Comandante máximo, EDITORIAL DA FOLHA
Se o PT imaginava que a cassação de Eduardo Cunha(PMDB-RJ) daria ao partido algum fôlego para se recuperar do impeachment de Dilma Rousseff, o procurador da República Deltan Dallagnol tratou de desfazer o engano com acusações devastadorasdirigidas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Durante entrevista coletiva nesta quarta-feira (14), Dallagnol afirmou que Lula não poderia, como fez no mensalão, dizer que não sabia do petrolão. Ao contrário, o ex-presidente, nas palavras do procurador da República, foi "comandante máximo" do esquema identificado pela Lava Jato, "grande general" da corrupção e "maestro da orquestra criminosa".
Pesadelo para os petistas, as expressões devem ter soado como música para seus adversários. Diante da inevitável dilaceração política, Lula terá de pensar duas vezes antes de emprestar seu carisma a candidatos a prefeito —isso para ficar apenas no curto prazo.
Não se trata só das expressões. Todo o contexto de corrupção sistêmica descrito por Dallagnol converge para Lula, cuja posição central foi repetidas vezes lembrada por recursos visuais.
O conjunto de evidências, prossegue o procurador, faz concluir que os desvios de recursos públicos ocorriam em nome da governabilidade, da perpetuação no poder e do enriquecimento ilícito. Na infografia, tudo aponta para Lula: José Dirceu, depoimentos, mensalão, pessoas próximas na Lava Jato etc.
O petrolão, segundo Dallagnol, é apenas uma parte da corrupção. Ainda maior é o sistema que ele chamou de propinocracia, o governo regido pelas propinas —cuja existência seria impossível sem a participação do ex-presidente Lula.
Passado o momento espetaculoso, Dallagnol cedeu a vez a seus colegas Roberson Pozzobon e Julio Carlos Motta Noronha, que explicaram a denúncia de fato apresentada pelo Ministério Público Federal.
A acusação formal, ainda a ser apreciada pela Justiça, representou o anticlímax. Tratava-se, no caso de Lula, de corrupção passiva (R$ 87,6 milhões) e lavagem de dinheiro, envolvendo um tríplex em Guarujá e o armazenamento de bens pela OAS (total de R$ 3,7 milhões).
Não que seja pouco ou perdoável, mas causa estranheza que, num esquema descrito com tantas hipérboles, a parte do "comandante máximo" se resuma a valores inferiores aos obtidos por figuras sem expressão política.
Diga-se, em favor da força-tarefa da Lava Jato e do trabalho esmerado que tem realizado, que toda a apresentação é verossímil. A ninguém escapa, afinal, que Lula era o chefe político; daí a ser o chefe criminoso há uma distância que precisa ser superada com provas.
Verdade que não se sabe que outras surpresas os procuradores trazem no bolso, mas, ao menos por ora, fica a impressão de que, sem conseguir apesentar evidências mais robustas contra Lula, o Ministério Público Federal tenta suprir a lacuna com retórica.
O alvo principal
Por BERNARDO MELLO FRANCO, de BRASÍLIA - A força-tarefa de Curitiba elegeu Lula como o principal alvo da Lava Jato. A escolha já era conhecida, mas havia certo pudor em anunciá-la. Isso acabou nesta quarta (14), quando o procurador Deltan Dallagnol chamou o ex-presidente de "comandante máximo" do esquema de corrupção na Petrobras.
Em apresentação transmitida ao vivo pela TV, o procurador acusou Lula de estar no centro de uma organização criminosa destinada a "saquear os cofres públicos" e assegurar sua "perpetuação criminosa no poder". Ele resumiu a tese com um diagrama em que todas as setas apontam para o ex-presidente.
Repetindo o nome do petista a cada frase, Dallagnol o acusou de instaurar uma "propinocracia" no país. Nas palavras dele, o ex-presidente seria o "grande general" ou o "maestro da orquestra criminosa" -as metáforas transitavam entre os campos de batalha e as salas de concerto.
Num arroubo retórico, o procurador chegou a comparar Lula a um homicida que "foge da cena do crime após matar a vítima e depois busca silenciar as testemunhas".
Apesar da contundência verbal, a força-tarefa não denunciou o petista por organização criminosa. Ele foi acusado de receber vantagens de uma só empresa, a OAS, no total de R$ 3,7 milhões. A quantia é expressiva, mas não chega perto das somas desviadas por alguns funcionários de segundo escalão da Petrobras.
Por um lado, sobram indícios de que Lula manteve relações próximas demais com as empreiteiras do petrolão. Ele ainda não deu explicações convincentes para a generosidade das empresas, que não costumam agradar políticos por filantropia.
Por outro lado, a força-tarefa parece não ter provas suficientes para sustentar que o ex-presidente era o líder de uma organização criminosa que usava as horas vagas para governar o país. Para bancar essa acusação, Dallagnol e seus colegas precisariam apresentar menos frases de efeito e mais evidências.
Lula enfrenta o adversário mais desafiador: a lei (por JOSIAS DE SOUZA, no UOL)
Lula deixou a Presidência como recordista de popularidade, com uma aliada na sua poltrona e convencido de que retornaria ao cargo máximo da República. Hoje, Lula coleciona taxas de rejeição acima dos 50%, acaba de assistir à deposição de sua pupila e enfrenta o medo de parar na cadeia. Lula ganhou uma nova qualificação. O procurador Deltan Dellagnol, coordenador da força-tarefa de Curitiba, enganchou no título de ex-presidente a designação de “comandante máximo de corrupção na Lava Jato.”
