A luta pela boquinha sindical (editorial do ESTADÃO)

Publicado em 28/07/2016 12:33
É por essa razão que as principais centrais sindicais do País começam a se organizar para, em conjunto, impedir que o governo do presidente em exercício Michel Temer leve adiante uma necessária reforma trabalhista (editorial de hoje de O Estado de S. Paulo) + O GLOBO + BLOG DE AUGUSTO NUNES

Quando se trata de atravancar qualquer iniciativa que possa significar a modernização e a racionalização das relações de trabalho, os chefões dos sindicatos esquecem até mesmo as mais agudas rivalidades políticas que os separam. Sabem que precisam unir forças para manter inalterada uma situação que confere aos sindicatos um enorme poder e abundantes recursos.

É por essa razão que as principais centrais sindicais do País começam a se organizar para, em conjunto, impedir que o governo do presidente em exercício Michel Temer leve adiante uma necessária reforma trabalhista. A mais recente adesão a esse movimento é a da Central Única dos Trabalhadores (CUT), braço sindical do PT.

O presidente da CUT, Vagner Freitas, informou que, depois que o processo de impeachment for encerrado, engrossará as fileiras dos que pretendem “negociar” com o governo os termos da reforma – em outras palavras, pressionar o Planalto, sob ameaça de infernizar a vida dos brasileiros em geral com greves e piquetes, para manter a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) exatamente como está, como se o País ainda estivesse na década de 40 do século passado.

“Depois que (o impeachment) passar no Senado, nós vamos negociar, com Temer ou com Dilma”, informou Freitas, segundo o jornal Valor. Pode-se dizer que tal disposição – ainda que o verbo “negociar”, na boca dos capi da CUT, frequentemente tenha o mesmo sentido que “chantagear” – é uma mudança significativa em relação às atitudes dos sindicalistas do PT até aqui. Em primeiro lugar, o líder da CUT admite conversar com Temer, cujo governo a central diz considerar “ilegítimo” e contra quem Vagner Freitas havia prometido mobilizar os trabalhadores para “ir para as ruas entrincheirados, com armas na mão”, caso o impeachment avançasse. Agora, ao aceitar “negociar” com Temer, Freitas sinaliza que a CUT reconhecerá o governo do peemedebista, abandonando, na prática, a patacoada segundo a qual está em curso um “golpe” contra a presidente Dilma Rousseff.

No entanto, o que poderia ser sintoma de amadurecimento da CUT nada mais é do que o recorrente oportunismo sindical. Diante da constatação de que as demais centrais sindicais já estão na mesa de negociação com Temer há algum tempo, a CUT parece ter percebido que ficaria isolada, sem nenhuma influência sobre os desdobramentos desse processo, restando-lhe a patética defesa de Dilma, por quem, aliás, os sindicalistas do PT jamais morreram de amores.

Nos cálculos da CUT, portanto, a eventual lealdade que a central ainda pudesse nutrir em relação à governante petista foi preterida pelo mister de preservar seu poder. E isso implica juntar-se a velhos rivais, especialmente a Força Sindical, com quem a CUT disputa espaço desde os anos 90, quase sempre em campos políticos opostos.

Agora mesmo, enquanto a CUT jurava defender Dilma com unhas e dentes, a Força Sindical alinhava-se a Temer. Mas, sendo esse o sindicalismo de resultados, nem tudo é tão simples. Do mesmo modo que a CUT começa a abandonar Dilma, o apoio da Força Sindical a Temer muitas vezes se assemelha a oposição, com direito inclusive a ameaças de greve geral.

Tudo isso porque o governo Temer pretende encaminhar ao Congresso uma proposta de reforma que atualize a CLT, para fazer a legislação acompanhar a modernização tecnológica, que alterou as relações de trabalho, e privilegiar o negociado em relação ao legislado, fortalecendo a negociação coletiva e permitindo que cada setor produtivo encontre as melhores soluções para cada caso.

