Na FOLHA: Em 2016 Brasil pode perder até 2,2 milhões de vagas formais de emprego

Publicado em 04/01/2016 06:55
Por CLAUDIA ROLLI, da FOLHA DE SÃO PAULO (edição desta sexta-feira, 1.0 de janeiro de 2016)

O Brasil pode perder até 2,2 milhões de vagas com carteira assinada neste ano que começa e o emprego só deve começar a reagir em 2018, na opinião de especialistas em mercado de trabalho.

Sem a retomada da economia, com a inflação corroendo o poder de compra das famílias e as empresas se reestruturando, o desemprego —mais concentrado em 2015 no setor industrial e na construção civil— deve agora atingir com intensidade o setor de serviços e o comércio.

O trabalhador com carteira assinada deve ser o mais afetado, segundo analistas, que já veem espaço para o avanço da informalidade nas contratações. Os mais otimistas preveem ao menos 800 mil vagas eliminadas.

Na análise dos mais pessimistas —os que acreditam que o PIB vai encolher 3%—, o Brasil vai perder de 2 milhões a 2,2 milhões de empregos com registro em carteira.

E há ainda quem diga que até 2017 termine com 100 mil postos de trabalho a menos.

EFEITO RETARDADO

"O mercado de trabalho sente os efeitos da fraca atividade com defasagem de até um ano. Os problemas de 2015 terão desdobramentos mais adiante", diz Fábio Romão, da LCA Consultores.

Os dados mais recentes mostram que, de janeiro a novembro de 2015, foram destruídos 945 mil vagas formais —revertendo a tendência de alta verificada de 2002 a 2014.

A indústria concentrou 44% da perda, seguida pela construção civil. Comércio e serviços juntos responderam por 30% das vagas fechadas.

"Daqui para frente, o enfraquecimento será onde ainda há gordura para cortar: no comércio e no setor de serviços. A indústria brasileira já regrediu oito anos —voltou ao mesmo nível da crise de 2008. Pode ainda haver perda no setor industrial? Pode, mas não com a mesma magnitude já vista", diz Fabio Silveira, diretor de pesquisa econômica da GO Associados.

Serviços ligados ao consumo das famílias (alimentação, educação, lazer e turismo) e os prestados às empresas (transporte, logística e armazenagem) devem ser os mais afetados. O mesmo vale para o comércio, que depende diretamente do bolso do consumidor.

Para o diretor da GO, a taxa de desemprego na média anual sobe para 10% em 2016, se considerada a pesquisa mensal de emprego (PME) do IBGE. "São três pontos percentuais acima da taxa média de 2015 (7,1%). Em 2017, o desemprego começa a ceder, mas pouco. A previsão é a taxa média ficar no patamar de 9%", diz Silveira.

O ritmo de fechamento de postos de trabalho neste ano deve ser semelhante ao de 2015, diz o economista Fábio Romão. "Em 2016, o Brasil deve perder 1,46 milhão de vagas, sendo que a maior parte deve ser fechada no primeiro trimestre."

MAIS PROCURA

O desemprego deve continuar subindo em 2016 e 2017, diz Romão, mesmo considerando retrações do PIB menores do que a prevista para 2015 (-3,6%).

"Deve haver geração de vagas em 2017. Mas, como será um ano de saída de crise, a busca por emprego vai pressionar o mercado de trabalho. A ocupação cresce em ritmo menor que a população economicamente ativa", afirma.

Levando em conta o desemprego medido pela Pnad contínua (indicador do IBGE que substituiu a pesquisa anterior, realizada apenas nas principais regiões metropolitanas do país), a taxa passa de 8,7% na média de 2015 para 13,5% em 2017, segundo a LCA. Na medida antiga (PME), iria de 6,9% para 9,5%.

*

SCORES

7,5%
foi a taxa de desemprego em novembro nas seis regiões metropolitanas, segundo a PME

R$ 2.177,20
foi o rendimento real em novembro, com queda de 8,8% ante o mesmo mês do ano anterior

ENTENDA A DIFERENÇA

PME
(Pesquisa Mensal de Emprego) é calculada pelo IBGE considerando os dados de seis regiões metropolitanas do país

Pnad Contínua
(Pesquisa Mensal de Amostras por Domicílio Contínua) é calculada pelo IBGE e tem abrangência nacional. Considera informações de 3.500 municípios do país.

 

Previsões para economia dependem de rumos do governo federal

Para o economista Rodolfo Margato, do banco Santander, a economia tende a começar a se estabilizar somente a partir do segundo semestre de 2017, mas ainda de forma insuficiente para inverter a queda dos principais indicadores da economia.

"Tudo vai depender também de todo o imbróglio fiscal [capacidade do governo de equilibrar as contas públicas e controlar sua dívida], que aumenta a percepção de risco do Brasil e tem impacto na expectativa de melhora da atividade econômica", diz.

