El Niño ganha força e se aproxima do patamar de Super El Niño
El Niño se intensificou nos últimos dias com maior aquecimento das águas do Oceano Pacífico Equatorial e as anomalias de temperatura do superfície do mar aproximam-se do patamar de um Super El Niño, esperando-se um aquecimento oceânico ainda maior no decorrer das próximas semanas com intensificação do fenômeno oceânico-atmosférico.
O último boletim semanal do estado do Pacífico da Administração Nacional de Oceanos e Atmosfera (NOAA), a agência de tempo e clima do governo dos Estados Unidos, indicou que a anomalia de temperatura da superfície do mar era de 1,8ºC na denominada região Niño 3.4, no Pacífico Equatorial Central.
Esta região é a usada oficialmente na Meteorologia como referência para definir se há El Niño e ainda avaliar qual a sua intensidade. O valor positivo de 1,8ºC está na faixa de El Niño forte (+1,5ºC a +1,9ºC) e se trata da maior anomalia semanal observada desde o começo deste evento de El Niño.
A maior anomalia até então neste episódio de El Niño, que se iniciou em junho, tinha sido de 1,7ºC e registrada no boletim da semana de 20 de setembro. Nas cinco semanas seguintes, a anomalia de temperatura da superfície do mar na região Niño 3.4 registrou estabilidade, variando entre 1,5ºC e 1,6ºC.
Nos últimos dias, por conta de ventos mais fortes de Oeste na faixa equatorial, o que favorece maior aquecimento das águas superficiais, a anomalia de temperatura do mar se elevou para 1,8ºC. Este é o maior valor semanal de anomalia informado pela NOAA para esta parte do Oceano Pacífico desde a semana de 9 de março de 2016, quando do Super El Niño de 2015-2016.
Por outro lado, a região Niño 1+2, está com anomalia de +2,2ºC, com El Niño costeiro muito forte junto ao Peru e Equador, aquecimento na região que teve início no mês de fevereiro e que atingiu o seu máximo de intensidade durante o inverno. A maior anomalia de El Niño costeiro na região Niño 1+2 neste ano se deu na semana de 19 de julho com 3,5º C.
O QUE É UM SUPER EL NIÑO
Não existe uma definição técnica de Super El Niño. A regra é considerar um El Niño fraco se as anomalias estão entre +0,5ºC e +0,9ºC no Pacífico Equatorial Centro-Leste, moderado entre +1ºC e +1,4ºC, forte de +1,5º a +2,0ºC e muito forte acima de +2ºC.
Aí entra a questão do que é ou não um Super El Niño. Na comunidade científica que se dedica a estudar o fenômeno ENOS (El Niño – Oscilação Sul) há quem entenda que o patamar de um Super El Niño se dê com anomalias acima de +2,0ºC e outros sustentam ser +2,5ºC.
O entendimento majoritário, e também nosso na MetSul Meteorologia, é que para haver a configuração de um Super El Niño é necessário ao menos um trimestre em que a média da anomalia da temperatura da superfície do mar fique acima de 2ºC. Assim, não basta que uma ou duas semanas tenham anomalia de +2ºC, mas é preciso uma média de ao menos um trimestre.
Com base no índice ONI (Oceanic Niño Index), que é a referência para análise trimestral das condições do Pacífico com base nas anomalias da região Niño 3.4, a última vez em que houve um Super El Niño foi em 2015-2016.
Naquele evento, foram seis trimestres seguidos com anomalia de ao menos 2ºC, sendo o primeiro entre agosto e outubro de 2015 com 2,2ºC e o último janeiro a março de 2016 com 2,1ºC. O máximo trimestral foi 2,6ºC nos trimestres outubro a dezembro de 2015, novembro de 2015 a janeiro de 2016, e dezembro de 2015 a fevereiro de 2016.
No Super El Niño de 1997-1998 houve cinco semestres com anomalias acima de 2ºC, de agosto a outubro de 1997 a dezembro de 1997 a fevereiro de 1998. Os trimestres mais quentes tiveram anomalia de 2,4ºC, em outubro a dezembro de 1997 e novembro de 1997 a janeiro de 1998.
Já no Super El Niño de 1982-1983, o Pacífico Equatorial Centro-Leste esteve em patamar de Super El Niño, assim com anomalias trimestrais de 2ºC ou mais, em quatro trimestres: setembro a novembro de 1982 (2,0ºC); outubro a dezembro de 1982 (2,2ºC); novembro de 1982 a janeiro de 1983 (2,2ºC); e dezembro de 1982 a fevereiro de 1983.
VAI TER SUPER EL NIÑO EM 2023-2024?
Haverá a configuração de um evento de Super El Niño com ao menos um trimestre em que as anomalias se situem acima de 2ºC? A tendência é que o Pacífico Centro-Leste aqueça ainda mais nas próximas semanas com o pico de aquecimento se dando entre o fim de dezembro e o mês de janeiro, sob ventos mais fortes de Oeste.
Assim, o entendimento nosso na MetSul Meteorologia é que em escala semanal serão atingidas anomalias em patamar de Super El Niño, mas são necessárias várias semanas com 2ºC ou mais para que um trimestre tenha anomalia trimestral de 2ºC ou acima, o que já consideramos um ponto de interrogação.