É claro que uma reforma assim, se levada adiante, pode representar risco para o poder quase imperial que as centrais sindicais exercem sobre o mercado de trabalho. Para essa turma, pouco importa se as mudanças visam a criar mais empregos, pois a preocupação dos sindicatos não é com os 11 milhões de desempregados atualmente no País, e sim com a manutenção de um sistema que lhes dá o monopólio da negociação trabalhista e é sustentado, na marra, pelos assalariados, gente que, ao contrário dos sindicalistas, tem de trabalhar para viver.

 

Dívida preocupante (editorial da GAZETA DO POVO, de Curitiba)

O governo brasileiro abusou do direito de errar na política macroeconômica e tudo indica que legará um quadro geral pior que o herdado pelo PT quando Lula chegou ao poder

O governo federal tinha como meta obter superávit primário nas contas públicas de R$ 66 bilhões em 2015, que é o saldo de caixa após o pagamento de todas as suas despesas, exceto os juros da dívida pública. O superávit é a poupança requerida porque o governo tem dívida sobre a qual incidem juros que precisam ser pagos. Como o governo nunca reduz o principal da dívida, é necessário que pelo menos os juros sejam pagos – se não no todo, ao menos em parte –, como forma de evitar que a dívida siga aumentando perigosamente.

Para melhor compreensão desse fenômeno, o Produto Interno Bruto (PIB) de 2015 está estimado em R$ 5,6 trilhões e a dívida pública interna líquida atualmente já está em R$ 2,8 trilhões – ou seja, 50% do PIB. A dívida bruta (o total que o setor público deve) já passa dos 64% do PIB, e é sobre esta que o governo deve pagar juros. O total da arrecadação tributária do governo (municípios, estados e União) deve atingir R$ 2,1 trilhões, pouco mais de 37% do PIB, do qual o governo previa ter superávit de R$ 66 bilhões para pagar uma parte (em torno de um terço) dos juros da dívida. Se isso ocorresse, não pagando a totalidade dos juros, a dívida iria crescer perto de R$ 150 bilhões, valor equivalente ao déficit público nominal final.

Na semana passada, os ministros da Fazenda e do Planejamento anunciaram oficialmente a revisão da meta de superávit primário, fixando-o em apenas R$ 6,5 bilhões. É praticamente nada diante do tamanho do problema e da necessidade de evitar a explosão da dívida pública. O argumento principal do governo para o abandono da meta de superávit é a fraca arrecadação tributária decorrente da recessão econômica que o país vive. Trata-se de confissão de que o governo não consegue reduzir gastos e preferiu assumir o que o mercado inteiro já sabia: não haverá superávit algum e a dívida pública vai seguir crescendo de forma perigosa.

 

Se fosse o Brasil um país em que a carga tributária estivesse no patamar de 25% do PIB, por exemplo, a saída seria a elevação dos impostos para fazer frente a esse momento difícil. Mas a carga tributária brasileira era de 21% do PIB há 30 anos – quando José Sarney, primeiro presidente após o regime militar, assumiu a Presidência. De lá para cá, vem aumentando todos os anos e já passa dos 37% do PIB. É uma carga muito alta e a partir desse limite eventuais elevações tributárias começariam a corroer as bases da economia brasileira.

Outro ponto essencial embutido nessa questão é o financiamento da dívida pública. O governo consegue fazer dívida até o volume que a sociedade tenha de dinheiro para emprestar ao setor público. Os bancos não criam dinheiro do nada e os recursos emprestados ao governo vêm dos depósitos feitos pelas pessoas e pelas empresas, os quais saem da renda nacional – que é apenas o outro lado do produto nacional – em forma de depósitos nos bancos e aplicações financeiras. Eventualmente, o governo pode se financiar tomando dinheiro emprestado no exterior. Entretanto, dívida tomada em dólar tem de ser paga em dólar, moeda essa que ingressa no país pelas mãos do setor privado, via exportações.

