Acordo entre Austrália e Emirados Árabes sobre reduzir taxas da carne bovina australiana pouco deve afetar exportações brasileiras, dizem especialistas
Um acordo entre Austrália e Emirados Árabes sobre a redução de taxas de exportação para os Emirados Árabes Unidos deve entrar em vigor no final deste ano. De acordo com informações da agência internacional de notícias Reuters, o acerto “removeria as tarifas de cerca de 99% dos produtos australianos e resultaria em uma economia de 135 milhões de dólares australianos (91 milhões de dólares americanos) no primeiro ano”. Entre os principais produtos enviados pela Austrália ao destino no Oriente Médio estão carne, laticínios, sementes oleaginosas, frutos do mar, aço, nozes, mel, carvão, grão-de-bico e lentilhas.
Apesar da Austrália ser um grande player quando se fala em carne bovina, especialistas no setor apontam que, mesmo com a diminuição da taxação sobre a proteína exportada para os Emirados Árabes pouco deve alterar a competitividade do Brasil para os embarques rumo ao mesmo destino. Segundo especialistas, a diferença entre o tamanho do rebanho brasileiro em comparação ao rebanho australiano está no cerne da questão.
De acordo com Fernando Henrique Iglesias, analista da Safras & Mercado, o Brasil tem se destacado na exportação de carne bovina para os Emirados Árabes Unidos.
“No caso da carne de frango, o Brasil é um expoente nas exportações para lá até pela capacidade de abate halal. Mas mesmo com este acordo entre a Austrália e os Emirados, até mesmo pela relação comercial construída durante anos com o Brasil, estes preços da carne bovina tendo aumentado no nosso país, ainda é mais competitivo do que quando se compara com Austrália, Uruguai, Argentina, Estados Unidos, União Europeia”, explicou.
Iglesias detalha que o Brasil hoje está muito bem posicionado no mercado global de proteínas animais, e deve se manter como grande fornecedor de proteínas para o Oriente Médio. “Os acordos comerciais vão surgindo com os players no mercado” disse, ressaltando que o setor brasileiro sabe como atender o mercado global, com preço, capacidade de produção e a demanda de cada país consumidor.
“O Brasil tem mais de 230 milhões de cabeças de gado, enquanto a Austrália tem 26, 27 milhões de cabeças de gado. Isso mostra a diferença em escala de produção”, disse.
Quem também pondera sobre a competitividade brasileira em função do tamanho do rebanho, em comparação com a Austrália, é o analista de commodities Geraldo Isoldi.
“Qualquer redução nos preços da carne australiana, portanto, pode afetar as vendas brasileiras. No entanto, é importante lembrar que o Brasil possui um rebanho bovino muito superior, com projeções de 226 milhões de cabeças para 2025, segundo a Companhia Brasileira de Abastecimento (Conab), enquanto a Austrália, segundo a MLA, conta com apenas 29 milhões de cabeças em 2024. Esse fator influencia diretamente os preços, pois rebanhos menores são mais suscetíveis a variações de mercado”, aponta Isoldi.
O médico veterinário e diretor da HN Agro, Hyberville Neto, explica que uma diminuição de taxas, de tarifas, sempre acaba beneficiando o país que vai pagar menos. Entretanto, ele destaca que a carne brasileira é muito mais competitiva que as demais, exceto em relação à do Paraguai, no momento.
“Considerando que a carne que vai para os Emirados, que não fica lá, já que são redistribuídos para outros países do Oriente Médio, estes países buscam por preço. Pensando que seja uma região com pessoas de poder aquisitivo e que o preço da carne em si não seja o problema, quando se coloca a redistribuição na equação, o preço ganha um certo peso”, afirmou Neto.
VOLUMES EXPORTADOS
As informações divulgadas pela agência internacional de notícias Reuters dão conta de que “o Australian Meat Industry Council (Conselho Australiano do Setor de Carnes) recebeu bem o acordo comercial e disse que ele ofereceria aos produtores maior acesso a um mercado vital para a carne bovina, ovina e caprina australiana”.
