Compradores de soja se preparam para negócios travados durante colheita em MT
Por Gustavo Bonato
PRIMAVERA DO LESTE, Mato Grosso (Reuters) - Compradores de soja em Mato Grosso, principal mercado do país, deverão continuar enfrentando resistência de boa parte dos produtores para fechar negócios de venda da nova safra 2016/17, mesmo com a aceleração da colheita, devido a preços pouco atrativos e boa situação financeira dos agricultores.
A colheita já começou em importantes regiões produtoras e ganhou ritmo nos últimos dias. Até o momento, contudo, as vendas antecipadas nos últimos meses têm ficado abaixo da média histórica, devido à relutância dos agricultores de finalizar negócios nos atuais patamares de preços.
De maneira geral, produtores de Mato Grosso tiveram boas margens de lucro nas últimas temporadas, o que deu a eles fôlego financeiro para evitar vendas em momentos de baixa nos preços.
Agentes do mercado ouvidos pela reportagem em importantes regiões produtoras do Estado acreditam que a situação de negócios mais travados deve perdurar nos próximos meses, mesmo com uma grande oferta física do grão.
"Essa venda no mercado 'spot' vai ser lenta. O produtor está capitalizado... Tem armazém sobrando e a tendência é o produtor esperar para o segundo semestre", disse o diretor da corretora ASP, Ademir José Sari, de Primavera do Leste, no sudeste de Mato Grosso.
Os negócios avançaram um pouco durante dezembro, mas chegaram ao início de janeiro ainda abaixo da média histórica. Segundo consultoria França Junior, as vendas da safra 2016/17 chegaram a 34 por cento em 6 de janeiro, ante 41 por cento da média de cinco anos. Em Mato Grosso, o índice ficou em 50 por cento, ante 53 por cento na média histórica.
O agricultor Jefferson Casteli, que plantou 750 hectares de soja em Primavera do Leste, é um bom exemplo de produtor na defensiva.
"Comprometi (antecipadamente) pouca soja. E agora os negócios estão parados... Como tenho armazém, a ideia é segurar o grão, talvez até o segundo semestre", disse ele, ao lado do silo que já está preparado para receber o resultado da colheita, nas próximas semanas.
Ele relata que tem recebido ofertas para vender a soja entre 64 e 65 reais por saca, mas "abaixo de 70 reais é prejuízo na certa".
Na região, em meados de 2016, houve negócios na faixa dos 90 reais por saca, devido a uma disparada do dólar. Essa lembrança também contribui para a sensação dos agricultores de que o momento não é ideal para fechar negócios.
ANO DIFERENTE
Executivos de tradings multinacionais que atuam na região projetam que apenas produtores que tiveram problemas graves de produtividade na safra passada, e que precisam quitar agora dívidas antigas, deverão estar no mercado nos próximos meses. Também deverão vender pequenos volumes aqueles que precisarem gerar caixa para pagar despesas do dia a dia da fazenda, como o óleo diesel para o maquinário.
"Do jeito que está, o produtor está relutante em vender", disse o gerente comercial de uma trading em Campo Verde (MT), que pediu anonimato.
Segundo ele, o principal entrave para os negócios é o nível de câmbio, que tem forte influência sobre os preços da soja em reais.
Na quinta-feira, a moeda norte-americana fechou no menor nível desde o início de novembro, no patamar de 3,17 reais. Nesta sexta-feira, operava em torno de 3,20 reais.
"Esse é um ano diferente e essa baixa comercialização atrapalha nosso planejamento", disse o executivo comercial de uma segunda trading, em Primavera do Leste. Segundo ele, a menor antecipação de negócios pode gerar descompasso entre os volumes originados e os previstos, prejudicando contratos de uso de ferrovia e de capacidade em terminais portuários.
E se os ofertantes de soja deverão estar retraídos, o lado da demanda também deverá ser morno no curto prazo, disseram os operadores.
"Nossa empresa já tem suas necessidades cobertas até maio", disse um executivo de uma terceira trading, também no sudeste de Mato Grosso, que pediu para não ter seu nome revelado.
Os agentes veem pouco espaço para fundamentos como as cotações em Chicago e os prêmios ofertados nos portos reagirem, o que despertaria maior interesse por parte dos agricultores. O cenário é de oferta confortável no mercado global, após uma safra recorde nos EUA e a colheita de mais de 100 milhões de toneladas no Brasil.
Na quinta-feira, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) reafirmou cenário de oferta abundante de soja, estimando os estoques globais na temporada 2016/17 acima de 82 milhões de toneladas, em níveis recordes.
Segundo o conceituado órgão norte-americano, a safra do Brasil deverá atingir um recorde de 104 milhões de toneladas e as exportações a marca histórica de 59,5 milhões de toneladas, colocando o país mais uma vez no topo do ranking dos maiores fornecedores globais da oleaginosa.
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