São essas questões que a sociedade brasileira precisa entender para poder avaliar o grau de gravidade e do perigo imposto por um sistema público que não controla suas contas e persiste em déficits crônicos. Assim como a carga tributária chegou ao seu limite, a dívida pública também, e estima-se que ela possa chegar a 70% do PIB ao fim do governo Dilma – essa, sim, uma herança maldita a ser jogada no colo do próximo governante. O Brasil vai pagar caro por não conseguir obter o superávit que havia prometido, a começar pelo aumento no grau de risco internacional e a consequente elevação da taxa de juros sobre os empréstimos obtidos no exterior.

A dívida consolidada do setor público é muito preocupante e esse deve ser o assunto central na discussão sobre a gestão das contas públicas nos próximos anos. O governo brasileiro abusou do direito de errar na política macroeconômica e tudo indica que legará um quadro geral pior que o herdado pelo PT quando chegou ao poder. O débito maior pela piora rápida na situação deve ser lançado sobre Dilma Rousseff, que, por teimosia, resolveu não ouvir os especialistas e jogou no lixo as bases da política econômica iniciada no governo Fernando Henrique e mantida no primeiro governo Lula. 

Benett

 

No GLOBO: Moro participa de ato contra mudança na lei sobre abuso de autoridade

SÃO PAULO — O juiz Sérgio Moro voltou a criticar a lei sobre crimes de abuso de autoridade, que está prestes a ser votada no Senado, em um ato realizado nesta quinta-feira na sede da Justiça Federal em Curitiba. O protesto mobilizou entidades de classe de juízes e do Ministério Público contra o projeto do senador Renan Calheiros (PMDB-AL). Moro voltou a dizer que ninguém é contra que autoridades que cometam abuso sejam responsabilizadas, desde que os abusos realmente tenham ocorrido, mas ressaltou que a redação atual do projeto, por sua abrangência, corre o risco de punir um juiz por ele ter tomado uma decisão interpretando a lei.

— Corre se o risco de se criar o que é chamado de crime de hermenêutica, punir o juiz por ele ter tomado uma decisão interpretando a lei. Alguém que eventualmente discorda, se esse projeto for aprovado, poderia em seguida propor ação penal contra o juiz, afirmando que ele teria cometido abuso de autoridade, quando em realidade ele teria apenas interpretado a lei, como é um exigência e uma garantia da magistratura e na sua atuação independente — disse Moro.

Moro defendeu que é importante que a interpretação da lei e do direito não seja criminalizada, para que os juízes possam atuar com independência, especialmente em processos envolvendo pessoas poderosas.

— A independência não é privilégio ou uma proteção ao juiz, mas às pessoas que esperam que através dos processos seja realizada justiça na forma da lei, independentemente da existência ou não de interesses especiais nestes processos.

O ato contra a aprovação do projeto de lei teve a participação de representantes do Ministério Público Federal, como o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, porta-voz da força-tarefa da Lava-Jato, e foi realizada pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), com a participação da Associação Paranaense dos Juízes Federais (Apajufe), da Associação Paranaense do Ministério Público (APMP) e da Associação dos Magistrados do Paraná (AMAPAR),

— Sem um Judiciário independente, os juízes não podem fazer seu trabalho e ficarão à mercê de poderosos, verdadeiros alvos dessas operações — afirmou o presidente da Ajufe, Roberto Veloso.

“Toma que o apê é seu” e outras quatro notas de Carlos Brickmann (EM VEJA.COM)

Publicado na coluna de Carlos Brickmann

Nada de estranho: você, caro leitor, não é dono de um imóvel; e, aproveitando a oportunidade que não existe, exige que os donos do imóvel que não é seu (e você proclamou que não é seu) lhe paguem por ele.

Pois é: Marisa Letícia, esposa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, abriu processo contra a Bancoop, Cooperativa Habitacional dos Bancários, e a empreiteira OAS, pedindo que lhe paguem, “em parcela única e imediata”, a quantia de R$ 300.817,37, referentes à cota de um apartamento no Edifício Solaris, no Guarujá – sim, sim, o mesmo do famoso triplex que mobilizou a Polícia Federal e o Judiciário.

