"O Brasil precisa saber a situação real do país", por JUAN ÁRIAS (no EL PAÍS)

Publicado em 20/05/2016 19:31
Temer deve vir a público e contar, sem meias palavras, a situação em que encontrou o país

Um axioma no jornalismo reza: “Contra o rumor, a notícia”.

O Brasil está cheio, por exemplo, de rumores sobre a situação concreta de suas contas públicas, ao ponto de se embaralharem cifras que vão de cem a trezentos bilhões de reais de dívida.

O novo governo interino de Michel Temer está com dificuldade de abrir a caixa preta que revelará a radiografia do país, enquanto a opinião pública exige que lhe conte a verdade.

Até agora, tudo faz parecer que Temer cometeu deslizes ao decidir muitos de seus ministros políticos, enquanto teria acertado em todas as decisões relacionadas a economia e política exterior.

As pessoas colocadas até hoje para comandar o Ministério de Economia, o Banco Central, o BNDES, o maior banco de fomento do mundo, assim como na direção da Petrobras e no Ministério das Relações Exteriores, estão sendo aplaudidas, por se tratar de personagens de indiscutível competência técnica e profissional.

Temer não deve esperar para apresentar à sociedade o retrato sem retoques da situação econômica do país, que tudo faz pensar que é muito mais grave do que já se imaginava, enquanto dispara o desemprego, sobretudo de jovens em Estados como a Bahia, onde beira os 14%, algo que há décadas não se via neste país.

O novo Presidente interino, que em suas nomeações na área econômica está sendoaplaudido pelo mercado e pelo empresariado, o que poderia significar uma retomada da confiança dos investidores para que, em vez de continuar demitindo, voltem a contratar, deverá agora conquistar a confiança da opinião pública que lhe foi hostil desde o primeiro momento.

Para isso, precisa vir a público e contar, sem meias palavras, sem generalidades, com números e dados concretos e indiscutíveis, a situação em que encontrou o país. E deverá fazê-lo com uma linguagem e uma convicção capazes de serem entendidas até pelos menos ilustrados.

Deverá comprometer-se, com todas as letras, para não deixar, por exemplo, qualquer dúvida quanto a seu compromisso de defender as investigações em curso contra a corrupção, sem que reste a menor suspeita de que tenta proteger alguns de seus ministros já investigados pela Justiça, embora ainda não condenados.

O novo governo joga todas as cartas nessa operação de transparência perante a sociedade. Dessa transparência e sinceridade dependerá a volta ou não de Dilma à Presidência, algo que parece cada dia mais remoto.

Um fracasso de Temer nas próximas semanas poderá ser crucial para o futuro de um país que vive um dos momentos mais delicados de seus últimos 30 anos.

Depois de 13 anos de governo do Partido dos Trabalhadores (PT) e da revolução social trazida pelo ex-presidente Lula, o Brasil vive apreensivo entre uma certa orfandade política e a busca de uma urgente recuperação econômica.

O PT, pela primeira vez, admitiu que errou ao cair na tentação dos outros partidos de contaminar-se com as práticas da corrupção política e busca um caminho novo para renovar-se na oposição.

São momentos cruciais para um país que tinha sonhado com dias melhores do que esses que está vivendo, mas com uma sociedade exigente e que não renuncia a voltar a ser o que tinha imaginado e que revelou ser um triste pesadelo.

Uma sociedade que exige que lhe contem toda a verdade, que não voltem a mentir para ela e que a façam partícipe e protagonista da retomada da esperança.

Temer anunciará medidas para reduzir rombo fiscal na 2a.-feira (FOLHA)

Pressionado pelo mercado financeiro a apresentar rapidamente saídas para equilibrar o deficit fiscal, o presidente interino Michel Temer aproveitará discurso na próxima segunda-feira (23) para anunciar medidas econômicas para aumento da arrecadação e redução das despesas e corte de gastos.

