Alerta na FOLHA: Tempo da economia não é o tempo da política; qualquer que seja o governo, a hora chegou...

Publicado em 15/10/2015 08:23
POR VINICIUS TORRES FREIRE, na Folha de S. Paulo (edição desta 5a.-feira)

VINICIUS TORRES FREIRE

Fim dos tempos

Tempo da economia não é o tempo da política; qualquer que seja o governo, a hora chegou

"O TEMPO DA política não é o tempo da economia." Até agosto, pelo menos, era o que diziam os líderes do PMDB a fim de espinafrar Joaquim Levy. No tempo do ministro da Fazenda, o governo acabaria antes de a economia se recuperar da recessão, na análise dos caciques maiores.

O tempo da economia não é o tempo da política. Seja qual for o governo em 2016, terá de enfrentar a recessão, a esta altura mais do que encomendada para o ano que vem. Remendos e projetos de reforma que poderiam atenuar a crise não serão aprovados até bem entrado o ano, na expectativa mais otimista.

Caso Dilma Rousseff permaneça no cargo, terá de lidar com o fato de que o número de baixas entre a "população civil", o cidadão comum, estará crescendo com mais rapidez. Muito difícil que não seja assim até meados do ano (quando então o número de baixas ainda continuará crescendo, mas mais devagar).

Suponha-se que isso que vamos chamar sarcasticamente de "elite política" decida não levar Dilma Rousseff para o cadafalso. Uma presidente que não será mais popular do que agora governará pessoas com a vida ainda mais avariada pela crise.

Não há motivos para esperar melhoria material da vida cotidiana.

A renda continuará a cair, devido a mais desemprego, reduções ou reajustes menores de salário, inflação baixando bem menos do que o imaginado.

O total de dinheiro emprestado cai, pois os bancos relutam em emprestar e a taxa de juros é insuportável. Dado que desemprego e quebras de empresas vão aumentar, dificilmente bancos ficarão menos relutantes. Os juros não cairão no ano que vem, pelo menos para todos os efeitos práticos.

As expectativas ruins para a economia não serão aliviadas pela política: haverá ainda zum-zum de deposição ou uma presidente impopular. Logo, difícil acreditar que a confiança do consumidor se recupere do colapso que a abateu ao mínimo que se tem registro.

Neste cenário pavoroso, parece até prosaico citar uma estatística econômica importante da vida real. As vendas nos hiper e supermercados caíam por quatro meses, até agosto. Devem ter caído em setembro.

Note-se a reação de economistas ao resultado das vendas do comércio, divulgado ontem pelo IBGE: o varejo continuará a cair até o final do ano. Para quem se aventura a previsões daí em diante, caem até o Carnaval ou Semana Santa de 2016. O desemprego continuará em alta até o final do ano que vem.

Esse é o cenário de degradação normal (o ambiente é propício a desastres; a inflação pode ganhar ritmo). A sobrevida do governo Dilma Rousseff terá sequelas horrendas.

A política não tem levado em conta que o seu tempo, o seu ritmo, está encomendando recessão ainda maior para 2016 e produzindo ainda mais entulhos que vão dificultar a retomada econômica, que talvez não venha nem em 2017.

Caso a chicana político-judicial-parlamentar redunde na deposição de Dilma Rousseff, o tempo da economia também será curto para os responsáveis e envolvidos. Até agora, todos eles se comportam feito uma malta de irresponsáveis e depredadores do país. É bom que comecem a pensar em um plano do que fazer da terra arrasada.

 

NATUZA NERY

Guinada à esquerda

SÃO PAULO - O ex-presidente Lula voltou a disparar contra o ajuste fiscal do governo. A uma plateia de sindicalistas, por ocasião da abertura do 12º Congresso da CUT, nesta terça (13), reclamou que sua sucessora venceu as eleições de 2014, mas adotou o manual econômico do rival. "A impressão que nós estamos passando aqui é que nós estamos com o discurso de quem perdeu e eles adotaram o nosso [de quem ganhou]", disse o petista logo após a presidente da República deixar o local do evento.

O padrinho de Dilma Rousseff já não mantém sigilo sobre as queixas que faz à gestão de sua criatura. Há muito perdeu o pudor de criticar. Sempre que não é ouvido nas internas, solta o verbo publicamente. Quem sabe assim a síndica do Planalto resolva seguir alguns de seus comandos. Lula, portanto, pressiona Dilma por uma guinada à esquerda. E cobra que ela faça mudanças até o fim do ano. Segundo o seu receituário, a caneta presidencial deveria ser usada para destravar empréstimos do BNDES a micro e pequenas empresas, reativar o crédito a setores da cadeia produtiva com baixo índice de inadimplência e fazer de tudo para aprovar a CPMF no Congresso.

Não que Lula renegue a necessidade de reequilibrar os cofres da União. Quando está a sós com a presidente ou mesmo nas reuniões com economistas que frequentam semanalmente o seu instituto, o ex-presidente afirma que cortes na carne são inevitáveis, urgentes até. Mas o ajuste, defende, não pode ser o filho único da política econômica. Se for assim, o crescimento não vem de jeito nenhum.

