Cesar Benjamin explica “por que agora”, sobre o caso "menino do MEP"

Publicado em 02/12/2009 16:50 e atualizado em 04/03/2020 18:51

Cesar Benjamin explica “por que agora”


Cesar Benjamin, que escreveu o artigo em que relata que Lula lhe confessara ter tentado violar um companheiro de cela, volta ao assunto nesta quarta em novo texto. Ou mais propriamente: ele expõe as razões de seu artigo original e responde a uma pergunta que muita gente fez: “Por que agora?”

O texto é primoroso - entre outros motivos porque Benjamin escreve muito bem. A análise que ele faz das motivações que embalam o filme hagiográfico “Lula, O Filho do Brasil” é impecável.

Benjamin é um homem de esquerda. Eu não sou - e o que escrevo naquele post enorme desta madrugada diz por que não. Certamente temos pontos de vista absolutamente distintos sobre como aumentar o quociente de felicidade e bem-estar dos brasileiros. Mas o que escreve sobre o filme-propaganda coincide exatamente com o que penso.

Impecável, sim, no conteúdo, acho que o artigo responde com eficiência a pergunta “Por que agora?”, mas ainda é incapaz de responder “por que SÓ agora?” A informação é importante demais para ter ficado tanto tempo guardada. E, especulo apenas, ser Benjamin um homem de esquerda pode explicar em parte o seu silêncio até a semana passada. Não sei em que medida considerou que tocar, antes, no assunto correspondia a misturar esferas pública e privada; quando percebeu a tramóia hagiográfica, deu-se conta de que aquele evento nunca fora privado e sempre dissera respeito à vida pública.

Abro uma exceção e reproduzo o seu artigo na íntegra - a esta altura, ele já circula na rede.

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DEIXO de lado os insultos e as versões fantasiosas sobre os “verdadeiros motivos” do meu artigo “Os Filhos do Brasil”. Creio, porém, que devo esclarecer uma indagação legítima: “por quê?”, ou, em forma um pouco expandida, “por que agora?”. A rigor, a resposta já está no artigo, mas de forma concisa. Eu a reitero: o motivo é o filme, o contexto que o cerca e o que ele sinaliza.

Há meses a Presidência da República acompanha e participa da produção desse filme, financiado por grandes empresas que mantêm contratos com o governo federal.
Antes de finalizado, ele foi analisado por especialistas em marketing, que propuseram ajustes para torná-lo mais emotivo.

O timing do lançamento foi calculado para que ele gire pelo Brasil durante o ano eleitoral. Recursos oriundos do imposto sindical -ou seja, recolhidos por imposição do Estado- estão sendo mobilizados para comprar e distribuir gratuitamente milhares de ingressos. Reativam-se salas pelo interior do país e fala-se na montagem de cines volantes para percorrerem localidades que não têm esses espaços. O objetivo é que o filme seja visto por cerca de 5 milhões de pessoas, principalmente pobres.

Como se fosse pouco, prepara-se uma minissérie com o mesmo título para ser exibida em 2010 pela nossa maior rede de televisão que, como as demais, também recebe publicidade oficial. Desconheço que uma operação desse tipo e dessa abrangência tenha sido feita em qualquer época, em qualquer país, por qualquer governante. Ela sinaliza um salto de qualidade em um perigoso processo em curso: a concentração pessoal do poder, a calculada construção do culto à personalidade e a degradação da política em mitologia e espetáculo. Em outros contextos históricos isso deu em fascismo.

O presidente Lula sabe o que faz. Mais de uma vez declarou como ficou impressionado com o belo “Cinema Paradiso”, de Giuseppe Tornatore, que narra o impacto dos primeiros filmes na mente de uma criança. “O Filho do Brasil” será a primeira -e talvez a única- oportunidade de milhões de pessoas irem a um cinema. Elas não esquecerão.

