Citricultura gaúcha foi uma das culturas mais atingidas pelas chuvas e enchentes do estado
Passado algum tempo das fortes chuvas e grandes enchentes registradas no Rio Grande do Sul, o estado segue contabilizando prejuízos nas mais diferentes esferas atingidas. O setor de frutas, legumes e verduras também está entre os mais afetados, especialmente nas regiões de Vales e próximas aos rios.
De acordo com dados levantados pela Emater, 206.604 propriedades rurais foram afetadas no Rio Grande do Sul, prejudicando 8.381 produtores de fruticultura e 8.049 produtores na olericultura. As perdas estimadas são de 62.053 toneladas de bergamota, 40.986 toneladas de laranja, 2.695 toneladas de banana, 51.885 toneladas de batata, 39.258 de brócolis, 21 mil de aipim, 12.742 de batata-doce e 11.612 de alface.
O Assistente Técnico Estadual da Área de Olericultura da Emater/Ascar-RS, Gervásio Paulus, explica que as três regiões mais afetadas do estado foram a Metropolitana de Porto Alegre, os Vales próximos à Lajeado e a de Caxias do Sul. Olhando para as culturas de FLVs, as que tiveram maior impacto foram a citricultura, as olerícolas de ciclo curto e as brássicas com ciclo um pouco mais longo.
“Dentro das folhosas mais afetadas estão a alface e a rúcula, que tem de 35 a 40 dias de ciclo. Além das folhosas, temos couve-flor, brócolis e repolho que tem um ciclo um pouco mais longo. Entre as frutas, principalmente a citricultura que estava em fase de colheita como a bergamota (mexerica), laranjas e limão, e áreas de banana no litoral, mas essas em menor porte”, pontua Paulus.
A região do Vale do Caí é um desses exemplos de localidade próxima à rios e que viu seus pomares de citricultura totalmente devastados pela água, como conta a Coordenadora da Regional Sindical do Vale do Caí, Regina Montenegro.
“São 21 municípios onde foi uma devastação total. Visitamos algumas partes do interior e as cenas são assustadoras, a devastação é enorme. A região dos hortigranjeiros perdeu toda a produção e perderam solo, que vai demorar para recuperar, mas ainda vão voltar a produzir bem antes do que a citricultura que levará anos para se reestabelecer. Os citricultores vão levar de 3 a 4 anos e alguns pomares não vão se reerguer”, diz Montenegro.
Gervásio Paulus também destaca que a retomada das atividades na citricultura será muito mais lenta do que nas outras culturas de hortifrutis gaúchas.
“Houve muita queda de frutas e, mesmo depois de a água baixar, continuaram as perdas porque faltou oxigênio no solo. Os pomares foram totalmente inundados nos vales e vai levar tempo para recuperar a fertilidade do solo. Vai precisar de esforços de recomposição, fazer cobertura e investir para recuperar da erosão. Tem áreas comprometidas nos vales que mais do que a inundação, que a água sobe e baixa lentamente, houve enxurrada, com a água passando com força e velocidade arrastando o solo e sua camada cultivável”, ressalta Paulus.
Outra cultura fortemente afetada foi a da noz pecan, que estava em época de colheita e viu muitos de seus pomares sendo dizimados. Carlos Eduardo Scheibe é produtor e relações públicas do IBPecan (Instituto Brasileiro de Pecanicultura), ele conta que como sua propriedade fica mais ao norte do estado, não houve registro de enchentes, apenas de chuvas. Porém, áreas mais ao sul tiveram mais danos.
Edson Ortiz é produtor de noz pecan no município de Cachoeira do Sul, região que decretou estado de calamidade pública e ficou ilhada por duas semanas, registrando até mesmo falta de itens como gás de cozinha, combustível e alimentos. Ele classifica a situação como perdas históricas para a agropecuária do município.
“Estamos tendo a pior safra da história com perdas entre 80 e 100% da produção, especialmente na região central do Rio Grande do Sul, nos vales dos Rios Jacuí e Taquari, onde estão a maioria dos pomares e foram as regiões mais atingidas”.
Ortiz relata que os problemas da safra começaram ainda antes, com inverno sem frio, chuva na florada e no ciclo, somando-se à catástrofe registrada em plena colheita.