Geraldo Isoldi, analista de commodities, traz dados de que os Emirados Árabes Unidos foram responsáveis pela compra de aproximadamente 4% de toda a carne bovina brasileira exportada em 2023, o que corresponde a 75.000 toneladas e US$ 333 milhões em faturamento.
Até setembro deste ano, conforme pontua Isoldi, a participação dos Emirados cresceu para 6%, com 117 mil toneladas de carne bovina brasileira adquirida, com pagamento de US$ 541 milhões, ficando atrás apenas da China, com suas impressionantes 928 mil toneladas (US$ 4 bilhões), e ligeiramente abaixo dos EUA, com 118 mil toneladas (US$ 566 milhões), de acordo com dados da COMEXSTAT/SECEX.
“Ao contrário da China, que responde por mais de 50% das exportações de carne bovina brasileira e onde qualquer mudança econômica reflete de forma imediata no preço da arroba, os Emirados Árabes, apesar de serem um mercado relevante, ainda representam apenas 6% do total. Dessa forma, no curto prazo, o impacto nos preços da carne brasileira deve ser limitado”, afirmou Isoldi.
De acordo com últimos dados do International Trade Centre, compilados pela Câmara Árabe-Brasileira, a pedido do Notícias Agrícolas, a Austrália exportou para EAU um total de US$ 123,41 milhões em 2023 de carne bovina (todos os tipos), já o Brasil exportou US$ 333,22 milhões no mesmo ano, ou seja, quase o triplo.
NEGÓCIOS ENTRE O BRASIL E OS EMIRADOS ÁRABES UNIDOS
Mohamad Mourad, secretário-geral da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira, pontua que a carne brasileira compete no mercado emirático com competitividade, gozando ainda de reputação de qualidade e tradição.
“O Brasil, no âmbito do Mercosul, iniciou há pouco tempo negociações para um acordo de livre comércio com os Emirados Árabes Unidos, atendendo a uma demanda antiga dos setores produtivos dos dois países. Na avaliação da Câmara Árabe, existe no interesse mútuo pela efetivação desse acordo uma oportunidade para que fortalecer a competitividade dos produtos brasileiros, especialmente da carne bovina, exportada em grandes quantidades para o país árabe. Da mesma forma, é de extrema importância que se destravem outros acordos na região, como o Mercosul-Conselho de Cooperação do Golfo, bloco econômico que inclui sete países árabes, atualmente paralisado. Além dos acordos de livre comércio, é preciso avançar nos entendimentos de facilitação de investimento, que vão favorecer a internacionalização de empresas brasileiras na região, inclusive do setor de proteína bovina, que já têm unidades produtivas no Golfo, como facilitar o ingresso de capital árabe no Brasil. Com a região, temos o acordo Mercosul-Egito vigorando desde 2019, que é um exemplo bem-sucedido desse tipo de instrumento bilateral. O entendimento não só elevou as vendas dos dois lados da relação, como também introduziu na pauta de exportações um novo conteúdo em termos de produtos, viabilizado por tarifas mais baixas, mas também pelos esforços dos dois países para abrir seus respectivos mercados para novas categorias de produtos. Os acordos de livre comércio e de facilitação de investimentos, portanto, são instrumentos benéficos e efetivos para se desenvolver relações bilaterais”, disse a liderança, em nota enviada ao Notícias Agrícolas.
PESO DA PECUÁRIA BRASILEIRA
Neste dia 14 de outubro, quando é celebrado o Dia Nacional da Pecuária, o Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) destacou o peso do setor para o Brasil.
Atualmente, a carne bovina brasileira é enviada para mais de 150 países e, somente com a carne bovina, as vendas alcançaram US$ 1,25 bilhão em setembro deste ano, um aumento de 29,2% em comparação ao mesmo período de 2023.
“Em 2023, a produção de carne bovina foi de 9,5 milhões de toneladas, e a expectativa para este ano é de 10,2 milhões de toneladas, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). O relatório "Perspectivas para a Agropecuária – Safra 2024/25, volume 12" destaca que o Brasil é o maior exportador, o terceiro maior consumidor mundial e o segundo maior produtor de carne bovina”, destacou o Ministério da Agricultura em nota.
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