Enxugando gelo - País emprega 12,5 milhões de servidores públicos estáveis, ‘imexíveis’

Publicado em 29/12/2018 09:54
O regime de estabilidade é a origem das devastadoras despesas de custeio formadas pela massa dos proventos, vantagens e verbas indenizatórias (por MODESTO CARVALHOSA, no ESTADÃO)

A estupenda reportagem de capa do Estado na edição de domingo 16 de dezembro, sobre a insolvência de milhares de municípios brasileiros, demanda uma reflexão sobre as causas estruturais da calamidade permanente das nossas finanças públicas. Os que acompanham a vida política a partir da metade do século passado podem testemunhar a velha ladainha, o repetido mantra de todo novo governo, que antes de assumir "promete tomar drásticas providências para diminuir substancialmente os gastos públicos".

Tancredo Neves, por exemplo, nos dois meses anteriores à sua malograda posse, declarava, todos os dias, que acabaria com a farra dos gastos públicos. Até Dilma Rousseff, ao nomear Joaquim Levy, disse que corrigiria a política fiscal de seu catastrófico “governo”.

Acontece que tais intenções, sinceras ou insinceras, não passam de falácia, bobagem, voluntarismo primário, nada condizente com os altos saberes dos sucessivos futuros ministros da Fazenda.

Nenhum deles ataca a causa central do desperdício orçamentário, isto é, o regime de estabilidade, origem das devastadoras despesas de custeio formadas pela massa dos proventos, vantagens e verbas indenizatórias (§ 11 do artigo 37 da Constituição federal) dos mais de 12,5 milhões de servidores públicos da União, dos Estados e dos municípios, que consomem, com generosos adicionais, todos os recursos orçamentários, expandindo o respectivo déficit, nos três Poderes e nas três esferas.

A estabilidade do emprego público é amparada por um bunker normativo dentro da própria Constituição. Nenhum servidor público pode ser exonerado ou dispensado, salvo se cometer gravíssimos crimes contra a administração. Mesmo nessa hipótese extrema, cabem-lhe ampla defesa em infindáveis processos administrativos e judiciais. Enquanto não for condenado com trânsito em julgado, goza o funcionário réu de todos os proventos, vantagens e verbas indenizatórias (artigo 41 da Constituição). A propósito, não se conhece mais do que meia dúzia desses processos canônicos em todo o País durante os últimos 70 anos, apesar do envolvimento de várias centenas de servidores nos casos de corrupção levantados a partir de 2014 pela Lava Jato. E quando, após décadas, sobrevém a condenação, fica o servidor em disponibilidade ou é “compulsoriamente” aposentado, com todos os proventos.

Nos países democráticos desenvolvidos somente os poucos que exercem altas funções de Estado são estáveis. Nos Estados Unidos apenas juízes da Suprema Corte e oficiais das Forças Armadas são estáveis. Já em nosso país, todos os 12,5 milhões de servidores são estáveis. Desde o manobrista da garagem do Senado até os ministros do Supremo Tribunal, desde o gari da pequena prefeitura de cidade de 6 mil habitantes até o médico do posto de saúde. Todos, simplesmente todos, exercem “funções de Estado”, e não simples atribuições administrativas. Pergunta-se: qual a função de Estado de um funcionário de município? Não importa. Os 12,5 milhões de servidores são constitucionalmente “imexíveis”.

Esse monumental contingente de funcionários públicos é obra da atual Constituição, que, ademais, no artigo 19 das suas Disposições Transitórias, declarou estáveis todas as pessoas que trabalhavam na União, nos Estados e nos municípios em 1988, mesmo sem concurso ou qualificação profissional.

Por coincidência, temos hoje no Brasil a seguinte realidade social: no setor privado 12,5 milhões de desempregados procuram um posto de trabalho há quatro anos. No setor público, dos 12,5 milhões de servidores públicos, nenhum foi despedido no mesmo período. São estáveis. Têm emprego garantido para toda a existência. No setor privado todos os empregados se submetem ao risco de perder o emprego, como agora milhões deles, por causa da recessão e da estagnação decorrentes da insanidade fiscal e da corrupção dos governos recentes.

