2021/22: Das chuvas aos fertilizantes, atrasos preocupam sojicultores às vésperas do início do plantio
A contagem regressiva para a safra 2021/22 de soja do Brasil se acelerou com a chegada de setembro e deve dar início a maior colheita da história da sojicultura global. Consultorias privadas estimam uma produção de mais de 140 milhões de toneladas em uma área cultivada de mais de 40 milhões de hectares. Assim, a chegada das chuvas é muito aguardada pelos produtores brasileiros, para que possam aproveitar as melhores janelas de plantio e mitigar os impactos dos outros desafios que os sojicultores certamente terão de enfrentar.
A nova temporada começa com preços bem mais elevados do que a média do mesmo período do ano passado, do início da safra 2020/21. Os custos de produção, todavia, também subiram fortemente em todos os estados produtores. O fertilizante foi o coadjuvante da puxada nos custos e continuam encontrando espaço para subir ainda mais. Do mesmo modo, algumas regiões já temem a falta do glifosato - cenário adiantado pelo Notícias Agrícolas há alguns meses.
Os desafios vão se mostrando e, agora, as perspectivas são as mais diversas antes do início efetivo da safra.
O QUE DIZEM OS PRODUTORES?
"As perspectivas para a próxima safra são boas apesar das incertezas. Os custos aumentaram bastante e estamos enfrentando problemas logísticos na entrega de fertilizantes", explica o presidente da Aprosoja Goiás, Joel Ragagnin.
Sua opinião é compartilhada por Azael Pizzolato, presidente da Aprosoja São Paulo. "Seguimos otimistas com os preços, mas muito cautelosos com as questões climáticas e os custos. Esta safra, diferente das anteriores, está muita cara, e apesar das margens continuarem atraentes, os custos nos expõe muito. Por isso, cautela redobrada nesta safra com o uso racional de insumos, respeito ao clima, operações casadas - venda de soja e compra de insumos - e utilização de ferramentas como seguros agrícolas", orienta o representante dos produtores paulistas. "É um ano desafiador".
Márcio Bonesi, presidente da Aprosoja Paraná, coletou informações juntos das maiores cooperativas do estado que informaram que têm produto para atender as compras de fertilizantes que já foram feitas. "Para compras novas o prazo de entrega é outubro. O principal motivador disso tem sido o problema enfrentado na Bielorrússia e agora tem que se buscar mais oferta no Canadá". Além disso, Bonesi cita os elevados valores de fretes marítimos e terrestres.
E não é só a alta do preço que preocupa, mas também esta demora e a possibilidade de atraso na chegada dos insumos em algumas regiões produtoras. Em Goiás os atrasos já estão ocorrendo, ainda segundo o presidente da Aprosoja do estado, como já ocorreram em outros anos. "E essa é uma das situações que temos enfrentado, o atraso da entrega dos fertilizantes, que já deveriam estar nos campos e ainda não estão. Isso pode atrasar um pouco as operações".
Já em São Paulo, a situação já não é tão grave quando a pauta é essa. "Com relação a entrega, não ouvi de nenhum produtor que solicitiou o produto e não chegou, na verdade, a maioria dos produtores, por esse temor, já está com os insumos na propriedade", explica Pizzolato.
Em contrapartida, o presidente da Aprosoja São Paulo, assim como o da Goiás, fala sobre o temor em torno da falta de glifosato.
"Acho que na maioria dos insumos não teremos grandes problemas. O que tenho escutado, inclusive de órgãos do governo é problema de fornecimento de glifosato e dessecante. Lembrando que a falta do glifosato e seu aumento de custos, por si só, já é algo preocupante", complementa. E Ragagnin relata situação semelhante, com "restrições na disponibilidade de alguns defensivos agrícolas, como por exemplo, o glifosato".
COM A PALAVRA, OS ANALISTAS E CONSULTORES
Segundo o diretor da LucrodoAgro, Eduardo Lima Porto, "não são problemas pontuais, mas são problemas muito graves" sobre a situação do glifosato. "Não tem glifosato, há empresas cancelando, teremos atraso na entrega, produto chegando depois da chuva". Em sua última entrevista ao Notícias Agrícolas, Lima Porto já havia alertado sobre a luz amarela em torno da oferta do produto. Relembre:
O aperto na oferta de matéria-prima para o glifosato começa na China, com restições ambientais para a indústria da nação asiática. Paralelamente, inundações severas afetaram também regiões da chamada rota glicínica, na China, o que também afetou a oferta de fósforo amarelo para a produção do glifosato.
