Juiz determina que BNDES libere dados pedidos pela Folha de S. Paulo

Publicado em 20/08/2015 04:48
Leia mais na edição desta quina-feira da Folha de S. Paulo

Juiz determina que BNDES libere dados pedidos pela Folha

TRF-2 mandou que banco envie relatórios sobre empréstimos a partir de R$ 100 mi

DE SÃO PAULO

O TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região) determinou, em decisão provisória, que o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) repasse à Folha relatórios internos sobre a aprovação de empréstimos com valores a partir de R$ 100 milhões entre abril de 2011 e dezembro de 2014.

É a segunda ação que o jornal move para obter documentos negados pelo banco via Lei de Acesso à Informação. A primeira está no STF (Supremo Tribunal Federal), com relatoria do ministro José Antonio Dias Toffoli.

Todas as operações aprovadas no BNDES são examinadas antes pela burocracia do banco, que expõe suas conclusões em documentos conhecidos internamente como "relatórios de análise".

Os documentos descrevem a situação das empresas que pedem recursos ao BNDES, discutem as razões que justificariam o apoio do banco e os riscos de cada operação.

A instituição não divulga essas informações, alegando que são protegidas por sigilo bancário, e por isso a Folha moveu na Justiça duas ações contra o presidente do banco estatal, Luciano Coutinho.

Ao considerar válido o pedido de tutela antecipada –quando a solicitação é atendida antes de o mérito do processo ser julgado–, o desembargador Guilherme Calmon Nogueira da Gama argumentou que os dados têm interesse jornalístico por sua "característica de atualidade".

A decisão do magistrado foi dada em caráter liminar, ou seja, provisório –à qual cabe recurso. Caso não consiga outra liminar, suspendendo a decisão em favor do jornal, o BNDES deverá enviar os dados pedidos após receber o ofício da Justiça.

 

CLÓVIS ROSSI

O PT perdeu a rua

Desafio do partido é demonstrar hoje que ainda mantém alguma capacidade mobilizadora

A mobilização desta quinta-feira (20) "em favor da democracia", segundo a propaganda de TV do PT, é um tremendo desafio para o partido: terá que mobilizar gente suficiente para provar que não perdeu as ruas, ao contrário do que escreveu Eliane Brum, uma das mais brilhantes jornalistas brasileiras, em sua coluna para o "El País".

Eliane se referia ao fracasso do ato em defesa do Instituto Lula, no mesmo domingo (16) da grande mobilização contra o governo Dilma Rousseff e contra o PT.

Fracasso medido em números: mesmo que houvesse as 5 mil pessoas contabilizadas pelos organizadores e não apenas as 600 apontadas pela PM, ainda assim seria menos de 5% dos que foram à Paulista (135 mil, para o Datafolha).

Pior: os "coxinhas" da Paulista se locomoveram por conta própria, ao passo que o "povo" do Instituto Lula teve que ser carregado por ônibus alugados pelos organizadores.

O ato desta quinta já começa mal: embora seja, evidentemente, um movimento de contraposição ao "fora Dilma" da Paulista, o PT não teve coragem de assumir essa característica. Preferiu enrolar a manifestação na bandeira da democracia, valor universal que só é contestado por meia dúzia de energúmenos.

Compreende-se o engodo: se fosse a favor do governo, não iria ninguém, dada a inédita rejeição da presidente. O governo é rejeitado até entre organizadores do ato: o governo é "indefensável do ponto de vista da política econômica e do ajuste fiscal que vem conduzindo", diz Guilherme Boulos, coordenador do MTST (Movimento dos Trabalhadores sem Teto).

Para Eliane Brum, "o partido das ruas perdeu as ruas porque acreditou que não precisava mais caminhar por elas". De fato, o PT, ao chegar ao poder, preferiu acomodar-se aos gabinetes e aos "super-coxinhas", como são os empresários e, entre eles, os executivos das empreiteiras. Luiz Inácio Lula da Silva, o líder maior do partido, é o grande exemplo: deixou o torno (há muitíssimo tempo, aliás) para se tornar companheiro das empreiteiras que o PT não se cansava de criticar quando elas faziam negócios com governos de outros partidos.