Os novos governantes afirmam que aplicarão a Lei de Responsabilidade Fiscal para limitar as despesas de custeio da máquina pública (artigo 19 da LRF). Mas como, se os servidores públicos não podem ser exonerados? União e Estados têm mais de 70% de orçamento e déficit em gastos com servidores, incluindo os inativos. E quase todos os 5 mil municípios - grandes, médios e pequenos - têm mais de 80% de suas receitas e déficit também vinculados ao pagamento da folha dos seus ativos e inativos. Há pequenos municípios do Brasil em que 100% dos homens válidos no perímetro urbano ocupam cargos administrativos. E todos estáveis. O resto da verba orçamentária deficitária dos municípios (20%) é gasto com os portentosos aparatos dos srs. prefeitos e suas inúmeras secretarias, além das dezenas de nobres vereadores com gabinetes recheados de assessores.

A questão, portanto, é de natureza estrutural, está no âmbito da Constituição, pois o déficit não nasce apenas dos péssimos governos anteriores. Só a quebra da estabilidade geral e irrestrita, acompanhada da isonomia previdenciária entre os setores público e privado, é que pode diminuir o déficit público e estabelecer o equilíbrio fiscal.

E aí volta a pergunta: onde o novo governo vai cortar? Vai intervir nos milhares de municípios e nos Estados que infringem a Lei de Responsabilidade Fiscal? Ou vão enfrentar o tabu máximo da República dos privilégios, instituindo, por meio de reforma constitucional, a estabilidade para as poucas e qualificadas funções de Estado, a par de extinguir o regime especial de aposentadorias do setor público? Tais medidas reduziriam em dois terços as pantagruélicas folhas de pagamento estatais. Fora disso não há que falar em cortar despesas, abater o déficit fiscal e retomar o investimento público. Vai-se, apenas, enxugar gelo.

Que o novo governo federal e o novo Congresso tenham a coragem de resolver esse problema, para podermos retomar a prosperidade econômica em bases sólidas e permanentes.

*MODESTO CARVALHOSA É ADVOGADO.

Assembleias estaduais gastam R$ 12,4 milhões por ano com auxílio-moradia (na FOLHA DE S. PAULO)

Benefício, que pode chegar a R$ 5.000, é concedido em 9 estados e em alguns casos se aplica até a deputados que têm imóvel próprio (por João Pedro Pitombo, na Folha de S. Paulo)

Presidente da Assembleia Legislativa da Bahia entre 2007 e 2016, o deputado estadual Marcelo Nilo (PSB) é dono de cinco apartamentos em Salvador e mora no Horto Florestal, um dos metros quadrados mais caros da cidade.

Seu sucessor no comando do Legislativo, o deputado estadual Angelo Coronel (PSD), é dono de uma casa avaliada em R$ 4 milhões em Stella Maris, uma das praias mais badaladas da capital baiana.

Deputados estaduais durante sessão no plenário da Assembleia Legislativa da Bahia, estado que mais gasta com auxílio-moradia para parlamentares

Adversários na política, os dois deputados estão afinados em relação a benefícios pagos pela Assembleia: ambos, assim como os outros 61 deputados estaduais da Bahia, recebem R$ 4.028 por mês de auxílio-moradia.

A situação se replica em outros estados. Ao todo, 9 das 26 Assembleias estaduais pagam benefícios para bancar a moradia de deputados, num custo anual de R$ 12,4 milhões.

O auxílio-moradia deve ser mantido na próxima legislatura a despeito de as Assembleias serem beneficiadas pelo efeito-cascata do reajuste concedido ao Poder Judiciário, cujo teto chegou a R$ 39 mil.

O mesmo deve acontecer na Câmara dos Deputados, que prevê auxílio-moradia de R$ 4.253 para os deputados que não ocupam apartamentos funcionais, e no Senado, que prevê a restituição de até R$ 5.500 mensais para gastos com moradia em Brasília.

Além da Bahia, os estados de Minas Gerais, Santa Catarina, Goiás, Rondônia e Tocantins preveem o pagamento de auxílio-moradia para todos os deputados, independente de eles serem donos de imóveis.

Já Rio de Janeiro, Amazonas e São Paulo concedem o benefício, mas com restrições.

A Bahia é o estado que mais gasta com o auxílio-moradia de deputados estaduais, com despesa anual de R$ 3 milhões.

O benefício deve ser mantido na próxima legislatura mesmo diante do agravamento da situação financeira. 

As dificuldades serviram como justificativa para aprovação, sob forte protesto dos servidores baianos, de um pacote de austeridade que incluiu extinção e privatização de estatais, além do aumento da alíquota da Previdência paga pelos funcionários. 