"São combinações de pressão de mercado e somando a isso há a elevação de frete de contêineres e mais a lentidão que vem acontecendo no processo deste tipo de carga temos a combinação perfeita de caos", explica.
Além dos químicos, o especialista e consultor em custos de produção e insumos, destaca ainda o grave cenário do cloreto de potássio, com as grandes empresas do setor passando por problemas de descarregamento. "Os produtores elevaram muito os pedidos, inclusive para a safra 2022/23, sem a menor necessidade, simplesmente para aproveitar as relações de troca. Então, as compras de fertilizantes estão, por baixo, 50% acima do ano passado e isso provocou um gargalo muito sério", explica.
Lima Porto fala sobre este ser um "problema estrutural e que pode haver produtor sem ter produto para começar a plantar esta safra".
Na análise de Jeferson Souza, analista de fertilizantes da Agrinvest Commodities, os preços que já estão elevados - mais de 180% no acumulado do ano no caso do cloreto de potássio - podem subir ainda mais. Alguns problemas que já vinham sendo registrados foram intensificados e a distribuição pode ficar comprometida.
"Teríamos que ver um fundamento de baixa forte para derrubar os preços dos nitrogenados, fosfatados e do cloreto de potássio. Não consigo enxergar um cenário tão otimista até o final de ano não só sobre os preços, mas também de disponibilidade de matéria-prima. O prazo de entrega e a disponibilidade são os pontos cruciais no momento", explica em entrevista ao Notícias Agrícolas nesta sexta-feira.
Souza fala ainda de relatos de produtores sobre atrasos na entrega e até mesmo do cancelamento de contratos. "Isso é pontual, é importante dizer (...) Acredito que ainda teremos alguns atrasos e que isso está no radar, mas não podemos dizer que é generalizado e que é uma regra". E dessa forma, se remete à preocupação dos produtores sobre a possibilidade de se perder a janela ideal de plantio em função da falta de insumos, podendo prejudicar a segunda safra de milho em 2022.
O analista citou preocupações com os problemas ainda sofridos na Bielorússia, com a logística canadense, mantendo as empresas mais cautelosas, além dos problemas causados em estruturas americanas pelo Furacão Ida que podem comprometer o mercado da ureia, produto que já registrou alta de US$ 5,00 por tonelada nos últimos dias.
Acompanhe a íntegra da entrevista:
Em visita ao porto de Itaqui, no Maranhão, o diretor do Movimento Pró-Logística, Edeon Vaz Pereira, pôde registrar que um dos problemas é o pouco volume de fertilizantes que estão sendo desembarcados no portos. "Existem 450 mil toneladas em navios que estão fundiados agurdando para acossar. Foi criada a COP - Companhia de Operação Logística do Porto de Itaqui - que tem um equipamento para descarregar navios de fertilizantes e essa companhia foi instalada em pouco tempo, o que faz com que sua produtividade - que deveria ser 750 toneladas/hora - seja, agora - de pouco mais de 300 toneladas/hora", relata.
Pereira explica ainda que os portos brasileiros possuem um normativo que dá prioridade a portos que tenham sistemas automatizados de descarga, como é o caso do COP. E como o Brasil passa por uma severa crise hídrica, parte dessa prioridade nas importações tem sido dada ao carvão, o que também traz alguma 'lentidão' a mais para o descarregamento dos fertilizantes. E dessa forma, alternativas estão sendo buscadas pelos representantes do setor para otimizar as atividades nos portos.
"As opções que temos são otimizar a descarga, colocando mais caminhões, utilizar um sistema misto - tanto de grab como automatizado - conversar com o Tegram para que possamos abrir um pouco mais a agenda e permitir o acossamento de mais navios, entre outras", explica o diretor. Assim, os representantes do setor seguem em negociações com os elos da cadeia de distribuição para "internalizar esse adubo o quanto antes".
Para Luiz Fernando Gutierrez, analista de mercado da Safras & Mercado, "ainda não podemos falar que é algo generalizado, um grande problema. Sabemos que sempre ocorrem problemas pontuais, em alguns lugares, e nesta safra podemos ter um pouco mais de relatos porque tivemos alguns atrasos de entregas nos portos".
