Chuvas chegam ao Sul de Minas Gerais, mas a dúvida é se os frutos do café vão crescer
Apesar das chuvas terem retornado para algumas regiões cafeeiras neste final de semana, os volumes ainda são baixos e as precipitações acontecem de forma muito irregular no sul de Minas Gerais. Em resumo, as chuvas foram e são bem vindas, mas chegaram muito tarde para a safra 21. A questão é se haverá formação de ramos para a safra 22. Mais preocupante, se os chumbinhos (os grãos em formação) serão abortados pelas plantas. Caso os grãozinhos comecem a cair, as perdas serão elevadas para esta safra 2021 no Sul de MG (a maior região produtora de cafés arábicas do Mundo).
-" Melhorou a condição, mas as chuvas ainda não se regularizaram", diz Éder Ribeiro, agronomo da Cooxupé e responsavel pela agrometeorologia da Cooperativa. Éder lembra que, em novembro, apesar do maior volume, as chuvas ficaram abaixo da média e se concentraram no segundo decênio do mês, ou seja, choveu, mas de forma muito irregular".
--"Até agora, parece que dezembro está indo para o mesmo caminho. Sem contar que as temperaturas continuam muito altas. A cada semana sem chuva já é um pedacinho da safra de 2022 que está indo embora", diz Éder Ribeiro.
Acompanhe os volumes de chuvas dos últimos dias, recolhidos pelo Sismet:
Municípios | 06/12/20 |
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Mensal |
Mensal |
---|---|---|---|---|---|---|
Alfenas | 18,6 | 10,2 | 9,8 | 24,8 | 78,4 |
209,8 |
Alpinópolis | 6,8 | 38,6 | 0,4 | 7,8 | 77,0 |
|
Cabo Verde | 0,2 | 2,6 | 0,2 | 15,6 | 26,6 |
252,5 |
Caconde | 0,0 | 25,8 | 0,2 | 24,0 | 55,4 |
251,1 |
Campos Gerais | 20,6 | --- | --- | 7,8 | 45,2 |
224,4 |
Carmo do Rio Claro | 18,2 | 93,8 | 0,2 | 22,8 | 197,6 |
219,7 |
Coromandel | 5,0 | 0,0 | 0,0 | 1,8 | 45,2 |
258,3 |
Guaxupé | --- | --- | --- | 3,8 | 15,4 |
241,7 |
Monte Carmelo | 0,2 | 7,8 | 0,0 | 21,0 | 114,8 |
278,2 |
Monte Santo de Minas | 0,0 | 3,0 | 0,0 | 6,4 | 30,2 |
254,0 |
Nova Resende | 5,4 | 6,8 | 0,0 | 0,2 | 46,6 |
258,2 |
Rio Paranaíba | 1,0 | 8,0 | 0,0 | 1,4 | 44,4 |
264,4 |
São José do Rio Pardo | 0,2 | 6,4 | 0,0 | 0,2 | 8,6 |
245,4 |
Serra do Salitre | 7,6 | 8,4 | 0,0 | 11,2 | 29,2 |
252,2 |
Fonte: Sismet Cooxupé
O problema está mais à frente
As condições climáticas estão no radar do mercado há algumas semanas. E o professor José Donizeti Alves, pesquisador da Universidade Federal de Lavras (UFLA), reconhece que o processo de desenvolvimento da safra 2021 já está com três meses de atraso nas principais regiões produtoras do país.
Os impactos da severa estiagem também podem atingir a safra de 2022. "Essa perda que nós já tivemos, ela vai refletir na safra de 2022 porque nesses três meses que já passaram, a planta não cresceu..., então nós vamos ter menos rosetas. A janela de crescimento do ramo encurtou em três mese, e esse encurtamento vai refletir em menos roseta para produzir grãos em 2022", afirma.