"Deve haver um crescimento moderado do PIB em 2017 por causa da perda de competitividade, que ocorre ao longo dos anos, e da necessidade de reformas estruturais não realizadas."

Na visão de oito economistas consultados, a queda no PIB deve ficar entre 2% e 3% neste ano.

O crescimento previsto para o ano que vem fica entre 0,9% e 1,8%.

"Se o PIB desaba, o mercado formal desaba", diz Silvia Matos, pesquisadora da FGV/Ibre. "Vamos recolher em 2016 os resultados da maior recessão em 25 anos e de uma inflação de dois dígitos. É algo que não se via no Brasil desde 2003", completa.

Fábio Pina, assessor econômico da Fecomercio-SP, destaca que o número de desempregados em 2016 deve ser ainda maior se for considerado o contingente de 1,5 milhão de pessoas que ingressam por ano no mercado de trabalho.

"Não serão só 2 milhões de desempregados em 2016 por causa de empregos eliminados. Pelas nossas projeções são 3,5 milhões, se incluídos os que entram no mercado todo ano. É um número assustador", diz.

 

Governo deixará de gastar R$ 815 milhões com subsídios rurais em 2016

Decisão do CMN (Conselho Monetário Nacional) deverá fazer o governo evitar um gasto adicional de R$ 815 milhões para pagamento de subsídios deempréstimos para a safra agrícola em 2016.

Em reunião extraordinária nesta quinta (31), os diretores do Conselho, vinculado ao Ministério da Fazenda, decidiram não aumentar o valor previsto de desembolsos de créditos subsidiados para o Plano Safra 2015/2016, previstos em R$ 216 bilhões.

Essa possibilidade existia porque houve uma aumento em relação ao estimado na quantidade de recursos da Poupança Rural, de onde os bancos captam dinheiro para emprestar no Plano Safra. Como os bancos são obrigados a ofertar um percentual de 74% do dinheiro da Poupança Rural, haveria aumento do volume de recursos disponíveis para a linha subsidiada do Plano Safra.

O Conselho decidiu criar novo fator de cálculo para a captação do dinheiro da Poupança Rural que, na prática, vai manter a quantidade de recursos previstas para o Plano Safra igual. Assim, se os recursos do Plano Safra fossem aumentados, os gastos com subsídios poderiam chegar a R$ 815 milhões.

Nas linhas de crédito do Plano Safra, os agricultores pegam recursos com taxas de juros abaixo dos valores de mercado. O governo compensa o banco pelo pagamento mais baixo de juros com recursos do Tesouro, a chamada equalização.

Neste ano de 2015, o governo pagou ao Banco do Brasil pela equalização da safra agrícola R$ 6 bilhões. Não foi divulgada a estimativa de quanto seria pago em 2016.

A falta de pagamento de R$ 10 bilhões dos subsídios devidos ao Banco do Brasil em 2014 foi um dos motivos que levou o TCU (Tribunal de Contas da União) a recomendar ao Congresso a rejeição das contas de governo da presidente Dilma Rousseff de 2014.

O relator do caso no Congresso, senador Acir Gurgacz (PDT-RO), recomendou ao Congresso a aprovação das contas com ressalva, revendo a posição do TCU. A palavra final do Congresso deverá ocorrer em 2016.

 

Realidade ampliada

Por PEDRO LUIZ PASSOS,  (É empresário e conselheiro da Natura).

Não é segredo que os resultados econômicos de 2015 foram muito ruins. O Orçamento primário, por exemplo, completou dois anos de deficit, algo inédito desde a reforma monetária de 1994.

Como a matriz dos problemas da economia está no desequilíbrio das contas públicas, o repetido revés nessa área impôs um tombo extraordinário no investimento, no emprego e na renda, abalando a confiança de empresários e consumidores. A queda do PIB, que provavelmente passou de 3,5% em 2015, somente encontra paralelo na história recente em 1981 e 1990.

A retração econômica começou em meados de 2014 e já estava em curso na campanha eleitoral, sem, no entanto, ter suscitado debate eficaz sobre a política econômica, seja pela avaliação fantasiosa da realidade propagada pela situação, seja pela falta de contundência das oposições em seus diagnósticos.

Ficou nas mãos dos artífices do retrocesso no qual nos encontramos a tarefa de repor a retomada da agenda de reformas (previdenciária, trabalhista, fiscal etc.), a adoção de medidas reparadoras das contas fiscais, com o corte de programas não essenciais, e o desmonte da indexação generalizada e da vinculação dos gastos públicos.

Nada se fez para diminuir o tamanho do Estado ou para melhorar a eficiência do setor público. Ficou apenas na promessa a consolidação fiscal indispensável para reduzir o endividamento público. Sem tais ações, a economia repetirá em 2016 o fracasso de 2015.

