Inflação cai, mas falta o ajuste (EDITORIAL DO ESTADÃO)
Há mais um ponto de luz na economia. A inflação recua, finalmente, contida pela pior recessão em décadas, um desastre completado nos últimos meses com 12,1 milhões de pessoas na rua, em busca de trabalho. Com o desemprego elevado, centenas de milhares de famílias sobrevivem com dificuldade, mas há um começo de alívio. A alta de preços ficou em 0,30% em dezembro e em 6,29% no ano, abaixo do limite de tolerância (6,5%). Ainda é considerável, mas parece afinal controlada e no rumo da meta oficial de 4,5%. Com persistência, talvez se possa chegar lá em 2017.
O percurso até aqui foi penoso e longo. Em 2015, enquanto a economia encolheu 3,8%, alimentação, moradia, transporte, educação e outros itens essenciais ficaram 10,67% mais caros, segundo a mais importante medida oficial de inflação, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A combinação de preços em disparada com atividade em queda livre é espetáculo raro, só visível em condições de enorme desajuste, causado por um acúmulo anormal de erros de política econômica.
A parte mais ostensiva desses erros, no caso brasileiro, foi o desarranjo financeiro do setor público, exacerbado durante o mandato da presidente Dilma Rousseff e deixado como herança para o governo sucessor. Arrumar as contas federais foi a grande promessa da nova equipe, mesmo antes de consumado o impeachment da presidente petista. Pela primeira vez em muito tempo um compromisso desse tipo foi recebido como algo sério. Mas envolveria um trabalho duro e demorado. O primeiro objetivo, ainda muito limitado, seria fechar o ano de 2016 com um déficit primário – sem juros, portanto – de R$ 170,5 bilhões.
Crédito escasso e juros altos ainda seriam por muito tempo os principais componentes do combate à inflação. Os juros só começaram a ser diminuídos em outubro. Depois de dois cortes, a taxa básica passou de 14,25% a 13,75% no fim do ano, continuando em nível ainda muito elevado. O aperto de juros foi um complemento importante do quadro recessivo. Essa política demorou a produzir algum resultado, mas o resultado final de 2016, uma taxa acumulada de 6,29%, sem dúvida comprova a eficácia do aperto monetário. O novo ano começou com a expectativa de novos cortes de juros pelo Comitê de Política Monetária (Copom), órgão principal de orientação das ações do Banco Central (BC).
As informações divulgadas a partir do início de 2017 confirmaram a convergência de três condições necessárias para o comitê levar adiante o afrouxamento. A inflação continuou em queda no fim do ano, a alta dos preços dos serviços começou a perder impulso e houve progresso na tentativa de conserto das contas públicas. Apesar dos obstáculos políticos, o Congresso aprovou o essencial da proposta orçamentária para 2017, com meta de déficit primário de R$ 139 bilhões, elevado, mas bem mais aceitável que o de 2016. Parlamentares de peso prometeram apoio ao projeto de reforma da Previdência, um assunto politicamente difícil, e o presidente da República já começou a falar, embora sem detalhes, sobre modernização dos tributos.
Mas é muito cedo para falar de vitória contra a alta de preços. Não se trata, agora, apenas de verificar se a inflação continuará a aproximar-se, nos próximos meses, da meta de 4,5%. O desafio é mais sério. Os aumentos foram freados, depois de muita demora, por uma recessão funda, prolongada e exacerbada por um severo aperto monetário. Isso é insuficiente.
A inflação poderá ressurgir com intensidade, se o ajuste das contas públicas e a agenda de reformas empacarem. Vários fatores têm contribuído para acentuar ou atenuar a alta de preços, mas é preciso manter o foco em um fator constante e de importância central.
O desarranjo das contas públicas tem sido a causa principal da desordem inflacionária. Sem a eliminação desse problema, os preços poderão ficar contidos temporariamente, mas voltarão a subir quando a economia se movimentar. Este é o ponto mais importante. Para uma retomada segura do crescimento, ajuste fiscal e reformas são indispensáveis.
Em novembro, a surpresa positiva do comércio
Os bons números de novembro da Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) do IBGE frustraram os pessimistas e desafiaram as projeções dos analistas: o volume de vendas do varejo restrito, que exclui veículos, peças e material de construção, cresceu 2% em relação a outubro, compensou parte da perda acumulada de 2,3% entre julho e outubro e contribuiu, segundo o IBGE, “para interromper a trajetória de queda no indicador de média móvel” registrada desde maio. Na média, projeções do mercado apontavam alta entre 0,3% e 0,4%.
Não resta dúvida de que as promoções de venda da Black Friday explicam, mas apenas em parte, a reação favorável do mês. Especialistas voltam a admitir que, por pior que tenha sido 2016 e por piores que sejam as comparações com 2015 e anos anteriores, o varejo parece ensaiar uma recuperação. Os analistas do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) falaram em “algum alento”.
Na comparação entre os últimos 12 meses, até novembro de 2016, com os 12 meses anteriores, o varejo restrito caiu 6,5% e o ampliado cedeu 9,1%. Mas, entre outubro e novembro, cinco dos oito setores pesquisados apresentaram alta, a começar de hiper, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo (+0,9%), que representam metade das vendas do comércio restrito.
Maior influência das promoções de vendas apareceram em equipamentos de escritório, informática e comunicação (+4,3%) e móveis e eletrodomésticos (+2,1%). Mas foi fraco o comportamento das vendas de tecidos, vestuário e calçados (-1,5%) e houve pequenas quedas em combustíveis e lubrificantes (-0,4%) e livros, jornais, revistas e papelaria (-0,4% também).
No varejo ampliado, as vendas de veículos e motos, partes e peças caíram 0,3% no mês, mas as de material de construção aumentaram 7,2%.
Obstáculos como o desemprego, a redução lenta do endividamento das famílias e dos juros dos financiamentos, além da desconfiança dos consumidores quanto ao futuro, limitam a retomada. Mas, se a inflação der alguma trégua e os indicadores industriais fornecerem sinais mais promissores, cria-se um ambiente melhor já para este semestre.
Na FOLHA: Transição política, ação do BC e ajuste fiscal mudaram expectativas economicas
Apesar de indicadores econômicos ainda frágeis, 2016 terminou muito diferente do que começou.
No início do ano passado, os economistas discutiam a possibilidade de o país ter sido tomado por uma patologia chamada dominância fiscal, que é quando o Banco Central perde controle da inflação por causa de uma crise fiscal, que gera desconfiança de poupadores e investidores quanto à capacidade do governo de honrar suas dívidas.
A consequência seria a inflação subindo em espiral.
Esse risco chegou a ser precificado pelo mercado financeiro enquanto analistas apontavam a probabilidade crescente de um cenário econômico disruptivo.
A expectativa para inflação em 2016 chegou ao pico de 7,62% em fevereiro, e acabou fechando em 6,3%, abaixo do teto da meta. Um êxito, tendo em vista os temores do passado recente.
O resultado demonstra que a politica monetária funciona. Seu papel é central nesta conquista, e aqui o mérito é também do ex-presidente do BC Alexandre Tombini, que iniciou o aperto das condições monetárias em 2015.
Mas havia o risco de a política monetária não funcionar, de a alta de juros ser inócua para combater a inflação.
Leia a notícia na íntegra no site Folha de S.Paulo.
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