Com menos de três meses cumpridos de seu segundo mandato, a presidente Dilma Rousseff atingiu a mais alta taxa de reprovação de um mandatário desde setembro de 1992, véspera do impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello.
Conforme pesquisa Datafolha feita entre segunda e terça, 62% dos brasileiros classificam sua gestão como ruim ou péssima. Há 22 anos, quando Collor estava prestes a cair, sua reprovação era de 68%.
Com indicadores de expectativa econômica batendo recordes negativos, a reprovação de Dilma subiu 18 pontos na desde fevereiro.
A pesquisa foi feita com 2.842 eleitores logo após as manifestações de domingo, atos contra Dilma que levaram milhares às ruas.
Conforme a série do Datafolha, é a primeira vez que a petista enfrenta insatisfação da maioria da população em relação ao seu governo.
No sentido oposto, a taxa de aprovação chegou ao ponto mais baixo desde o início de seu primeiro mandato. Os que julgam sua gestão como boa ou ótima somam 13%.
Este patamar só é comparável com os piores momentos dos ex-presidentes Itamar Franco (12% de aprovação em novembro de 1993, época do escândalo do Orçamento, na Câmara) e Fernando Henrique Cardoso (13% em setembro de 1999, quando a população sentia os efeitos da desvalorização do Real). Além do próprio Collor na fase pré-impeachment (9%).
Durante os dois mandatos do ex-presidente Lula, a pior taxa de aprovação foi de 28%, em dezembro de 2005, logo após a cassação do mandato parlamentar de José Dirceu (PT-SP) na Câmara, acusado de corrupção no mensalão.
Com dois pontos percentuais de margem de erro, o levantamento do Datafolha mostra deterioração da popularidade de Dilma em todos os segmentos sociais analisados pelo instituto.
As taxas mais altas de rejeição estão nas regiões Centro-oeste (75%) e Sudeste (66%), nos municípios com mais de 200 mil habitantes (66%), entre os eleitores com escolaridade média (66%) e no grupo dos que têm renda mensal familiar de 2 a 5 salários mínimos (66%).
Já a maior taxa de aprovação está na região Norte, a menos populosa, com 21%.
No Nordeste, onde a presidente obteve expressiva votação por sua reeleição, em outubro de 2014, só 16% aprovam seu governo atualmente.
Nas pesquisas de avaliação de governo, o Datafolha costuma pedir para os entrevistados atribuírem uma nota de 0 a 10 ao mandatário objeto do levantamento.
A atual nota média de Dilma é 3,7, também a pior desde sua chegada à Presidência, em 2011. Em fevereiro a nota média era 4,8. No primeiro mandato, a pior média apurada foi 5,6, em pesquisas feitas em junho e julho de 2014.
O Datafolha também perguntou aos entrevistados sobre o engajamento em atos a favor e contra Dilma: 4% disseram ter participado de algum evento contra ela no domingo, o que, projetado sobre o eleitorado, dá 5,7 milhões de pessoas. Outros 3% confirmaram participação em atos a favor dela neste ano, algo como 4,3 milhões de pessoas.
Ainda pior que a popularidade de Dilma é a avaliação que a população faz do trabalho do Congresso. A pesquisa mostra que só 9% consideram ótimo ou bom o desempenho dos deputados e senadores.
Para metade da população (50%), a atuação dos congressistas é ruim ou péssima. A taxa só é comparável com as do fim de 1993, período em que a reprovação aos parlamentares oscilou em torno de 56%.
Os presidentes da Câmara e do Senado, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e Renan Calheiros (PMDB-AL), estão entre os investigados da Operação Lava Jato.
por RICARDO MENDONÇA
EDITOR-ADJUNTO DA FOLHA DE S. PAULO
Análise: Insatisfação também aumenta em redutos petistas tradicionais
MAURO PAULINO
DIRETOR-GERAL DO DATAFOLHA
ALESSANDRO JANONI
DIRETOR DE PESQUISAS DO DATAFOLHA
Com exceção dos simpatizantes do PT e de seus próprios eleitores, todos os demais segmentos socioeconômicos, políticos ou demográficos reprovam majoritariamente o desempenho de Dilma Rousseff. Mesmo nos estratos mais beneficiados pelas políticas sociais do governo, a rejeição disparou.