Há algum tempo, na Europa, uma igreja cristã, situada ao lado de um prostíbulo, promovia rezas diárias (e em alto volume) contra as atividades do vizinho. E, claro, o volume das orações atrapalhava o movimento. Um dia, o prostíbulo foi destruído por um incêndio, e sua proprietária responsabilizou judicialmente as orações da igreja vizinha pelo problema, exigindo indenização. A igreja disse, na defesa, que as orações nada tinham a ver com o incêndio.

Este colunista não se lembra do resultado da disputa, mas nunca esqueceu uma frase do juiz: “Jamais imaginei julgar uma causa em que um prostíbulo culpe as preces do vizinho como causadoras de seu prejuízo; e a igreja afirmar que as orações não têm efeito nenhum”.

O barateiro

Lembra de Fernando Cavendish, da empreiteira Delta? Aquele da Festa dos Guardanapos, em Paris, com hotel fechado para seletos candidatos, como Sérgio Cabral, com mulheres exibindo as solas vermelhas de seus caros calçados Louboutin? Bem, Cavendish apresentou sua defesa no processo da Operação Saqueador, e disse que a Delta “foi responsável por uma economia milionária aos cofres públicos”. Deve ter razão: uma economia tão grande que lhe deve ter permitido financiar a farra parisiense.

Sem essa economia, a conta da festa poderia cair no velho e bom Tesouro.

Turismo

Dilma diz que, se o impeachment for aprovado, vai repousar algum tempo fora do país, no Uruguai ou no Chile. São excelentes pontos turísticos, mas Dilma esquece os amigos: por que não Venezuela e Cuba?

Atenção

O processo contra a senadora Gleisi Hoffmann, do PT paranaense, será animadíssimo – e não apenas por Gleisi ser ministra e amiga de Dilma e esposa de outro político petista de importância, o ex-ministro Paulo Bernardo; mas por esbarrar no porto cubano de Mariel, construído pela Odebrecht e financiado pelo BNDES. Pode roubar as manchetes.

Sinal de perigo

Só 37% dos alunos que acabaram recentemente o ensino médio pensam em ir para a Universidade. O número de universitários no último ano caiu 22,4%. A maior parte culpa a crise, que os obriga a trabalhar mais cedo. Resolvem seu problema, mas o desenvolvimento do país fica para trás.

Dilma identifica mais dois integrantes da conspiração golpista: o ‘surto de misoginia’ e o ‘componente sexista’

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Inconformada com o despejo do Palácio do Planalto, arrogante demais para reconhecer que perderá o emprego pelo que fez e pelo que deixou de fazer, Dilma Rousseff vem desperdiçando o tempo que tem de sobra engrossando a fila de culpados pelo golpe que a Constituição autoriza. Já é maior que as plateias amestradas dos comícios estrelados pela Assombração do Alvorada. E só vai parar de crescer quando a avó dedicar-se em tempo integral aos cuidados requeridos pelo neto Gabrielzinho.

Puxada por Eduardo Cunha, a fila inclui Aécio Neves, os tucanos que não abrem mão do terceiro turno, direitistas rancorosos que não digerem o sumiço dos pobres e dos miseráveis, os inimigos do Bolsa família, dos movimentos sociais e dos direitos trabalhistas, o traidor Michel Temer, os partidos que caíram fora da base alugada, os ex-ministros que que agora apoiam o impeachment, os ministros do Supremo que não sabem ser gratos a quem os nomeou, os simpatizantes do regime parlamentarista, o juiz Sérgio Moro, os que aplaudem a Lava Jato e os que sonham com uma bomba nuclear explodindo a República de Curitiba, fora o resto.

Nesta semana, durante a entrevista a uma emissora de rádio francesa, Dilma encompridou espetacularmente a fila com outra descoberta espantosa: incontáveis brasileiros desejam vê-la pelas costas “devido ao grande surto de misoginia que sofre o Brasil e também a um componente sexista”. Sofre de misoginia quem tem aversão a tudo que é ligado a mulheres. Sexista é quem discrimina um gênero ─ o feminino, no caso. A presidente que vê um cachorro oculto por trás de toda criança agora enxerga um país atulhado de brucutus que não admitem ser governados por uma fêmea.