Em entrevista à imprensa, no Palácio do Planalto, o peemedebista explicará como tentará reduzir orombo de R$ 170,5 bilhões das contas públicas, anunciado nesta sexta-feira (20). Segundo assessores e auxiliares, ele detalhará iniciativas como o estabelecimento de um teto de gastos, o corte de cargos comissionados e o descontingenciamento de recursos orçamentários.

O tom do discurso será a necessidade de realizar ajustes na máquina pública para melhorar a situação fiscal. O objetivo é sinalizar tanto ao mercado como à sociedade que o governo interino não está parado e tentará fazer o país voltar a crescer.

A expectativa é que o presidente interino também detalhes medidas que serão enviadas ao Congresso Nacional em curto e médio prazos, como as reformas previdenciária e trabalhista, e apresente faça um esclarecimento público para mostrar o que a equipe do peemedebista chama de "inventário de problemas" herdados do governo anterior.

A ideia avaliada é apresentar a real dimensão do rombo fiscal do país, o quadro de dificuldade econômica de pastas e secretarias e elencar gastos e despesas sem receita feitos no apagar das luzes do governo petista.

O discurso foi discutido nesta sexta-feira (20) pela junta orçamentária do governo interino. No final de semana, o peemedebista se reunirá com os ministros Henrique Meirelles (Fazenda) e Romero Jucá (Planejamento), na capital paulista, para fechar os últimos detalhes do pronunciamento.

Como o presidente interino teme um desgaste neste momento com um aumento da carga tributária, a estratégia será criar uma narrativa pública que justifique uma iniciativa neste sentido.

A ideia é reforçar o discurso de que o quadro econômico é grave e que serão necessárias medidas amargas para estabilizar a economia e voltar a gerar emprego.

A proposta é que, após o discurso, o vice-presidente leve pessoalmente ao Congresso Nacional a proposta de mudança da meta fiscal. Ele, no entanto, ainda não decidiu se irá.

Brasil não deve temer 'austericídio', diz Eduardo Loyo (em O GLOBO)

RIO - O Brasil não deve ter medo dos efeitos colaterais do ajuste fiscal, na avaliação de Eduardo Loyo, economista-chefe do banco BTG Pactual e ex-diretor do Banco Central. Para Loyo, o país não corre o risco de cometer um "austericídio", um termo normalmente usado para se referir à crise gerada em países como a Grécia por causa do desequilíbrio fiscal. O economista defende que, com juros altos, o país tem instrumentos para reequilibrar a atividade econômica.

— Tenho ouvido muita preocupação, principalmente de interlocutores estrangeiros. "Como o Brasil pode fazer um ajuste fiscal contracionista?" As pessoas são muito rápidas de se lembrar de lições anticrise, a palavra que vem à mente é o austericídio: “Vejam só o exemplo da Grécia!”. Não vamos transplantar para o Brasil toda a má vontade com políticas de austeridade em ambientes que falta o que não nos falta. Com o ajuste fiscal efetivamente implementado e tendo os efeitos contracionistas, que a política monetária faça o ajuste necessário para compensar — afirmou Loyo, durante o Seminário de Metas de Inflação do Banco Central, no Rio.

Analisando o cenário internacional. o economista acredita que o Brasil e outras economias emergentes podem se beneficiar mais dos juros baixos no resto do mundo. Nos últimos anos, devido ao crescimento baixo global, países como os EUA e algumas nações da Europa têm mantidos juros baixos - e em alguns casos até taxas negativas. A estratégia é uma forma de estimular o consumo e elevar a inflação, que quando está muito baixa indica ritmo fraco de crescimento. 

— Temos uma agenda muito pesada de sacrifícios que teremos que fazer. Com uma agenda dessa na mão, não seria bem-vinda a complicação adicional da mudança nas condições externas. Para nós, a permanência (dos juros baixos) por mais tempo do que se imaginava foi e ainda continua sendo uma boa notícia — afirmou Loyo.

Engenho e arte na saída do atoleiro 

Rogério Furquim Werneck, O Globo

Para sair de um atoleiro, é preciso calma, engenho e arte. Improvisar e tentar sair na marra costuma ser receita certa para afundar ainda mais na lama. Dilma Rousseff que o diga.

