Petrificado, Lula faz caravana sem sair do lugar (por JOSIAS DE SOUZA, no UOL)

Publicado em 29/08/2017 05:19
Lula é candidato a cabo eleitoral, por RICARDO NOBLAT (em O GLOBO) e + Candidato em público, Lula mira o PSB em costura para Haddad (por IGOR GIELOW, na FOLHA)

Lula só virou um portento eleitoral depois que assinou, em 2002, a Carta aos Brasileiros. Nela, apropriou-se dos pilares que escoraram a política econômica na Era pós-Real. E deslizou da esqueda para o centro, beliscando votos no campo adversário. Elegeu-se presidente. No governo, vangloriou-se de ser “uma metamorfose ambulante”. Reelegeu-se com um pé nas costas e o mensalão sobre os ombros. E ainda abriu uma fábrica de postes.

Hoje, sem condições de fornecer explicações críveis sobre os episódios inacreditáveis em que se meteu, Lula encolhe. Sua retórica, baseada no ódio à força-tarefa da Lava Jato, cabe numa caixa de fósforos. Seu prestígio, tisnado por seis ações penais e uma condenação, cabe nos 30% do eleitorado que tradicionalmente pende para o PT. Ainda em dúvida sobre o que vai ser quando terminar de decrescer —se presidiário ou presidenciável— Lula realiza uma viagem ao passado.

O pajé do PT prega para devotos e convertidos ao conceder entrevistas e discursar diante das plateias companheiras arregimentadas para ouvi-lo no Nordeste. Dirige-se a uma gente que continuará seguindo-o mesmo se o TRF-4 o enviar para a cadeia. Estalando de pureza ética, Lula revela-se capaz de tudo —chama procuradores de “canalhas” e diz que os “meninos” da Lava Jato minaram a saúde de Marisa Letícia, empurrando-a para a cova. Só não consegue colocar em pé uma agenda para a reconquista dos territórios adversários.

Ao final de sua caravana de 18 dias, Lula terá percorrido 25 cidades de nove Estados nordestinos. E perceberá que, petrificado, viajou de volta para suas origens sem sair do lugar. Notará que campanha política não absolve um réu em seis ações penais, assim como uma condenação de 9 anos e meio de cadeia não elege um presidente.

Lula é candidato a cabo eleitoral, por RICARDO NOBLAT (em O GLOBO)

Uma coisa é o que Lula e os principais líderes do PT dizem para consumo externo, principalmente dos eleitores cativos dos dois. Outra é o que dizem para consumo deles mesmos.

Para consumo externo, Lula é candidato à sucessão do presidente Michel Temer. E como candidato se comporta ao sair em caravana por 25 cidades de nove Estados do Nordeste.

Para consumo interno, Lula e seus interlocutores concordam que são ralas as chances de ele não ser condenado na segunda instância da Justiça, o que o impedirá de ser candidato.

Assim, Lula está em campanha para ser o mais forte cabo eleitoral que um candidato da oposição possa ter – de preferência, um candidato do PT.

É aí que entra o nome de Fernando Haddad, ex-prefeito de São Paulo, o petista com o perfil mais palatável para uma maioria de eleitores conservadores que rejeita os políticos em geral.

É remota a possibilidade de o PT abrir mão de disputar a eleição presidencial do próximo ano com um candidato próprio. E Ciro Gomes (PDT), que ofereceu a vice ao PT, sabe disso.

No segundo turno, o jogo será outro. Se Haddad ficar de fora, o PT apoiará o candidato que se opuser ao governo Temer e ao candidato das forças reunidas pelo PSDB.

Esse candidato, nas contas do PT, será o governador Geraldo Alckmin (PSDB), a não ser que até lá ele seja tragado pela Lava Jato. Haddad acredita que Alckmin escapará incólume.

Para o PT o que verdadeiramente importa é não ser varrido do mapa eleitoral. Não passar pelo vexame que viveu nas eleições municipais do ano passado, quando elegeu poucos prefeitos.

Lula, o dilema do PT (por Hélio Schwarstzman)

É difícil a situação de Luiz Inácio Lula da Silva. A menos que ele decida fazer um improvável "mea culpa" público, admitindo, no mínimo, que se meteu em relacionamentos inadequados com empresários que já confessaram estar envolvidos até a medula em corrupção, só lhe resta mesmo esbravejar contra a Lava Jato e os jovens promotores. Ele precisa tentar pintar os processos a que responde como uma perseguição política.