Dilma não faz sentido há muito tempo. Mas o uso de palavras que nunca frequentaram seu minguado repertório vocabular sugere que algo de novo aconteceu. Talvez ande trocando ideias com Marilena Chauí.

José Nêumanne: Lula, um atrapalho no trabalho

Em 2003, primeiro ano de seu primeiro governo, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva visitou Cabaceiras, cidade às margens do Rio Taperoá e que já serviu de cenário para filmes que retratam o sertão nordestino, embora não fique propriamente neste, mas no chamado Cariri, parte de um bioma único no mundo, a caatinga. A paisagem do semiárido é inóspita e única. Do helicóptero, que pousou no leito seco do rio, Lula desceu no meio da poeira com o prefeito, o governador e os principais líderes governistas e da oposição daquele município e do Estado da Paraíba. Muita gente do local e das cidades vizinhas acorreu para vê-lo. E Lula atendeu a todos de forma cativante e carismática, trocando ideias com crianças do grupo escolar, fardadas de gala para a ocasião.Publicado no Blog do Nêumanne

Em 13 de julho de 2016, ele desembarcou de um Gulfstream G200, jato executivo de muito luxo e alta performance, para um encontro com militantes contra o impeachment de Dilma no aeroporto Oscar Laranjeira, em Caruaru, maior cidade do agreste pernambucano. Conhecida por promover uma festa junina muito frequentada, a terra natal do mestre Vitalino, célebre artesão de barro cozido, fica a meio caminho entre Cabaceiras e Caetés, vilarejo onde Lula nasceu. Segundo relato dos repórteres da revista VEJA daquela semana, Thiago Bronzatto e Daniel Pereira, não havia militantes à sua espera: todos estavam reunidos no lugar da recepção onde seria servido o almoço gratuito. E o portão do aeródromo foi fechado para que o vexame não fosse registrado por jornalistas abelhudos. A visita se resumiu a um encontro com membros da CUT e do MST, o prefeito e alguns políticos fiéis num auditório com capacidade para 70 pessoas. Dali mesmo cancelou um compromisso em Crato, Ceará, que fica razoavelmente perto. Lá receberia o título de doutor honoris causa da Universidade Regional do Cariri. Preferiu voar para Brasília.

À Capital foi com o intuito de pregar uma peça no vice-presidente no exercício da Presidência, Michel Temer, que enfrentava uma rebelião de parte de sua base na Câmara dos Deputados, a cuja presidência concorriam 16 pretendentes. A ideia original de Lula era apoiar o candidato do DEM, Rodrigo Maia (RJ), para sair como grande vitorioso sobre o “vice golpista”, que apoiava Rogério Rosso (PSD-DF). Este tinha sido o relator da Comissão de Impeachment, que abriu o processo de afastamento da presidente Dilma Rousseff, iniciando o calvário dela. A bancada petista não engoliu a afronta de votar num colega que apoiou o impeachment e lançou o dissidente do PMDB, Marcelo Castro, que tinha votado contra o processo, cumprindo ordens de Dilma e desafiando Temer, que descarregou os próprios votos em Maia. Este obteve 120 votos e enfrentou Rosso no segundo turno. Castro, ex-ministro da Saúde da petista, teve 70. Somados aos 22 de Luiza Erundina (PSOL-SP) e 16 de Orlando Silva (PCdoB-SP), a esquerda conseguiu frustrantes 108, pouco mais de um quinto dos 513 deputados federais. No segundo turno, o líder máximo petista reforçou a votação contra o Centrão, criado por Eduardo Cunha e representado por Rosso, levando o filho do ex-prefeito César Maia do Rio a uma votação vitoriosa consagradora de 218 votos. Lula foi buscar lã e saiu tosquiado numa Casa de leis da qual já foi senhor e suserano.

Dias antes, o senador aliado Roberto Requião (PMDB-PR) convidara colegas para ouvir dele seus melhores argumentos sobre a permanência de Dilma e do PT no governo federal. Cristovam Buarque (PDT-DF), tido como indeciso, preferiu encontrar-se na ocasião com uma funcionária da diplomacia americana residente na França. O líder de Dilma, Humberto Costa (PT-PE), preferiu “não constranger” o prócer. E só foram seis.