Em quase oito anos de governo, o loteamento de cargos enfraqueceu o Estado. A generalização do fisiologismo demoliu o Congresso Nacional. Não existem mais partidos. A política ficou diminuída, alienada dos grandes temas nacionais. Nesse ambiente, o presidente determinou sozinho a candidata que deverá sucedê-lo, escolhendo uma pessoa que, se eleita, será porque ele quis. Intervém na sucessão em cada Estado, indicando, abençoando e vetando. Tudo isso porque é popular. Precisa, agora, do filme.

Embalado pelas pré-estreias, anunciou que “não há mais formadores de opinião no Brasil”. Compreendi que, doravante, ele reserva para si, com exclusividade, esse papel. Os generais não ambicionaram tanto poder. A acusação mais branda que tenho recebido é a de que mudei de lado. Porém os que me acusam estão preparando uma campanha milionária para o ano que vem, baseada em cabos eleitorais remunerados e financiada por grandes grupos econômicos. Em quase todos os Estados, estarão juntos com os esquemas mais retrógrados da política brasileira. E o conteúdo de sua pregação, como o filme mostra, estará centrado no endeusamento de um líder.

Não há nada de emancipatório nisso. Perpetuar-se no poder tornou-se mais importante do que construir uma nação. Quem, afinal, mudou de lado? Aos que viram no texto uma agressão, peço desculpas. Nunca tive essa intenção. Meu artigo trata, antes de tudo, de relações humanas e é, antes de tudo, uma denúncia do círculo vicioso da extrema pobreza e da violência que oprime um sem-número de filhos do Brasil. Pois o Brasil não tem só um filho.

Reitero: o que escrevi está além da política. Recuso-me a pensar o nosso país enquadrado pela lógica da disputa eleitoral entre PT e PSDB. Mas, se quiserem privilegiar uma leitura política, que também é legítima, vejam o texto como um alerta contra a banalização do culto à personalidade com os instrumentos de poder da República. O imaginário nacional não pode ser sequestrado por ninguém, muito menos por um governante.

Alguns amigos disseram-me que, com o artigo, cometi um ato de imolação. Se isso for verdadeiro, terá sido por uma boa causa.

LULA, O SEXO, OS ANIMAIS E AS VIÚVAS


Vocês sabem: fim de ano é hora de jogar fora papel velho, livros de auto-ajuda que lhe mandam na suposição de que você precise deles, jornais e revistas que vão ficando pelo caminho. Regra geral: “Conteúdo que já estiver na Internet vai pro lixo, excetuando-se algumas edições históricas de momentos históricos”. Há algumas coisas aqui: o fim do AI-5, os grandes comícios das diretas, afastamento de Fernando Collor, atentados de 2001, mensalão… Não jogo essas coisas, não, ainda que uma ou outra possam estar na rede. E eis que me deparo com algo tornado também histórico: a entrevista de Lula à revista Playboy em 1979. TRINTA ANOS ESTA TARDE!

Pena não ser possível digitar tudo. Sabem aquela máxima de Wordsworth que vivo citando aqui, “o menino é o pai do homem” (depois “popularizada” por Machado de Assis)? Pois é… O sindicalista era o pai do presidente. Vou brindá-los com alguns trechos que revelam o, digamos, espírito do homem por dentro daquela figura pública mítica que começava a se plasmar ali.

Lula tinha, então, 34 anos e era visto por parte da esquerda como a grande novidade da política — uma liderança genuinamente operária. Outra parte torcia o nariz e rejeitava o que lhe parecia individualismo excessivo, falta de “consciência de classe” (risos), despolitização, flerte com o populismo etc. Eu tinha 18 anos à época, militava numa organização trotskista e o considerava um verdadeiro violador dos princípios da classe operária… Bem, já contei para vocês como eu e o mito Lula nunca nos demos: antes, eu era esquerdista demais para suportá-lo; depois, acho que virei democrata demais…

Na entrevista, como não poderia deixar de ser, Lula fala sobre sexo também. Destaco um trecho:

Playboy - Com que idade você teve sua primeira experiência sexual?
Lula -
 Com 16 anos.
Playboy - Foi com mulher ou com homem?
Lula 
(surpreso) Com mulher, claro! Mas, naquele tempo, a sacanagem era muito maior do que hoje. Um moleque, naquele tempo, com 10, 12 anos, já tinha experiência sexual com animais… A gente fazia muito mais sacanagem do que a molecada faz hoje. O mundo era mais livre…

Comento
Evito comentar. Não considero o trecho propriamente político. Apenas relevo que, dada a pergunta, a resposta-síntese é esta: “Nem com mulher nem com homem”. Vamos a outro trecho. Este, com efeito, apela a algumas instâncias um tanto mais graves da vida pública.