Além disso, Gutierrez explica também que as compras para esta temporada foram mais criteriosas diante dos preços dos fertilizantes que subiram muito. A demanda, mesmo assim, foi muito forte, principalmente em função do aumento previsto da área.
Nos estúdios do Notícias Agrícolas, no último dia 30 de agosto, o diretor da Pátria Agronegócios, Matheus Pereira, acredita que, diante deste quadro, as preocupações com este início de temporada, ao menos por agora, não é a formação do preço tão somente, mas, para o Brasil, a distribuição dos insumos para a safra 2021/22. E o crescimento de área estimada pela consultoria varia entre 7% e 7,5% no caso da soja, além de um incremento estimado também para o milho verão.
"Teremos para esse ano 2021/22, aqui no Brasil, duas grandes safras e duas áreas grandes em expansão que competirão nessa distribuição de fertilizantes, sementes, químicos para essa nova temporada", explica Pereira. Relatos recebidos pela Pátria dão conta de atraso na entrega de fertilizantes para dezembro, falta de alguns produtos, inclusive de produtos necessários para consolidar o aumento de área para algumas regiões.
Reveja a entrevista:
CAOS LOGÍSTICO
A pandemia da Covid-19 agravou os problemas logísticos que já vinham sendo sentidos e o atual momento - marcado por uma severa falta de contêineres e pelo atraso e congestionamento de rotas - e trata-se de um cenário sem precedentes.
"As viagens estão cada vez mais demoradas em navios porque os transportadores marítimos estão sofrendo cada vez mais com gargalos no setor portuário, baixa produtividade - sempre atrelado à Covid - quarentenas, terminais fechando, e isso causa uma pressão enorme na oferta de navios, de contêineres", explica Larry Carvalho, advogado com ênfase em transporte marítimo.
O especialista explica que os graneis sentem menos, uma vez que apesar dos elevadíssimos valores dos fretes - que têm batido recorde atrás de recorde - ainda há alguns navios disponíveis. De outro lado, a falta dos contêineres chega a defensivos agrícolas, o que agrava muito a preocupação do agronegócio brasileiro. E com essa lacuna, as taxas de contêineres chegaram a registrar um aumento de até 1000% se comparadas ao ano passado.
Tanto Carvalho, quanto Fábio Pizzamiglio, diretor da Efficienza, empresa especializada em comércio internacional, afirmam que a situação não deverá ser resolvida no curto e médio prazo.
Leia mais:
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PREVISÃO DO TEMPO
E não é só o atraso dos insumos que preocupa, mas das chuvas também.
Em qualquer região produtora de grãos do Brasil os produtores estão à espera das chamadas "chuvas plantadeiras" para, assim que possível e permitido, dar início aos seus trabalhos campo. No entanto, a chegada das precipitações já se mostra insuficiente para alguns estados, como é o caso do Paraná, ainda nos relatos de Márcio Bonesi, presidente da Aprosoja PR.
"Não vai dar para começarmos a plantar no dia 10. Nós não temos níveis de umidade do solo adequados para isso. Está muito calor e as chuvas previstas para os próximos dias serão insuficientes para reverter essa situação por enquanto. Vamos ver o que temos pela frente, mas a situação é muito precoupante", diz.
A mesma cautela foi relata pelos presidentes da Aprosoja SP e Aprosoja GO, principalmente diante dos custos bastante elevados e das perdas agressivas sofridas pela última safrinha de milho.
Ao Notícias Agrícolas, o meteorologista Francisco de Assis Diniz, do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia), afirmou que as chuvas começam a chegar ao Brasil da soja, porém, ainda de forma bastante irregular. "Serão chuvas passageiras, que ainda não vieram para ficar", diz.
Além disso, ele alerta ainda sobre os próximos dias de calor intenso no Brasil Central, sendo registrado nos estados de São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Tocantins.
Veja a íntegra de sua entrevista:
O começo da semana será marcada por chuvas intensas no Rio Grande do Sul, de acordo com a rodada mais recente dos modelos meteorológicos. Segundo as previsões da Climatempo, um sistema de baixa pressão entre o norte da Argentina e o Paraguai vai favorecer a formação de nuvens carregadas sobre grande parte do estado. "Atenção especial à Fronteira Oeste gaúcha, onde a chuva vem acompanhada por muitos raios, rajadas de vento entre 40-50km/h e eventual queda de granizo", complementa.
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