Pela primeira vez, a maioria dos que têm menor renda e menor escolaridade classifica sua gestão como ruim ou péssima. O mesmo ocorre no Norte e no Nordeste.
As manifestações do fim de semana e sua repercussão intensificaram a frustração que evoluía desde fevereiro. Desde o último levantamento do Datafolha, a divulgação da lista do procurador Janot, a crise com o Congresso, os panelaços, as confusões no FIES e a mobilização da classe média potencializaram o peso da corrupção no terreno fértil da incerteza econômica.
O grau de capilaridade e cobertura das variações na opinião pública, apesar do alto prestígio e poder atribuídos às redes sociais pelos brasileiros, deve-se principalmente à comunicação em massa por rádio e TV, que alcança todas as regiões e segmentos da população. Sintoma disso são os 73% que tomaram conhecimento da divulgação dos nomes dos políicos que serão investigados pela Operação Lava Jato, índice que se mostra elevado também no Norte (68%) e no Nordeste (72%).
A gestão Dilma desce a patamares de reprovação equivalentes à instabilidade do governo Sarney e aos últimos suspiros de Collor antes de sua renúncia. O Congresso também vive sua pior crise de imagem junto à opinião pública desde o escândalo dos anões do Orçamento, em 1993.
O índice de aprovação da presidente é idêntico ao de FHC em setembro de 1999, depois do ajuste que desvalorizou a moeda brasileira. Como esperança para a petista, há ainda a referência de Itamar, que tinha apenas 16% de ótimo ou bom cerca de um mês antes da implantação do Real.
O caminho a ser percorrido pela opinião pública nos próximos meses depende de como se comportará essa imensa maioria, de perfil oposto ao dos que foram às ruas nos últimos dias. A maioria tem a insatisfação em comum com os manifestantes, mas é mais carente, menos politizada e mais pragmática quanto aos serviços públicos e à influência da economia em suas vidas.
Entre os que têm nível superior de escolaridade, 11% dizem ter saído às ruas para protestar no domingo, taxa que cai para 1% entre os de nível fundamental. Entre os que têm renda maior do que 10 salários, 12% dizem que o fizeram, contra 2% entre os mais pobres. Na avenida Paulista, no domingo, 68% tinham renda familiar superior a 5 salários, taxa que corresponde a 27% entre os paulistanos.
Cada vez mais inseguros sobre o emprego, muitos brasileiros já não enxergam no governo o continuísmo pelo qual optaram na última eleição, mas também não se identificam com a maioria dos manifestantes. Executivo e Congresso, se quiserem minimizar a crise, devem ações concretas a seus representados. E a classe média, se quiser maior representatividade, deve encorajar "rolezinhos" nas suas manifestações.
Lula aconselha Dilma procurar movimentos sociais
Na primeira reunião após os protestos de domingo, a presidente Dilma Rousseff e seu antecessor Luiz Inácio Lula da Silva estabeleceram uma agenda de reação para recuperar a interlocução do Palácio do Planalto com os movimentos sociais, hoje mais distantes do governo.
O Palácio do Planalto passará a conversar constantemente com representantes da CUT (Central Única dos Trabalhadores) e, se possível, alinhavar uma pauta conjunta, buscando acelerar medidas como na área de assentamentos da reforma agrária, por exemplo.
O PT, representado na reunião no Palácio da Alvorada por meio do presidente da sigla, Rui Falcão, também participará da ofensiva.
Dilma e Lula também discutiram, na reunião realizada na segunda-feira (16) à noite, uma estratégia para pôr fim à crise do governo com sua base aliada, que coloca em risco a votação do ajuste fiscal no Congresso.
O ex-presidente voltou a defender que Dilma dê mais espaço ao PMDB na equipe ministerial.
Dilma, segundo assessores, acatou o conselho do ex-presidente e deve entregar ao PMDB o comando do Ministério da Integração Nacional.
Na reunião do Alvorada, da qual participaram também os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil), Jaques Wagner (Defesa) e Miguel Rossetto, a avaliação é que o governo precisa recuperar o "protagonismo" no Congresso.
