Uso de Inteligência Artificial em máquinas agrícolas ainda possui desafios para superar, mas caminha para ser a próxima revolução digital das lavouras
A agricultura de precisão passa por uma nova transformação e promete revolucionar, mais uma vez, a capacidade produtiva das lavouras brasileiras. Ao integrar sustentabilidade e alta eficiência operacional, esse avanço tecnológico, conhecido como Agro 4.0, permite que produtores rurais coletem e analisem dados históricos de suas safras, tornando o manejo cada vez mais específico e personalizado para cada talhão da propriedade.
Nos últimos anos, a transformação digital trouxe avanços expressivos para o setor, com a integração de tecnologias como Internet das Coisas (IoT), uso de georreferenciamento (GNSS) e Big Data. Com a digitalização das informações e a aplicação de geolocalização em máquinas agrícolas, os produtores conseguem otimizar tempo, reduzir custos e aumentar a eficiência na aplicação de insumos. Essas inovações não apenas impulsionam a produtividade, mas também favorecem a automação e o desenvolvimento de novas soluções energéticas, alinhadas às tendências que moldam o futuro do setor.
Agora, uma nova solução começa a ganhar espaço no campo: a Inteligência Artificial (IA). Amplamente aplicada em setores urbanos, a IA é estudada pelo setor, que pretende utilizá-la para otimizar o funcionamento de tratores, colheitadeiras, pulverizadores e implementos agrícolas.
Apesar do algum avanço nesse quesito, a adoção da IA ainda enfrenta desafios. De acordo com Paulo Molin, professor especializado em máquinas agrícolas da ESALQ/USP, mesmo as máquinas mais avançadas ainda precisam de acompanhamento humano, especialmente em manobras complexas. “Já é possível automatizar e dispensar o operador da máquina, mas as indústrias perceberam que não é simples deixar um equipamento operando completamente sozinho”, explica Molin.
Ainda segundo o professor, algumas tecnologias apresentam maior potencial do que outras, especialmente porque muitas inovações são desenvolvidas sem uma compreensão aprofundada das reais necessidades dos produtores rurais. Além disso, há desafios regulatórios que precisam ser superados para viabilizar o avanço do setor no uso de equipamentos operados remotamente.
“Veja, por exemplo, os drones, que passaram por longos debates até que seu uso fosse regulamentado. Hoje, eles já são amplamente utilizados em um conceito conhecido como ‘enxame’, onde várias máquinas atuam simultaneamente de forma programada. Ainda precisamos entender como essa dinâmica será adaptada para máquinas maiores e como elas serão controladas, especialmente em áreas com talhões de formatos diversos”, destaca Molin.
Parte dessas dificuldades será superada à medida que o uso dessas tecnologias se expanda e novas experiências sejam incorporadas. Algumas empresas já estão explorando as possibilidades proporcionadas pela Inteligência Artificial, desenvolvendo projetos inovadores que prometem transformar a mecanização agrícola nos próximos anos. Confira alguns desses avanços:
EVOLUÇÃO NOS MANEJOS
A PTx é a mais nova marca de tecnologia em agricultura de precisão da AGCO, empresa que também detém as fabricantes de máquinas agrícolas Massey Ferguson, Valtra e Fendt. A companhia tem investido em projetos inovadores que integram Inteligência Artificial ao maquinário agrícola, destacando-se sistemas de autonomia, como o OutRun da PTx Trimble, além do uso de sensores avançados e monitoramento inteligente. Essas tecnologias permitem otimizar operações, acompanhar o desempenho em tempo real e melhorar o uso de insumos, proporcionando mais produtividade e sustentabilidade para o produtor rural.
Além da IA, a PTx desenvolve soluções voltadas para a agricultura de precisão, incluindo pilotos automáticos, plataformas digitais de gestão agrícola, sistemas de controle de plantio e equipamentos de pulverização seletiva. A conectividade no campo e a automação de processos também são prioridades para a empresa, visando maior eficiência operacional e redução de custos.
“Atualmente, estamos investindo no desenvolvimento de operações agrícolas autônomas, como o OutRun da PTx Trimble, pulverização seletiva com o Weedseeker e equipamentos de eficiência e controle de plantio, como os produtos Precision Planting. Nossas plataformas digitais integram todos os dados da fazenda, facilitando a gestão agrícola de forma precisa e eficiente. Além disso, o avanço da conectividade no campo abre novas possibilidades para o uso de robótica e automação em larga escala, elevando a mecanização agrícola a um novo patamar”, destaca Giancarlo Fasolin, gerente sênior de Marketing Estratégico PTx América do Sul.
