CPR tem embasamento legal para integrar processos de recuperação judicial, diz advogada
O procedimento de recuperação judicial é previsto na Lei 11.101/2005. Nos termos de seu art. 1º, possuem legitimidade para ingressar com o pedido o empresário e a sociedade empresária. De acordo com o art. 48 da mesma lei, um dos requisitos é o exercício regular da atividade empresarial por mais de dois anos.
A doutrina e a jurisprudência brasileira têm admitido que o produtor rural que atua como pessoa física ingresse com o pedido desde que obtenha o registro perante a junta comercial antes do protocolo do pedido e comprove o exercício regular da atividade rural pelo período de dois anos.
No fim de 2019 o Superior Tribunal de Justiça entendeu bastar ao produtor rural obter o registro mercantil antes do pedido e comprovar a atividade empresarial rural pelo biênio exigido, submetendo todas as dívidas ao procedimento da recuperação judicial.
Desde então, vem à tona assuntos referentes à sujeição de créditos ao procedimento, tendo em vista que os credores, em especial tradings e bancos, não admitem a sujeição de seus créditos, principalmente quanto ao crédito originário de Cédula de Produto Rural (CPR). Os credores detentores dessa modalidade de contrato utilizam diversos artifícios argumentativos para criar óbices à sujeição.
Todavia, observada a lógica-racional-normativa disposta no Código Civil e na Lei de Recuperação Judicial, caem por terra os argumentos terroristas abordados pelos credores, para que a CPR não seja atingida pelo procedimento.
A CPR, um dos principais instrumentos do financiamento rural, foi instituída pela Lei nº. 8.929/1994 como título representativo de promessa de entrega de futura produção agrícola. O devedor, muitas vezes mediante recebimento antecipado de valores ou insumos, se obriga a entregar a produção ao credor. O instrumento é garantido pelo penhor agrícola da safra produzida, a qual deve ser entregue ao credor.
Como é sabido o penhor agrícola, nada mais é, que uma garantia real ao cumprimento da obrigação , devidamente esculpido nos artigos 1.438 a 1.443 do Código Civil.
Assim, conforme estabelecido pelo próprio Código Civil, não restam dúvidas que o penhor agrícola é uma modalidade de garantia real, assim como a hipoteca e a anticrese.
Ora, é ilógico que os contratos garantidos por hipoteca se submetam irrestritamente à recuperação judicial e o penhor agrícola gere tantas discussões.
Observando o disposto na Lei de Recuperação Judicial, é ainda mais claro a sujeição da CPR ao procedimento, haja vista que em seu art. 41, III , resta estabelecido que os créditos com garantia real são sujeitos ao procedimento recuperacional. Ademais nos termos do art. 49: “Estão à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.”
Para que não restem dúvidas acerca do tema na legislação recuperacional, o inciso III do art. 51, dispõe que o pedido de recuperação judicial será instruído com “a relação nominal completa dos credores, inclusive aqueles por obrigação de fazer ou de dar (…)”. O disposto comprova quando se trata de obrigação de entrega de grãos, esta é sujeita ao processo.
Não obstante, conforme o próprio intuito do procedimento recuperacional previsto no art. 47 da Lei 11.101/2005, a não sujeição da CPR ao procedimento inviabilizaria a manutenção da atividade, bem como o interesse dos credores, impedindo a superação da crise econômico-financeira dos devedores.
Em suma, é indiscutível que o penhor agrícola é uma modalidade de garantia real e, consequentemente, a CPR garantida por penhor agrícola está sujeita ao procedimento de recuperacional.
Visando a exclusão da CPR do processo de recuperação judicial, quando do projeto de conversão da medida provisória do agro em lei, era prevista a
exclusão dos créditos vinculados à CPR em casos de recuperação judicial. No entanto, após longas discussões no Congresso Nacional, tal prerrogativa restou suprimida no texto-base aprovado quando convertido na Lei nº 13.986/20 (Lei do Agro).
Porém, seguindo a mesma direção, e visando favorecer os credores do agronegócio, restou disposta na Lei do Agro duas novas possibilidades garantidas à CPR: a alienação fiduciária e a criação do patrimônio rural em afetação.
O instituto da alienação fiduciária já é bem conhecido pela sua “exclusão” do procedimento recuperacional, conforme previsto no parágrafo 3º do artigo 49 da Lei de Recuperação Judicial .
Com a criação do patrimônio rural em afetação, é possibilitado o fracionamento e segregação do patrimônio do devedor, destinando a prestar garantia à CPR. Segundo a lei, a CPR garantida por esse instituto não será atingida pelos efeitos da recuperação judicial .
Essas novas modalidades de garantia, tornam a CPR muito mais agressiva ao patrimônio do produtor rural, tendo em vista que em caso de inadimplência, não resta alternativa senão a perda do bem objeto de garantia, além de não se sujeitarem processo de recuperação judicial.
Além do disposto na Lei do Agro, recentemente, foram apresentadas emendas ao PL 6.229/2005, que objetiva reformular a Lei 11.101/2005, destacando-se a Emenda 11 que estabelece a exclusão da CPR do procedimento recuperacional.
Caso o Projeto de Lei seja aprovado desta forma, a recuperação judicial de produtores rurais será severamente impactada. Posto isto, por exata disposição legal, enquanto não temos nenhuma reforma legislativa, a CPR somente poderá ser excluída do procedimento recuperacional quando for garantida pelo patrimônio rural em afetação ou alienação fiduciária, não havendo qualquer possibilidade de exclusão por penhor agrícola.
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