Lula, portanto, vê Joaquim Levy (Fazenda) como ministro de uma nota só. Fala de ajuste, alimenta o pessimismo e não mostra a porta de saída. Apesar dessa percepção, o próprio Lula desencoraja uma mexida imediata na equipe econômica. Afinal, os tempos andam turbulentos demais para movimentos tão bruscos agora.

 

BERNARDO MELLO FRANCO

Dilma vai ao ataque

BRASÍLIA - Discursos não ganham guerras, mas podem motivar a tropa para o combate. A presidente Dilma Rousseff apostou nisso ao elevar o tom contra a oposição e se dizer alvo de uma ofensiva de "golpismo escancarado". Na noite de terça-feira, ela fez o mais duro pronunciamento desde que subiu a rampa do Planalto, em janeiro de 2011.

Acuada, Dilma foi ao ataque. Acusou os adversários de tentarem forçar um "terceiro turno" e de se esforçarem para "construir, de forma artificial, o impedimento de um governo eleito pelo voto direto". "O que antes era inconformismo, por terem perdido a eleição, agora transformou-se em um claro desejo de retrocesso político, de ruptura institucional. E isso tem nome, isso é um golpismo escancarado", afirmou.

No trecho mais forte, a presidente disse que seu mandato é ameaçado por "moralistas sem moral". "Quem tem força moral, reputação ilibada e biografia limpa suficientes para atacar a minha honra?", questionou.

Diante de sindicalistas amigos, Dilma falou em diálogo e em "paz política", mas pediu ajuda para a guerra. "Nenhum trabalhador pode baixar a guarda. É preciso defender a legalidade e normalidade com toda energia", conclamou. Foi aplaudida pelo presidente da CUT, Vagner Freitas, que já prometeu resistir de "armas na mão" se o mandato da aliada estiver em risco.

A ofensiva verbal da presidente tem um objetivo claro: motivar os eleitores do PT a saírem em sua defesa. Com apenas 8% de aprovação, ela está muito abaixo do patamar histórico do partido. Sem recuperação nas pesquisas, não há possibilidade de trégua no Congresso.

O novo tom de Dilma empolgou os aliados. Nesta quarta, muitos petistas sonhavam em convencê-la a fazer um pronunciamento em cadeia de rádio e TV. A ideia tem poucas chances de dar certo. Nas últimas vezes em que o Planalto recorreu à ferramenta, a voz da presidente foi abafada pelo som das panelas.

PAINEL

Inseguros Embora tenha havido uma leve valorização do real em relação ao dólar, o mercado continua reticente. Apesar de o STF embaralhar o jogo do impeachment, favorecendo Dilma, investidores se dizem perdidos e sem apetite para apostar no país.

Bola de cristal Um dos principais nomes do mercado financeiro nacional faz o seguinte diagnóstico sobre a situação política: o risco de impeachment já foi, em parte, precificado. Um processo contra Dilma não deve mudar muito o patamar atual do dólar.

Tiro curto Segundo esse operador, o cenário de uma forte disparada, chegando perto de R$ 5,00, é pouco factível. O impacto da abertura de denúncia seria em parte "mitigado por parcela do mercado que vê essa saída como positiva".

reto no branco A oposição viu a declaração de Rui Falcão, presidente do PT, de que vai esperar o resultado do Conselho de Ética antes de o partido decidir sua posição sobre Cunha como senha do acordo com o governo.

Gravado Lideranças de setores mais à esquerda do PT dizem que, ao fechar um pacto com Eduardo Cunha, a presidente Dilma pode até salvar seu mandato, mas pode "manchar sua biografia".

Fala comigo Estabelecida a "ponte" com Eduardo Cunha, o Planalto já está atrás de aliados do peemedebista. Nesta semana, o ministro Ricardo Berzoini (Governo) procurou Arthur Lira (PP-AL), presidente da CCJ, para tentar negociar o andamento da DRU e da CPMF.

Tem mais Apesar do congelamento temporário do processo de impeachment, o Palácio do Planalto avalia que só conseguirá dar sinais reais de superação da crise quando conseguir convencer sua base de apoio a aprovar as medidas do ajuste fiscal.

 Em meio à turbulência em Brasília, uma funcionária da Câmara foi flagrada rezando, ajoelhada, na porta do gabinete de Eduardo Cunha. Só não se sabe se orava para salvar ou derrubar o deputado.

Susto O ex-presidente Lula comentou com interlocutores que ficou "surpreso" com o forte conteúdo político do discurso de Dilma, na terça, no qual criticou "moralistas" e "conspiradores".

Carta na manga Cunha já disse a aliados que considera um dos pedidos de impeachment ainda em análise tão ou mais consistente do que o encampado pela oposição. Guarda a peça como um segundo tiro possível contra o Palácio do Planalto.

Teste cego - Apesar dos acenos de Eduardo Cunha à possibilidade de diálogo com governo, a definição dos próximos movimentos do presidente da Câmara passa pela falta de confiança mútua entre as duas partes. Em conversas reservadas, o deputado tem dúvidas sobre se o Planalto irá de fato conseguir entregar os votos necessários para salvar seu mandato no Conselho de Ética da Casa. "Tudo o que o governo prometeu até agora a todo mundo, ele não entregou", avisou a um interlocutor.

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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