E não só a economia. Do escândalo da Lava Jato ao estouro da barragem de minérios no Rio Doce, passando pela emergência de novas doenças do mosquito Aedes Aegypti, o ano que passou expôs a realidade ampliada dos problemas nacionais.

Só sairemos do impasse com medidas realistas, como tem sido o ajuste tarifário e cambial. Ambos estão desfazendo quase uma década de subsídios que estouraram com o caixa da Petrobras e das empresas elétricas, além de levar as indústrias, as exportações e as contas externas à anemia devido à prolongada valorização do real.

Tais medidas engrossam a inflação num primeiro momento. Mas estão criando as condições para o retorno dos investimentos em atividades importantes da economia e já implicam a redução do deficit externo e o fomento à exportação.

O colapso das contas públicas também desperta no meio empresarial, na sociedade e entre os políticos a consciência de que só a solução dos problemas estruturais fará o país voltar a crescer. Vão se formando consensos importantes. Um deles é o de que a integração com a economia global favorece a inovação e a produtividade, dois componentes essenciais para a riqueza das nações.

É crescente também a percepção no setor privado de que os subsídios de juros, as desonerações tributárias e o protecionismo configuram ganhos ilusórios, se estendidos no tempo, mais servindo para encobrir ineficiências que induzir os avanços empresariais.

Tenho esperança de que as contas públicas serão tratadas com maior zelo, inclusive pelo Congresso Nacional, que é a instância fiscalizadora dos atos do governo. E que "criatividade", "maquilagem" e "pedaladas", esses tristes neologismos das contas nacionais, sejam julgadas como realmente são: irresponsabilidades que não dignificam o Brasil e os brasileiros.

Esse será o curso natural da crescente aceitação no debate econômico da imperiosa necessidade de que os resultados das políticas públicas sejam sistematicamente auditados, avaliados e divulgados. Quando e se todas essas transformações se tornarem realidade, poderemos festejar o ano que se vai e desejar feliz ano novo não como um chavão da época, mas como compromisso.

 

Poucas esperanças (editorial da FOLHA)

Pelo menos no que diz respeito à economia, o ano que ora começa carrega poucas esperanças de renovação. A crise de 2015, infelizmente, continuará presente em 2016, e não se imagina que as dificuldades nessa área possam ser superadas sem que se resolva antes o enorme impasse no hoje infértil campo da política.

Há, a rigor, um aspecto novo, talvez até auspicioso: é cada vez mais claro a um número crescente de pessoas que acabou o dinheiro para irresponsabilidades do poder público. O próprio governo da presidente Dilma Rousseff (PT), campeão dos desatinos administrativos, parece ter-se dado conta disso.

Iniciou-se sob a tutela de Joaquim Levy uma inflexão, ainda que caótica, na política econômica. Se ainda não mostra resultados palpáveis é porque, além do legado de erros acumulados, existem dúvidas de que a conversão do governo ao novo rumo seja permanente.

Dilma, com sua notória incompetência política e administrativa, alimenta incertezas e não encampa as reformas necessárias.

Em algumas frentes até houve sucesso, como no realinhamento das tarifas públicas e do câmbio. Na mais essencial, porém, houve tímido progresso: o ajuste das contas públicas não tocou no tema do controle de gastos obrigatórios, em especial com a Previdência.

Em meio a esse rearranjo claudicante, o país amarga profunda recessão. Projeções recentes apontam para queda do PIB de quase 4% em 2015 e de pelo menos 2% em 2016. Com isso, Dilma terá ficado seis anos no Planalto sem que a economia tenha saído do lugar.

Essa é a dimensão da tragédia que se anuncia para os brasileiros.

Ao contrário das crises históricas, entretanto, desta vez não há insolvência em moeda estrangeira causada por dívida externa alta. O país dispõe de reservas.

O colapso do PIB deriva diretamente da paralisia decisória do setor privado, que por sua vez advém da percepção de que o governo não conseguirá estabilizar o crescimento da dívida. A questão, portanto, é puramente doméstica.

Caso Dilma Rousseff se mostre capaz de implementar uma agenda de reformas que façam as despesas crescerem menos que o PIB nos próximos anos, a confiança poderá voltar gradualmente, possibilitando novos investimentos e estabilização do câmbio e da inflação, além de cortes dos juros.

A continuidade da paralisia política, todavia, aprofundará a recessão e provocará uma contínua fuga de investimentos, com desvalorização adicional do real, juros ainda mais altos e a permanência do fantasma da inflação.

Mais do que nunca, em 2016 só a política poderá salvar a economia.

 

Dilma durante reunião com juristas contrários ao impeachment

 

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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1 comentário

  • Kayo Marcelo Wiesbaden

    Muito bom! A falta de trabalho atinge o estado, o trabalhador e sua família. Mas o mais prejudicado é o trabalhador e sua família, a pessoa que se encontra desempregada fica com baixa autoestima, por se sentir inútil ao convívio social.

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