Argentina: Apenas metade da pouca soja vendida já foi precificada com caos na economia do país
"A forma que os produtores agropecuários argentinos adotaram para se proteger dessa grave crise econômica é reter o máximo que podem de grãos", relatou diretor executivo da Globaltecnos S.A., Sebastian Gavalda, direto da Argentina, em entrevista ao Notícias Agrícolas nesta sexta-feira (12), confirmando a comercialização lenta e atrasada este ano na Argetina.
O país produziu cerca de 42 a 43 milhões de toneladas de soja na temporada 2021/22, sofrendo uma quebra tão severa como a registrada no Brasil em função de adversidades climáticas, em especial promovidas pelo La Niña e, deste montante, já entregou cerca de 20 milhões de toneladas entre portos - com volumes para serem exportados - e indústrias processadoras. Todavia, a incerteza econômica é tão grande e as mudanças são tão rápidas que, desta 20 milhões, apenas 13 milhões de toneladas já foram precificadas.
O restante do que foi produzido segue nas fazendas, cooperativas, nas mãos dos produtores que buscam vender o menos possível e se garantir o quanto podem diante de um quadro tão nebuloso. "Trata-se de um nível muito baixo de vendas se comparado a anos anteriores e isso se dá por alguns problemas", diz.
O executivo relata como o primeiro dele as já tão conhecidas retenciones, que tiram do produtor argentino 33% do valor de sua soja - bem como de farelo e óleo que são exportados também -, o que desestimula ainda mais os negócios frente a uma profunda desvalorização da moeda argetina.
O preço FOB da soja no porto de Rosário está perto de US$ 550,00 por tonelada - próximo do que se pratica no Brasil ou no Uruguai - porém, com o desconto das taxações cai para algo entre US$ 390,00 e US$ 395,00 por tonelada do produto disponível, o que afasta o produtor da ponta vendedora. Soma-se a isso o diferencial dos mercados cambiais dentro do próprio país. Como explica Gavalda, no 'dólar vigente', o produtor recebe 135 pesos por dólar, enquanto no 'dólar formal' são 300 pesos. A soja da safra nova tem indicativo perto de US$ 365,00/tonelada base porto.
"Ou seja, no dólar vigente ele recebe menos de US$ 200,00 por tonelada na soja. Assim, ele vende o menos possível esperando uma melhora da situação. Mas, de outro lado, isso preocupa porque ele precisa de dólares. Mas, agora, ele vende só se precisa atender compromissos financeiros, comprar algum insumos, máquinas, equipamentos", relata o diretor da Globaltecnos.
À Bloomberg, o produtor rural Francisco Perkins, de Buenos Aires, afirmou que diante de uma rápida e forte aceleração dos custos de produção, bem como da inflação, reteve cerca de metade de sua produção. "Sempre que a inflação é mais rápida que a depreciação da moeda, perco competitividade porque preciso de mais dólares agrícolas para cobrir os pagamentos em pesos".
IMPACTOS NO ESMAGAMENTO
Ainda segundo ele, com esse volume de soja já entregue, em partes, para as indústrias, o esmagamento argentino ainda não foi duramente impactado, porém, pode ser um problema a frente, resultando, inclusive, em exportações ainda mais contidas tanto de farelo, quanto de óleo. "A situação pode se agaravar", diz.
AGRONEGÓCIO X GOVERNO
A crise econômica se agravou tanto no país que hoje já não há qualquer instrumento financeiro, como explica Sebastian Gavalda, que dê alguma forma de garantia para os produtores rurais argentinos. Assim, a soja é apenas um dos produtos que ele segura agora, já que passam por isso ainda milho, trigo, sorgo, cevada, entre outros. O setor está emprerrado de uma forma geral em sua comercialização.
Em um congresso realizado nesta quinta-feira (11) na Argentina, o ex-presidente argentino Maurício Macri - antecessor de Alberto Fernández, citou a importância do agronegócio para a nação sul-americana, mas lembrou também como as retenciones são um grande e crescente limitador de sua competitividade, segundo noticiou o Clarín.
"Devemos caminhar para a eliminação das retenciones na agricultura. Não é um imposto construtivo, impediu que a produção fosse impulsionada ainda mais. Acredito que podemos produzir de forma sustentável e para isso devemos ter impostos corretos. Com o tempo, esses impostos têm que desaparecer, então será preciso definir como, mas eles têm que tender para zero. Esses impostos impedem o maior desenvolvimento das comunidades", disse Macri.
Mais do que isso, o ex-presidente ainde teceu críticas sobre o atual governo, afirmando que trata-se de um "exército de demolição. A Argentina não tem presente, mas tem futuro. E isso com o campo como um importante protagonista".
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