A pesquisa Datafolha calculou em 50% a porcentagem dos brasileiros a favor de Temer ficar no governo e em só 32% (menos de um terço) os adeptos da tese de que a saída de Dilma é mesmo um golpe. Nela o ex-presidente liderou no primeiro turno em quatro cenários: disputando com Aécio, Alckmin e Serra, do PSDB, ou Marina Silva, da Rede. Isso dá um quinto dos votos, menos do que a votação tradicional do PT, mesmo antes de suas enxurradas nas urnas. E Lula perderia no segundo turno para qualquer um dos quatro.

Em pesquisa mais recente, publicada por Ricardo Noblat, no Globo de segunda-feira 25 de julho, o resultado ainda é mais contundente. Segundo o Instituto Paraná, apenas 15,2% responderam aos pesquisadores que querem vê-lo de volta à Presidência. Para 34,15%, seria preferível que ele se aposentasse na política. E 47,7% querem que ele seja preso. Os números impressionam, pois o próprio Datafolha registrou, há somente cinco meses, que Lula foi considerado o melhor presidente brasileiro de todos os tempos por 37% dos entrevistados, superando de longe seu antecessor, Fernando Henrique, com 15%.

Parte do milionário capital eleitoral de Lula foi triturado pelas denúncias de corrupção do PT durante seus oito anos de governo e os cinco anos, quatro meses e 12 dias da gestão da discípula e afilhada que elegeu, Dilma Rousseff. A roubalheira que provocou a maior crise política e o caos econômico com desemprego e quebradeira de empresas, embora ainda não tenha apagado de todo as boas lembranças dos tempos de bonança em suas gestões, demoliu seu prestígio pessoal e sua reputação de vencedor.

Tem sido cada vez mais difícil para Lula convencer mesmo seus mais fiéis prosélitos de que ele é mesmo o homem mais honesto de todos os tempos em todos os lugares, como insiste em afirmar. Afinal, ele vive sob o temor da prisão que pode ser decretada em primeira instância seja por Sergio Moro, o juiz da Lava Jato, seja na Operação Zelotes, na Justiça Federal, em Brasília, e na Justiça estadual de São Paulo, por ocultação de patrimônio imobiliário: um apartamento no Guarujá e um sítio em Atibaia.

Na semana passada, o promotor Ivan Cláudio Marx, o mesmo que arquivou processo penal contra Dilma pelas pedaladas, voltou a denunciá-lo em processo por obstrução de justiça. Este tinha sido devolvido à primeira instância depois de despacho no mesmo sentido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, quando estava na última instância.

A defesa de Lula pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que o livrasse do juiz Sergio Moro, por ser este seu acusador, e não julgador. O presidente Lewandowski podia ter simplesmente se negado a receber o pedido, mas preferiu mandá-lo de volta a Teori Zavascki, relator da Lava Jato. Este só voltará de férias em agosto, tido como o mês do desgosto.

Este deve ter sido o ânimo com que Lula leu a notícia do Estadão de sábado 23 de julho de que Moro respondeu à interpelação do STF garantindo que a interceptação dos áudios de conversas telefônicas de Lula com ministros do governo Dilma podiam motivar a prisão dele. Pois, conforme o juiz federal, esta “revelou uma série de diálogos do ex-presidente nos quais há indicação de sua intenção de obstruir as investigações, o que por si só poderia justificar, por ocasião da busca e apreensão, a prisão temporária dele, tendo sido optado, porém, pela medida menos gravosa da condução coercitiva. A medida de condução coercitiva, além de não ser equiparável à prisão, nem mesmo temporária, era justificada”.

Lula e seus advogados poderiam ter dormido sem essa, como dizia minha avó. Se é que eles têm dormido desde que o ex se tornou para os brasileiros que perdem seus negócios e seus empregos um “atrapalho no trabalho”, como definia o título de um livro do beatle John Lennon.

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Fonte:
Blog Augusto Nunes, de veja.com

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