Referindo-se a seu passado, Lula conta que já era viúvo e costumava sair da casa de uma namorada no começo da madrugada. Andava de táxi (!!!). Sempre o mesmo. O motorista lhe contara que o filho fora assassinado ainda muito jovem e que sua nora prometera jamais se casar. Pressuroso e solidário, Lula pensava  segundo ele próprio confessa: “Qualquer dia eu vou papar a nora desse velho…”. Agora sigo com Lula, entre aspas:

“Nessa época, a Mariza apareceu no sindicato. Ela foi procurar um atestado de dependência econômica para internar o irmão. Eu tinha dito ao Luisinho, que trabalhava comigo no sindicato, que me avisasse sempre que aparecesse uma viúva bonitinha. Quando a Marisa apareceu, ele foi me chamar”.

Comento
Entendeu, leitor amigo? Era morrer um representante da “craçe trabaiadora”, Lula estava ali, preparado, para “papar” a carente mulher do defunto. Se eu fosse esquerdista, construiria aqui um raciocínio demonstrando que Lula cresceu sobre os cadáveres da classe operária. Mas eu não sou. A abordagem que me interessa é a do caráter dos indivíduos. Então afirmo que Lula abusava de sua posição institucional, política, para obter uma vantagem que era, convenham, absolutamente individual. E isso expõe a diferença entre individualismo e oportunismo.

Que outro brasileiro teria sobrevivido politicamente à confissão de que usava o sindicato para “papar” a mulher de companheiros mortos? Lula sobreviveu. E se tornou um mito. Não sei se o filme mostra todo o seu empenho em conquistar as viúvas. A turma da hagiografia vai dizer que ele fizera aquele pedido porque estava em busca de uma “esposa”. O seu pensamento enquanto o taxista contava as suas agruras diz tudo: “Qualquer dia eu vou papar a nora desse velho…”

Na vida de Lula, tudo termina em filme. A “nora do velho” que ele prometera “papar” era, o que ele só soube depois, justamente… Marisa! Não é demais? Sua antevisão se consumou. Só que, consta, ele casou primeiro e “papou” depois. Mirian Cordeiro, tornada a bruxa nacional pelos adoradores de Lula, é desse período. Ele próprio já confessou que a abandonou grávida. Papou e largou. Nem todas as filhas e mulheres da classe operária que cruzaram com Lula tiveram a mesma sorte…

Ainda comentarei por estes dias outros aspectos da entrevista. Uma coisa é certa: o mito estava em construção — e a excelente entrevista feita pela Playboy — 13 páginas — não deixa de ser parte dessa construção. Mas que se releve: embora seja simpática a Lula e o trate sempre com admiração (e alguma benevolência), revela de modo indubitável que o sindicalista era o pai do presidente. Tudo estava devidamente anunciado ali.

ELES NOS QUEREM A TODOS “MENINOS DO MEP”. MAS SEM RESISTÊNCIA


Seis centrais sindicais — só falta avisar os trabalhadores da existência de algumas delas — divulgaram um manifesto, calculem!, protestando contra o artigo de Cesar Benjamin na Folha. É o texto em que ele revela que, em 1994, Lula lhe confessara ter tentado violar um companheiro de cela — chamou o rapaz de “O Menino do MEP” — quando esteve preso, em 1980.

O Planalto disse que não se manifestaria a respeito, mas anunciou que Lula não tem a disposição de processar Benjamin. O “Menino do MEP” tem hoje 60 anos e se chama João Batista. Indagado se confirmava a tentativa de violação, ele não diz nem que sim nem que não. Limita-se a afirmar que pertence a uma religião que o proíbe de mentir. Ora, ele poderia seguir a sua religião, por exemplo, negando o fato — desde que o fato seja falso, certo?