“Alguns pomares foram parcialmente destruídos e vão levar décadas para recuperar. Outros tiveram solo lavado com erosão da parte superficial. A maioria teve as nozes da safra levadas pelas águas com as enchentes acontecendo exatamente quando as nozes estavam prontas para colher, sendo que uma boa parte estava no chão, já que as nozes maduras caem”.
A região de Farroupilha na Serra Gaúcha também sofreu impactos das chuvas e inundações, afetando cultivos de uva, citrus, pêssego, ameixa e kiwi.
“Em algumas localidades, os parreirais foram atingidos e terão que ser recuperados, o que pode prejudicar a próxima safra de uvas viníferas. Com relação às frutas de mesa, os citrus foram bastante afetados pois as chuvas ocorreram muito próximas ao período da safra, impossibilitando sua colheita. Além disso, alguns dos nossos fornecedores de pêssegos, ameixas e kiwis também tiveram danos em seus pomares”, conta Eduardo Miguel, Gerente de Marketing da Silvestrin Frutas.
Já no cultivo da maçã, cultura tradicional no estado, os estragos foram apenas pontuais, deixando o setor com baixos danos causados pelas inundações. “Ocorreram sim alguns casos, que representam prejuízos importantes aos produtores atingidos, porém na média do setor os danos foram baixos”, pontua a ABPM (Associação Brasileira dos Produtores de Maçã).
A entidade explica que a colheita da maçã Gala, principal variedade em volume, já estava totalmente concluída antes das chuvas e restava 15% por colher da variedade Fuji, cerca de 50 mil toneladas que teve parte expressiva deste volume perdida e o restante sofrendo depreciação de qualidade a valor de venda.
“As chuvas torrenciais de maio de 2024 provocaram em escala coletiva prejuízos expressivos em infraestrutura das propriedades, especialmente estragos nas estradas das propriedades rurais. Muito embora essas chuvas de 2024 tenham trazido prejuízos aos produtores de maçã, o longo período chuvoso do segundo semestre de 2023 foi mais impactante para o setor produtivo afetando brotação, floração, polinização e fecundação de flores, além da fixação, crescimento de frutos e por óbvio, também produtividade. Além disso, parte das regiões produtoras também sofreram com ocorrência de tempestades de granizo. Como resultado, a produção brasileira de maçãs na Safra 2023/2024 ficou ao redor das 880 mil toneladas, o que representa uma quebra ao redor dos 25% em relação ao que consideramos a produção média de maçãs no Brasil”, diz a ABPM.
O Assistente Técnico Estadual da Área de Olericultura da Emater/Ascar-RS, Gervásio Paulus, também destaca os danos causados na infraestrutura e na logística que também afetaram muito os produtores de frutas, legumes e verduras do estado.
“Além das perdas em si no campo, perdeu-se também por transporte e logística. A dificuldade de comercializar foi grande com estradas bloqueadas. A Ceasa de Porto Alegre recebe 40% de tudo o que é comercializado de hortifruti no Rio Grande do Sul e ficou inundada por 3 semanas. Houve um espaço provisório em Gravataí, mas com o acesso principal impedido, era necessário dar uma volta de 80 km com muito congestionamento e pista simples”, relata.
“Na região da Serra Gaúcha os maiores prejuízos foram causados por deslizamentos e inundações. Isso causou muitos danos nas estradas tanto vicinais quanto as rodovias, dificultando o acesso dos produtos aos mercados e nas estruturas de muitas propriedades. Será necessário muito trabalho para recuperar todos os estragos e com certeza, os setores de produção ainda sofrerão as consequências por um bom tempo”, aponta Miguel.
Paulus ainda ressalta que foram 2.005 estufas afetadas pelas enchentes no estado, mas alguns cultivos já estão sendo retomados. “Algumas iniciativas estão sendo feitas para auxiliar o produtor e a produção está voltando no estado. Inicialmente não tínhamos alface no estado, vinha tudo do Rio de Janeiro e chegava aqui por até R$ 60,00 a dúzia, mas agora estabilizou e voltou para R$ 20,00. Essas culturas de folhosas de ciclo curto em 2 ou 3 meses já estarão de volta ao normal e os acessos aos espaços de comercialização também estão retomados”, diz.
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