ONU propõe revisão do Codex Alimentarius e possíveis mudanças podem afetar a segurança alimentar do mundo
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ONU propõe revisão do Codex Alimentarius e possíveis mudanças podem afetar a segurança alimentar do mundo
OS EUROPEUS QUE ME DESCULPEM, MAS SEGURANÇA ALIMENTAR É FUNDAMENTAL
Agricultores e indústrias estão de olho nas premissas enviesadas da Cúpula dos Sistemas Alimentares
“Comida para quem precisa, comida para quem precisa de comida”, berravam Arnaldo Antunes e os Titãs antes ou depois de interpretar a canção “Comida”, em shows pelos país afora nos idos da década de 1980. A música composta há mais de 30 anos pelo próprio Antunes, em parceria com Marcelo Fromer e Sérgio Brito, nunca pareceu tão atual, mesmo que por motivos diferentes.
Segundo a ONU, a fome e a insegurança alimentar afetam mais 800 milhões de pessoas no mudo. Ainda assim, há quem questione o modelo agrícola adotado pelos países que contribuem, cotidianamente, para reduzir essa triste estatística.
Ninguém discorda que os sistemas alimentares, que garantem o abastecimento da população, não devem se sobrepor à preservação ambiental. Também é consenso que justiça e inclusão social são fundamentais para a construção de um mundo melhor para todos.
Bem além do campo
Os sistemas alimentares, para quem ainda não entende o conceito, são complexas teias de atividades que envolvem todas as etapas relacionadas à alimentação. Englobam a produção, o processamento e a distribuição, ou seja, tudo o que acontece no caminho entre o campo e a mesa do consumidor. Desequilíbrios nessa rota, podem resultar em problemas sérios. Por isso, hoje, o mundo se preocupa em agregar o máximo de sustentabilidade aos sistemas, oferecendo segurança alimentar e nutricional sem comprometer as bases econômicas, sociais e ambientais para as gerações futuras.
A tarefa não é simples nem fácil. Na tentativa de vencer esse desafio, a ONU convocou as lideranças mundiais para a Cúpula dos Sistemas Alimentares (Food Systems Summit, ou FSS, na sigla em inglês), que acontecerá em Nova York, em setembro. Reunindo representantes da academia, do setor privado e de ONGs, o evento pretende acelerar os esforços para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) através de sistemas alimentares. No entanto, a reunião preparatória para a Cúpula, realizada essa semana em Roma, disparou o sinal de alerta para alguns setores e países.
Entre várias propostas em discussão, está a mudança do Codex Alimentarius, uma normativa criada pela ONU em 1963, com o objetivo de proteger a saúde dos consumidores e assegurar práticas igualitárias no comércio regional e internacional de alimentos. As diretrizes do Codex se referem a higiene e propriedades nutricionais, normas para o uso de aditivos, substâncias contaminantes, rotulagem, métodos de amostragem e análise de risco. É uma referência mundial consolidada e seguida por boa parte dos países. Inclusive, o Brasil.
Cada cabeça uma sentença
Mudanças no Codex podem interferir significativamente na produção e no comércio internacional de alimentos. Especialmente, se não respeitarem as características próprias de cada país, sejam elas geográficas, climáticas ou culturais.
Um exemplo emblemático é a frequente indicação do não consumo de carne bovina como medida para reduzir a emissão gases de efeito estufa. Se essa sugestão virasse regra, desestruturaria cadeias produtivas e afetaria as economias de muitos países.
Da mesma forma, desconsiderar as diferenças entre a agricultura de clima temperado e a agricultura tropical, como a brasileira, poderia colocar em risco a capacidade produtiva e a segurança alimentar do planeta. A título de comparação, ao contrário do que acontece nas regiões frias, o Brasil não tem neve para interromper o ciclo de vida de insetos, fungos, vírus e bactérias que atacam as lavouras. Sem esse fator, a pressão de pragas e doenças é muito maior nos trópicos. Por isso, nossa necessidade de defensivos químicos, biológicos e de plantas geneticamente modificadas - que resistem às pragas, à seca e outras intempéries - é completamente diferente da demanda europeia.
Por outro lado, a disponibilidade de terra, o regime de chuvas, o sol e o calor nos permitem colher duas e até 3 safras por ano, conferindo ao Brasil uma imensa capacidade de fornecer alimentos para o mundo. Uma verdade que precisa ser respeitada, principalmente, quando observamos fatores importantes para a sustentabilidade. O Brasil tem leis que protegem o meio ambiente. 25% do território nacional dedicado à proteção de florestas, estão dentro de propriedades rurais. Os municípios que têm a agricultura de escala como pilar da economia, oferecem melhor qualidade de vida para a população. Esses são fatos, não especulações.
Viés indigesto
No documento de convocação da Cúpula dos Sistemas Alimentares, o secretário-geral da ONU faz referência ao Green Deal (acordo verde) e a estratégia Farm to Fork (da fazenda ao prato), programas europeus que propõem a revisão dos padrões de produção e consumo de alimentos, de acordo com o pensamento daquele continente. Diante disso, é natural pressupor que há um viés ideológico na origem do movimento.
Cabe aos representantes dos países dos outros blocos, argumentar, com base em fatos e dados, que decisões unilaterais, ao invés de promover a sustentabilidade podem comprometer os sistemas alimentares. Como disse Tom Vilsack, Secretário de Agricultura dos Estados Unidos, “a Cúpula tem que reconhecer a importância da agricultura no sistema alimentar. Temos que assegurar que ela não promova uma solução única para todos os desafios que enfrentamos, ao contrário, temos que encorajar a implementação de uma variação científica das nossas políticas, considerando vários aspectos”.
Em resumo, respeito é bom. Agricultores brasileiros, americanos, canadenses, australianos e argentinos, entre outros, agradecem!
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