 
 

Conseguirá Michel Temer tirar a economia brasileira do enorme atoleiro em que Dilma a deixou? Tomara que sim. Mas é bom não ter ilusões sobre as proporções do desafio que tem pela frente, a exiguidade do tempo com que efetivamente conta, a precariedade dos recursos políticos a que terá de recorrer e as problemáticas fragilidades inerentes a seu governo.

Em meio a todas essas dificuldades, é animador constatar que o novo governo parece ter percebido, com muita clareza, que o âmago do gigantesco desafio que terá de enfrentar é a penosa reconstrução das finanças públicas.

E ainda mais animador saber que o núcleo da nova equipe econômica, em Brasília, contará com profissionais tão qualificados como Ilan Goldfajn, Mansueto Almeida, Marcelo Caetano e Marcos Mendes.

Tendo em vista a devastação do quadro fiscal, ninguém espera, em sã consciência, que o reparo possa ser feito num par de anos. O que, sim, talvez se possa esperar é que o governo seja capaz de promover um choque de confiança decisivo, que desencadeie um círculo virtuoso que, aos poucos, na esteira de melhora persistente das contas públicas, permita vislumbrar a restauração da sustentabilidade fiscal em prazo um pouco mais longo.

Trata-se de viabilizar uma sequência de medidas que possam dar sinais críveis de que a deterioração das contas públicas pode ser revertida. E de que o novo presidente está efetivamente empenhado na mudança do regime fiscal.

O ideal seria que o governo pudesse anunciar essa sequência de medidas tão logo quanto possível, mesmo tendo em conta que muitas delas não poderão ser implementadas de imediato. Um plano de jogo claramente explicitado, que eliminasse temores de surpresas e improvisações, seria um grande avanço.

É inevitável que boa parte dessas medidas requeira a aprovação de emendas constitucionais, que podem colocar à prova o apoio do novo governo no Congresso e exigir mais tempo do que Temer efetivamente tem.

Caso Dilma seja afastada de vez, como parece provável, Temer terá pouco mais de 31 meses de mandato. E, de agora até outubro, terá de lidar com um calendário atribulado, fadado a lhe dificultar as negociações com o Congresso, exatamente quando elas deveriam ser mais intensas: interinidade até pelo menos setembro, quando o Senado deverá se pronunciar sobre o impeachment, paralisação parcial do país com as Olimpíadas e mobilização dos parlamentares com as eleições municipais, a partir de agosto.

O ano de 2017 poderá ser menos conturbado. Mas, já em meados do ano seguinte, o Congresso estará totalmente mobilizado com as eleições de 2018.

Temer pode ficar tentado a se animar com a lembrança de que Itamar Franco contava, de início, com um mandato ainda mais curto, de 27 meses. E de que ainda se deu ao luxo de dilapidar os primeiros sete, permitindo-se nomear nada menos que quatro ministros da Fazenda entre outubro de 1992 e maio de 1993.

Foi nos 20 meses restantes que o Plano Real pôde ser concebido e implementado com grande sucesso. Mas é preciso ter em conta que as dificuldades de viabilização do Plano Real foram de natureza distinta. Não envolveram um esforço de reconstrução fiscal tão problemático como o que Temer agora tem pela frente.

Tampouco teve o governo Itamar de lidar com fatores de risco tão sérios como os que agora terão de ser enfrentados. Temer terá de governar sob o espectro da perda de mandato por decisão do Tribunal Superior Eleitoral.

E terá de conviver com a probabilidade, nada desprezível, de que os desdobramentos da Lava-Jato e de operações similares acabem afetando as possibilidades da condução da política econômica, seja pelos efeitos diretos que poderão ter sobre o governo, seja pelos abalos que poderão provocar na bancada governista no Congresso.

Fácil não será. Mas não há dúvida de que o quadro se tornou bem mais promissor.

Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio



 

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Fonte:
EL PAÍS + O GLOBO

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