Frei Betto, de impecáveis credenciais petistas, localiza o início do divórcio com as ruas no momento em que o PT chegou ao poder federal.

"Trocou um projeto de país por um projeto de poder", afirmou o dominicano em uma recente entrevista à Folha.

Consequência inescapável: não é que o PT tenha perdido as ruas, como diz Eliane. Foi expulso delas, durante as manifestações de junho de 2013, lembra-se?

É uma perda mensurável: até aquele momento, o PT era o partido de preferência de 29% dos eleitores. Hoje, tem a simpatia de apenas 9%, apoio idêntico ao da presidente, lembra o "El País".

Para desmentir Eliane Brum, o PT terá que pôr nas ruas, no mínimo, o mesmo número de manifestantes contra ele no domingo.

Não é possível que, num país como o Brasil, haja mais "coxinhas" que "povo". E, ainda assim, será difícil medir quem foi para gritar "fica Dilma" e quem foi para gritar "fora Levy", superministro de Dilma.

 

VINICIUS TORRES FREIRE

Esfolar o povo à toa

"Ajuste" segue adiante, arrasando a vida cotidiana, mas política joga sacrifício no lixo

O PREÇO DO ALUGUEL de residências caiu mais de 11% em um ano, até julho, na cidade de São Paulo. Queda em termos reais, descontada a inflação medida pelo IPCA, conta feita com dados divulgados ontem pelo Secovi, o sindicato das empresas que negociam imóveis.

A recessão está solta nas ruas, parte do povo é esfolada, como de hábito e inevitável, sofrimento ainda mais gratuito e talvez prolongado porque não se percebe princípio algum de ordem, direção e sentido no que se faz em Brasília.

O massacre do ajuste econômico também derruba salários, como se sabe, que caíram em média quase 3% de um ano para cá, nas grandes metrópoles. As vendas em supermercados caíam 1,7% neste ano contado até junho, dado mais recente disponível.

A preços internacionais, "em dólar", o salário médio no país está sendo barateado, tendo voltado ao patamar de 2007, mais ou menos, quando a taxa de câmbio real não devastava a indústria e suas exportações (trata-se aqui da relação câmbio-salário, corrigida pela produtividade). Sim, isso significa "ajuste".

Apesar de consumo em baixa e repressão salarial na prática, a inflação resiste, o início da razia no mundo do trabalho está longe de bastar para reanimar empresas. De novo, sim, isso significa "ajuste". Ainda permanecerá à beira dos 10% ao ano até o Natal, pelo menos. A inflação de alimentos anda pela beira de 11%.

Tarifaço de serviços públicos, indexações formais e informais, descrença restante no Banco Central e o dólar sustentam a inflação e vão atrapalhar a retomada, embora sejam efeitos da limpeza do entulho deixado pelo governo anterior, cortesia ruinosa de Dilma 1.

Parte da viagem do dólar às alturas se deve decerto a tumultos na economia mundial, do qual estamos ora esquecidos, dada a superoferta doméstica de problemas. Parte se deve justamente à catadupa nacional de desastres, burrices, pequenez política e outras mesquinharias sórdidas.

O que resta do governo Dilma 2, basicamente Joaquim Levy, é solapado pelas almas penadas do Planalto e pelo próprio PT. Esses pacotes de socorro via bancos públicos, embora em si mesmo nem façam estrago direto relevante, agora, começam a dar um ar de terra de ninguém à política econômica, já um tanto devastada pelo esfarelamento do ajuste fiscal proposto no início do ano.

Há, óbvio, os cavalões e cavalinhos do apocalipse. O Congresso, abertas as porteiras, sem mata-burros ou mata-loucos, continua a depredar a economia do país, com apoio de alguns lobbies de partes do funcionalismo público e do dito empresariado.

Além de dar sobrevida a Dilma Rousseff, o "acordão" não fez e ainda não tem cara de fazer nada por um acordo mínimo a respeito de mudanças urgentes e de médio prazo. Um plano com três ou quatro dezenas de itens, de resto, é ridículo.

