Fim da Paridade de Preços de Importação pela Petrobras limita altas do etanol, porém cenário sucroenergético atual reduz impacto para o setor

Publicado em 01/11/2024 15:00 e atualizado em 01/11/2024 16:50
Sequência de safra recorde e perda de qualidade da cana têm mantido biocombustível em nível mais baixista

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O fim da política de Paridade de Preço de Importação (PPI) da Petrobras, que ajustava os preços internos da gasolina aos praticados no mercado internacional, tem como uma das consequências a limitação do potencial de alta do etanol, de acordo com que explica Lívea Coda, analista de açúcar e etanol da Hedgpoint. Entretanto, o cenário atual do setor sucroenergético tem mantido os preços do biocombustível em um nível mais baixista, o que limita os impactos da nova medida.

Como detalha Coda, a política de Paridade de Preço de Importação repassava aos consumidores a volatilidade dos preços globais. O cálculo incluía o valor do petróleo no mercado internacional, a cotação do dólar e os custos logísticos de importação.

Em 16 de maio de 2023, foi anunciado o fim da PPI, que estava vigente desde 2016. Com a nova política, a Petrobras passou a ter flexibilidade para definir preços abaixo dos valores internacionais. Na nova abordagem, de acordo com a explicação da analista, a estatal considera as alternativas de abastecimento e o menor preço possível que permite manter sua margem de lucro. “O objetivo é que a Petrobras se torne a opção mais vantajosa para o consumidor no mercado doméstico”, aponta Coda.

Porém, um dos resultados disso, segundo a analista, é o reflexo sobre o setor sucroenergético. “Como o etanol segue as flutuações de sua concorrente nas bombas, aumentos no preço da gasolina em resposta ao mercado internacional tornavam o combustível renovável mais competitivo, impulsionando seus preços conforme a demanda aumentava. Com a mudança na política, essa dinâmica foi interrompida”, destaca a analista.  

IMPACTO LIMITADO PARA O ETANOL

Beatriz Pupo, Líder de Análise Quantitativa, S&P Global Commodity Insights, lembra que na época em que a Petrobras anunciou o fim da política de Paridade de Preços de Importação, os impactos foram limitados para o setor de etanol brasileiro, pois a medida coincidiu com uma produção recorde de etanol para o Brasil em 2023, com 35,4 bilhões de litros produzidos e um aumento de mais de 15% ano a ano.

Conforme o que explica Pupo, houve uma combinação de uma safra recorde de cana-de-açúcar no Centro-Sul em 2023/24, de 654 milhões de toneladas métricas, e um aumento na capacidade de produção de etanol de milho, que atingiu 6,2 bilhões de litros no Centro-Sul.

“Isso significa que, embora os preços da gasolina não estivessem mais seguindo a paridade internacional, o etanol ainda era capaz de competir com a gasolina nas bombas - o que levou a um aumento na demanda por hidratado (E100) dos consumidores)”.

De acordo com Lívea Coda, é difícil medir com precisão os impactos da mudança de política nos preços, mas, com ajustes mais lentos pela estatal, os preços da gasolina se tornaram mais estáveis e, ao serem mantidos mais baixos, limitaram o potencial de alta do biocombustível – especialmente à medida em que os preços da gasolina se tornam um limite inferior ao preço do açúcar, dificultando a escolha do produtor pela produção de etanol.

Neste momento, como ela explica, o etanol tem respondido aos fundamentos do setor sucroenergético, que têm mantido os preços do biocombustível mais baixos. “Em 24/25, a baixa qualidade da cana tem levado as usinas a manter um mix de açúcar menor do que o desejado, considerando a paridade de preços. Dessa forma, a produção de etanol, tanto de anidro quanto hidratado, tem sido suficiente para acompanhar o crescimento da demanda, evitando problemas de abastecimento e mantendo os preços em um nível mais baixista”, detalha Coda.

BAIXA PREFERÊNCIA DO CONSUMIDOR 

Conforme explicação de Beatriz Pupo, no Brasil, os consumidores com veículos flex podem abastecer seus tanques com etanol hidratado (E100) ou gasolina C – que contém uma taxa de mistura de 27% de etanol anidro. Como regra geral, o hidratado precisa ter um preço de 70% ou menos que a gasolina por causa de seu conteúdo energético.