É um cenário que o transforma num excelente candidato para chegar ao segundo turno e nele ser derrotado por um oponente que desperte menos animosidade na maioria da população. Sua melhor chance, senão a única, seria disputar o segundo escrutínio contra alguém ainda mais polêmico, isto é, contra Jair Bolsonaro. Eu não me surpreenderia se alguns petistas mais dados ao pensamento estratégico, levando a dissonância cognitiva a extremos, descarregassem seus votos de primeiro turno no ex-militar.

O segundo problema de Lula é que são grandes as chances de a Justiça bloquear sua candidatura. Nesse caso, o PT precisará lançar um outro candidato —que, ao que tudo indica, seria Fernando Haddad e aí o discurso anti-Lava Jato do partido tende a tornar-se contraproducente. A melhor chance de a legenda voltar a ser viável em eleições majoritárias é admitir honestamente seus erros e tentar mostrar que aprendeu algo com eles. A presença de Lula como líder máximo e inconteste do partido praticamente inviabiliza esse caminho. 

Candidato em público, Lula mira o PSB em costura para Haddad (por IGOR GIELOW, na FOLHA)

Em público, Luiz Inácio Lula da Silva continua candidatíssimo à Presidência em 2018, como evidencia seu giro por Estados do Nordeste.

Em privado, o ex-presidente acredita em sua inabilitação pela Justiça e busca tornar o nome do ex-prefeito paulistano Fernando Haddad competitivo o suficiente para que o PT ao menos não desapareça nacionalmente.

Segundo a Folha apurou, em reuniões recentes durante a caravana nordestina, Lula deixou claro a interlocutores que considera que terá sua condenação por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá confirmada em segunda instância antes do começo da campanha eleitoral.

Em reuniões reservadas, incentiva os até aqui discretos movimentos do ex-prefeito para se viabilizar.

Haddad tem se articulado em viagens pelo país. Ele dá entrevistas quase semanais para avaliar conjuntura política e sempre diz que Lula é o candidato, mas nunca nega a possibilidade de ser lançado em seu lugar.

E invariavelmente ignora as raízes da crise econômica na política dos governo do PT, poupando o padrinho.

O que é natural: além de lhe dever a carreira, Haddad precisa de Lula caso queira alçar tal voo após ter sido trucidado no primeiro turno em 2016 pelo tucano João Doria.

Mesmo que Lula seja absolvido e possa concorrer, há em setores do PT a avaliação de que o jogo é mais favorável para a centro-direita, apesar do desgaste da agenda associada à gestão Michel Temer.

Nessa avaliação, os 30% que Lula pontua em pesquisas seriam um teto, e um candidato como Haddad poderia tentar partir daí para buscar votos num espectro centrista. No partido, fala-se mais em "construir 2022" do que "sonhar com 2018".

Neste momento, o plano de Lula está focado na montagem do arcabouço para o PT manter-se acima da linha d'água em 2018, trazendo o que sobrar da implosão do PSB para seu lado.

É uma operação complexa, que foi discutida durante jantar que reuniu Lula, o governador Paulo Câmara (PSB-PE), um antigo desafeto do petista, e a viúva de Eduardo Campos, Renata, na quinta (24), no Recife.

A fatia governista do PSB, que inclui a órbita do ministro Fernando Coelho Filho (Minas e Energia), está negociando com o DEM.

Para atrair o grupo mais à esquerda do partido, descontente com a adesão a Temer, Lula tem um trunfo duplo.

Primeiro e mais fácil, a vaga de vice. Segundo, o apoio à candidatura de Márcio França (PSB) ao governo de São Paulo em 2018.

França é vice de Geraldo Alckmin (PSDB) e quer se candidatar ao Bandeirantes, mas foi rifado pelo governador paulista em nome de uma aliança nacional dos tucanos com o DEM e talvez o PMDB.

A questão é que ele é visto como muito próximo de Alckmin, o que dificultaria uma aliança nacional com o PT contra o padrinho, caso seja mesmo o presidenciável.

Além do PSB e de aliados naturais como o PC do B, os petistas trabalham com a hipótese de a pré-candidatura de Ciro Gomes desidratar, levando o PDT para a esfera lulista por gravidade.

Ciro sonha em ter Haddad como vice, mas no PT poucos confiam no ex-governador, visto como mercurial, para ficar em termos elegantes.

Por fim, a manutenção da candidatura de Lula serve para sua defesa, já que adensa a figura a ser julgada. A esperança no PT é a de que a pena seja reduzida, evitando a prisão ainda que o inabilite. 

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Fonte:
UOL + FOLHA + O GLOBO

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