Assinam o documento Antonio Neto (Central Geral dos Trabalhadores do Brasil), Artur Henrique (Central Única dos Trabalhadores), José Calixto Ramos (Nova Central Sindical de Trabalhadores), Paulo Pereira da Silva (Força Sindical), Ricardo Patah (União Geral dos Trabalhadores) e Wagner Gomes (Central de Trabalhadores do Brasil).

No texto, os valentes questionam a Folha de S. Paulo por ter publicado o artigo e vêem objetivo eleitoral na iniciativa… Huuummm… Estariam acusando o esquerdista Cesar Benjamin de vínculos com o PSDB ou com o DEM? Justo ele que rompeu com o partido pela via esquerda? Como se nota, Lula preferiu não se defender porque há quem faça isso por ele. E, como esses caras são quem são, vão logo indagando o direito que a imprensa tem de ser… imprensa.

Por eles, seríamos todos “meninos do MEP”! Só que sem resistência.

Essa é a independência das centrais sindicais no Brasil. Respondam rápido: como instituição, o que é que os sindicatos têm a ver com essa história? Eu sei o que elas têm a ver com Lula: ele viabilizou o projeto que garante a essas entidades “independentes” uma parcela do pornográfico Imposto Sindical e vetou o artigo que as obrigava a prestar conta ao Tribunal de Contas da União.

Assim, elas realmente ficaram independentes: são independentes da lei e dependentes de Lula. Vale dizer: estão na cela por sujeição voluntária.


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ROBIN WILLIAMS, OBAMA, O PÓ E A VIRA-LATICE


Leitores pedem que me manifeste sobre a entrevista do ator Robin Williams a David Letterman. Referindo-se às Olimpíadas de 2016, afirmou que foi uma disputa desigual: “Espero que Oprah [ Winfrey] não fique chateada com as Olimpíadas. Chicago mandou Oprah e Michelle [Obama]. O Brasil mandou 50 strippers e meio quilo de pó [cocaína]. Não foi justo”. Todos acharam muito engraçado. Pareciam Silvio Tendler ouvindo uma piada de Lula em 1994…

O que eu penso? Trata-se de uma óbvia boçalidade — vinda de um boçal habitual. Confesso que tenho certos problemas com este senhor. Todos temos os nossos piores atores, não é? Williams é o meu pior ator. Seus personagens são sempre os mesmos, pouco importa se ele estrela um dramalhão ou uma comédia. Mas não é aquele “mesmo” que faz os gênios — de certo modo, Marlon Brando nunca deixou de ser Marlon Brando. É o “mesmo” que faz os cretinos.

Ele deveria ter-se lembrado que o pateta Barack Obama também esteve presente à solenidade. Não foram só Michelle e Oprah. A ser assim, ainda que o Brasil tivesse levado suas strippers, elas teriam sido mais convincentes no rebolado delas do que Obama no rebolado retórico dele. Só um bobalhão faria o presidente dos EUA pagar um mico como esse. Lula presente, se o Rio tivesse sido preterido, tudo bem. Restaria ainda o discurso da vítima. Como ganhou, o brasileiro escolheu a linguagem triunfalista. Obama presente, se Chicago tivesse vencido, diriam que era uma trama do império. Como perdeu, restou a imagem do império decadente. Houve um grande tolo naquela história. Não foi o Brasil.

Quanto ao pó.., Bem, nos EUA ele faria mais sucesso. Afinal, o país cheira toda a produção colombiana. E isso já incluiu, não sei se inclui ainda, Williams, que já fez tratamento para se livrar do vício.

Pronto! Paro por aqui e acho que se deve parar por aqui. A indignação nacionalista, com ameaças de processar o ator nos EUA, é pura vira-latice arrogante. Williams é um idiota num grande país, onde há liberdade de expressão para que se possa ser, inclusive, um idiota.

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Fonte:
Blog Reinaldo Azevedo (Veja)

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