Não há coordenação de partidos, nem de bancadas, lideranças capazes ou interessadas em recolocar alguma ordem no Parlamento. Pelas atitudes recentes, não se nota que a presidente tenha reconhecido o tamanho da encrenca econômica ou política, realimentando ela mesmo crises palacianas, por exemplo.

Em suma, o sacrifício do ajuste em parte é crueldade pura, pois é consumido pela crise política contínua.

MONICA BAUMGARTEN DE BOLLE

Agenda Brasil

 
A Agenda é nada além de uma lista de boas intenções desconectada da realidade política e social do país
 
O que esperar quando a presidente da República, assombrada pelos mais baixos índices de aprovação da história, emparedada pelo Congresso e atormentada pelos protestos agora explicitamente dirigidos contra ela, resolve formular agenda para "avançar" selando pacto com um dos menos confiáveis membros de sua coalizão?
 
Como avaliar a probabilidade de sucesso da chamada agenda positiva, que inclui não menos do que 43 medidas? Medidas que abrangem temas contenciosos como reforma trabalhista e previdenciária, além de uma aderência mais rigorosa à Lei de Responsabilidade Fiscal?
 
Essas são algumas das perguntas que cercam a Agenda Brasil, suposta solução para os impasses que travaram o país.
 
Antes de prosseguir, adianto revelação nada surpreendente: algumas propostas incluídas na Agenda Brasil seriam de extremo benefício para o país. A instituição formal de limites para a dívida pública brasileira, previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal e contemplada na Agenda Brasil, é urgente. A adoção de travas para o endividamento público não apenas melhoraria a solidez das contas públicas à frente como impediria estripulias tentadoras: os vultosos e sistemáticos repasses do Tesouro para o BNDES, a farra das operações compromissadas, que, nos últimos anos, deixaram de ser mero instrumento de gestão de liquidez do Banco Central e se tornaram mecanismo de financiamento indireto do governo.
 
Contudo, a Agenda é ambiciosa. Para restaurar a governabilidade, o pacto firmado entre Dilma e Renan Calheiros prevê a aprovação pelo Congresso de ao menos 5 das 43 medidas. São elas, segundo noticiou recentemente o "Valor Econômico": a reforma do PIS/Cofins, os dois tributos mais complexos do emaranhado sistema tributário brasileiro; a desvinculação das receitas para flexibilizar os gastos, algo que se persegue há anos sem sucesso; a reoneração da folha de pagamentos, medida rechaçada por Renan, hoje bandeira do Senado, o último bastião de estabilidade, nos diz seu líder; a flexibilidade do mercado de trabalho, ignorando os sindicatos, doa a quem doer, duela"¦ Deixe para lá. Como se isso não bastasse, o governo também vai lutar pelo aumento da idade de aposentadoria para 65 anos.
 
Cada uma dessas medidas está há décadas sob discussão sem que se chegue a um consenso. Afinal, os interesses dos sindicatos, dos aposentados, dos desempregados, dos trabalhadores, do próprio governo chocam-se frontalmente uns com os outros. Sem falar que algumas das medidas contidas na Agenda Brasil teriam impacto de curto prazo possivelmente negativo sobre uma economia já em frangalhos.
 
Portanto, a expectativa de que um governo fraco, com baixíssima aprovação, enfrentando a ameaça de protestos e convulsões sociais, além de um Congresso abertamente hostil, seja capaz de levar adiante essa "solução" para a crise é difícil de sustentar.
 
Nos últimos dias, parece ter aumentado a percepção de que está nas mãos da presidente Dilma dar direção ao país mostrando liderança e dialogando com o Congresso. Ora, tal percepção se esborracha quando se toma a Agenda Brasil por aquilo que de fato é: nada além de uma lista de boas intenções desconectada da realidade política e social do país, amparada em aliança para lá de frágil. Durma-se com mais um barulho desses.
 
MONICA BAUMGARTEN DE BOLLE, economista, é doutora pela London School of Economics e pesquisadora do Peterson Institute for International Economics.