NA FÁBRICA E NO CAMPO
Empresas tradicionais do agronegócio também estão adotando planos inovadores para o uso de Inteligência Artificial, como é o caso da Massey Ferguson, que investe continuamente em automação e digitalização para aprimorar processos produtivos e equipamentos agrícolas. Um dos avanços mais significativos foi a implementação dos AGVs (Veículos Guiados Automaticamente), plataformas robóticas inteligentes que transportam componentes dentro da fábrica, aumentando a agilidade e a segurança no processo produtivo. Além disso, cobots (robôs colaborativos) trabalham junto aos operadores na organização de tarefas produtivas, garantindo mais eficiência e segurança. A adoção da impressão 3D de peças seriadas também tem contribuído para a otimização da produção.
No campo, a automação está presente em diversas atividades, com destaque para os pulverizadores. O modelo MF 500R, por exemplo, conta com uma estação meteorológica integrada ao controlador MF Guide, analisando as condições climáticas em tempo real para garantir a aplicação precisa de defensivos e evitar desperdícios. Além disso, o sistema exclusivo LiquidLogic® automatiza processos de pré-mistura e recirculação de produtos, aumentando a precisão e reduzindo o uso excessivo de insumos. Outra inovação na pulverização é a aplicação seletiva, que utiliza câmeras acopladas aos pulverizadores para identificar plantas daninhas e pragas, permitindo a aplicação direcionada de defensivos apenas onde necessário.
A marca também investe em tecnologias voltadas à colheita e ao manejo da lavoura. O sistema de produtividade de colheita ProSense coleta dados em tempo real para auxiliar na tomada de decisões e no planejamento da próxima safra. Já a integração entre análise de solo e mapeamento de produtividade permite identificar áreas que necessitam de mais fertilização, otimizando recursos e maximizando a produção. Na produção de feno, as enfardadoras da Massey Ferguson utilizam controladores inteligentes que ajustam automaticamente a altura de corte e o tamanho dos fardos, garantindo mais eficiência no armazenamento e transporte.
"A transformação digital já está presente em nossos processos e máquinas agrícolas, sendo aplicada para otimizar as operações no campo. Isso permite uma operação mais eficiente, reduzindo o desgaste dos equipamentos, otimizando o consumo de combustível e aumentando a eficiência operacional. A Inteligência Artificial já é uma realidade e deve ampliar ainda mais essas interações entre sistemas", destaca Lucas Zanetti, gerente de Marketing de Produto da Massey Ferguson.
TRABALHO DE “ENXAME” E TRANSIÇÃO ENERGÉTICA
A Fendt, fabricante alemã do grupo AGCO, tem direcionado esforços para ampliar a robotização das lavouras e o uso de novas formas de energia. Um dos destaques é o projeto Fendt Xaver, que estuda a automação total do plantio por meio do conceito de "enxame de robôs". Entre os principais benefícios dessa tecnologia estão a eficiência e a sustentabilidade, já que, devido ao baixo peso dos robôs, a compactação do solo é mínima. Além disso, os equipamentos são projetados para operar longas jornadas de trabalho, aumentando a produtividade e reduzindo o consumo energético.
"São robôs que trabalham em equipe, colaborando de maneira autônoma e eficiente em tarefas como a semeadura. A ideia principal é simplificar o processo, utilizando menos sensores, controles robustos e uma estrutura de hardware clara, tornando cada robô extremamente confiável e produtivo. A gestão ocorre por meio de uma solução baseada na nuvem, onde os dados são monitorados e controlados remotamente, facilitando o acesso e a documentação precisa da semeadura", explica Elizeu dos Santos, gerente de Estratégia para Venda de Valor & Agricultura de Precisão da Fendt.
Unindo automação e sustentabilidade, a empresa também desenvolveu o projeto HELIOS, focado na redução das emissões de carbono e na promoção de práticas agrícolas mais sustentáveis. O trator HELIOS é movido a hidrogênio e utiliza uma célula de combustível de 100 kW como seu principal sistema de acionamento. O hidrogênio é armazenado em tanques de alta pressão montados acima do teto da cabine.
"Embora ainda existam desafios, como a autonomia necessária para atender às demandas operacionais diárias, o uso do hidrogênio como combustível traz um grande benefício: a redução das emissões. Esse sistema resulta apenas na liberação de vapor d’água, eliminando a emissão de CO2 associada aos combustíveis fósseis", destaca o gerente.