A denúncia inaugural enviada ao juiz Sérgio Moro injeta o tríplex do Guarujá e o aluguel de contêiners pela OAS no contexto geral da corrupção, caracterizando Lula como ''general'' da bandalheira. E ainda há muito por vir. Lula é acusado ou suspeito —em Curitiba e alhures— de corrupção passiva, lavagem de dinheiro, tráfico de inflência, obstrução da Justiça e formação de quadrilha. Traduzindo-se o pesadelo do linguajar do Código Penal para o português das ruas, Lula foi reduzido à condição de um reles suspeito de se beneficiar de dinheiro sujo.
No final de janeiro, em entrevista a um grupo de repórteres-companheiros, Lula jactou-se: “Não sou investigado!” Crivado de suspeitas já àquela altura, permitiu-se um instante de autocongratulação: “Se tem uma coisa de que me orgulho é que não tem, nesse país, uma viva alma mais honesta do que eu.” Decorridos oito meses, o personagem é réu em Brasília e denunciado em Curitiba.
Lula lutou para fugir de Sérgio Moro. Sua penúltima tentativa resultou numa bronca do ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal. Ao negar novo pedido da defesa do ex-presidente para suspender inquéritos que correm contra ele em Curitiba, Teori anotou que a peça não passava de mais uma das inúmeras tentativas de “embaraçar as investigações.”
O morubixaba do PT tem motivos para temer Sérgio Moro. Sem alarde, o juiz encostou a Lava Jato na jugular de Lula. Primeiro, avalizou a inclusão do tríplex 164-A, que a OAS reservara para a família Silva no célebre prédio do Guarujá, no rol de imóveis investigados na Operação Triplo X.
Na sequência, Moro liberou a Polícia Federal para abrir, na mega-investigação do assalto à Petrobras, um inquérito específico sobre o sítio de Atibaia, cuja utilização foi terceirizada a Lula —livre de ônus e sem prazo— por dois sócios do primogênito Fábio Luiz da Silva, o Lulinha.
Logo, logo Moro enviará Lula ao banco dos réus. E estará pronto para intimá-lo a prestar depoimentos. Nessa hora, a pose de perseguido político e as notas oficiais do Instituto Lula terão pouca serventia. O depoente terá de oferecer explicações. Algo que vem sonegando até aqui. Talvez por não dispor de matéria-prima.
Lula enfrenta agora o adversário mais implacável de toda sua carreira: a lei. Contra esse rival, sua retórica fácil, os palanques e as plateias amigas terão pouca serventia. O trabalho da força-tarefa da Lava Jato acaba de tornar Lula candidato a uma pena de pode variar de 4 anos a 16 anos de cadeia. De resto, Lula virou também candidato a ex-candidato às eleições presidenciais de 2018.
Vende-se de tudo no Congresso, menos honra
Assim começou o depoimento de Léo Pinheiro, mandarim da OAS, ao juiz Sérgio Moro: “…Eu cometi crimes e, para o bem da Justiça do nosso país, para o bem da nossa sociedade, eu estou aqui para falar a verdade e dizer tudo o que eu sei.” Contou que comprou proteção para sua empresa na CPI da Petrobras.
Os ex-senadores Vital do Rêgo (PMDB-PB) e Gim Argello (PTB-DF), presidente e vice-presidente da CPI, cobraram R$ 5 milhões contou Léo. Receberam R$ 2,85 milhões. O deputado Marco Maia (PT-RS) cobrou R$ 1 milhão para aliviar a barra da OAS em seu relatório. Sem descontos.
Num dos encontros, na casa de Gim Argello, estava presente o então ministro Ricardo Berzoini (PT-SP), responsável à época pela coordenação política do governo Dilma Rousseff. Ele disse que falava em nome do governo. Manifestou a preocupação do governo com o “andamento” da CPI e pediu que a empresa “colaborasse no que fosse possível”.
Como de costume, os acusados negaram os crimes. Berzoini admite o encontro. Mas diz que foi à casa de Gim Argello para discutir a pauta de votações do Congresso, não a emboscada contra a CPI.
Não é a primeria vez que a Lava Jato esbarra em suspeitas que avacalham o instituto da investigação parlamentar. Colecionaram-se evidências de que o ex-presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE), já morto, mordeu R$ 10 milhões da Queiroz Galvão para sabotar outra CPI da Petrobras.
A Lava Jato reforça a impressão, já bem generalizada, de que o Congresso é meio bazar, meio bordel. E ainda pode se revelar meio confessionário se Eduardo Cunha resolver suar o dedo nos depoimentos que sera intimado a prestar.
Comercializa-se de tudo no Legislativo: relatórios de CPIs, contrabandos em medidas provisórias… Vendem-se almas no varejo e a consciências no atacado. Só não há na gôndola do Parlamento um tipo de mercadoria: honra. Os 10% que ainda prezam a própria honra não vendem. Os outros 90% topariam vender até a honra, mas não têm como oferecer certificado de garantia.
– Serviço: Vão abaixo os três vídeos com a íntegra do depoimento de Léo Pinheiro ao juiz da Lava Jato.
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