BB lança em 15 dias pacote para agricultura

Petróleo e gás e construção civil serão os beneficiados seguintes, diz presidente do banco em entrevista à Folha

"Estamos muito preocupados; se houver desemprego, pode haver aumento da inadimplência"

MARIA CRISTINA FRIASCOLUNISTA DA FOLHANATUZA NERYEM SÃO PAULO

O presidente do Banco do Brasil, Alexandre Abreu, 49, antecipou quais os próximos setores a receber crédito da instituição: cooperativas agrícolas, petróleo e gás e construção civil. Mais R$ 9 bilhões serão destinados a financiar ramos específicos da cadeia produtiva brasileira.

Em entrevista à Folha ele afirma que a injeção de mais dinheiro no mercado é uma estratégia comercial do banco para evitar o crescimento da inadimplência, não uma política de governo nos moldes do socorro feito durante a crise internacional de 2009.

"Não vai ser uma elevação de crédito abrupta, mas, sim, suave", disse Abreu.

Na terça (18), a presidente da Caixa, Miriam Belchior, ao anunciar política de crédito de bancos públicos que começa pelo setor automotivo, disse que se tratava de uma ação conjunta patrocinada pelo Palácio do Planalto.

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Folha - O governo novamente usou os bancos públicos para salvar a economia?
Alexandre Abreu - É uma estratégia do Banco do Brasil desenhada para alguns setores. Não utilizamos nenhum tipo de recursos públicos. O momento é bastante desafiador da economia, em que temos diversos setores produtivos reduzindo em vendas e com dificuldades de atravessar este momento.

Reedição da política de 2009?
Fizemos naquela época uma estratégia mais ampla. Era estrategicamente adequado ampliar participação de mercado –hoje estamos com 21%. E há setores com queda muito forte de vendas. É preciso ser cirúrgico.

Além do automotivo, quem terá mais crédito?
Cooperativas agrícolas serão as próximas. Sai em umas duas semanas. Dos R$ 9 bilhões de aumento de crédito, R$ 2,3 bilhões vão para o setor agro. Depois vem petróleo e gás, em uns dois meses.

Vamos incluir o setor de construção civil também.

Com a Lava Jato, é seguro emprestar para empreiteiras?
Não se pode generalizar. Para algumas, sim, outras, não. Não acredito em risco sistêmico.

A qual taxa de juro?
Não tenho juro subsidiado, então vou trabalhar com o que eu tenho. A gente está reduzindo taxa de juro baseada na redução do risco. O objetivo é manter o emprego, mas achamos muito difícil controlar isso. A empresa vai assumir o compromisso, mas não haverá meta no contrato.

É só uma carta de intenções?
Exatamente.

Por que o Ministério da Fazenda e o BB não estavam presentes no anúncio da Caixa?
É uma estratégia comercial de cada banco, não uma política de governo.

Não foi isso o que disse a presidente da Caixa.
O governo está evidentemente sabendo. O BB financiará as empresas menores que fornecem para as empresas líderes de mercado. Vincularemos os empréstimos às pequenas ao fluxo de recebíveis das grandes. Teremos ciência do quanto as empresas líderes planejam comprar de suas fornecedoras.

É uma espécie de fiador?
Praticamente. Isso vai diminuir o número de demissões. Estamos muito preocupados. Se houver desemprego, pode haver aumento da inadimplência da pessoa física. Não vai ser uma elevação de crédito abrupta, mas sim suave. Queremos atingir empresas que precisam, mas de forma menos arriscada.

O banco levanta R$ 9 bilhões de crédito, mas o BC eleva a Selic [taxa básica], inibindo o crédito. Não é contraditório?
As empresas e as pessoas continuam necessitando de crédito. Esse projeto procura fazer isso. Claro que a taxa de juros mais alta ela tende a induzir o crescimento do crédito e compete a nós encontrar maneira de continuar trabalhando para dar crédito sem elevar nossos riscos.

Banqueiro não gosta de juro alto?
Discordo. Quando você tem juros mais altos, tem mais inadimplência. O que banqueiros e bancos não gostam é de inadimplência.

Investidores estão querendo investir aqui?
Sim. A crise dá essa oportunidade. Os ativos brasileiros ficaram baratos. Os investidores estão procurando ativos. O mercado de fusões e aquisições deve crescer. O país está barato.

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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