Outra inovação da marca é o trator elétrico Fendt e107 Vario, que se destaca pelo design compacto e silencioso. Ideal para operações em vinhedos, pomares, estufas e outros locais onde a redução de ruído e emissões é essencial, o modelo opera com um motor elétrico de alto desempenho e tecnologia de recuperação de energia, garantindo mais eficiência e sustentabilidade no campo.
APRIMORAMENTO DE GESTÃO
Na CNH, grupo que reúne as marcas Case IH e New Holland, a Inteligência Artificial (IA) é aplicada para aumentar a eficiência das colheitadeiras, tornando as operações mais automatizadas e precisas. Um dos destaques é a linha CR Intellisense™ da New Holland, lançada em 2022, que permite ao produtor escolher entre diferentes estratégias de colheita, ajustando-se às condições da lavoura e aos objetivos da produção.
“A IA do Intellisense™, aliada à tomada de decisão do operador, torna esse sistema de colheita um dos mais sofisticados do mundo, sem perder a simplicidade na operação. A CR Intellisense™ conta com uma tecnologia premiada internacionalmente, que ajusta automaticamente diversas configurações da máquina, aumentando a eficiência e a produtividade em tempo real”, explica Yara Carvalho, diretora de Tecnologia da Informação da CNH para a América Latina.
Já as colheitadeiras das Séries 160 e 250 da Case IH utilizam o sistema Automation, que emprega machine learning e IA para simplificar a operação de colheita em quatro modos distintos, proporcionando mais eficiência e produtividade. Com 12 sensores que coletam dados em tempo real, essas máquinas conseguem se autorregular e controlar automaticamente 90% das operações.
“Na busca por inovação com foco no cliente, mantemos um diálogo constante com quem utiliza nossos equipamentos e tecnologia. Entre os principais projetos em andamento, destacamos o desenvolvimento de máquinas movidas a combustíveis alternativos, como biometano, etanol, gás natural liquefeito e eletricidade, além da expansão de soluções de conectividade e Internet das Coisas (IoT), engenharia de produto e design e o desenvolvimento de drones de pulverização”, acrescenta.
Entre as tecnologias em fase de testes, a Solução de Autonomia Assistida na Colheita se destaca ao permitir a sincronização de duas máquinas. O operador da colheitadeira pode coordenar a velocidade e o trajeto de um trator sem motorista durante a operação de descarga em movimento. Os principais benefícios dessa solução incluem maior precisão nas operações, mais eficiência, redução da necessidade de mão de obra qualificada, menor fadiga e diminuição das perdas de grãos.
Outro avanço tecnológico importante é o sensor Augmenta® Field Analyzer, que melhora a qualidade do trabalho e reduz o desperdício de insumos por meio da aplicação em taxa variável, de acordo com a necessidade da cultura. A tecnologia utiliza sensores multiespectrais e câmeras 4K para analisar as plantas e, por meio de algoritmos baseados em Computer Vision e Machine Learning (CVML), determina a quantidade exata de insumo a ser aplicada em cada área. Todo o processo ocorre em tempo real, otimizando os custos da produção e tornando a operação mais sustentável.
CONEXÃO TOTAL
A John Deere tem investido fortemente na aplicação de Inteligência Artificial (IA) em suas operações industriais e agrícolas, com o objetivo de otimizar processos, aumentar a eficiência produtiva e garantir a excelência na montagem de seus equipamentos. A empresa emprega modelos de IA para o sequenciamento da produção, otimização de cargas de produtos e aprimoramento do uso de materiais. Um exemplo disso é o corte a laser, que utiliza IA para agrupar perfis de peças similares dentro de milhões de possibilidades, reduzindo desperdícios. Além disso, modelos preditivos são usados para identificar tendências de qualidade, enquanto a tecnologia CVML (Computer Vision Machine Learning) garante precisão na montagem, ao utilizar câmeras em diferentes etapas do processo produtivo.
“Esses são apenas alguns exemplos de como estamos integrando com sucesso a Inteligência Artificial em nossa manufatura. Além disso, continuamos explorando novas aplicações, como a IA Generativa, que utiliza algoritmos de aprendizado de máquina para criar novos conteúdos a partir de padrões e dados existentes. Essa busca constante por inovação e tecnologia é essencial para aprimorar a eficiência e a qualidade em nossas operações”, afirma Alexandre Kersten, gerente de Produto de Agricultura de Precisão para a América Latina da John Deere.
