E as instâncias intermediárias entre o “sim” e o “não” continuam a ser testadas na história do “Menino do MEP”. João Batista dos Santos, então militante do Movimento de Emancipação do Proletariado, que esteve preso com Lula em 1980, falou com a Folha. À VEJA desta semana, indagado sobre o conteúdo do artigo de Cesar Benjamin — segundo quem Lula lhe relatara que havia tentado violar, sem sucesso, o “menino do MEP”—, Santos respondeu: “Isso tudo é um mar de lama. Não vou falar com a imprensa. Quem fez a acusação que a comprove”. E só!
A resposta ao repórter Fábio Amato, na Folha de hoje, parece ainda mais enigmática. Lula tentou subjugá-lo? “Não tenho nada para comentar sobre o assunto”. Num e-mail ao repórter, já havia escrito que nada diria a respeito, afirmando que se converteu a uma religião que o proíbe de mentir.
Santos, hoje com 6o anos, casado, oito filhos, chegou a se dizer “emocionado” com o relato que Cesar Benjamin fez de sua própria passagem pela cadeia, “sendo que aqueles mais ferozes da prisão foram amigáveis para com ele”. Se vocês se lembram, o articulista afirma que foi entregue, aos 17 anos, para ser usado pelos outros presos, mas que foi respeitado por todos. Santos se emocionou justamente com esse respeito.
Ele também criticou a Folha e afirmou que, se Octavio Frias de Oliveira, morto em 2007, estivesse vivo, o texto não teria sido publicado.
A questão
Ainda sobre o post abaixo:
Por que João Batista fez questão, sem que lhe tivesse sido perguntado, de informar que aderiu a uma religião que o proíbe de mentir?
Talvez seja confiança na lógica. Ocorre que, hoje em dia, muitos não distinguiriam de um fardo de alfafa essa forma de apreensão da realidade.

DEIXEMOS QUE COMAM CAPIM. VAMOS LIDAR COM A LÓGICA, LEITORES!
A história do “Menino do MEP” virou realmente um enigma a ser decifrado pela linguagem. Ou nem tanto. Na Folha de hoje, o repórter Fábio Amato fala com João Batista dos Santos, militante do Movimento de Emancipação do Proletariado, que esteve preso com Lula em 1980. Em “Máximas de Um País Mínimo”, escrevo: “A lógica é uma iguaria do pensamento, mas há quem prefira comer capim”. Pois é…
A Folha indagou a João Batista se Lula, afinal, tentou ou não molestá-lo, conforme relato que o agora presidente fez a Cesar Benjamin, o que foi confirmado pelo cineasta Silvio Tendler — que viu naquilo, no entanto, só uma “brincadeira”. E João Batista dá algumas respostas que renderiam um pequeno tratado lógico.
Ao repórter, ele disse não ter nada a dizer sobre o relato de Cesar Benjamin. E emendou: “Sou convertido em uma religião que não me permite mentir”. Certo!
O que faz alguém que se ocupa da lógica? Lembra que uma religião que impede alguém de mentir certamente não o impede de dizer a verdade — ao contrário: que eu saiba, todas estimulam tal prática. Assim, notem:
1 - Se o episódio não aconteceu, e Batista afirmasse ter acontecido, então ele estaria mentindo,o que sua religião proíbe;
2 - se o episódio não aconteceu, e Batista negasse ter acontecido, estaria dizendo a verdade,o que sua religião permite;
3 - se o episódio aconteceu, e Batista afirmasse ter acontecido, estaria dizendo a verdade, o que sua religião permite;
4 - se o episódio aconteceu, e Batista negasse ter acontecido, estaria mentindo, o que sua religião proíbe.
Prestem atenção à hipótese 2: A VERDADE SE ESTABELECERIA, e todos sairiam bem na fita: a) Lula, que, então, estaria livre da suspeita; b) ele próprio, que não carregaria na memória um evento desagradável; c) sua religião, que não teria sido desrespeitada.
No caso da hipótese 3, sua religião continuaria prestigiada, mas a reputação do agora presidente sairia arranhada, e ele próprio teria alguns contratempos.
As hipóteses 1 e 4 são vetadas a Batista: na 4, teria havido a tentativa de molestamento, mas ele preferiria preservar Lula e a si mesmo. Na primeira, ele não preservaria ninguém, nem os fatos. Todos saíram chamuscados.
A indagação óbvia é por que Batista não se fixou no item 2 e pronto. Estaria a resposta nos itens 3 e 4? O fato é que, depreende-se do texto, ele prefere não falar sobre o assunto porque não pode mentir.
Encerrando
Realmente comovente o silêncio quase unânime daquilo que os
petistas chamam “mídia” sobre esse assunto. Mais do que isso: as
vestais ficaram chocadas que isso tenha ido parar num artigo de jornal…
Muitos se apressaram em negar o que o próprio Batista — aquele que não
pode mentir — não negou.
Assunto privado em cadeia pública, envolvendo aquela que era, então, a principal liderança sindical do Brasil e depois presidente da República??? Desde quando??? A censura exercida pelo estado é coisa gravíssima, mas morre junto com a democracia. A autocensura em razão de simpatias ideológicos ou da adesão ao politicamente correto é também grave — e costuma não ter cura.