Sobre as manifestações de domingo, Lula disse a Dilma que o governo não pode seguir na linha de ficar tachando os protestos de um movimento de "aecistas" e de "neoliberais".
Na opinião do ex-presidente, isto só serve para desqualificar o debate sobre os protestos e acaba estimulando que mais gente vá para as ruas contra o governo.
A saída, segundo o petista, é o governo sair da defensiva e recuperar o papel de condutor do debate nacional, que a presidente Dilma perdeu desde sua reeleição.
Em documento interno, Planalto diz que comunicação é 'errada e errática
Em um momento em que enfrenta uma crise política e protestos de ruas, documento reservado do governo Dilma Rousseff admite que sua comunicação foi "errada e errática", mas avalia que "a crise é maior do que isso".
O documento, de autoria da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, diz que os "eleitores de Dilma e Lula estão acomodados brigando com o celular na mão, enquanto a oposição bate panela, distribui mensagens pelo Whatsapp e veste camisa verde-amarela". O arquivo foi divulgado pelo jornal "O Estado de S. Paulo" e depois obtido pela Folha.
Em seguida, afirma que "dá para recuperar as redes, mas é preciso, antes, recuperar as ruas". Segundo a Folha apurou, o texto é de responsabilidade do ministro Thomas Traumann e chegou à imprensa num momento em que setores do PT fazem uma nova ofensiva para controlar diretamente a comunicação oficial do Palácio do Planalto, principalmente a distribuição de verbas públicas para bancar a publicidade oficial.
Nos últimos dias, setores do PT têm criticado a comunicação do governo e defendido mudanças no setor. Uma proposta do partido é transferir para o Ministério das Comunicações, comandado pelo partido, o controle da publicidade do governo.
O documento, que faz parte do trabalho de análise de conjuntura feito semanalmente pela Secom para a presidente da República, é dividido em três tópicos: onde estamos, como chegamos até aqui e como virar o jogo?
Depois das críticas à comunicação do governo e à atuação do PT em defesa do governo, o documento anota em seu terceiro capítulo que "não será fácil virar o jogo", mas aponta que "a entrevista presidencial deste dia 16 foi um excelente início", avaliando que Dilma Rousseff falou "com firmeza sobre sue compromisso com a democracia", explicou de "forma fácil a necessidade do ajuste fiscal" e assumiu "falhas como a da condução do Fies".
Segundo o texto, a "presidente deu um rumo novo na comunicação do governo", mas "não pode parar".
Para 60%, situação da economia vai piorar
O pessimismo dos brasileiros com o futuro próximo da economia do país aumentou ainda mais e atingiu 60%. É o nível mais alto desde dezembro de 1997, quando a pergunta começou a ser feita pelo Instituto Datafolha.
O percentual superou o recorde de 55%, registrado no início de fevereiro, de entrevistados que achavam que a situação econômica iria piorar nos próximos meses.
Essa deterioração é alimentada pelas expectativas ruins com relação a aspectos macroeconômicos.
Com relação ao desemprego, por exemplo, 69% acreditam que tende a aumentar, embora 61% achem que não correm risco de ser demitidos.
O pessimismo com a inflação também continua alto: 77% acreditam que aumentará, contra 81% em fevereiro, oscilação no limite da margem de erro da pesquisa.
Antes deste ano, o recorde havia sido registrado em setembro de 2001, quando 72% previam a alta dos preços.
A sucessão de fatos negativos na economia ajuda a explicar o mau humor. Desde dezembro, houve aumento de tributos, do preço dos combustíveis e da energia elétrica, além da desvalorização acentuada e contínua do real diante do dólar americano.
Tampouco ajudaram o aprofundamento do escândalo da Petrobras e a crise de água no Sudeste, a região mais populosa e rica do país.
Em pronunciamento à nação no último dia 8, a presidente Dilma Rousseff pediu "paciência e compreensão" com as dificuldades econômicas, mas assegurou que "a situação é passageira".
A expectativa com a economia sofreu uma inflexão depois de dezembro. No último mês de 2014, o número de otimistas com a situação econômica do país (33%) era um pouco maior do que o percentual de pessimistas (28%).