Cenário para represas do Sudeste é pior que em 2014, volta temor de racionamento
Por Anna Flávia Rochas
SÃO PAULO (Reuters) - As previsões para a situação dos reservatórios das hidrelétricas do Sudeste do país em janeiro pioraram e as condições do período úmido atual têm se mostrado mais desfavoráveis do que no ano passado, frustrando expectativas iniciais de meteorologistas e do setor elétrico.
Diante de tal cenário, em que as chuvas têm se mostrado bem mais escassas do que o esperado, uma possível necessidade de racionamento do consumo de eletricidade volta a rondar o planejamento de consultorias e comercializadoras de energia do país.
O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) reduziu a 44 por cento da média histórica a estimativa de chuvas esperadas para reservatórios do Sudeste em janeiro, segundo o informe do Programa Mensal de Operação divulgado nesta sexta-feira, número antecipado mais cedo por fontes à Reuters.
A estimativa da semana passada era de que as chuvas na região seriam equivalentes a 56 por cento da média, próximo do que ocorreu em janeiro do ano passado, quando as chuvas foram equivalentes a cerca de 54 por cento da média histórica. As previsões atualizadas representam uma grande redução ante a estimativa de afluências equivalentes a 90 por cento da média feita pelo ONS no final de dezembro.
O ONS reduziu também o valor estimado para o nível operativo de reservatórios ao final de janeiro, sendo que as represas do Sudeste devem chegar a 18,5 por cento, ante estimativa anterior de que ficassem em 22,7 por cento.
A estimativa atualizada sinaliza que não haverá recuperação dos reservatórios em janeiro, como deveria ocorrer, e sim uma queda em relação ao nível atual das represas do Sudeste de 18,72 por cento e de 19,36 por cento ao fim de dezembro.
"Tem um sistema de alta pressão que não deixa chuvas saírem do Sul para o restante do Brasil, que atuou no ano passado e não estava previsto para esse ano", disse o gerente de regulação da Safira Energia, Fábio Cuberos.
O meteorologista da Climatempo Alexandre Nascimento disse que esse sistema deve começar a enfraquecer na semana que vem e há expectativa de retorno das chuvas nos últimos 10 dias de janeiro. "Mas isso não vai compensar essas duas primeiras semanas de janeiro e a última semana de dezembro que tiveram pouquíssima chuva", disse ele.
Apesar de as previsões de chuva poderem mudar rapidamente, Nascimento lembra que as estimativas têm se mostrado melhores que a realidade nos últimos tempos. "Olhando as condições atuais, tanto de reservatórios como do clima, acho que não tem chuva para reverter a situação de forma tão satisfatória para dizer que a situação estará tranquila em abril", disse.
O ONS estima ainda que as afluências em janeiro devem ser equivalentes a 63 por cento da média no Norte, 27 por cento da média no Nordeste e 222 por cento da média no Sul. Assim, as represas dessas regiões deverão finalizar janeiro a 32,2 por cento, 16,6 por cento e 68,6 por cento, respectivamente.
O Operador ainda manteve o posicionamento divulgado na semana passada de que a análise das atuais condições hidrometereológicas e climáticas no Sudeste/Centro Oeste e no Nordeste ainda não caracterizam o estabelecimento efetivo do período úmido.
RESERVATÓRIOS A 30% EM ABRIL
As previsões de agentes do setor elétrico apontam que o nível dos reservatórios das hidrelétricas no Sudeste deve chegar a no máximo 30 por cento de armazenamento ao fim do período úmido, em abril, em condições piores do que no ano passado, quando ficou em 38,77 por cento.
Em 2001, ano do racionamento de energia, o nível dos reservatórios do Sudeste chegou a 32,18 por cento em abril. O racionamento foi decretado em junho, quando o nível das represas estava abaixo de 30 por cento. Na ocasião, contudo, o Brasil não contava com a mesma diversidade de fonte de geração de energia e nem com um sistema de transmissão interligado tão extenso.
"Se a chuva vier na média, a estimativa do ONS é que no final do período úmido estivesse com 35 por cento nos reservatórios do Sudeste e daria para passar o ano todo. Mas é difícil chegar a 35 por cento no cenário atual", disse o consultor da Enecel Energia, Lucilio Lelis.
Ele acrescentou que, além disso, o consumo de carga de energia no sistema elétrico já começou a atingir recordes na demanda instantânea máxima diante das altas temperaturas registradas, conforme aconteceu na terça-feira nos subsistemas Nordeste e Sudeste/Centro Oeste..
"A situação está muito crítica mesmo. Deveria haver uma medida mais enérgica para reduzir a carga", disse Lelis.
O diretor da consultoria Excelência Energética, Erik Rego, avalia que o cenário causa preocupação quanto ao abastecimento neste ano. "Janeiro, fevereiro e março são os três meses que têm que salvar o ano", disse.
Pelas projeções da consultoria realizadas no fim de dezembro, seria preciso chover 80 por cento da média histórica no período úmido no Sudeste para evitar a necessidade de um racionamento de energia, disse Rego.
Cuberos, da Safira Energia, disse que na última projeção de da consultoria, considerando até a segunda semana de janeiro, a expectativa era de que o nível dos reservatórios das hidrelétricas no Sudeste chegasse a entre 30 e 35 por cento em abril e a 10 por cento em novembro.
"Com esse cenário agora, vamos ter que dar uma revisada nas previsões. A gente começa, sim, a vislumbrar alguma possibilidade de complicar o abastecimento. A situação está se agravando a cada semana", disse.
Em relação ao setor elétrico, Braga admitiu que o Brasil está entrando em 2015 com menos água nos reservatórios das hidrelétricas e que o regime de chuvas "aparentemente será muito próximo" ao de 2014, sendo que o ritmo hidrológico no Sul e no Norte está melhor que no ano passado.
O ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, afastou nesta sexta-feira a possibilidade de um racionamento de energia elétrica. "Nosso sistema elétrico está suficientemente robusto e nós temos energia na base térmica e energia de matrizes alternativas, que estão cada dia mais entrando no nosso sistema, para dizer que nós não teremos racionamento, mais uma vez, no ano de 2015, em que pese todas as dificuldades climáticas", afirmou em coletiva de imprensa.
Alexandre Nascimento, da Climatempo, vê o nível das represas de hidrelétricas no Sudeste em no máximo 30 por cento ao final do período úmido.
Para o reservatórios do Cantareira, que abastace a Grande São Paulo com água, as previsões também pioraram. "No cenário mais otimista possível, chegaríamos em 20 por cento (em abril)", disse. No início de janeiro, Nascimento disse que na melhor das hipóteses o reservatório recuperaria o volume morto, chegando a 28 por cento de armazenamento.
(Reportagem adicional de Paula Laier)
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