Por que a economia da China está mais vulnerável às tarifas de Trump desta vez
Por Marius Zaharia
HONG KONG (Reuters) - A ameaça de Donald Trump, eleito o próximo presidente dos Estados Unidos, de impor tarifas de 60% sobre as importações de produtos chineses representa grandes riscos de crescimento para a segunda maior economia do mundo.
Além de as taxas tarifárias serem muito mais altas do que os 7,5% a 25% cobrados da China durante o primeiro mandato presidencial de Trump, a economia também está em uma posição muito mais vulnerável.
Veja o que mudou para o país asiático:
CRISE DO MERCADO IMOBILIÁRIO
Em 2018, o mercado imobiliário estava forte, impulsionando cerca de um quarto da atividade econômica da China. Isso significou que as finanças do governo local, que dependem fortemente do leilão de terrenos para projetos residenciais, não foram pressionadas com tanta força.
Isso ajudou a China a absorver o choque tarifário. Porém, desde 2021, o setor imobiliário vem sofrendo uma grave queda e as receitas dos governos locais despencaram.
O excesso de oferta de moradias significa que esse setor pode nunca mais voltar a ser o motor do crescimento econômico chinês.
DÍVIDA
A queda do setor imobiliário sobrecarregou os governos locais com dívidas insustentáveis.
Embora Pequim esteja providenciando ajuda fiscal para que eles reduzam suas obrigações, o ônus é enorme, limitando a capacidade da China de responder a qualquer choque de crescimento externo.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) calcula que a dívida total do setor público será de 147 trilhões de iuanes (20,7 trilhões de dólares) no final de 2023. Soma-se a isso a dívida das famílias e das empresas e esse número ultrapassa 350 trilhões de iuanes -- cerca de três vezes o tamanho da economia, de acordo com o Banco de Compensações Internacionais (BIS, na sigla em inglês).
FRACA DEMANDA INTERNA
Os baixos salários e aposentadorias, o alto índice de desemprego entre os jovens e a fraca rede de segurança social deixam os gastos das famílias chinesas abaixo de 40% do PIB, cerca de 20 pontos percentuais atrás da média global.
Para impulsionar isso, é preciso mais dívidas ou uma revisão na forma como a renda nacional é distribuída, de modo que beneficie as famílias em detrimento do governo e das empresas.
Isso poderia ser alcançado mudando a forma como as empresas e as famílias são tributadas e como o governo gasta o dinheiro, aumentando os benefícios de aposentadoria, saúde e desemprego e removendo um sistema de passaporte interno responsável por enormes desigualdades rurais e urbanas, entre outras reformas.
Até agora, no entanto, as autoridades têm se concentrado em atualizar o setor de manufatura dependente de exportação, com sucesso notável em veículos elétricos, energia solar e baterias.
Mas isso também gerou tarifas nos Estados Unidos, na Europa, na Turquia e em outros lugares.
A China pode ser capaz de impulsionar as vendas externas em áreas em que sua economia é extremamente competitiva, mas tem pouco controle sobre a demanda externa.
PRESSÕES DEFLACIONÁRIAS
A crise imobiliária, o excesso de dívidas e o consumo fraco alimentaram as pressões deflacionárias.
A política da China de redirecionar recursos do mercado imobiliário para o setor de manufatura, em vez de para os consumidores, alimentou o que os governos ocidentais descrevem como "excesso de capacidade industrial". Isso levou à deflação das portas de fábrica.
A inflação dos preços ao produtor foi de 4,6% em julho de 2018, quando as primeiras tarifas de Trump entraram em vigor. Em setembro de 2024, esse valor era de -2,8%. A inflação dos preços ao consumidor caiu de 2,1% para insignificantes 0,4% durante esse período.
A deflação, que prejudica o consumo, as empresas e o crescimento, pode piorar muito se as tarifas reduzirem a demanda externa, exacerbando o excesso de capacidade industrial.
ESPAÇO LIMITADO PARA A DEPRECIAÇÃO DA MOEDA
O iuan encerrou 2019 cerca de 10% mais fraco em relação ao dólar do que no início de 2018, quando Washington sinalizou o plano de tarifas, e 4% mais fraco em termos ponderados pelo comércio em relação a todas as moedas. As restrições dos EUA aumentaram a taxa tarifária efetiva sobre todas as exportações chinesas em 2,4 pontos percentuais, de acordo com os analistas da empresa de pesquisa Capital Economics, o que significa que a desvalorização do iuan mais do que compensou o impacto das tarifas.
Desta vez, o iuan talvez tenha que cair 18% em relação ao dólar para compensar totalmente as tarifas de 60% dos EUA, o que implica uma taxa de 8,5 por dólar, segundo os cálculos dos analistas -- níveis nunca vistos desde a crise financeira asiática da década de 1990.
Preocupadas com as saídas de capital, as autoridades tentaram evitar que o iuan se enfraquecesse além de 7,3 no início deste ano. Um ajuste total parece improvável.
OUTROS FATORES
Durante a pandemia da Covid-19, Washington liberou trilhões de dólares em estímulos, incluindo doações em dinheiro para os consumidores, alguns dos quais foram gastos em produtos fabricados na China.
Além disso, após a invasão da Ucrânia pela Rússia, Moscou ficou de fora de muitos mercados ocidentais, o que a levou a adquirir mais produtos da China.
Essas foram oportunidades inesperadas para Pequim e é improvável que se repitam.
(Reportagem de Kripa Jayaram)
0 comentário
Wall Street fecha em alta após dados de atividade
Ibovespa sobe e chega nos 129 mil pontos com Petrobras; tem ganho na semana
Dólar fecha estável antes de anúncios do governo na área fiscal
Dólar sobe e euro recua para menor cotação em dois anos após dados do PMI
STOXX 600 salta mais de 1% e atinge pico em uma semana com impulso do setor imobiliário
S&P 500 e Dow Jones atingem máximas de uma semana após dados de PMI dos EUA