Combustíveis em análise: Projeto no Senado e PEC do governo vão baixar preço ao consumidor, mas prejudicam setor sucroenergético
A decisão das usinas de cana-de-açúcar do Centro-Sul do Brasil ganha mais dois componentes: o Projeto de Lei Complementar (PLP) 18/2022 do Senado, que estabelece um teto para a cobrança do ICMS sobre combustíveis, além de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) apresentada pelo governo para compensar os estados que zerarem alíquota do imposto.
Na visão de especialistas consultados pelo Notícias Agrícolas, o avanço das propostas em Brasília (DF) que devem baixar os preços aos consumidores e dar um respiro para a inflação do país, também pode impactar o setor sucroenergético, principalmente por conta do impacto na demanda pelo etanol hidratado, substitutivo da gasolina nos postos do Brasil.
"A redução do preço da gasolina nas bombas pelo Brasil seria maior do que a redução do preço do etanol. Com isso, aquela competitividade que a gente fala, de 70%, aumentaria nos principais estados consumidores: São Paulo, Paraná, Minas e Goiás. Então fica favorável para o fóssil", explicou Annelise Izumi, analista do Itaú BBA.
Além da perda da demanda de etanol para o setor sucroenergético, que estava sendo um destaque na safra, também devem haver mudanças no mix das usinas, apesar de que a decisão já estava bastante acelerada pelas unidades produtoras na safra 2022/23, sem muita margem para alteração. A maior parte do açúcar a ser exportado já está fixada pelas unidades do Centro-Sul.
"Para não acontecer essa perda de demanda, podemos ver por parte das usinas uma redução de preço do etanol. Reduzindo essa competitividade, voltamos naquela dúvida sobre a decisão entre a produção de etanol ou de açúcar", afirma Annelise. "Em termos de açúcar [com essa dinâmica], também reduziria aquele piso de preço. Se o etanol cai, o preço do açúcar também acaba reduzindo", complementou.
O Pecege também fez simulações de preço, caso os projetos avancem, e também vê impactos para o setor sucroenergético. "Para se manter minimamente competitivo, o preço do etanol hidratado deveria reduzir-se proporcionalmente nas bombas, o que pressionaria negativamente os preços ao longo de toda a cadeia de produção e distribuição", pontuou.
Como alternativa, "o efeito negativo sobre os preços recebidos pelas usinas e produtores de cana-de-açúcar pode ser reduzido de duas maneiras não excludentes: redução da tributação sobre o etanol e/ou correção Preço médio ponderado ao consumidor final (PMPF) utilizado como base de cálculo do ICMS e que encontra-se congelado desde o fim de 2021", pontuou em relatório.
De acordo com a entidade, no estado de São Paulo, e em outros, o etanol é favorecido pela estrutura tributária, tal que, se todos os tributos fossem zerados para ele e, simultaneamente, para a gasolina, haveria perda de receita do setor sucroenergético.
"A redução do preço do biocombustível tende a incentivar a produção de açúcar, depreciando seu preço internacional e reforçando a queda de renda tanto de usinas, quanto de produtores agrícolas via sistema CONSECANA", destacou o Pecege em relatório.
O banco BTG Pactual levantou na semana passada que, com o etanol perdendo competitividade sobre a gasolina, o combustível de origem fóssil seria mais demandado, inclusive com risco de desabastecimento.
"O preço da gasolina na refinaria está atualmente com um desconto de 25% em relação à paridade de importação, e dado que Brasil depende de importações para atender cerca de 8% de seu consumo de gasolina, a menos que os preços alcancem os internacionais (o que mais do que compensaria os impactos do PLP18) o risco de desabastecimento de gasolina também pode se tornar uma realidade mais à frente", disse em relatório.
A União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) foi procurada pelo Notícias Agrícolas, mas disse que não vai se manifestar sobre o assunto.
Atualmente, a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) é diferente em cada estado e para cada combustível. O estado do Rio de Janeiro, por exemplo, tem a maior alíquota para a gasolina, de 34%. No caso do etanol, os estados costumam cobrar 25%, o Rio de Janeiro fica em 32% e São Paulo, principal consumidor do biocombustível, adota 13,3%.
A proposta com o PLP 18/2022 em tramitação no Senado Federal é de limitar a cobrança em 17% para os combustíveis no Brasil e 18% sobre outros itens essenciais, como energia e transportes. Ou seja, em alguns estados, a alíquota seria reduzida pela metade, o que preocupa governadores pelo país. A estimativa é de perdas de R$ 83 bilhões ao ano. A consultoria de orçamento do Senado calcula cerca R$ 50 bilhões.
A imprensa em Brasília destaca que o projeto deve ser aprovado sem mudanças, apesar da pressão dos estados, que inclusive podem judicializar a questão, segundo fontes ouvidas pelo Estadão. A votação do PLP está prevista para segunda-feira (13), mas como houve mudanças pelo relator, o texto precisará voltar à Câmara dos Deputados.
Caso o Senado aprove essa proposta, que inclusive já foi discutida e aprovada na Câmara, o governo quer avançar com uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que foi apresentada nesta quinta-feira (09) pelo líder do governo no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ), que visa compensar os estados que zerarem as alíquotas de ICMS do diesel e gás de cozinha e natural, além de fixarem a alíquota do etanol em 12%.
O texto prevê que o governo arque com quase R$ 30 bilhões para as perdas. As parcelas aos estados seriam pagas em cinco vezes e a medida teria validade até o final deste ano de 2022.
A PEC apresentada ontem conseguiu mais assinatura do que o necessário para avançar, inclusive não teve mudanças do que o proposto pelo governo, mas ela só deve sair do papel caso a PLP seja aprovada.
Na última semana, a Agência Nacional do Petróleo (ANP), trouxe dados que mostraram que o preço médio da gasolina comum no país estava em R$ 7,218 o litro, o etanol em R$ 5,083/l e o diesel em R$ 6,882/l, apesar de queda ante a anterior.
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