Os modelos de clima se dividem sobre tal possibilidade. O modelo de clima alemão da DWD projeta anomalias trimestrais de 1,76 para OND (outubro a dezembro de 2023); 1,90 para NDJ (novembro de 2023 a janeiro de 2024); 1,91 para DJF (dezembro de 2023 a fevereiro de 2024); e 1,83 para JFM (janeiro a março de 2024). Já o modelo de clima do britânico Met Office aponta 1,72 em OND; 1,83 para NDJ; 1,86 para DJF; e 1,72 para JFM.
Por outro lado, o modelo do Centro Meteorológico Europeu (ECMWF) estima 1,98 em OND; 2,09 em NDJ; 2,09 em DJF; e 1,94 em JFM. Já o modelo de clima da NASA projeta anomalias de 2,13 para OND; 2,35 em NDJ; 2,38 em DJF; e 2,14 em JFM. Também os modelos australiano e francês apontam anomalias acima de 2ºC em ao menos um trimestre.
A média de todos os 17 modelos dinâmicos de clima usados, elaborada pelo centro de clima da Universidade de Columbia, indica anomalias de 1,88 em OND; 2,00 em NDJ; 1,98 em DJF; e 1,79 em JFM. Assim, o prognóstico médio é absolutamente limítrofe em configurar ou não um Super El Niño.
EL NIÑO CONTINUARÁ ATÉ O PRÓXIMO OUTONO
A tendência é de o fenômeno El Niño seguir influenciando o clima nos próximos meses com mais extremos pelo Brasil. Ao menos até o começo ou o meio do outono de 2024 são esperadas condições de fase quente do Oceano Pacífico Equatorial. De acordo com a maioria dos modelos de clima, o pico de intensidade do El Niño se daria entre novembro e dezembro.
Com isso, novos extremos de chuva e seca devem ser esperados no Brasil. Chuva com volumes muito acima da média está no prognóstico climático da MetSul Meteorologia para os próximos meses ainda no Sul do país e acumulados acima do normal são previstos para as próximas semanas em parte do Centro-Oeste e do Sudeste, sobretudo no Mato Grosso do Sul e São Paulo.
No Norte, a chuva deve seguir abaixo da média, embora a chegada do inverno amazônico traga um aumento da precipitação. A situação tende a se deteriorar em parte da Região Nordeste com seca que tende a se agravar principalmente em áreas mais ao Norte da região com piora maior esperada para os primeiros meses de 2024.
Os mapas acima mostram as projeções trimestrais de anomalia de precipitação para a América do Sul por trimestres até abril de 2024 pela Universidade de Colúmbia, dos Estados Unidos, em que se constata a tendência muito clara de um sinal invertido da chuva no território brasileiro com excesso mais ao Sul e chuva abaixo da média no Norte e no Nordeste do Brasil.
Assim, o restante desta primavera e todo o verão de 2024 ainda terão a presença do El Niño pelas projeção da agência de clima norte-americana. A transição para uma fase de neutralidade, com o fim do episódio de El Niño de 2023/2024, somente se daria durante o outono do próximo ano, mais possivelmente entre meados de abril e maio.
O QUE É EL NIÑO
Um evento de El Niño ocorre quando as águas da superfície do Pacífico Equatorial se tornam mais quente do que a média e os ventos de Leste sopram mais fracos do que o normal na região. A condição oposta é chamada de La Niña. Durante esta fase, a água está mais fria que o normal e os ventos de Leste são mais fortes. Os episódios de El Niño, normalmente, ocorrem a cada 3 a 5 anos.
El Niño, La Niña e neutralidade trazem consequências para pessoas e ecossistemas em todo o mundo. As interações entre o oceano e a atmosfera alteram o clima em todo o planeta e podem resultar em tempestades severas ou clima ameno, seca ou inundações. Tais alterações no clima podem produzir resultados secundários que influenciam a oferta e os preços de alimentos, incêndios florestais e ainda criam consequências econômicas e políticas adicionais. Fomes e conflitos políticos podem resultar dessas condições ambientais mais extremas.
Ecossistemas e comunidades humanas podem ser afetados positiva ou negativamente. No Sul do Brasil, La Niña aumenta o risco de estiagem enquanto El Niño agrava a ameaça de chuva excessiva com enchentes. Historicamente, as melhores safras agrícolas no Sul do país se dão com El Niño, embora nem sempre, e as perdas de produtividade tendem a ser maiores sob La Niña. O El Niño agrava o risco de seca no Norte e no Nordeste do Brasil enquanto La Niña traz mais chuva para estas regiões.
A origem do nome “El Niño” data de 1800, quando pescadores na costa do Pacífico da América do Sul notavam que uma corrente oceânica quente aparecia a cada poucos anos. A captura de peixes caía drasticamente na região, afetando negativamente o abastecimento de alimentos e a subsistência das comunidades costeiras do Peru. A água mais quente no litoral coincidia com a época do Natal.
Referindo-se ao nascimento de Cristo, os pescadores peruanos, então, chamaram as águas quentes do oceano de El Niño, que significa “o menino” em espanhol. A pesca nesta região é melhor durante os anos de La Niña, quando a ressurgência da água fria do oceano traz nutrientes ricos vindos do oceano profundo, resultando em um aumento no número de peixes capturados.
O último episódio de El Niño se deu entre 2015 e 2016 e foi de muito forte intensidade, o que rendeu a expressão Super El Niño e o apelido de “El Niño Godzilla”. Este evento foi responsável por grandes enchentes no Sul do Brasil e alguns dos maiores picos de cheia do Lago Guaíba, em Porto Alegre, desde 1941.
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