Argentina vê complexo de soja comprometido pela desvalorização cambial, logística e coronavírus
Enquanto o mercado discute quanto o Brasil ainda tem de soja para atender os mercados externo e interno e se a China comprará mais produto dos EUA, efetivamente, nos próximos meses, a Argentina amarga um dos piores momentos da história para a comercialização da oleaginosa.
Com uma safra que deverá ser concluída entre 51 e 53 milhões de toneladas, de acordo com estimativas de consultorias privadas, o produtor argentino acumula problemas cambiais, políticos, econômicos, logísticos e todos eles agravados pelos efeitos da pandemia do coronavírus.
Assim, embora a Argentina tenha se mostrado quase que às margens da dinâmica global do complexo soja nesta temporada, "ela sempre pode registrar um evento que tem capacidade de mudar todo o mercado", diz Gutierrez, e por isso precisa ser monitorada frequentemente.
RETENCIONES, CÂMBIO e POLÍTICA
Comercializando em dólar e com seus custos construídos na mesma moeda, os sojicultores sofrem com preços muito fracos e pouco estímulo de exportação por conta das retenciones, que seguem nos elevados 33%. Para farelo e óleo a tributação é a mesma, como explica Luiz Fernando Gutierrez, analista de mercado da Safras & Mercado, e para ambos, portanto, o mercado também não é dos melhores.
"A tributação atrapalha o complexo soja como um todo na Argentina", afirma o especialista. E o consultor em agronegócios Ênio Fernandes, da Terra Agronegócios, complementa afirmando que a atual condição só faz deixar as novas vendas ainda mais lentas.
Até o dia 13 de maio, a Argentina já havia comercializado cerca de 22,3% de sua safra atual, contra 20,7% do mesmo período do ano anterior, contabilizando tanto negócios para exportação quanto no mercado interno.
Para Gutierrez, as exportações argentinas de soja em grão deverão ser menores neste ano, perto de 8 milhões de toneladas. Em 2019, foram 10,2 milhões, de acordo com dados oficiais do Ministério da Agricultura do país. "É importante lembrar que o ano comercial deles começa dois meses depois do início no Brasil, começando abril e sendo concluído em março", esclarece o analista.
O gráfico abaixo, produzido pela agência internacional de notícias Bloomberg, mostra a baixa evolução das vendas de soja desde que o presidente Alberto Fernandez assumiu o governo argentino. Antes da vitória de Fernandez, os sojicultores aproveitaram para acelerar os negócios já presumindo que as taxações sobre o campo aumentariam, como aconteceu.
As três marcações do gráfico mostram, da esquerda para direita, são dos momento da eleição de Alberto Fernandez, do primeiro aumento das retenciones e com 38% da colheita completa, em 13 de maio de 2020
As estimativas para o farelo de soja, por outro lado, já são mais próximas do que o registrado em 2019, quando foram 28,7 milhões, e as exportações do derivado somarem 29 milhões de toneladas. "O farelo argentino é menos elástico e sempre bem demandado", complementa.
Ao lado do peso que as taxações já provocam sobre os preços - e sobre o dia-a-dia do produtor argentino - há ainda a intensa desvalorização do peso em relação ao real. São cerca de 70 pesos no chamado 'câmbio exportação' e 120 pesos para um dólar no câmbio regular.
Diferença entre as taxas oficial e não oficial de câmbio na Argentina - Fonte: Bloomberg
E frente a isso, o analista de mercados agrícolas Pablo Adreani, da Argentina, afirmou em seu perfil no Twitter e reportada pela Bloomberg que "a soja de US$ 200,00 por tonelada já é uma realidade e só a China pode dá-la algum oxigênio. Com essa diferença cambial, o produtor não irá vender um quilo de soja. Considerando US$ 200,00 por tonelada, metade dos produtores perdem dinheiro".
Assim, com seus custos em dólares, ainda como explica Ênio Fernandes, o produtor segue com suas vendas cadenciadas, realizando-as quando da necessidade e oportunidade de empregar esses recursos na compra de algum insumo. "Com a situação atual, ele vende e faz o que com esse dinheiro? A desvalorização da moeda local é muito forte", diz. "Até mesmo financiar um produtor argentino neste momento traz um certo temor", completa.