Na contramão do corte de gastos, a própria Assembleia Legislativa pediu uma suplementação de R$ 80 milhões no orçamento este ano.

Presidente da Assembleia da Bahia, Coronel, que se elegeu senador em outubro, afirma que o benefício foi instituído no estado há mais de duas décadas e é importante para os deputados que vivem no interior.

"É claro que enfrentamos um momento difícil da economia. Acredito que, se os deputados assim quiserem, a Assembleia pode seguir a tendência nacional e extinguir o benefício na próxima gestão", afirma Coronel.

Em Minas, um dos estados em pior situação fiscal do país, o benefício de R$ 4.337 gera custo anual de R$ 2,1 milhões para a Assembleia.

Até 2015, o estado pagava o benefício apenas para os deputados que não moravam na região metropolitana de Belo Horizonte. Mas uma lei aprovada no início da atual legislatura estendeu o benefício para todos os deputados que o pleiteassem.

Em Santa Catarina, o gasto anual também chega a R$ 2,1 milhões. Dos 40 deputados estaduais, apenas Padre Pedro Baldissera (PT) abriu mão do auxílio-moradia mensal de R$ 4.377.

Já a Assembleia Legislativa de Rondônia é a que paga maior benefício mensal: são R$ 5.000 por mês para cada um dos 24 deputados estaduais, num custo anual de R$ 1,44 milhão.

Dois deles —Aélcio da TV (PP) e Léo Moraes (Podemos)— destinam o montante para entidades beneficentes.

Em São Paulo, Amazonas e Rio de Janeiro, recebem benefícios apenas os deputados estaduais que vivem no interior e que não possuem imóvel próprio nas respectivas capitais de seus estados.

No Rio, apenas 11 dos 70 deputados recebem o benefício mensal de R$ 3.189.

Já no Amazonas, nenhum dos 24 deputados da atual legislatura teve direito ao auxílio moradia --todos os deputados com base eleitoral no interior têm imóveis próprios em Manaus.

Em São Paulo, o auxílio-moradia foi substituído em 2013 pelo auxílio-hospedagem de R$ 2.850, que também só é concedido para deputados com base fora da região metropolitana e que não tenham imóveis na capital.

Ao contrário do auxílio-moradia, o auxílio-hospedagem demanda que o deputado estadual apresente notas fiscais de gastos com aluguel de imóveis ou diárias de hotéis.

Outros estados extinguiram o benefício nos últimos anos, na esteira de medidas de enfrentamento da atual crise fiscal dos estados.

É o caso do Maranhão, que acabou com o auxílio-moradia para deputados em fevereiro deste ano, gerando uma economia de R$ 1,5 milhão por ano. (na FOLHA DE S. PAULO)

Bombas nas contas de 2019, editorial do ESTADÃO

Com mais R$ 4,7 bilhões fora de seu controle, o governo central terá maior dificuldade para frear e tornar mais eficiente o gasto público no próximo ano. Esse dinheiro poderia ser aplicado em funções de enorme importância para os cidadãos, como educação, saúde, segurança ou obras públicas, mas será destinado ao reajuste salarial do funcionalismo. O presidente Michel Temer tentou, por meio de Medida Provisória (MP), adiar o reajuste para 1.º de janeiro de 2020, dando um precioso fôlego financeiro à nova administração. Mas o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu por decisão liminar os efeitos da MP. Tentativa semelhante havia sido bloqueada no ano passado pelo mesmo ministro.

Servidores federais ganhavam em média R$ 8,1 mil por mês em 2016 e acumularam em 20 anos ajustes bem superiores à inflação. Pelos últimos dados disponíveis, a média salarial do trabalhador formal do setor privado chegou neste ano a pouco mais de R$ 2 mil. Esses trabalhadores, ao contrário dos funcionários públicos, são facilmente demissíveis e têm sido as grandes vítimas do desemprego nos últimos anos.

A tentativa do presidente Michel Temer poderia fracassar mesmo sem a intervenção do ministro Lewandowski. Sem aprovação parlamentar, a MP perderia efeito em 8 de fevereiro e, ao descuidar do assunto, mais uma vez a maioria dos congressistas teria jogado contra a gestão responsável das finanças públicas.