A John Deere já utiliza Inteligência Artificial em suas máquinas agrícolas, trazendo soluções inovadoras para otimizar o uso de insumos e reduzir custos. O ExactShot™, por exemplo, é uma tecnologia que reduz em mais de 60% a quantidade de fertilizante utilizada no desenvolvimento inicial da planta. O sistema pulveriza 0,2 ml de fertilizante diretamente na semente, no momento exato em que ela é depositada no solo, garantindo eficiência e minimizando desperdícios.
Já o See & Spray™ é um sistema avançado de pulverização que combina visão computacional e Machine Learning. Equipado com câmeras e sensores, o See & Spray™ identifica e pulveriza somente as plantas daninhas, aplicando a quantidade adequada de defensivos de forma seletiva. Essa tecnologia permite tratar cada planta individualmente, protegendo o solo e as culturas vizinhas, além de reduzir significativamente o uso de produtos químicos.
Outro serviço disponibilizado pela fabricante é o Expert Alerts, uma tecnologia preditiva que utiliza Machine Learning e Big Data para identificar e diagnosticar falhas antes que elas ocorram. O sistema previne quebras, reduz custos de manutenção e minimiza o tempo de máquina parada (downtime).
“Com o consentimento do produtor para o compartilhamento de informações coletadas em campo, a John Deere usa algoritmos avançados para analisar dados e prever possíveis falhas nos componentes da máquina. O sistema notifica gestores de frota e operadores, emitindo alertas sobre potenciais problemas e sugerindo oportunidades de melhoria no desempenho”, explica Kersten.
Além disso, a John Deere disponibiliza o John Deere Operations Center™, uma plataforma digital gratuita que auxilia clientes dos setores agrícola, construção, florestal e pavimentação de estradas. O sistema permite criar planos de trabalho otimizados, monitorar a qualidade do serviço e analisar dados em tempo real, oferecendo insights estratégicos para a melhor tomada de decisão no campo.
MONITORAMENTO E CONTROLE DE PRAGAS E DOENÇAS
A Jacto, fabricante nacional de máquinas agrícolas, tem investido em Inteligência Artificial (IA) para desenvolver equipamentos mais autônomos e eficientes. Entre suas inovações está o Arbus 4000 JAV, um pulverizador autônomo equipado com sensores avançados, como LIDAR (sensor de medição de distância a laser), câmeras, unidade inercial e receptores GNSS, que monitoram o ambiente ao redor da máquina. Essas informações são processadas pela IA do computador de bordo, que analisa se o caminho está livre de obstáculos, garantindo deslocamento seguro e preciso.
Além disso, o equipamento possui a funcionalidade Follow the Leader, que permite que a máquina acompanhe um veículo guia ou outra máquina à sua frente sem necessidade de intervenção humana. Outra funcionalidade importante é a capacidade de identificar e caracterizar frutos no pomar, analisando seu estado de maturação para prever a produtividade da lavoura.
Além da automação de maquinários, a Jacto também desenvolveu armadilhas eletrônicas para a classificação e contagem de insetos, facilitando o monitoramento remoto de pragas. Essa solução inovadora está disponível no módulo Monitoramento Integrado Inteligente de Pragas (MIIP), dentro da plataforma EKOS, sistema de gerenciamento da fazenda.
As armadilhas eletrônicas funcionam de forma semelhante às convencionais, utilizando feromônios específicos para cada praga e pisos adesivos. No entanto, contam com tecnologia embarcada que permite capturar imagens programadas do piso adesivo e enviá-las via conexão 4G para a plataforma EKOS. Além das imagens, o sistema registra dados ambientais, como temperatura e umidade, permitindo um monitoramento detalhado da infestação.
"Com a tecnologia de envio de fotos 4G de forma programada, é possível realizar o monitoramento remoto diário da população de insetos, permitindo decisões mais rápidas e precisas no controle de pragas. Isso reduz a necessidade de aplicações calendarizadas de defensivos, tornando o manejo mais eficiente e sustentável", destaca a Jacto.
O diferencial dessa tecnologia está nos algoritmos próprios de IA, que utilizam o conceito de Active Learning (Aprendizado Ativo) para aprimorar continuamente a identificação e contagem dos insetos. A arquitetura de IA foi cuidadosamente projetada para reconhecer diferentes pragas (primárias e secundárias) em uma mesma armadilha, mesmo em cenários variados.
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