Mercado de açúcar: "A grave crise está longe de acabar" (análise da Archer)
O mercado de açúcar continua a percorrer um caminho de agonia que atravessou os 10 centavos de dólar por libra-peso e se dirige agora a caminho dos 9 centavos, reverberando a crise mundial provocada pelo coronavirus, o derretimento do preço do petróleo no mercado internacional inaugurando preços negativos e a desvalorização acentuada do real (que chegou a 5.7480 na sexta) estimulada pela tensão política produzida pela inépcia do presidente Jair Bolsonaro.
NY encerrou a semana com o vencimento maio/2020 ajustado a 9.68 centavos de dólar por libra-peso, uma queda de 69 pontos na semana, equivalentes a pouco mais de 15 dólares por tonelada. Como dissemos há duas semanas aqui nesse espaço, o açúcar teria muita dificuldade em se manter acima dos 10 centavos de dólar por libra-peso em vista do problemático cenário mundial. Pensamos que pudesse se recuperar nas semanas seguintes, mas o quadro agravou-se.
Os fundos não-indexados aumentaram a posição vendida e agora estão com 65,000 contratos. O Brasil, se exportar 21-23 milhões de toneladas de açúcar nesta safra, pode ter ainda para fixar entre 70 e 90 mil contratos.
Parece haver pouca dúvida de que teremos um substancial aumento na produção de açúcar para esta safra. Nosso número para o Centro-Sul é de 35.8 milhões de toneladas de açúcar, mas alguns analistas colocam esse volume perto dos 38 milhões de toneladas de açúcar.
Se argumentarmos que a colocação desse volume imenso no mercado internacional é extremamente complicada, seria bastante razoável admitir que deveremos ter uma entrega substancial de açúcar contra as telas de julho/2020 (que expira em 30 de junho) e de outubro (que expira em 30 de setembro) aumentando a pressão sobre os spreads. O vencimento julho, por exemplo, negocia com desconto de 11.8% a.a. em relação ao vencimento outubro que, por sua vez, negocia com um deságio de 18% a.a. em relação ao vencimento março de 2021.
Alguns analistas acreditam que o impacto do coronavirus pode diminuir o consumo mundial de açúcar entre 5 e 13 milhões de toneladas. Exatamente no momento em que teremos que produzir mais açúcar porque também o mercado de energia vai sofrer um enxugamento de demanda sem precedentes. É mandatório que o governo federal implemente o financiamento de estoques de etanol de maneira rápida e eficiente.
O preço da soja no Brasil continua quebrando novos recordes. A saca da soja chegou a R$ 105 em alguns portos. Quanto será que vamos perder de área de cana plantada para a soja que remunera muito mais? A cana tem um custo muito alto com o corte, o carregamento e o transporte, comparativamente à soja, por exemplo.
Caros leitores, vocês se recordam quando aprenderam na escola que o preço de qualquer bem não poderia ser menor do que zero? E que o preço de nenhum produto poderia cair mais do que 100%? Pois é, esqueçam o que vocês aprenderam, pois o ano de 2020 veio para quebrar paradigmas. E nem chegamos a um terço do ano ainda.
Explicando: o contrato futuro do petróleo WTI, no vencimento maio, em seu último dia de negociação chegou a ser negociado a incríveis 40 dólares negativos por barril. É uma situação inédita e muito rara chamada long squeeze.
Menos comum que o short squeeze, movimento de alta acelerada no preço de uma commodity motivado pela cobertura apressada daqueles que estão vendidos, provavelmente reagindo a algum evento fundamentalista que o provocou, no caso raro de um long squeeze, aqueles que detém o produto, na iminência de recebe-lo e não tendo como armazená-lo, seja por falta de capacidade disponível, seja pelo alto custo de fazê-lo, livram-se da mercadoria vendendo a qualquer preço, mesmo pagando para que alguém fique com ela.
O ineditismo dessa bizarra situação chegou ao ponto de os traders começarem a se preocupar em como precificar de maneira correta o valor de uma opção sob um cenário de enormes incertezas e turbulências como esse. Esclarecendo: o preço justo de uma opção é calculado pela fórmula de Black & Scholes, criada em 1973 e uma das ferramentas mais utilizadas no mercado financeiro. Ocorre que toda a dedução da fórmula – e vamos poupar vocês das tecnicalidades – pressupõe que os preços do mercado seguem uma distribuição log-normal, que sendo mais simplista possível, significa que a fórmula pressupõe valores negociados no terreno positivo. Ela não funciona para valores menores que zero. E agora?
Para contemplar essa inusitada circunstância, a Bolsa informou a todos os interessados que a partir de agora e até nova ordem ela vai utilizar o modelo de apreçamento e avaliação de opções de Bachelier, de 1900, para poder acomodar valores negativos e permitir a listagem de opções com preço de exercício negativo para uma série de ativos (gasolina RBOB, petróleo WTI e Brent). O resumo de ópera é o seguinte: evidentemente que as puts (opções de venda) vão valer muito mais do que valiam no modelo anterior. Bachelier foi um matemático francês, nascido em 1870, e que influenciou Fischer Black e Myron Scholes, ganhadores do Nobel em 1997 pela fórmula que criaram. Bachelier era considerado o precursor da teoria moderna das probabilidades e fundador da matemática financeira. Trocamos 1973 por 1900.
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A saída do Ministro da Justiça Sérgio Moro por não concordar com a ingerência do presidente na cúpula da Polícia Federal marca o início do fim do governo Bolsonaro. Com a saída de Moro, perde o Brasil e ganham os políticos corruptos, pois a mudança de comando na PF deve afrouxar o combate à corrupção. Há décadas o Brasil mantém a triste sina de ver o cargo máximo da República ser ocupado por pessoas desqualificadas que se servem do País ao invés de a ele servirem. Nem o PT com todas suas mazelas conseguiu imiscuir-se na Policia Federal. Se comprovado, o crime de Bolsonaro é grave. E nem chegamos a um terço do ano ainda.
Uma frase de Bertrand Russell bem apropriada para esses tempos sombrios: “O problema do mundo de hoje é que as pessoas inteligentes estão cheias de dúvidas, e as pessoas idiotas estão cheias de certezas”.
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Lygia Pimentel, CEO da Agrifatto, lançou o livro “Administre o risco de preços pecuários: um guia prático para o hedge de sucesso”, o qual tive a oportunidade de ler antes do lançamento. A publicação discorre sobre as ferramentas para a administração de risco de preços pecuários ou hedge. É sempre auspicioso ver crescer o interesse das empresas pela gestão de risco. Você pode conhecer mais sobre o livro no link www.agrifatto.com.br/loja
Um bom final de semana
Arnaldo Luiz Corrêa
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