Esse desprezo ao bom uso do dinheiro público tem sido demonstrado com frequência, às vezes em parceria com os senhores juízes. Isso ocorreu, por exemplo, na aprovação de um reajuste de 16,38% para os ministros do STF, com desdobramentos para os demais servidores do Judiciário, para o pessoal do Ministério Público e, enfim, para todo o funcionalismo dos três níveis de governo. Incluído o efeito cascata, esse aumento inicialmente destinado a algumas excelências deve impor ao setor público uma despesa adicional de R$ 6 bilhões por ano, segundo estimativas de especialistas. Os salários do Judiciário já são os mais altos do serviço público e, em alguns casos, podem causar inveja – ou espanto – a juízes do mundo rico.

Senhores do Judiciário têm-se permitido estourar o teto de gastos criado pela Emenda Constitucional n.º 95, mas essa faculdade é vedada a quem responde pela execução do Orçamento-Geral da União. O futuro presidente da República e sua equipe econômica terão dificuldade para preservar o teto em 2019, respeitar a chamada regra de ouro (proibição de endividamento para cobrir gastos de custeio) e manter o déficit primário no limite de R$ 139 bilhões. Terão de enfrentar todas essas limitações e, ao mesmo tempo, realizar as despesas mínimas indispensáveis para manter a administração federal em funcionamento. Pouco poderão fazer, portanto, para estimular o crescimento econômico e a redução do desemprego ainda muito alto.

Mas, além dessas, há outras bombas enterradas no caminho da gestão orçamentária. Contrariando as opiniões da equipe da Fazenda, o presidente Michel Temer decidiu criar o Rota 2030, mais um discutível programa de benefícios fiscais ao setor automobilístico. Mas congressistas ainda conseguiram, mais uma vez, piorar uma proposta já inoportuna.

Na versão final, aprovada em apenas 22 minutos no Senado, o projeto foi inflado com prorrogação de incentivos a empresas do setor instaladas no Norte e no Nordeste. Houve também uma tentativa de estender os benefícios a empresas implantadas no Centro-Oeste. Pelo menos este penduricalho foi rejeitado na Câmara. Segundo estimativa da Receita Federal, só o Rota deverá custar R$ 2,1 bilhões anuais ao Tesouro.

O presidente eleito Jair Bolsonaro criticou a proposta de reajuste para o Judiciário. Nenhum ministro do STF parece ter-se comovido. O presidente Michel Temer poderia ter vetado o aumento, mas preferiu sancioná-lo como parte de uma troca muito discutível e certamente ilusória, o fim do auxílio-moradia para juízes. Resta ao presidente eleito rezar para nenhuma outra bomba aparecer até sua posse.

Despertar da cidadania no condomínio Brasil (por MURILLO DE ARAGÃO)

Nas urnas, a luta contra o privilégio e a favor da subordinação do Estado ao interesse da sociedade

Desde os tempos coloniais, o governo é mais importante que a sociedade. A vida brasileira gira em torno do Estado. E quem se relaciona bem com ele, seja vendendo produtos e serviços ou trabalhando para ele com uma incontável série de benefícios, está feito. Criamos duas castas no Brasil: a dos que se servem do Estado e a dos que são escravizados por ele.

A mão grande dos exploradores dos cofres públicos atingiu todos os ramos da administração pública, criando um Estado gastão, ladrão, ineficiente e preguiçoso. Ao cidadão tem restado ruminar as narrativas politicamente corretas que impunham a lógica de que o Estado sabe o que faz pela sociedade.

A eleição de Jair Bolsonaro (PSL) como presidente do Brasil, cujo mandato se inicia agora, representa uma espécie de despertar da cidadania. Ainda que parte da imprensa, das esquerdas derrotadas, da academia e do mundo politicamente correto diga que não. Pois a nova lógica demole o projeto de poder que transferia a subserviência das oligarquias econômicas para as oligarquias de esquerda.

No entanto, sem entrar no mérito, a escolha em si representou uma libertação em muitos sentidos. Aliás, não é a primeira vez que tal fenômeno acontece, uma certa independência da população em relação ao pensamento das elites. Em 2005, quando o “não” ao desarmamento foi derrotado em referendo, o universo (pretensamente) politicamente correto também foi.