Floradas desuniformes
Donizeti explica que, apesar das condições climáticas terem sido positivas para a colheita da safra 20, desde março o corredor cafeeiro enfrenta baixo volumes de chuvas, deixando um déficit hídrico crítico para a produção do ano que vem. Além da falta de água, as temperaturas elevadas também castigaram o cafezal.
No mês de setembro foi registrada a primeira florada generalizada com condições fora do ideal para o desenvolvimento da planta.
-- "Quando se tem um déficit hídrico muito intenso e altas temperaturas, acabamos tendo uma queima do botão floral, que é quando não tem fruto e há abortamento. A maior parte dessa florada não vingou, é isso que nós chamamos de abortamento", afirma.
Perda de chumbinhos
Fotos: Guy Carvalho
As chuvas continuaram irregulares durante todo o mês de setembro e as temperaturas também permaneceram acima dos 35 graus.
"Já no mês de outubro, a chuva até voltou, mas o déficit hídrico já era muito grande. Nesse momento, tivemos uma segunda florada, que teve um pegamento mais positivo, mas acontece que as chuvas não cairam nos níveis que a gente esperava. Foi uma chuva para abrir a flor", comenta.
No começo de novembro as condições foram mais positivas, com chuvas pouco mais volumosas, mas ainda abaixo do que era ideal, com apenas 20 e 30 mm. Com o déficit hídrico muito acentuado e temperaturas elevadas, o professor explica que a planta passa a produzir um hormônio chamado ácido abscísico (ABA) – que funciona como um inibidor de crescimento.
-- "O que acontece é que aquele frutinho que vingou, não desenvolve, e ele pára de crescer", explica.
Perdas de folhas
Ainda durante o mês de novembro, a planta começou a produzir também um hormônio chamado Etileno, que tem como característica atuar jogando folhas fora. "A planta já perdeu muita folha durante a colheita. A planta vem de agosto até novembro muito desfolhada e muito murcha. E quando a folha está murcha, a raiz responde, não absorvendo água, ou seja, piora o quadro", explica.
Esperança é a formação de ramos
Entre o final de novembro e começo deste mês de dezembro, as chuvas passaram a ser mais regulares em Minas Gerais, segundo o professor. A expectativa daqui para frente, é que as previsões se confirmem e a planta comece a reagir.
-- "Essas folhas que vão nascer agora, se a condição de chuva voltar ao normal, apresentarão, a cada ramo, dois pares (de folhas) que vão contribuir para aumentar o rendimento dos frutos que estão na própria planta", explica.
Fotos: Guy Carvalho
Porém, as chuvas de agora em diante não recuperam mais os danos para a safra de 2021.
-- "Hoje não tem jeito, para a safra de 2021, de aumentar o número de frutos. Mas tem jeito de você aumentar o peso daqueles frutos que estão lá. O produtor precisa aumentar o tamanho do fruto, não tem outra saída para 2021", afirma o especialista.
O professor explica que as chuvas são importantes neste momento, mas o produtor precisa estar atento aos tratos culturais.
-- "Nós já estamos atrasados, tudo que a gente tem que fazer daqui pra frente, a gente tinha que ter feito desde setembro. Agora nós não podemos cruzar os braços e só esperar. Se voltar a chover como a previsão está falando, nós vamos ter aumento de folha e com o cafeicultor cuidado bem, ele vai aumentar a renda e ajudar a aumentar a produção", explica.
Outros fatores devem impactar 2021
Além das questões climáticas, o especialista destaca outros pontos que devem impactar a próxima produção, são eles: o tipo de variedade utilizada; o grau de desfolha - quanto mais desfolhada, menos produz; quantidade que produziu na safra de 2020; altitude - quanto mais baixo, maior a perda; alta incidência de doenças e pragas - que teve aumento expressivo de bicho mineiro devido às altas temperaturas e idade da lavoura.