LOGÍSTICA
O desestímulo para as exportações argentinas de soja e derivados se deu não só pelas questões econômicas, tributárias e cambiais, mas também logísticas. Os efeitos da pandemia do Covid-19 foram muito mais graves por lá do que no Brasil ou nos EUA, provocou logo no começo da quarentena o fechamento de plantas processadoras de soja e terminais portuários.
"Agora as coisas estão um pouco melhores, mas ainda há problemas em alguns locais que, aos poucos, estão voltando ao normal, alguns tabalhando com a capacidade reduzida. Mas portos foram fechados fechados, a produção e o escoamento foram afetados", diz o analista da Safras & Mercado.
E como se não bastasse, há ainda a seca dos rios Paraná e Uruguai, comprometendo ainda mais o escoamento da produção argentina. "E estamos falando de Rosário, o maior complexo portuário da Argentina, e passa soja paraguaia também por lá", relata Luiz Fernando Gutiterrez.
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O nível das águas do rio Paraná estão nas mínimas em 50 anos, segundo informações reportadas pela agência de notícias Reuters, e já exigem que as barcaças com soja circulem com menor volume e em um ritmo mais lento, provocando, inclusive, atraso na entrega.
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EMPOBRECIMENTO DO CAMPO
Essa acúmulo de fatores negativos, agravados pelo coronavírus e intensificado pela questão cambial, vem promovendo um movimento de 'empobrecimento' do campo. A tecnologia, por conta da falta de recursos e de margens muito apertadas que são alcançadas pelo produtor argentino, vem sendo reduzida ano a ano.
"E o câmbio caminha a passos largos para promover isso", diz Ênio Fernandes.
Para o consultor da Terra Agronegócios, a situação ainda pode piorar no país, que vem impondo medidas em um dos poucos setores da economia que ainda dá certo. "Não vejo uma mudança no curto prazo. Mas a economia não suporta por muito mais tempo, o que leva às mudanças necessárias no longo prazo, para então vermos um outro cenário".
e arriscar uma dolorosa batalha judicial se os detentores de títulos decidirem que há poucas chances de um acordo.
Aconteça o que acontecer, o país precisa desesperadamente de receitas de exportação de soja - no valor de US $ 17,9 bilhões na última temporada - para proteger reservas de dólar, financiar os gastos com estímulos Covid-19 e pagar empréstimos.
Credor argentino diz ser "muito difícil" país evitar default
BUENOS AIRES (Reuters) - Um importante membro do grupo de credores da Argentina disse nesta quinta-feira que seria "muito difícil" para o país evitar default, enquanto o governo tenta chegar até o fim da semana a um acordo com credores para uma reestruturação maciça da dívida.
Autoridades argentinas estão tentando alcançar um acordo com detentores de títulos para a reestruturação de 65 bilhões de dólares em dívidas ou então arriscar o nono default do país conforme se aproxima a sexta-feira, duro prazo final para pagamento de títulos.
"Eu odiaria ver algo desordenado como um duro default", disse Hans Humes, que chefia a Greylock Capital e tem liderado um grupo de hedge funds e outros credores privados.
Humes, falando em uma conferência online, disse ser mais provável que a Argentina chegue a um consenso com seus credores após o prazo de sexta-feira.
"Dentro da estrutura apresentada pelo FMI e por Martín Guzmán (Ministro da Economia), deveria haver flexibilidade suficiente para chegar a um acordo que seja aceitável, mas teremos que ver", disse Humes.
Os credores do país sul-americano elaboraram contrapropostas no final da semana passada, depois de rejeitarem uma proposta inicial do governo envolvendo um hiato de pagamento de três anos, um corte de 62% no cupom e o adiamento de vencimentos para 2030 e além.
Guzmán disse mais cedo nesta semana que existe uma "grande chance" de as negociações da Argentina com os credores se estenderem para além de sexta-feira.
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