Em 2013, no auge das manifestações em São Paulo, que se espalharam pelo País, declarei no programa GloboNews Painel, a William Waack: “O mundo político está completamente atônito porque, evidentemente, é um fator novo e que tem profundas repercussões políticas. Pode até ser considerado um despertar da cidadania”. Pois ali prosseguia o lento despertar, que continuou este ano com o resultado das eleições para a Presidência, em outubro.

No momento, o despertar da cidadania significa que, em 2018, parte expressiva do eleitorado rejeitou a tutela da grande mídia, do universo “cultural-Rouanet” e da academia pública. E também a tutela do clientelismo escravizador de bolsas variadas. Da bolsa BNDES, com seus 13 salários e até quatro salários de bônus para seus funcionários, à finada TJLP, que beneficiava os campeões nacionais.

A cidadania pode errar em sua escolha. Mas tem o livre-arbítrio para tal. Em especial, quando as elites acadêmicas, midiáticas e culturais buscam incutir um padrão ideológico que deveria ser hegemônico, baseado na crença de que o modelo do Estado forte é o único que pode propor a redenção do povo.

Fica claro que, depois de quase 40 anos orbitando em torno de fórmulas social-democráticas e socialistas tupiniquins, não fomos a lugar nenhum de forma consistente. O roubo e o privilégio aumentaram. Os gastos com salários mais do que dobraram. Bilhões de reais foram surrupiados em corrupção, corporativismo, clientelismo e fisiologismo. Auxílios-moradia, planos odontológicos e pagamento de faculdade para filhos de juízes são a ponta de um iceberg profundo que envolveu crimes e privilégios ilegítimos, mas legalizados por leis anticidadania.

Todo o discurso do bom-mocismo dos últimos tempos serviu para encobrir uma brutal exploração dos cofres públicos em favor de políticos, empresários corruptores e corporações de funcionários públicos. A eleição de Jair Bolsonaro significou que a cidadania não quer o sistema que vigia até agora. Deseja outra relação entre o governo e a sociedade. Enfim, representa um despertar cujas repercussões não são apenas nacionais.

O Brasil da era Lula-Dilma (PT) foi um anteparo para os movimentos de esquerda não democráticos em todo o mundo. As duas gestões mantiveram relações espúrias com países e movimentos, alguns deles terroristas, cujo objetivo era implantar ditaduras sob os mais variados pretextos. Agora, consternados, devem assistir ao desmonte do aparelhamento estatal promovido diante da nossa imensa complacência. Ainda agora, após exaustivos debates, o PT decidiu que não faria nenhuma autocrítica sobre a sucessão de erros, fracassos e escândalos.

A cidadania não quer mais relações com quem não respeita, de verdade, os direitos humanos. A esquerda petista tolera as violências contra os direitos humanos em Cuba, na Venezuela e na Nicarágua, mas trata de desmoralizar e desinstitucionalizar a polícia no Brasil. Tampouco a cidadania quer aposentadorias diferenciadas ou privilégios, tais como os 16 salários pagos aos funcionários do BNDES, auxílios-moradia sem justificação e educação paga para filhos de juízes. Deseja uma segurança pública forte e uma política feita em bases de honestidade.

A cidadania demanda que o governo Bolsonaro abra a caixa de Pandora dos privilégios no Brasil. De forma ampla e transparente. E, passo seguinte, comece a cortá-los. Doa a quem doer. Não será uma batalha fácil. Não há aqui, no meu texto, uma intenção de oposição ao serviço público, que é mais do que necessário para a cidadania. Não podemos, contudo, viver num condomínio em que os moradores trabalham para os funcionários, e não o contrário.

Em junho, em artigo que publiquei na IstoÉ, afirmei que as eleições de 2018 não resolveriam os nossos problemas. Não deverão resolver, sobretudo, porque são questões incrustadas em nossa cultura há séculos. Ao longo do tempo mudou a narrativa, mas não o propósito de tutelar uma cidadania carente de educação. No entanto, a tomada de decisão do eleitorado apontou uma nova direção: a luta contra o privilégio e a favor da subordinação do Estado aos interesses da sociedade. Essa é a mensagem que veio das urnas e que Jair Bolsonaro deve receber como sus principal missão.

*MURILLO DE ARAGÃO É ESCRITOR, CIENTISTA POLÍTICO, DOUTOR EM SOCIOLOGIA (UNB) E PROFESSOR DA COLUMBIA UNIVERSITY (NOVA YORK).

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Fonte:
ESTADÃO/FOLHA

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