O maior de todos os males
Os males começaram com a crise de crédito de 2008, sucedida pela questão climática. Em 2009, choveu demais durante toda a colheita de cana-de-açúcar, que normalmente se inicia em maio e vai até novembro. Com a chuva, quase 60 milhões de toneladas de cana ficaram de pé -não foi possível colhê-las.
Além disso, os terrenos em que o canavial foi colhido com chuva ficaram bastante prejudicados com o trânsito de máquinas e caminhões pesados, reduzindo a brotação para o ano seguinte. Chegamos a 2010 com canaviais "pilados" e canas cortadas com atraso, e, portanto, menos desenvolvidas.
E 2010 teve uma seca tremenda, reduzindo a produção total de cana em cerca de 50 milhões de toneladas. Com um agravante: a brotação das soqueiras para 2011 foi péssima, reduzindo o número de plantas por hectare e deixando-as mais fracas e sujeitas ao ataque de pragas e de doenças. Como consequência, já se fala em "quebra" de safra deste ano superior a 10% sobre a passada, que já foi menor do que a normalidade. Em resumo, três anos seguidos de queda de produção.
Além disso, os investimentos em novas usinas diminuíram drasticamente após a crise de 2008. Até aquele ano, o setor crescia 10,5% ao ano; hoje, mal chega a 3% ao ano. Como tinha cana já plantada, sem moagem adicional, as safras se alongaram, com mais problemas.
Por outro lado, a demanda continuou aquecida, sobretudo pela venda de carros flex, mas também pelo surgimento de novos usos para o etanol, como a alcoolquímica e outros projetos formidáveis, como é o caso dos bioplásticos, da química fina, dos bio-hidrocarbonetos e do bioquerosene para aviação. Uma empresa norte-americana de tecnologia instalada no Brasil, a Amyris, já está produzindo diesel a partir da garapa da cana, de maneira competitiva e eficaz, além de outros produtos da mesma matéria-prima.
Como não se constrói uma usina de etanol de um ano para o outro -especialmente devido ao longo prazo necessário para a implantação dos canaviais essenciais-, não há um horizonte claro de diminuição de preços.
Isso se considerarmos apenas o mercado interno, sem falar na provável abertura do mercado norte-americano, onde nosso etanol já é considerado "avançado" em relação ao de milho produzido por lá, e onde se fala insistentemente na redução do subsídio para a produção desse combustível.
Por fim, cresce globalmente o interesse pelo etanol como combustível renovável e mitigador do aquecimento global.
Tudo isso exige uma estratégia vigorosa para o setor, tanto governamental como privado.
E essa estratégia deve ser de longo prazo, viabilizando a retomada do crescimento de um setor altamente promissor e que vinha atraindo o interesse de poderosos grupos nacionais e estrangeiros.
Mas nada de intervencionismo, coisa retrógrada e que não resolve nada, salvo limpar a cara do governo que não se move há anos em termos estratégicos.
E há temas de fundo para resolver. É o caso dos preços "administrados" da gasolina desde 2005, que impõe um teto aos do etanol: isso inibe investimentos porque comprime a lucratividade.
A questão tributária também pesa bastante e precisa ser revista, reconhecendo as externalidades sociais e ambientais do biocombustível.
A estocagem é outro ponto importante, uma vez que a safra se dá em oito meses e o consumo, em 12. Quem banca isso, sendo o etanol um produto estratégico?
Enfim, é preciso montar uma estratégia eficiente para promover um setor capaz de mudar a geopolítica global. O maior de todos os males será seu desequilíbrio, porque isso desestrutura novos projetos que são indispensáveis para a retomada sustentável da oferta.
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