O professor Donizeti diz, que apesar das lavouras apresentarem alto nível de estresse, ainda não é possível quantificar o tamanho do impacto. Considerando o sul e cerrado mineiro e a Alta Mogiana/SP, o professor explica que as perdas estão muito variáveis, o que acaba dificultanto entender o tamanho da baixa para o ano que vem.
Dados dos especialistas indicam que a minoria das lavouras devem ter cerca de 10% de perda, enquanto a maioria deve perder entre 20 e 40% e ainda há os produtores que optaram pela poda e terão safra zero no ano que vem.
Orientações para o produtor
O especialista destaca que a partir de agora o produtor deve avaliar as condições e tomar a melhor decisão, visando tanto a safra de 2021, como a safra de 2022. "O produtor que quer diminuir a perda em 2021, o enfolhe do café. Se quer diminuir a a perda para 2022, faça crescer ramos", comenta.
As atenções do produtor precisam estar voltadas para a nutrição de planta, sobretudo na aplicação de macronutrientes como nitrogênio, potássio e cálcio. "Nós temos que ter um controle muito efetivo de pragas e doenças. Devido à seca, nós tivemos um aumento muito grande de bicho mineiro, que desfolhou muito", comenta.
Destaca ainda que é interessante que o produtor faça uso reposição hormonal, os bioestimulantes e antiesstressantes. "Porque quando o cafeeiro entra em estresse, ele deixa de produzir hormônios de crescimento e tem produtos que você consegue fazer esse controle. Todas essas ações tem um único objetivo que é aumentar a fotossíntese da folha do café, que é o que vai fazer o fruto crescer. O segredo é aumentar a fotossíntese", complementa.
Confira publicação feita pelo produtor Guy Carvalho, avaliando as condições das lavouras em Cabo Verde/MG:
Guy Carvalho: Safras 21/22: o desafio é quantificar os prejuízos
"Já estamos no mês de dezembro e temos várias declarações de produtores e agrônomos experientes dizendo que nunca viram uma ocorrência como essa durante a história de suas vidas, e um consenso geral é de que os prejuízos decorrentes disso tudo são muito grandes e irreparáveis.
O primeiro impactado é o produtor rural atingido pela seca, principalmente aqueles que já possuem compromissos financeiros para pagamento pós-colheita do ano de 2021. Depois, temos o impacto social das cidades que possuem em sua base econômica a atividade agropecuária. Menor receita de vendas geram menos impostos. Menos dinheiro circulando pode causar mais desemprego e menos irrigação econômica, e já podemos imaginar o forte impacto em tempos de pandemia, não será fácil! A cadeia produtiva antes, dentro e depois da porteira sentirá os danos.
O momento exige muita cautela por parte das lideranças e, mais ainda, uma união de discursos e ações para amenizar os efeitos gerados pela seca, sejam eles financeiros, sociais ou até mesmo psicológicos. Os produtores rurais precisam de boa orientação em momentos difíceis, visto claramente que os efeitos da seca estarão presentes no ano de 2021 e também 2022, pois hoje as lavouras cafeeiras apresentam crescimento comprometido e muito abaixo do normal.
Ainda não podemos falar o quanto foi perdido em termos de produção, pois existem variáveis importantes a serem consideradas, mas não dá para negar que as perdas de potencial para a próxima safra já são uma realidade e variam até dentro da mesma gleba em função da estrutura e idade das plantas, produção na safra 2020, variedade cultivada, tipos de poda e topo clima, sendo maiores as que ocorreram em áreas voltadas para o sol da tarde nas lavouras que saíram de uma carga maior. Em áreas irrigadas, que floresceram no início de outubro, as perdas se igualam as de sequeiro em função das altas temperaturas. O sentimento forte é de que esse clima inédito nas principais regiões produtoras trará consequências também nunca vistas.
Vale também salientar a necessidade de revermos de forma urgente a questão dos seguros agropecuários no Brasil, pois da maneira que está não pode mais continuar, uma vez que o produtor simplesmente não consegue receber os valores devidos quando existe a ocorrência de sinistro".
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