijão comum. Referente a parte nutracêutica, foram encontrados nos genótipos isoflavonóides, agliconas, daidzeína e geniste- ína e os flavonóis kaempferol, miricetina e quercetina. Grãos do tipo preto e origem Mesoamericana, a exemplo da cultivar IAC Una, destacaram-se pelas maiores concentrações de isoflavonóides, variando de 5.25 a 14.03 mg/ kg, sendo uma cultivar que também apresentou o isoflavonóide daidzeína.
2 A denominação “Milênio” se deve ao fato de ser esta a cultivar de número 1.000 desenvolvida pelo Instituto Agronômico em seus 127 anos de existência. O Agronômico | v. 64-66 | 2014 9 TRAJETÓRIA DE PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA 10 O Agronômico | v. 64-66 | 2014 INFORMAÇÕES TÉCNICAS A cultivar IAC Formoso, com grãos tipo carioca, aliado ao alto teor de proteínas e sendo também uma cultivar resistente a ocorrência de carunchos, apresentou a maior concentração de genisteína, representando cerca de 11% do conteúdo presente na soja, bem como níveis elevados do flavonol kaempferol.
A transferência de tecnologia do Programa de Melhoramento Genético de Feijoeiro
Visando a difusão das tecnologias desenvolvidas pelo Programa de Melhoramento de Feijão do IAC, destaca-se que a produção de sementes realizada pelo Núcleo de Produção de Sementes do IAC teve uma evolução nos últimos anos, pois entre os anos de 2005 a 2007 foram produzidos ao redor de 10.000 kg de sementes ano, ao passo que no ano de 2013, o sistema fechou com uma produção de 90.000 kg, representando um aumento aproximado de 700% na produção de sementes genéticas entre os anos de 2008 a 2013 (Figura 1). Salienta-se que essa produção de sementes é realizada para atender empresas parceiras do IAC, que multiplicam as cultivares visando atender ao produtor rural.
Entre os anos de 2013 e 2014 foram emitidas autorizações de multiplicação de sementes para 28 empresas o que Figura 1. Produção de sementes de feijão, cultivares do IAC, 2005 a 2013. TRAJETÓRIA DE PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA O Agronômico | v. 64-66 | 2014 11 INFORMAÇÕES TÉCNICAS totalizou uma área de 2.976 hectares semeados com cultivares de feijão do IAC. Em relação a esse total, e considerando que cada hectare produz em média 1.800 kg de sementes de feijão beneficiada, foram produzidos cerca de 1.873.500 kg de sementes, sendo suficientes para semear uma área de 89.286 hectares, considerando que em média são utilizados 60 kg de sementes para cada hectare.
O resultado destacado acima reflete um processo efetivo de difusão e ado- ção das tecnologias geradas no âmbito do Programa de Melhoramento Gené- tico de Feijoeiro do IAC, pois grande parte da semente obtida pelas empresas foram utilizadas para a semeadura de novos campos de produção, o que permite deduzir que a participação em área na agricultura brasileira das cultivares do IAC seja maior do que o valor mostrado acima. Salienta-se também que os dados apresentados referem-se ao processo legal de comercialização de sementes de feijão, não estando computado a utilização de sementes salvas pelos agricultores. No Brasil apenas 19% das lavouras comerciais de feijão utilizam sementes certificadas (ANUÁRIO ABRASEM, 2014).
A aceitabilidade das cultivares de feijão do IAC devem-se basicamente a qualidade de grão apresentada por atender as exigências do mercado brasileiro, como também, a resistência genética demonstrada para o patógeno da antracnose (Colletotrichum lindemuthianum), 11 sendo que, por meio de avaliações realizadas a resistência genética ao pató- geno promove uma redução ao redor de 30% no custo de produção do agricultor rural. Para a cultivar IAC Imperador, além das características citadas acima, a produtividade média obtida de aproximadamente 50 sacos de 60 kg por hectare, aliado a sua precocidade, tem permitido colheitas de 75 dias, a contar da semeadura a colheita, vem sendo bem procurada por agricultores de vá- rias regiões do Brasil.
A cada ano tem aumentado a procura por essa cultivar desde seu lançamento em 2012. Outras características como a resistência ao fungo de solo causador da murcha de Fusarium (Fusarium oxysporum), tal como conseguido na cultivar IAC Milênio, tem permitido também maior aceitabilidade da cultivar por parte dos agricultores.
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