“A maioria dos consumidores só abastecerá seus carros com E100 quando este for mais competitivo. A grande maioria dos consumidores brasileiros escolhe seu combustível (etanol ou gasolina) com base no custo-benefício, sendo que apenas uma parcela muito pequena utiliza um critério ambiental para escolher o etanol”, afirma Pupo.

Com o cenário atual do setor sucroenergético, de acordo com Lívea Coda, em grande parte dos estados, a paridade de preços nas bombas segue abaixo da equivalência energética. Porém, avaliando apenas a correlação entre o hidratado B3 e o WTI, um dos principais benchmarks do petróleo, a correlação do período entre 16 de maio de 2020 até 31 de outubro de 2024 é de 62%. “Se olharmos apenas para o período de vigência da PPI, entre 16 de maio de 2020 e 16 de maio de 2023, essa correlação era de 76% enquanto do fim da PPI, 17 de maio de 2023, até 31 de outubro de 2024, foi -15% (valores aproximados). Assim, fica evidente o descolamento dos preços”, observa a analista da Hedgepoint.

Outro ponto destacado por Pupo é que quando o consumo de hidratado aumenta, uma consequência possível é a menor necessidade de importação de gasolina. “Desde o segundo semestre de 2023, um aumento na participação de mercado do E100 e a melhora da produção doméstica aliviaram a necessidade de importação de gasolina. A paridade de preço nacional do E100 sobre o combustível fóssil atingiu a média de 64% em 2024 (janeiro a setembro), mostraram dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP) do Brasil”, completa.

O Notícias Agrícolas também conversou com  José Guilherme Nogueira, CEO da Orplana (Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil ), o qual lamenta o número de consumidores que optam pelo etanol no Brasil. “Infelizmente, hoje, a gente tem os dados da utilização de etanol, por exemplo, de etanol hidratado dentro dos veículos flex. Hoje, 85% da frota, ou melhor, 87% da frota brasileira é de veículos flex, e mesmo assim, a gente utiliza somente 29% de etanol dentro desses veículos flex. A gente ainda usa 70% de gasolina”, declara Nogueira.

Segundo ele, mesmo que tenha etanol misturado a essa gasolina, o efeito ainda é muito grande da gasolina. Por isso, para ele, é preciso estimular ainda mais o consumo de etanol e fazer com que esse jogo vire, fazendo que a preferência nacional seja direcionada em sua maioria para os biocombustíveis.

PARA PRESIDENTE DA ORPLANA, É PRECISO INCENTIVAR O CONSUMO DO ETANOL

Segundo Nogueira, o fim da política de paridade traz muita cautela. Ele destaca que é importante deixar claro que o governo atual fez e vem fazendo uma escolha clara de transição energética pelo combustível do futuro, pelos biocombustíveis, é necessário esperar que isso realmente aconteça.

Porém, o CEO diz ser difícil entender como vai ser o funcionamento, porque o petróleo é uma commodity e o preço varia conforme o mercado internacional. “Qualquer ação de segurar o preço de gasolina ou interferir nesse preço sem acompanhar o mercado mundial certamente poderá trazer sérios prejuízos, a gente já viu esse filme. E aí quem pode pagar por tudo isso são as empresas. Certamente que isso depois o preço e todo esse custo vem para a sociedade como um todo”, declara.

Com isso, esse é muito apreensivo com esse tipo de política. “A gente gostaria de entender claramente como essa política vai funcionar, uma vez que eliminando a política de paridade certamente isso vai afetar diretamente a competitividade do etanol e pode afetar ainda mais a disponibilidade desse produto para os consumidores”, acrescenta Nogueira.

“Acho que fica claro que todos nós queremos um combustível limpo, um combustível barato e, um combustível alinhado com o mercado, e para isso a gente precisa estimular a produção, estimular toda a capacidade produtiva do nosso setor para que a gente possa desenvolver ainda mais os biocombustíveis.  Exportar, sim, o petróleo e deixar todos os biocombustíveis aqui dentro para que a gente possa ter uma matriz energética mais efetiva”, conclui o CEO da Orplana.

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Por:
Igor Batista
Fonte:
Notícias Agrícolas

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